Fundamentos epistemológicos da psicologia cognitiva chegando as neurociências Fundamentos epistemológicos de la psicología cognitiva cercana a las neurociencias |
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Doutoranda do Programa de Pós-Graduação de Psicologia |
Juliana Vieira Almeida Silva (Brasil) |
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Resumo Neste artigo procurou fazer uma revisão epistemológica sobre a Psicologia Cognitiva, relacionado com as Neurociências. Foi construído um caminho que perpassou o Behaviorismo, as ciências cognitivas, neuropsicologia até as neurociências associando esta última a processos tecnológicos. Unitermos: Ciências cognitivas. Psicologia cognitiva. Neurociências |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 133 - Junio de 2009 |
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Introdução
No início do século passado, surge o behaviorismo que tem como objeto de estudo o comportamento, opondo-se ao mentalismo e ao introspeccionismo. O movimento nasceu nos Estados Unidos frente a duas matrizes de pensamento: o estruturalismo (vindo da Europa) que estudava fenômenos estáticos e o funcionalismo (mais compatível com a mentalidade do novo mundo) que enfatizava os caminhos de mudança. Porém, o behaviorismo tem as suas origens nessa última matriz, onde considera a mente ou os estados mentais sendo diferenciados pela função que desempenham no sistema, independente do tipo de substrato físico (Lopes, Lopes e Teixeira, 2004).
Como pioneiro do Behaviorismo encontramos Watson que possuía como proposta a observação do comportamento usando procedimentos objetivos e desconsiderando fenômenos como consciência, sentimentos e estados mentais. De acordo com Matos (1998), para Watson, todo o comportamento estudado é comportamento aprendido e as causas do comportamento devem ser encontradas em seus antecedentes imediatos e não na mente, como no mentalismo e sim, deveria ser procurada no ambiente. Para ser considerado comportamento, no Behaviorismo Metodológico ou Behaviorismo Watsoniano, é necessário que seja observável por outro indivíduo. E também outro pressuposto importante é o fato que esse behaviorismo não nega a existência da mente e sim, nega seu status científico que é comprovado que esta não pode ser estudada ao fato da sua inacessibilidade.
O behaviorismo de Skinner, chamado de Behaviorismo Radical, tem propostas diferenciadas do behaviorismo de Watson: não acredita na existência da mente, mas concorda em estudar eventos internos, com isso não dicotomizando mundo interno de externo. Para Skinner (2000), comportamento é interação de organismo-meio, aceita a introspecção e rejeita a consciência. Porém concorda com a introspecção não como método, e sim como objeto de estudo. Micheletto e Serio (1993) demonstram assim que o sujeito de Skinner é um sujeito em interação, onde há uma transformação de homem e ambiente e nessa relação acontece o comportamento e as suas conseqüências. Mas pensar no cerne da matriz funcionalista, bem como em uma ciência da cognição foi contraditório o pensamento da teoria behaviorista.
Para Gardner (1995) o behaviorismo fracassou em ser uma ciência da mente e há mais de um século os psicólogos procuravam encontrar as leis básicas do funcionamento da mente humano que foi obtido pela psicologia cognitiva, mas antes de entrar nesta questão é importante conhecer sobre as ciências cognitivas que fundamentam essa nova “psicologia”.
Das ciências cognitivas e neurociências
Os cientistas cognitivos se questionam sobre o que é conhecer algo e ter crenças precisas, bem como procuram entender o que é conhecido (objetos e sujeitos do mundo externo) e a pessoa que conhece (processos cognitivos como memória, tomada de decisões, linguagem, atenção, aprendizagem, entre outros). Os cientistas ainda investigam as fontes do conhecimento: de onde vem, forma de armazenamento e recuperação das informações. Eles também são intrigados com certas perguntas: qual a diferença entre os indivíduos que aprende mais rápido entre os que têm mais dificuldade? O que acontece com uma pessoa que sofreu lesão cerebral?
