Maternidade precoce silencia o lazer de adolescentes La maternidad precoz silencia el tiempo libre de las adolescentes Early pregnancy inhibits adolescents’ leisure time |
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*Acadêmica do 9º semestre do Curso de Educação Física da UNIJUÍ, Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul Bolsista PIBIC-UNIJUÍ **Doutora em Educação. Professora do Curso de Educação Física, do Departamento de Pedagogia da – UNIJUÍ Membro do grupo Paidotribus – UNIJUI Participante do Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero, GEERGE –UFRGS |
Denise Raquel Rohr* Maria Simone Vione Schwengber (Brasil) |
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Resumo A gravidez na adolescência não se constitui como um acontecimento recente na Sociedade Ocidental. No século XIX e início do século XX, as meninas-mulheres casavam-se entre 13 e 14 anos, e eram educadas para serem esposas, mães e cuidar da casa. Hoje a gravidez na adolescência continua a acontecer, porém, o que a diferencia é que se alteraram os padrões de fecundidade da população feminina, e ocorreram redefinições na posição social das mulheres, gerando novas expectativas para as jovens no tocante a escolarização e a profissionalização. Assim, nosso objetivo foi identificar como e de que modo as meninas lidam com as condições corporais, adolescentes/jovens e grávidas, e, sobretudo, quais os impactos em suas trajetórias de vidas sociais [lazer]. Do movimento de análise, podemos focalizar alguns resultados: que após a gravidez, os tempos e espaços sociais como os de lazer das jovens-mães pesquisadas, restringem-se ainda mais à domesticidade (a esfera familiar). O tempo dedicado para o lazer é usado de modo diferente entre as jovens e seus companheiros, sendo atravessado por fatores como as diferenças de gênero, pois são elas as mais afetadas no seu tempo de lazer, uma vez que assumem um maior cuidado para com seus filhos. Unitermos: Gravidez. Maternidade. Juventude. Gênero. Lazer.
Abstract Pregnancy during adolescence is not a recent situation in the Western society. In the nineteenth century and early twentieth century, girls used to marry when they were 13-14 years old, and they were raised to be housewives and mothers. Today pregnancy during adolescence is still found, but what makes it different is that patterns of fecundity of female population have changed, and women’s social position has been redefined, generating new expectations among young women as to their education and professional careers. The aim of this study is to identify how girls have dealt with body conditions, considering which impacts motherhood has had on their social lives. From the analysis, we can visualize some results: after pregnancy, social times and spaces, such as leisure of the young mothers researched, have been even more limited to the family circle. Time devoted to leisure activities is used in a different way by young women and their mates. It is crossed by some factors, such as gender differences, since young women have been more affected in their leisure time, because they are supposed to look after their children. Keywords: Motherhood. Pregnancy. Adolescence. Gender. Leisure |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 133 - Junio de 2009 |
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Introdução a problematização do tema
Este artigo analisa a ocorrência da gravidez em adolescentes do município de Ijuí RS, triadas a partir de dados do CAAMI 1, 2. Buscamos também, compreender como e de que modo essas jovens3 vivem a gravidez e como organizam o seu tempo de lazer após a chegada do filho.
O tema da gravidez, apesar de ser relevante na contemporaneidade, constitui-se de poucos estudos que o abordam, principalmente questões relacionadas à temática do corpo, bem como a gravidez (a experiência) entre adolescentes e jovens, no Brasil. Scavone (2004, p. 20) destaca que “a temática da maternidade [da gravidez] é de uma atualidade sem fim”. Meyer (2006) destaca também que há um campo específico da história da maternidade e da gravidez ainda a ser explorado, sejam elas desejadas/recusadas, realizadas/interrompidas, sobretudo, no Brasil.
