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Paradesporto futsal para cegos: um estudo 

das motivações dos atletas participantes

 

*Docente do Centro Universitário Metodista IPA

**Coordenador do Curso de Educação Física do Centro Universitário Metodista IPA

***Docente do PPGRI do Centro Universitário Metodista IPA

(Brasil)

Prof. Ms. Luciano Santarosa Fernandes*

Prof. Ms. Leandro Vargas**

Prof. Dr. Atos Prinz Falkenbach***

atos.falkenbach@metodistadosul.edu.br

 

 

 

Resumo

          O presente artigo é fruto do desenvolvimento da dissertação de mestrado na área do paradesporto e inclusão desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Reabilitação e Inclusão do Centro Universitário Metodista IPA. O estudo investigou a partir de uma metodologia qualitativa na modalidade etnográfica o paradesporto futsal desenvolvido na Associação dos Cegos do Estado do Rio Grande do Sul (ACERGS). Problematizou a questão da motivação dos participantes do paradesporto futsal, pessoas com deficiência visual, sobre a participação nos treinos, eventos e competições desportivas. O estudo possibilitou compreender que as motivações para participar do paradesporto futsal vão muito além da prática desportiva e de saúde, mas implicam em motivos como o de superação pessoal e social, o reconhecimento como pessoa e cidadão, a oportunidade de convívio social e de relações interpessoais e também o exercício de independência e autonomia.

          Unitermos: Paradesporto futsal. Cegos. Motivações.

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 132 - Mayo de 2009

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Introdução

    O eixo deste estudo tematiza a inserção social de pessoas com deficiência através do paradesporto futsal para pessoas com deficiência visual. A pesquisa problematizou limites e possibilidades de inclusão social de cegos participantes de atividades esportivas regulares, assim como as suas relações com os grupos que freqüentam como a família, escola, trabalho e amigos.

    Constitui objetivo central avaliar como o paradesporto se processa como fenômeno social através da disponibilização desta prática junto aos praticantes de futsal para pessoas com deficiência visual. Também se dedica estudar como são oportunizados os espaços das práticas desportiva, recreativas e de competição, bem como analisar possibilidades do esporte adaptado na prevenção e promoção do desenvolvimento da saúde física. Relacionar a integração entre a pessoa com deficiência e a família com a inclusão social, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida. O estudo descreve atividades paradesportivas de treinamento e competitivas no grupo de futsal da Associação dos Cegos do Estado do Rio Grande do Sul (ACERGS) vinculadas ao aspecto da motivação dos participantes.

Deficiência: problema para praticar atividades esportivas?

    Conforme Diniz (2007) são vários os termos utilizados para dirigirem-se as pessoas com algum tipo de deficiência desde os injuriosos e pejorativos até as tentativas mais adequadas e sensíveis. Atualmente tem ocorrido uma procura em redefinir tais termos buscando desenvolver expressões que não insultem este público, como “pessoa portadora de necessidades especiais”, “pessoa portadora de deficiência”, “pessoa com deficiência”. Embora “[...] ainda hoje não há consenso sobre quais os melhores termos descritivos” (p.20).

    Diniz (2007) aponta para o fato que para a consolidação acadêmica dos estudos sobre deficiência foi o primeiro curso de graduação, o qual baseava-se nas referências bibliográficas dos teóricos do modelo social. O curso, "A Pessoa Deficiente na Comunidade" (p.31), desenvolvido pela Universidade Aberta (Open University), no Reino Unido, em 1975. Devido ao caráter democrático da Universidade Aberta o curso alcançou grande sucesso entre os alunos com deficiência, cujas aulas eram oferecidas a distância. Já o primeiro curso de pós-graduação foi promovido pela Universidade de Kent, também no Reino Unido, onde pela primeira vez houve o registro da expressão "estudos sobre deficiência" o qual delineava o campo disciplinar de pesquisas sociológicas e políticas tendo como tema a deficiência. Considera-se que aquele momento foi de “[...] estruturação acadêmica dos estudos sobre deficiência, e os escritos eram esparsos e pouco acessíveis” (p.32). Em 1986 foi fundado o primeiro periódico científico especializado em estudos sobre deficiência com o nome de “Disabílíty, Handicap and Socíety”, diferente das revistas científicas que tinham compromissos com o modelo médico e especialização em subáreas do conhecimento, como a medicina da reabilitação, a educação especial e a psicologia.

    A partir daquele momento o periódico é publicado trimestralmente, tendo como conselho editorial, maioritário, deficientes. Nesse sentido o compromisso do periódico é “procurar promover o modelo social, além de estimular que acadêmicos e pesquisadores deficientes escrevam sobre a experiência da deficiência” (p.32).

