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O mini-handebol na formação de acadêmicos de Educação Física

El mini-balonmano en la formación de estudiantes de la carrera de Educación Física

 

*Faculdade de Educação, Ciências e Letras de Ponta Porã - MAGSUL

**Centro Universitário da Grande Dourados – UNIGRAN

(Brasil)

Rogério Zaim-de-Melo* **

Nicodemos Filgueiras Junior*

rogeriozmelo@gmail.com

 

 

 

Resumo

          O presente artigo tem o objetivo de apresentar a experiência de utilizar o mini-handebol e a realização de um festival da modalidade como uma estratégia possível de ser realizada em cursos de graduação em Educação Física. O Festival de mini-handebol é o encerramento da disciplina Metodologia do Ensino do Handebol e, é realizado anualmente pelos discentes da Faculdade MAGSUL.(1) Para tanto serão apresentados e discutidos os caminhos trilhados pelos acadêmicos e professores da Faculdade de Educação, Ciências e Letras para a realização do referido evento.

          Unitermos: Graduação. Mini-handebol. Festival

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 133 - Junio de 2009

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Introdução

    É possível afirmar que a formação inicial de um professor é uma grandeza diretamente proporcional ao seu futuro desempenho como profissional. Sendo assim, as dúvidas e os percalços para formar um bom docente permeiam todos os cursos de licenciatura. Corroborando com esse ideário a Revista Nova Escola traz em seu exemplar de Outubro de 2008, matérias sobre o sucesso/fracasso escolar.

    De todos os fatores que influenciam a qualidade da escola, o professor é, sem dúvida, o mais importante. Por isso a formação (inicial e continuada) faz tanta diferença – para o bem e para o mal. No Brasil, infelizmente, para o mal (GURGEL, 2008, p. 48).

    Com a Educação Física a situação não é muito diferente. Os cursos de formação possuem seus currículos baseados em dois modelos (RANGEL-BETTI, BETTI, 1996): 1. O modelo tradicional esportivo que enfatiza as disciplinas "práticas" (especialmente esportivas – vôlei, basquete, handebol, futebol, natação e atletismo estão presentes em todos os cursos de graduação brasileiros). A dicotomia teoria X prática é evidente, pois há separação entre conteúdos teóricos e práticos. Considera-se teoria o que é apresentado na sala de aula enquanto prática o que realizado nas piscinas, nas quadras, nas pistas, etc.; e, 2. o modelo de orientação técnico-científica que valoriza as disciplinas teóricas. O conceito de prática está relacionado com a idéia de "ensinar a ensinar". Durante toda a formação são utilizadas as chamadas seqüências pedagógicas, o graduando aprende ou deveria aprender a "executar" a seqüência, e não a aplicá-la. Segundo Sadi (2006, p. 47):

    A cultura universitária vivida por aqueles que se tornam professores muitas vezes ameaça a profissionalização, pois é responsável pelo descompasso citado: O indivíduo entra e sai da Universidade sem ter que viver intensamente o que será sua atividade profissional. Por mais que se tenha avançado no campo das metodologias e dos estágios, o fato dos professores aplicarem teorias contraditórias com a realidade das escolas é muito mais intenso do que os projetos existentes para enfrentar tal problemática.

    Objetivando modificar essa situação durante os últimos anos a Faculdade de Educação, Ciências e Letras de Ponta Porã desenvolve com os acadêmicos da disciplina de Metodologia do Ensino do Handebol um projeto de Ensino e Extensão que visa aproximar e/ou amenizar a relação dicotômica teoria X prática, buscando dar alicerce para que a seqüência pedagógica do handebol possa ser aplicada.

    Um dos princípios que norteiam essa prática é o ensino reflexivo. O professor busca que o acadêmico (futuro docente) reflita sempre sobre os seus atos, aprendendo sobre as suas ações práticas. Desta maneira, se vislumbra o discente tornar-se-á um investigador da sua própria práxis, transformando-a constantemente (RANGEL, SANCHEZ NETO, DARIDO, GASPARI, GALVÃO, 2005).