Heilborn (2003) destaca que os estudos sobre gravidez na adolescência no Brasil, em geral, apontam esse fato como sendo um problema, identificando a gravidez com mães adolescentes, às classes sociais baixas (pobres) e sem um companheiro que as auxilie. Ainda, estudos como o de Esteves & Menandro (2005), Gontijo & Medeiros (2004) mostram que a gravidez na adolescência não pode ser vista como um problema individual da adolescente que experencia e sim, como um problema decorrente de fatores sociais, culturais, políticos e econômicos do ambiente em que adolescente está inserida.
Hoje a gravidez na adolescência continua a acontecer, porém o que a diferencia é que nas últimas décadas, ela é vista como um problema social. Perguntamos: Mas porque a gravidez na contemporaneidade é encarada como sendo um problema social? Poderíamos dizer por que mudaram-se os tempos e alteraram-se os padrões de fecundidade4 da população feminina, conforme justifica Brandão (2006, p. 79), “sobretudo porque ocorreu redefinições na posição social da mulher [inclusive das meninas] e, gerou-se novas expectativas para as jovens no tocante à escolarização e à profissionalização”.
A gravidez adolescente passa a ser vista como um problema pelos diferentes discursos e em distintos contextos históricos, a partir do século XX. Argumentos que vão desde o discurso médico ao psicológico, mostrando as implicações dessa condição, adolescente e grávida, bem como, alertas para as implicações de uma gravidez precoce, tanto na área da saúde quanto nos aspectos sociais. Nos anos 60, predominava o discurso da medicina, no qual se apontava os riscos da gravidez adolescente, tanto para a saúde da jovem quanto do bebê, em virtude de o corpo da jovem-mãe não estar suficientemente preparado para gerar um feto. Na década de 70, o discurso da psicologia enfatizava a imaturidade da gestante adolescente para cuidar do seu filho, para estabelecer vínculos com o mesmo. Já nos anos 80 e 90, o alerta era das ciências sociais, que apontavam os riscos sociais da gravidez na adolescência, como por exemplo, abandono escolar, além da precária inserção no mercado, acarretando a reprodução do estilo de vida pobre de suas famílias de origem. (OLIVEIRA, 2007, p. 28 apud SALVA, 2008, p. 1).
Conforme dados do SINASC (Sistema de Informações Sobre Nascidos Vivos – Ministério da Saúde), em 2005 no Brasil, de um total de 3.035.096 partos, 21,8% (661.650,928) foram de adolescentes entre 10 e 19 anos. No Rio Grande do Sul, no mesmo ano, de um total de 147.199 partos, 18,7% (27.526,213) foram em adolescentes de 10 aos 19 anos. E, em Ijuí-RS, no mesmo ano, de 1.071 partos, 15,7% (168,147) foram de adolescentes entre 10 e 19 anos.
A gravidez na vida de uma adolescente traz consigo inúmeras transformações sejam corporais ou mudanças nas formas de relações sociais. Perguntamos: Quais os rastros do acontecimento da gravidez em suas trajetórias afetivo-sociais? Juntamos na pesquisa em questão, os fragmentos das histórias para compor as biografias, no sentido de destacar nessas, as trajetórias afetivo-sociais e as práticas de lazer.
Neste artigo, apresentamos o movimento de análise a partir de fragmentos da história biográfica de Janine.
Trajetória biográfica da jovem-mãe Janine
Dezesseis anos, uma filha com um ano, Janine é mais uma jovem que engravidou e abandonou a escola. Mora com a mãe, a filha e o companheiro, e sobrevivem com uma renda de aproximadamente R$ 250,00 que a mãe ganha do trabalho como costureira, e o companheiro como biscate, sendo complementado pelo Programa Bolsa Família do Governo Federal.
A gravidez mudou a vida de Janine, “foi sem querer, por descuido”. E diz: “agora aumentou a minha responsabilidade (...) devo dizer que pensei que engravidar era mais legal (...) nossa eu nem sabia que ia engravidar, quando vi já estava grávida”, afirma. Janine aponta que com a gravidez teve perdas, “perdi a minha liberdade de sair e, tudo mudou (...) tive que trabalhar, não pude mais ir na escola (...) a gravidez trouxe novas responsabilidades (...) agora tenho que cuidar da minha filha, trabalhar, ir atrás das coisas” aponta a jovem.