Segundo Gardner (1995) a ciência cognitiva possui como objetivo explicar a natureza do conhecimento humano, usa de métodos empíricos para testar suas hipóteses e teorias, para que assim possam ser refutáveis. Os cientistas cognitivos estão preocupados em construir disciplinas novas, como exemplo a inteligência artificial e também utilizam de avanços científicos e tecnológicos de diferentes disciplinas como o computador.
“Defino a ciência cognitiva como um esforço contemporâneo, com fundamentação empírica, para responder questões epistemológicas de longa data, principalmente àquelas relativas à natureza do conhecimento, seus componentes, suas origens, seu desenvolvimento e seu emprego” (Gardner, 1995, p. 19).
Várias pesquisas procuraram relacionar o conhecimento das ciências cognitivas com a Psicologia, distanciando-se do behaviorismo. Com a vinda do computador e a linguagem da teoria da informação contribuíram na legitimação de uma nova abordagem. Não se restringiria mais a eventos e comportamentos e sim, a considerar a representação da informação dentro da mente.
Conforme Eysenck e Keane (1994) a psicologia cognitiva surgiu em um momento histórico propiciado por uma visão tradicional da ciência se modificando, portanto a psicologia cognitiva tem a possibilidade de se constituir enquanto identidade científica e firmando como seu objeto de estudo a mente. Outro fato é do behaviorismo não ter atingido o objetivo de ser uma ciência da cognição humana adequada apesar da sua proposta inicial ter como matriz de pensamento o funcionalismo.
Entre os antecedentes da Psicologia Cognitiva pode-se encontrar Willian James com seus estudos sobre a atenção e a memória e Tolman com o mapa cognitivo em camundongos. Os neuropsicólogos no século XIX também influenciaram com pesquisas de déficit de linguagem em pacientes com lesão cerebral e as partes do cérebro envolvidas nesse déficit. Porém, segundo Eysenk e Keane (1994) somente nos anos 50 que a psicologia cognitiva avançou e principalmente com o surgimento do computador digital que serviu de comparação com o funcionamento da mente.
No final dos anos 70, psicólogos cognitivos percebem que o paradigma do processamento de informação seria a forma mais adequada de se estudar a cognição humana, entretanto existem pelo menos três gerais agrupamentos da psicologia cognitiva de acordo com Lopes, Lopes e Teixeira (2004):
Psicólogos cognitivos experimentais ou processamento de informação: não utilizam da modelagem computadorizada, seguindo a tradição experimental da psicologia cognitiva;
Cientistas cognitivas: que constroem modelos computacionais;
Neuropsicólogos cognitivos: acreditam que estudos sobre déficit cognitivo em pacientes com lesão cerebral podem trazer dados da cognição humana.
A neuropsicologia como afirmam Eysenk e Keane (1994) seguem algumas suposições:
os pacientes são em muitas vezes classificados por síndromes;
os processadores cognitivos são independentes, ou seja, uma lesão numa estruturado cérebro pode deixar danos somente nessa estrutura (módulo);
acreditam no isomorfismo, existe uma organização da mente e cérebro físico, ou melhor, cérebro e mente possuem a mesma forma;
investigar indivíduos com lesão trazem informações sobre o processo cognitivo normal.
A neuropsicologia faz parte de uma outra grande área denominada neurociência que esta última é o estudo de como acontece o processo de informação no sistema nervoso humano animal e humano (Bear et al, 2002). Após um longo desenvolvimento as neurociências afirmam-se, hoje em dia, como o estudo do sistema nervoso através dos nossos processos cognitivos, como por exemplo, a linguagem, a resolução de problemas, tomada de decisão, atenção, percepção, entre outros.