Paradesporto, inclusão e sociedade

    Duarte (2005) descreve que nas últimas décadas o termo inclusão vem ganhando destaque. Para o autor a busca pela sociedade igualitária em que as diferenças, a diversidade, a cooperação, a qualidade de vida e o direito de pertencer estejam sempre presentes é antagônico à ordem econômica colocada pelo capitalismo, onde predominam a competição e a lógica de mercado. No entanto existem esforços dos organismos internacionais para que ocorra a inclusão de pessoas com deficiências bem como no Brasil, um exemplo é a Constituição entres outros documentos, que definem as questões de acesso e acessibilidade as pessoas com deficiência seja no campo da educação, trabalho e inclusão social. Nessa perspectiva, pode-se considerar que a intenção da Inclusão por parte dos governantes é grande havendo esforço para que o processo tenha sucesso, já que a justiça social estará na origem da convivência.

    Argumenta Duarte (2005) que se deve levar em conta que inclusão é um sentimento ou uma percepção pessoal e intransferível, muitas vezes difícil de ser mensurada. O autor argumenta que as pessoas podem sentir-se incluídas ou não. Reforça que o sentimento de estar incluído, embora possa ser freqüente, não ocorre todo tempo em todas as situações de vida. Pode-se considerar, também, que surgem situações desagradáveis que provocam, em maior ou menor intensidade, certa frustração.

    Duarte (2005) explica que se de um lado decretos e leis estabelecem responsabilidades aos governos e à sociedade como um todo, favorece a conscientização, pelo tecido social, sobre os direitos dos “excluídos”. Por outro lado, no Brasil, não existe ainda uma rede de apoio para atender, adequadamente, as necessidades de todos. É mister considerar que a inclusão apresenta uma rede de suporte em várias áreas como: acesso e acessibilidade a saúde, educação, assistência social, transporte, justiça, entre outros. E não fique restrito a questões no campo da educação, como é colocada freqüentemente. Para que o processo de inclusão aconteça é necessário que as redes sociais estejam organizadas e inter-relacionadas, ou seja, a escola e suas relações de suporte.

    A inclusão social é um processo que contribui para a construção de um novo tipo de sociedade através de transformações, pequenas e grandes, nos ambientes físicos e na mentalidade de todas as pessoas, portanto também da pessoa com deficiência (SASSAKI, 1997).

    A acessibilidade e inclusão são inseparáveis. Garantir o acesso é fundamental para o profissional que trabalha em educação. Propiciar acesso ao aprendizado através de estratégias de ensino e de conteúdos adequados ao nível cognitivo dos deficientes. Propiciar acesso às atividades físicas, de esporte e lazer através de políticas públicas é basilar para o processo inclusivo.

    Ribeiro (2001) explica que a inclusão proporciona a participação de pessoas com deficiência em ambientes que eram considerados exclusivos, sob este aspecto é interessante que o professor de educação física possa compreender o processo pelo qual a inclusão ocorre. O esporte pode viabilizar uma ação inclusiva. Ribeiro (2001) reforça que as atividades esportivas fizeram e ainda fazem parte do processo de construção do homem no seu meio cultural. A inclusão através da prática da atividade esportiva pode ser efetivada a partir da compreensão de possibilidades de jogar e menos na busca do movimento técnico.

A idéia de motivação e sua relação com o paradesporto

    Rodrigues (1991) explica que um dos principais fatores que interferem no comportamento de uma pessoa é a motivação, que influi com propriedade em todos os tipos de comportamentos, permitindo um maior envolvimento ou uma simples participação em atividades que se relacionem com: aprendizagem, desempenho, atenção. Para o autor somos todos cercados por uma constelação de valores que pode a um dado momento, levar-nos à ação ou reduzir-nos à imobilidade. Essa é uma das razões da dificuldade em mensurar a motivação de maneira precisa, principalmente se a medida depende do humor, sentimentos ou verbalizações momentâneas do sujeito.

    Para Davidoff (2001) a motivação refere-se a um estado interno que resulta de uma necessidade e que ativa ou desperta comportamentos realmente dirigido ao cumprimento da necessidade ativante. Motivação não é algo que possa ser diretamente observado; inferimos a existência de motivação observando o comportamento. Um comportamento motivado, segundo Braghirolli et al. (2001), se caracteriza pela energia relativamente forte nele despendida e por estar dirigido para um objetivo ou meta. Já o motivo pode ser definido como uma condição interna relativamente duradoura que leva o indivíduo ou que o predispõe a persistir num comportamento orientado para um objetivo, possibilitando, a transformação ou a permanência da situação (SAWREY e TELFORD, 1976).