Antes da gravidez, “eu saía, dançava, me divertia... agora, depois que ela nasceu, eu saio pouco, (...) se eu sair não posso demorar muito, porque se hoje saio, daqui a três horas tenho que voltar, por causa da nenê que ainda mama (...) e aí fico em casa, cuido da minha filha, brinco com ela, vou à igreja, nos vizinhos passear, assisto TV, escuto música”. Hoje, Janine sonha em voltar a estudar, arrumar um emprego “pra dar as coisas pra minha filha, pois ser menina, mãe e pobre, é complicado”.
O acesso ao lazer
Dumazedier (1999, p. 21) caracteriza o lazer como “atividades consideradas em alto grau obrigatórias ou necessárias à manutenção da vida”. O autor questiona: será o lazer uma criação específica da sociedade industrial?
De acordo com este estudioso do lazer, “alguns consideram que o lazer existia em todos os períodos, em todas as civilizações”, mas Dumazedier (1999, p. 26), defende que “o lazer possui traços específicos, característicos da civilização nascida na Revolução Industrial”.
O lazer é um fenômeno estreitamente ligado aos processos de industrialização, urbanização e do capitalismo, estando assim, interligado com o trabalho. Então, de acordo com Bruhns (1997) na sociedade industrial, onde o trabalho tem um tempo e um espaço específico, tem-se a institucionalização do lazer.
Para Dumazedier (1999, p.44), “historicamente, o direito ao lazer é definido em relação ao trabalho profissional e, os homens é que o reivindicaram”. Para as mulheres “do lar” ainda não existia o lazer. A elas somente era concedido o direito ao repouso para recuperar as forças investidas e gastas nos trabalhos domésticos, como os cuidados com a casa, os filhos e o marido. As mulheres não tinham tempo para si nem para o lazer. Mas para Dumazedier, 1999, p. 45
hoje, após os progressos das técnicas do trabalho doméstico, do controle da natalidade e da ação dos novos movimentos de libertação das mulheres e dos jovens, este direito ao lazer se afirma explicitamente em substituição a uma parte das antigas obrigações domésticas, conjugais e familiares.
A partir de 1960, é possível distinguir quatro períodos de lazer: o lazer do fim do dia, o do fim de semana, o do fim de ano ou férias e, o do fim da vida ou aposentadoria. Em função destes períodos, o lazer refere-se a “um conjunto mais ou menos estruturado de atividades com respeito às necessidades do corpo, segundo Dumazedier (1999, p. 92).
De acordo com Marcassa & Mascarenhas (2008, p. 256) lazer é
um tempo e um espaço de organização da cultura, criando e recriando um novo circuito de práticas culturais lúdicas e educativas, experimentadas de acordo com a capacidade de consumo dos indivíduos, com as formas político sociais em disputa e com as novas formas de produção e reprodução (...) dos sujeitos.
Para Bruhns (1997), a oportunidade de vivenciar um tempo de lazer não é oferecido de forma igual para toda a população. Segundo a autora
o acesso ao lazer é favorecido nas camadas mais privilegiadas da população, impedindo por vários fatores (necessidade de realização de horas extras, preços de ingressos em espetáculos, grandes distâncias entre moradia e o local de trabalho, dependência de transporte coletivo, etc.) que as camadas econômicas de baixa renda usufruam de muitas possibilidades (BRUHNS, 1997, p. 35-6).
Bruhns afirma ainda que o espaço de lazer na sociedade contemporânea é o espaço urbano, e, de acordo com seus estudos,
há uma série de problemas envolvem esse espaço urbano de lazer: expulsão das camadas menos favorecidas dos centros concentradores das áreas de lazer, como também dos benefícios para as áreas periféricas; a questão do transporte dificultando acessos; o isolamento do homem numa sociedade não estimuladora do convívio; a iniciativa privada colocando-se à frente dos investimentos destinados ao lazer, muitas vezes transformando-o numa mercadoria a mais (BRUHNS, 1997, p . 37).