O cérebro e o comportamento são diferentes, mas estão relacionados, pois o cérebro é físico, um órgão do corpo, enquanto o comportamento uma ação, sendo um responsável pelo outro (Kolb e Whishaw, 2002). Porém, a inter-relação entre cérebro e comportamento é uma das questões centrais das neurociências, pois há diferentes formar de perceber isso. Como afirmam Kolb e Whishaw (2002) Aristóteles tinha a hipótese denominada mentalismo, onde a mente é responsável pelo comportamento, sendo a mente responsável pelos pensamentos, percepções e emoções humanas, não havendo relação com o cérebro. Essa explicação de Aristóteles se manteve incontestável até o século XVI com o surgimento do pensamento de René Descartes de que o cérebro tem um papel fundamental e a mente está localizada nesse órgão. A mente e o corpo são separados, mas estão interligados; a mente envia um sinal para o cérebro e gera um comportamento e essa posição filosófica foi denominada dualismo. Na metade do século XIX inicia-se uma outra teoria sobre o comportamento e cérebro chamada de materialismo, cujo pensamento é sobre o comportamento explicado pelo funcionamento do cérebro e do sistema nervoso e sem mencionar a mente como coordenadora das ações.
Na década de 90, a denominada década do cérebro, a psicologia cognitiva sofreu uma grande influência das neurociências: conhecimento do cérebro e de técnicas de acesso a esse cérebro. De acordo com Lopes, Lopes e Teixeira (2004) as neurociências apresentam um cenário reducionista frente à psicologia, contudo se demonstra como muito importante devido que conhecer o cérebro pode trazer infinitos benefícios, para a psicoterapia e neuropsicologia. Além disso, pode contribuir para uma reflexão entre a mente (cérebro) e o comportamento.
Uma das maneiras de conhecimento do cérebro é o ECG (Eletrocefalograma) e que quando ele tem como objetivo a auto-regulação, por onde o indivíduo aprende a controlar os processos físicos e mentais para um melhor funcionamento do organismo é denominado de neurofeedback (Chaves, 1997). Esse autor ainda demonstra que com as informações obtidas através do neurofeedback, o indivíduo tem como alterar o seu funcionamento e com a orientação do biofeedbackterapeuta, há a possibilidade de condicionamento de alguns processos fisiológicos para atingir um funcionamento estável e saudável.
Considerações finais
Esse artigo não teve como objetivo afirmar que teorias são mais válidas ou mais científicas e sim, descrever o caminho percorrido pela Psicologia Cognitiva até chegar as neurociências. Não existe uma teoria melhor do que a outra e sim, teorias mais apropriadas para estudar determinados fenômenos. Como pensar em estudar de forma minunciosa a mente através da teoria behaviorista? Estudar aprendizagem sem fazer referência ou até mesmo sem utilizar de conceitos behavioristas?
Referências
Bear, M. F.; Connors, B. W.; Paradiso, M. A. (2002). Neurociências: desvendando o sistema nervoso. Porto Alegre: Artmed.
Chaves, J. Biofeedback: a terapia do século 21. (1998). Cérebro e Mente, 4. Disponível em: http://www.cerebromente.org.br/n04/tecnologia/biofeed.htm.
Eysenk, M.W.; Keane, M.T. (1994). Psicologia cognitiva: um manual introdutório. Porto Alegre: Artes Médicas.
Gardner, H. (1995). A nova ciência da mente. São Paulo: USP.
Kolb, B.; Whishaw, I.Q. (2002). Neurociência do comportamento. São Paulo: Manole.
Lopes, E.J.; Lopes, R.; Teixeira, J.F. (2004). A Psicologia cognitiva experimental cinqüenta anos depois: a crise do paradigma do processamento de informação. Revista Paidéia, 14 (27), p. 1-9.
Matos, M. A. (1998). Behaviorismo metodológico e behaviorismo radical. In: Rangé, B. (ORG.). Psicoterapia Comportamental e Cognitiva: pesquisa, prática, aplicações e problemas. 2ªed. São Paulo: Editorial Psy. 1998. p. 27-34.
Micheletto, N.; Serio, T. (19993). Homem: Objeto ou sujeito para Skinner? Temas em Psicologia, 1 (2), p. 11-22.
Skinner, B.F. (2000). Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins Fontes.
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