    Para Machado (1995) é importante saber que, em determinadas circunstâncias, alguns motivos adquirem predominância sobre outros, orientando o indivíduo para certos objetivos, ou seja, direcionando o comportamento. Da mesma forma que, certos motivos, têm maior intensidade em diferentes indivíduos, dependendo de fatores como personalidade de cada um, bem como indivíduos diferentes podem realizar a mesma atividade, animados por motivos diferentes e de intensidades diferentes.

    O entendimento dos motivos pelos quais as pessoas com deficiência se envolvem com a prática dos esportes, em no caso do presente estudo o futsal, tem sido fonte de várias pesquisas para profissionais e pesquisadores da área. As pessoas com deficiência utilizam os mesmos aspectos da motivação para o esporte. É significativo o número de pessoas que se tornaram deficientes em virtude de algum tipo de trauma ou doença e que já tiveram experiências esportivas antes da deficiência. Em alguns casos, a deficiência foi causada por alguma lesão esportiva. Em relação à motivação externa as experiências com sucesso tornam adequado o processo de aprendizagem do que o fracasso. Pois é comum que as experiências negativas aumentam o nível de insatisfação de um programa de atividades resultando em abandonos. Portanto a motivação para a prática esportiva depende da história de vida de cada pessoa e principalmente do incentivo dos grupos que cercam a pessoa com deficiência como a família, os amigos, professores e os colegas de trabalho.

Metodologia

    A pesquisa deste estudo esteve voltada para as descrições das práticas desportivas da ACERGS, especificamente as motivações para o treinamento do futsal do grupo de paradesporto futsal para cegos dessa instituição. O estudo é de caráter qualitativo na modalidade da etnografia e seguiu orientações metodológicas para essa finalidade a partir dos estudos de Stigger (2002), que orienta o desenvolvimento de vínculos relacionais no grupo investigado.

    O procedimento do processo investigativo procurou descrever e interpretar os fenômenos e as realidades vivenciadas. A modalidade metodológica para a coleta de informações foi o estudo etnográfico que permite a inserção do investigador no processo da prática investigativa, isto é, estar em conjunto com os investigados e passar a constituir a prática com o grupo. Inicialmente foram recolhidas as características socioeconômicas e demográficas do grupo, suas trajetórias, contextos familiares e a participação no grupo. Para dar conta de aspectos relacionados às vivências cotidianas dos participantes dos projetos, empregamos também uma abordagem de observação participante, articulada com entrevistas abertas.

    Foram realizadas entrevistas e observações participantes com diário de campo no período do primeiro semestre de 2008. Acompanhamos as atividades esportivas do grupo uma vez por semana. Ao final de cada atividade diária relatamos minuciosamente todas as situações ocorridas no diário de campo.

    As entrevistas foram realizadas com todos os principais segmentos com atuação no grupo: praticantes, professores, dirigentes e familiares. O processo de coleta de informações permitiu a organização das categorias de análise e respectivos conteúdos que dedicamos na sequência.

Motivações dos atletas deficientes visuais na participação da equipe de paradesporto futsal da ACERGS

    No processo do estudo pudemos perceber que foram diferentes os fatores que motivaram os atletas a ingressarem na ACERGS. A maioria dos atletas ingressou através da orientação do Instituto Santa Luzia, outros vieram indicados por pessoas que já jogavam na equipe. Mas que fatores motivacionais foram predominantes para os atletas iniciarem e se comprometerem com as atividades desenvolvidas pela equipe do paradesporto futsal da ACERGS?

    Podemos destacar que a vontade em praticar o esporte também está presente em pessoas com deficiências. A busca por lazer, praticar esporte, do prazer por jogar futebol, de poder realizar uma atividade que as pessoas sem deficiência realizam, a busca de novas amizades, podem ser algumas das hipóteses comuns aos deficientes visuais para a busca do paradesporto futsal.

    O processo de coleta de informações com o uso das entrevistas trouxe subsídios para poder compreender o movimento das motivações nos atletas investigados. Os atletas confirmam que a busca do prazer de jogar futebol, bem como de ser reconhecido por realizar uma atividade que uma pessoa sem deficiência realiza foi fator motivante para ingressar na ACERGS:

    “(...) em primeiro lugar eu sou um apaixonado pelo futebol, sempre fui, e em segundo lugar porque tenho o meu lazer, é uma forma de eu me distrair” (Entrevista número 1).