Para Veronese (2008), no caso do lazer das adolescentes, as condições sócio-econômicas da família é que ditam, muitas vezes, as condições do lazer da jovem, já que é esta, na maioria das vezes, quem toma conta dos trabalhos domésticos, e se ocupa em cuidar do filho, quando os pais trabalham fora. Nas palavras da autora, “quanto maior o grau de pobreza da família, maiores são as imposições para com o trabalho familiar doméstico, restringindo as possibilidades de usufruto do lazer” (VERONESE, 2008 p. 3).
Dumazedier (1999) classifica o lazer em categorias por conjuntos de interesses, quanto ao seu conteúdo: lazeres físicos, constituídos pelas práticas corporais e esportivas tais como, caminhadas, esportes, ginásticas, lutas, em espaços planejados, como pistas, quadras, clubes, academias; lazeres manuais, constituídos pelas práticas de artesanato, costura, marcenaria; lazeres estéticos feitos de imagens, emoções, sentimentos, envolvem meios de comunicação como por exemplo, a TV, rádio, internet, cinema, igreja; lazeres intelectuais, relacionados com o universo cognitivo, de informações, de aquisição de conhecimentos, através de leituras de livros, jornais, revistas, literatura; e por último, os lazeres sociais, ligados aos espaços de convivência social, como por exemplo, boates, salões de bailes e festas, baladas noturnas, discotecas, bares, entre outros.
Após a gestação, os tempos e espaços sociais como os de lazer das jovens-mães pesquisadas, restringem-se ainda mais à domesticidade. Um lazer como o de Janine: “Cuidar do filho e brincar com ele, ir à igreja, nos vizinhos passear, assistir TV, escutar música”, são essas as formas de lazer mais comuns relatadas pelas jovens.
No caso da jovem pesquisada, afirma que ir à igreja faz parte do seu lazer. O lazer religioso pode ser interpretado, na perspectiva pluridimensional apresentada por Dumazedier (1999) como um lazer estético. Para Gutierrez (2001), o crescente aumento da religiosidade que presenciamos atualmente, possui uma evidente dimensão de lazer, no sentido da comemoração e confraternização social. As meninas afirmam que freqüentam a igreja para “se divertir e para dar um sentido à sua vida”.
Atualmente, cada vez mais nos deparamos com novas formas de entretenimento, muitas atividades vão sendo incorporadas às atividades lúdicas, como por exemplo, nas Igrejas. Esta, por sua vez, tinha como objetivo e função, antigamente, ligar o sujeito ao mundo espiritual, por vezes de maneiras penosas e árduas, como forma de “se redimir e pagar os pecados”. Hoje, tornou-se muito comum que a Igreja (as religiões) se envolvam em climas mais descontraídos, como uma forma de entretenimento para os fiéis (ALMEIDA, 2004).
O cuidado com o filho, bem como outras responsabilidades demandadas pela maternidade, impõe de certo modo, a restrição ainda maior do tempo de lazer das jovens. O tempo agora é quase exclusivo para os cuidados com o filho. No caso de Janine, a gravidez lhe trouxe outras responsabilidades e “o filho ocupou um tempo muito grande em suas vidas”. Como Janine afirma: “não posso sair sozinha, tenho que levar o filho junto”, pois este inspira cuidados.
Referindo-nos a Brenner et al. (2008, p. 184), que apontam
no que se refere ao gênero, a tradicional divisão sócio-espacial brasileira, na qual os homens possuem maior mobilidade sócio-comunitária no espaço público, enquanto as mulheres estão mais circunscritas ao espaço doméstico e têm menor mobilidade para praticar atividades extra-familiares.