O Projeto

    No início de cada semestre em que o handebol é ministrado, na aula inaugural da disciplina, são explicitados aos alunos: o plano de ensino; os objetivos, geral e específico; o referencial teórico; e os pré-requisitos para a aprovação, sendo que o principal item da avaliação relaciona-se com a iniciação e treinamento de uma equipe de mini-handebol (que deverá ser composta por crianças que nunca tenham vivenciado o desporto), visando à participação em um Festival desenvolvido pela própria Instituição de Ensino Superior (IES) organizado pelos próprios graduandos. Os locais para os treinos poderiam ser Escolas, Associações de Moradores, Igrejas, Clubes, etc. Nesta mesma aula já fica estabelecida a data do referido evento.

    Já na segunda aula, os discentes são divididos em duplas para iniciarem o trabalho com suas respectivas equipes. Nesta etapa são levadas em consideração as especificidades de cada aluno no que tange a localização espacial, buscando aproximar aqueles que vivem na mesma cidade e/ou bairro. A Faculdade de Educação, Ciências e Letras de Ponta Porã atende alunos das cidades de Ponta Porã, Coronel Sapucaia, Amambai, Aral Moreira, Assentamento Itamarati, Antonio João e Bela Vista.

    Estipula-se uma idade de referência que deve ser respeitada. Quanto à questão de gênero, embora Santos (2003) afirme que no mini-handebol não se separa por naipes, optou-se pela separação para que os acadêmicos compreendessem melhor as diferenças entre meninos e meninas.

    O foco principal nessa atividade é o acadêmico vivenciar como o professor o que aprendera como aluno. Muitas vezes o aluno tem contato com o desporto na Faculdade, vivencia as famosas seqüências pedagógicas, e, no término do semestre ou ano letivo, muitas vezes, as esqueceu ou as guardou em seu baú de conhecimentos adquiridos durante a graduação. Quando precisa utilizar esse conhecimento, quase sempre, se coloca em situação de desespero e começa a buscar receitas em livros ou sites.

    Cada aula ministrada na disciplina deveria ser transformada em planos de aulas para aplicação com os respectivos grupos de treinamento. Nesta etapa utilizaram-se como base teórica os conceitos básicos de iniciação estabelecidos por Knijnik (2004), são eles: atividades de oposição, automatismos inconscientes e jogar para aprender.

    Compreendem as atividades de oposição àquelas que favoreçam a criança a trabalhar com a figura de um oponente, pois segundo o autor em um jogo de handebol sempre haverá um opositor ora sendo o adversário tentando impedir os avanços da equipe ou o goleiro evitando o gol, ora a própria criança que ocupará esse posto.

    Quanto ao automatismo inconsciente, o professor deve realizar atividades que proporcionam a criança o domínio de forma inconsciente da gestualidade no qual ela passará realizar movimentos sem que grande parte da sua atenção mental esteja voltada para eles.

    Já o conceito de jogar para aprender prega que o aluno deve jogar para aprender jogar. Sendo assim, em toda aula se faz necessário que se jogue um pouco aplicando o que foi aprendido durante a realização da mesma.

    No término de cada quinzena os acadêmicos apresentavam para o professor e o grupo as dificuldades encontradas na realização do trabalho. Desta forma os possíveis obstáculos foram socializados e sanados pela troca de experiência.

    Uma das principais dificuldades levantadas foi a falta de bolas para a efetivação dos treinamentos, realidade encontrada em muitas das escolas públicas da região Conesul do Mato Grosso do Sul. Dificuldade amenizada pela confecção de bolas com material alternativo: jornal ou algum tipo de papel reciclável, meião ou meia-calça, sacolas plásticas de supermercado e fita adesiva.

    Próximo à data de realização do Festival, inicia-se uma nova etapa os alunos recebem orientação sobre como organizar um evento do porte do mesmo, uma vês que, a disciplina Organização de Eventos Esportivos ainda não oferecia a eles. Desde a composição de chaves, tabelas, solenidades de abertura e encerramento, etc. São formadas as equipes de transporte, alimentação, cerimonial, arbitragem, etc.

A escolha do mini-handebol

    Nos primeiros anos em que o Festival foi realizado trabalhava-se com o desporto propriamente dito, ou seja, o handebol conforme as regras da Federação Internacional. Essa prática gerava muita discussão entre os acadêmicos, pois eles entendiam serem necessárias indumentárias, equipamentos e espaço oficial para a realização das suas atividades. Algo inalcançável, pois a realidade nas Escolas e Ginásios nas suas cidades era completamente diferente. Em toda a região não existe uma quadra nas dimensões oficiais.