    “Bom, acho que são duas coisas: primeiramente quando eu fiquei deficiente visual, pois lembro que foi através do esporte que eu, deficiente visual, pude fazer o que as pessoas sem deficiência fazem. Em segundo porque já está no sangue, sou apaixonado por esporte, foi daí que eu consegui me movimentar me deslocar sozinho, superei minha deficiência através do esporte” (Entrevista número 2).

    Percebemos nessas situações uma motivação interna, da busca por satisfazer um desejo, por superar um desafio. Percebemos também um fator externo, que são as atividades realizadas pelas pessoas sem deficiência, e o desejo interno de fazer o mesmo. Esse também foi um fator motivacional. Os atletas deficientes visuais também desejam ser reconhecidos como pessoas que conseguem realizar suas atividades com desenvoltura e autonomia. Desejam inclusive ser reconhecidos por essas perfomances e com isso quebrar alguns preconceitos que ainda os atingem.

    Percebemos que o ponto de partida para ingressarem na ACERGS foi à busca por uma atividade prazerosa, da diversão e conseqüentemente pudessem conhecer e conviver com outras pessoas.

    A motivação inicial surgiu internamente, ou seja, foi fruto de um desejo pessoal de busca do prazer, da busca por não desanimarem, em levarem uma vida normal, de fazerem o que as pessoas sem deficiência também fazem.

    Entre os fatores motivacionais podemos citar a competição. Um grande número de atletas treina exclusivamente para competir. A fala que segue ajuda a compreender essa idéia:

    “A competição me deixa mais motivado e ansioso para vir treinar. Só treino para competir, e esse é o principal motivo porque pratico o esporte, se não fosse isso talvez nem praticasse o esporte. Competindo conhecemos novas pessoas, fazemos viagens e conhecemos novos lugares” (Entrevista número 3).

    O fator motivacional é externo. A competição é algo criado e elaborado por outras pessoas, que o motivam a vir treinar. Obviamente ai existe um fator interno, mas o mais impactante é, sem dúvida, o externo.

    Em contrapartida existem outros atletas que demonstram outras motivações como, por exemplo, a busca ou a manutenção da saúde. Acreditam que praticando um esporte regularmente estarão mantendo sua saúde em boas condições. Nessas pessoas encontramos presente também o prazer da convivência com os amigos. A fala que segue ilustra:

    “Por entender que isso é muito importante para saúde e para dar uma relaxada porque a gente vive em uma semana sempre muito tensa, trabalho, compromissos, então eu acho que pra mim hoje o fator principal é a saúde, saúde geral, mental, clinica, física, tudo. Também a convivência com o pessoal, nós já nos conhecemos há tanto tempo e é bom estar com eles” (Entrevista número 4).

    Foi possível perceber nos atletas que partilham dessa opinião uma motivação já internalizada. O que os motiva é o desejo de estarem bem de saúde e de conviverem com os amigos. Aprenderam que o esporte é um bom meio de convivência e de desenvolvimento de possibilidades de ascensão social e pessoal.

    Além desses fatores um novo fator motivacional, surgido no processo de coleta de informações da pesquisa, tem motivado os atletas a participarem dos treinamentos. Com a vinda da sede da equipe para o Centro Universitário Metodista IPA, os atletas ganharam uma infra-estrutura que nunca tiveram antes. Uma quadra em boas condições, facilidade de acesso, vestiários bons, acesso a piscina, acompanhamento especializado de treinamento físico. Tudo isso tem motivado sobre maneira a participação dos atletas nos treinamentos. É como descrevem as citações que seguem:

    “O que mais me motiva atualmente é a estrutura. A nova estrutura é excelente. A rapaziada é participativa, e com essa estrutura agora ficou muito bom. Agora temos que trabalhar para trazer resultados” (Entrevista número 5).

    “Terminado o treino todos se sentam no centro da quadra para fazer o alongamento final e começa os comentários da quadra: acharam que o piso deste ginásio deixa o jogo mais rápido e todos concordaram. Elogiaram muito a acústica do ginásio, fato que reclamavam muito no ginásio do cruzeiro. Elogiaram também toda estrutura do ambiente” (Obs.número 5 em 01/03/2008).