No caso da jovem pesquisada, o companheiro, como ela afirma, sai para o bar, para o futebol, e ela fica em casa para cuidar da filha, ficando restrita, enclausurada no espaço doméstico, tendo poucas perspectivas de crescimento cultural, pessoal e econômico e, restringe-se assim, às relações sociais, ficando mais com as relações familiares. Além disso,
o matrimônio pode ser um dos fatores que provocam alterações na escolha das atividades de ocupação do tempo livre entre as mulheres, dadas as características das relações de gênero, nas quais é reservado à mulher maior fixação no espaço doméstico, especialmente na presença da maternidade (BRENNER et. al, 2008, p. 186).
Então, um relacionamento amoroso, um filho, o casamento, são escolhas que comprometem ainda mais o tempo de lazer feminino, as sociabilidades das jovens e as suas relações sociais, pois elas ficam estritamente ligadas ao ambiente doméstico de tal maneira que incorporam isso em si.
Schwengber & Meyer (2007) contribuem para a ampliação de nossa reflexão, mostrando a emergência de uma mãe cuidadora a partir do final do século XIX. Quando a imagem paterna parece ter sido quase eclipsada, com a justificativa de que o pai seria absolutamente incapaz da educação moral e física dos filhos, trabalho delicado, inadequado às necessidades da vida social.
Nesse sentido, para Brenner et al. (2008), os diferentes modos de viver o tempo do lazer, são atravessados pelas diferenças sociais e econômicas, e podemos pensar também as diferenças de gênero, que influenciam diretamente “sobre as possibilidades de acesso, experimentação, consumo e criação dos mundos da cultura e do lazer” (BRENNER et al., 2008, p. 176).
Para Marcassa & Mascarenhas (2008, p. 257), “o lazer é visto como um momento em que os jovens criam e reforçam seus laços de identidade social (...), que renovam valores e comportamentos”. Perguntamos: com um lazer caracterizado como doméstico, de que forma os “laços de identidade social” das jovens-mães serão renovados? Laços de identidades e relações, que são restringidos especificamente ao ambiente do bairro, da rua onde moram e/ou por imagens televisivas.
Então, como afirma Brandão (2006, p. 91)
compreender o universo adolescente e juvenil a partir da vivência de uma experiência singular, como a gravidez, por exemplo, permite melhor identificar o processo de construção social das jovens na contemporaneidade. Desvelar algumas dimensões desse percurso de transição entre a infância e a vida adulta pode contribuir para fomentar o debate no tocante a muitas outras questões, para além da gravidez, também vinculadas à socialização juvenil.
Miguel (2005, p. 25) enfatiza o papel da formação dos grupos na adolescência e na juventude, pois “quando reunidos em grupos, os adolescentes e os jovens apresentam uma identidade própria, com determinados estilos, preferências e comportamentos”. Então, um grupo ampliado, envolvido com práticas sociais de lazer, também possibilita aos jovens, a constituição e configuração de identidades.
A família é o primeiro grupo identitário a que o indivíduo pertence. À medida que este cresce, a família passa a dar espaço à sua inserção em outros grupos, os grupos de pares. E, na adolescência e juventude, o grupo de pares assume um espaço maior na vida dos jovens, pois passam a maior parte do seu tempo em companhia desses grupos, que começa com os amigos da escola (FERREIRA & FERREIRA, 2000).
A inserção dos adolescentes e dos jovens em grupos de pares, passa a ser um marco fundamental de ingresso na vida adulta, pois a partir disso, os jovens adquirem maior independência e menor controle parental, além de que, segundo Ferreira & Ferreira (2000, p. 199), “o grupo de pares influencia diretamente sobre os valores, a conduta [as escolhas, o estilo, os modos de pensar e de ser] dos jovens”. Com a convivência, as trocas de experiências entre os indivíduos de um mesmo grupo e de diferentes grupos, os jovens rompem com os laços infantis de dependência dos pais e está em busca do seu reconhecimento social, da sua emancipação (FERREIRA & FERREIRA, 2000).