    Sendo assim, sabendo que o mini-handebol, conforme afirma Santos (2003), não se configura como um desporto formal é uma adaptação do desporto com o objetivo de favorecer a criança a vivenciar motoramente os principais pré-requisitos da modalidade e poder ser realizada em espaços adaptados mudou-se então o enfoque do Festival.

    O MINI-HAND deve ser entendido como uma “FILOSOFIA”, cujo conteúdo é essencialmente um jogo de bola para crianças. Por uma parte, esta “filosofia” deve integrar as necessidades lúdicas das crianças e transmitir prazer, felicidade e experiências positivas (PETROBRÁS, 2008, p.3).

O Festival propriamente dito

    Embora os preparativos para o Festival tenham começado com o início da disciplina. Foi no em Junho que o mesmo ganhou forma. No início do mês, algumas decisões foram tomadas: a princípio as traves seriam feitas com bambu e arame para reduzir custos, mas a possibilidade de se fazer balizas mais resistentes, tomou conta do imaginário dos graduandos. Desta forma, as traves foram feitas de tubos galvanizados, pintadas com tinta acrílica, branca e vermelha com as dimensões oficiais conforme as regras apresentadas pela Confederação Brasileira de Handebol.

    A trave pode ser a mesma das categorias superiores, com uma diferença que o travessão superior esteja e uma altura mais baixa. Se a bola é arremessada por cima do travessão se assinala um tiro de meta. Sugerimos uma Trave com 2.40 cm de largura, por l.60 cm de altura (PETROBRÁS, 2008, p. 6).

    Na semana que antecedeu a realização dos jogos tornaram-se necessárias reuniões diárias, pois várias dúvidas pairavam e precisavam ser sanadas, uma vez que o tipo de envolvimento, para os acadêmicos era impar, ninguém havia participado da realização de um evento desse porte.

    Para resolver os problemas foram criadas comissões, gerenciadas pelos próprios discentes: comissão de cerimonial, arbitragem, saúde, alimentação, infra-estrutura, premiação e divulgação. As comissões de cerimonial e premiação foram responsáveis pela recepção de autoridades, convidados, abertura, encerramento e entrega de medalhas. Independente do resultado das partidas, toda criança recebeu a sua medalha. As comissões de alimentação e infra-estrutura precisaram estar o tempo todo se comunicando, pois a preparação das quadras, bem como, a confecção da alimentação, foram fundamentais para o sucesso do festival. A Comissão de saúde era a responsável por eventuais problemas médicos e a Comissão de divulgação fez contatos com órgãos de imprensa de toda a Região.

    Parcerias foram firmadas com o Exército, Fundações Municipais de Esporte e Secretarias de Educação, que contribuíram no auxiliam da preparação da refeição e transporte das crianças de outras cidades, respectivamente.

    Participaram 24 equipes, sendo 05 femininas e 19 masculinas, totalizando 240 crianças. Os jogos foram realizados entre 09h00 até 16h00. Cada equipe participou de no mínimo dois jogos, sendo que, alguns times jogaram mais de duas vezes. A arbitragem foi realizada pelos discentes, que se revezavam nas funções de árbitro, cronometrista e apontador com o critério de não estar com a sua equipe em quadra de acordo com a programação feita anteriormente. No término dos Jogos foi realizada a entrega das premiações.

    Encerradas as partidas, a premiação iniciou-se a avaliação do Festival. Cada acadêmico preencheu uma ficha com os aspectos positivos e negativos do Evento. Foram citados como aspectos positivos:

1.     O ineditismo do evento, muitos alunos se quer imaginavam como se organizava o mesmo.

    Talvez o aspecto positivo que mais tenha chamado atenção, tenha sido a organização do mesmo... Talvez seja o divisor de água na vida de muitos acadêmicos... (Acadêmico 1)

    Foi o primeiro envolvimento prático do Curso de Educação Física do 4º Semestre (Acadêmico 2).