Para Ferreira & Ferreira (2000), o que o grupo de pares pensa a respeito do adolescente ou do jovem, constitui um aspecto importante no processo de construção de identidades pessoais. Para os autores, o grupo pode influenciar o indivíduo tanto positiva quanto negativamente
O grupo pode colaborar para a constituição de uma imagem positiva de si, uma auto-imagem mais favorável, como também, pode levar a uma auto-desvalorização, o que acontece quando o jovem procura ser como outros elementos do grupo e não o conseguindo experencia alguma desilusão, podendo desencadear outros comportamentos, de violência, envolvimento com drogas, álcool (FERREIRA & FERREIRA, 2000, p. 202).
Para Brenner et al. (2008, p. 177) “a convivência em grupos possibilita a criação de relações de confiança; desse modo, a aprendizagem das relações sociais, como as de lazer, serve também de espelho para a construção de identidades coletivas e individuais”. O espaço social/lazer, é visto como possíveis espaços de construção das identidades juvenis. As formas de lazer, as trocas, as experiências possibilitam o surgimento de elementos sociais que dão aos jovens a confiança e o crescimento. Nessa perspectiva, podemos questionar: como uma jovem como Janine, que tem um lazer estritamente doméstico, terá possibilidades de construção e afirmação de identidades a partir do grupo de pares e do espaço social de lazer?
Para Novaes (2006), existem diferentes juventudes e diferentes formas de viver as juventudes, e, “qualquer que seja a faixa etária estabelecida, jovens com idades iguais, vivem juventudes desiguais”, devido principalmente, aos atravessamentos de raça, classe social e gênero e, aqui podemos dizer, da gravidez. Relacionando às meninas estudadas, podemos dizer, segundo Novaes (2006,) “ser pobre, mulher, negra e grávida, ou homem, parece que faz diferença em termos de ‘viver a juventude’ (...)” (NOVAES, 2006, p. 106).
Notas
O CAAMI é um ambulatório da Secretaria Municipal da Saúde de Ijuí RS, específico para o atendimento aos adolescentes na faixa etária dos 12 aos 18 anos, prestando atendimento nas seguintes áreas: medicina (clínica de adolescentes, ginecologia e obstetrícia e urologia), psicologia, nutrição, enfermagem, pedagogia. Os atendimentos /consultas podem ser marcadas pelos próprios adolescentes, pelos seus pais ou pelas escolas diretamente no ambulatório ou por telefone, durante o horário normal de atendimento. Entre as ações interdisciplinares do CAAMI estão o Projeto Encontro e o Programa Jovens em Ação, incluindo temas como limites, auto-estima, sexualidade, adolescência, nutrição, entre outros.
Com base na definição do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o município de Ijuí montou o CAAMI, este mantém vínculo permanente com o Conselho Tutelar, Secretaria de Educação do Município, Coordenadoria Regional da Educação, COMDICA (Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente), entre outras instituições do município.
Realizamos dez entrevistas semi-estruturadas com perguntas abertas. Das jovens estudadas, nove possuem filhos da adolescência, uma está grávida do primeiro filho e duas estão grávidas do segundo filho. Possuem idades entre 15 e 19 anos, duas continuaram a estudar após a gestação, e as demais pararam entre a 4.ª e 8.ª série do Ensino Fundamental “por causa da gravidez”. A vida das meninas pesquisadas e das suas famílias é marcada pela gravidade da violência e pela pobreza impostas, pois tem que sobreviver mensalmente com uma renda, com menos de um salário mínimo (complementado pelo trabalho de biscate e pelo Programa Bolsa Família do Governo Federal).
No Brasil, observou-se uma queda na taxa de fecundidade a partir da segunda metade do século XX. No século XXI a média de fecundidade assim se configurava: em 1940, cada mulher brasileira tinha em média 6,16 filhos; em 1950, 6,21; em 1960, 6,28; em 1970, 5,76; em 1980, 4,35; em 1990, 2,9; em 2005, 2,8, conforme Arillha Berquó (2007) apud Schwengber (2008).
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