2.     Possibilitar as crianças o primeiro contato com a modalidade.

    Crianças que não tinham contato com o esporte, não só o conheceram, mas o praticaram. (Acadêmico 2)

    Mas o que mais me incentivou era ver a alegria deles em realizar um novo esporte. (Acadêmico 3)

3.     Transpor a barreira teoria/prática.

    Ver na prática aquilo que o professor falava nas suas aulas (Acadêmico 4)

    Pela primeira sentir a sensação de ser professor. (Acadêmico 1)

    Quanto aos aspectos negativos todos direcionaram a dificuldades encontradas:

1.     Falta de condições físicas e materiais para os treinamentos.

    A quadra onde minha equipe treinou era muito precária, áspera de mais... (Acadêmico 2)

    A falta de bolas oficiais. Embora eu tenha feito as bolas alternativas, elas não pulavam, ficando muito difícil ensinar o drible. (Acadêmico 3)

2.     Estabelecer relações de confiança entre pais e acadêmicos.

    As maiores dificuldades foram em convencer os pais dos alunos a deixar seus filhos treinarem e depois viajarem 90 quilômetros com professores que eles nunca tinham visto. (Acadêmico 2)

3.     As crianças entenderem o sentido do Festival.

    As crianças não conseguiam entender que todos iriam jogar. (Acadêmico 4)

    Tiveram meninos que queriam ganhar o seu jogo de qualquer maneira e ficaram chateados ao serem substituídos (Acadêmico 1).

Considerações finais

    A utilização do festival de mini-handebol veio ao encontro com as preocupações existentes na nossa IES, gostaríamos de romper a dicotomia teoria X prática possibilitando aos alunos uma experiência real do ser professor.

    No término do evento percebemos estarmos trilhando o caminho correto. Durante toda a trajetória as falas dos acadêmicos nos deram pistas para esse entendimento, ficando evidente na troca de dúvidas e sugestões, realizadas quinzenalmente. Nesses momentos, muitas vezes a intervenção do professor nem era necessária, pois os alunos resolviam os problemas encontrados apenas conversando uns com os outros. Se uma das intenções era propiciar a reflexão na formação podemos dizer, sem sombra de dúvidas que ela foi alcançada.

    Entretanto torna-se necessário ressaltar que problemas surgiram. Não os apontados pelos acadêmicos esses solucionados com conversa e bom senso. Alguns discentes tentaram dar “jeitinho brasileiro”, foram atrás de crianças que já treinavam ou haviam vivenciado a modalidade, achando que dessa maneira teriam notas melhores que os outros, o que não aconteceu. Não obtiveram conceito superior aos outros alunos e perderam uma experiência única na sua vida acadêmica.

    O modelo empregado na disciplina Metodologia do Ensino do Handebol está sendo estudado para ser adotado pelas outras Metodologias dos desportos da Faculdade MAGSUL, com algumas alterações: nos próximos eventos para a avaliação do mesmo, além dos acadêmicos, as crianças (atletas) também serão ouvidas.

    Sendo assim, da mesma maneira que começamos este artigo o encerramos: nossa preocupação com a formação profissional na Educação Física permanece. Mas observamos que com seriedade e um trabalho bem feito muitas coisas podem mudar...

Nota

  1. Faculdade de Educação, Ciências e Letras de Ponta Porã é o nome oficial da IES, mas todos na região a conhecem como MAGSUL.

Referências

  • ANDRADE, Irene Conceição Andrade; SANCHEZ NETO, Luiz; DARIDO, Suraya Cristina; GASPARI, Telma Cristiane; GALVÃO, Zenaide. O ensino reflexivo como perspectiva metodológica. In: DARIDO, Suraya Cristina; ANDRADE, Irene Conceição Andrade (Coord.); Educação física na escola: implicações para a prática pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.

  • GURGEL, Thais. A origem do sucesso (e do fracasso) escolar. Nova Escola, São Paulo, n. 216, p.48-53, out. 2008.

  • KNIJNIK, Jorge Dorfman. Conceitos básicos para a elaboração de estratégias de ensino e aprendizagem na iniciação à prática do handebol. Revista Ludens – Ciências do Desporto, Lisboa, 2004, p. 75-81.

  • PETROBRÁS, MINI HAND INICIAÇÃO ESPORTIVA. Mini-hand. Disponível em: http://www2.uel.br/cef/HANDEBOL/MiniHandebol.pdf Acesso em 10 Out 2008.

  • RANGEL-BETTI, Irene Conceição Andrade; BETTI, Mauro. Novas perspectivas na formação profissional em Educação Física. Motriz, Rio Claro, v. 02, n. 01, p.10-15, 1996.

  • SADI, Renato Sampaio. Formação permanente de professores de Educação Física: notas de investigação sobre o conhecimento crítico-criativo. Motrivivência, Florianópolis, n. 26, p.47-68, jun. 2006.

  • SANTOS, Ana Lúcia Padrão dos. Manual de mini-handebol. São Paulo: Phorte, 2003.

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