    A observação descrita relata a mudança de contexto que tiveram no desenvolvimento dos treinamentos, pois com o envolvimento da equipe de investigação, os atletas do Paradesporto Futsal da ACERGS foram convidados para jogar e treinar no Ginásio do Centro Universitário Metodista IPA. Diferentes são os fatores que motivam os atletas a participarem dos treinamentos da equipe de paradesporto Futsal da ACERGS. Seguindo o estudo sobre o fator motivação, vamos agora estudar os fatores que os motivam a participarem dos jogos e competições. Em relação à motivação para participar dos jogos podemos afirmar que quando há perspectiva de jogos os treinamentos se tornam mais motivadores, e também com mais participantes. Os jogos são com certeza fatores que motivam os atletas a treinarem. Mas o que motiva esses atletas a desejarem participar dos jogos?

    A grande motivação para participarem dos jogos é o desejo de vencer, de serem reconhecidos como capazes. Misturam um emaranhado de sentimentos, desde a vontade de serem reconhecidos, de mostrarem que também podem até manifestações de euforia, de medo e a ansiedade diante de atividades novas e desconhecidas. Aliado a esses sentimentos que são motivações internas, existem as motivações externas que podemos citar: a) apresentar suas habilidades ao público; b) ganhar a premiação, troféus, medalhas em campeonatos; c) passar a ser reconhecido como alguém com capacidades e outras. As citações concordam com a afirmação:

    “De vencer, o objetivo é sempre vencer. Não gosto de perder, ninguém gosta de perder. A motivação é vencer e trazer resultado para nossa equipe. A gente trabalha sério né, muito sério. Eu estou desde 2003, desde lá só resultados bons para nós. O ultimo campeonato ficamos em 4º lugar, para nós não foi tão ruim assim, pois estávamos muito mal fisicamente” (Entrevista número 6).

    “O deficiente visual, infelizmente, a todo dia que passa ele tem que provar para sociedade que pode, que ele tem condições. Esse jogo, com todo o público olhando, é uma grande oportunidade de provarmos isso. Além disso, esse grupo aqui é minha segunda família. Quanto a vencer, tu sempre entra em uma competição para ganhar, o intuito é ganhar é vencer. Mas tu não vencer faz parte do Esporte, tem que aprender, a saber, perder também, faz parte da vida” (Entrevista número 7).

    Os participantes do estudo destacam motivações relacionadas às suas superações pessoais, Relacionam o esporte como um meio de superação pessoal e reconhecimento social. O esporte é a possibilidade de serem percebidos como pessoas capazes e com habilidades como pessoas sem deficiências. Aliado a esse pensamento também há a aprendizagem de vencer competições.

    Conseguimos perceber através das observações o quão motivante é a marcação de um gol. O gol, objetivo maior do futebol, conseguir realizar significa vencer a si mesmo, se superar, ser capaz. Marcar um gol é significado de vitória pessoal e coletiva, é estar à frente no placar, receber aplausos do público, receber reconhecimento dos colegas, do treinador, conceder entrevistas. Assim, percebemos o quanto existe de motivação externa para marcar um gol.

    O fato é que a marcação de um gol, com toda essa mistura de sentimentos e prazer, é um fato muito comemorado entre os atletas, uma comemoração espontânea, sincera, que por vezes emociona. A citação que segue ilustra:

    “Aos 10 minutos do segundo tempo acontece gol da equipe azul nesse jogo de apresentação aqui no CEPE. O gol é muito comemorado pela equipe, o atleta que fez o gol grita muito e sai pulando, correndo pela quadra em busca de seus companheiros. Todos se juntam e se abraçam, comemorando muito. O público aplaude muito, ouvem-se assobios, a empolgação é generalizada” (Obs. número 11 em 19/04/2008).

    Percebemos também outro fator motivacional externo entre os atletas que é a repercussão que as vitórias em quadra causam em suas vidas públicas, principalmente no meio profissional. Os atletas se sentem felizes ao serem reconhecidos em seus locais de trabalho. Citam que através das vitórias nos jogos, dos títulos conquistados, conseguem mudar a visão das pessoas que convivem no dia a dia com eles, fazendo com que as mesmas deixem de vê-los como coitados, ou inferiores. Através das vitórias esportivas conseguem mostrar que tem um grande potencial, que são capazes.

    “Através do futebol eu consegui algumas coisas na minha empresa, por exemplo, quando eu fui campeão da Copa América pela Seleção, foi colocada minha foto em uma reportagem no site da minha empresa, isso para mim é gratificante. Eu recebi uma homenagem, um troféu da empresa. Tu ser conhecido é ótimo! As pessoas saem daquela mentalidade de “coitadinho dele”, e começam a pensar: não ele joga futebol! No Hospital Moinhos onde trabalho, por exemplo, logo que eu entrei algumas pessoas ficavam com aquela mentalidade a “coitadinho dele” e eu consegui mudar isso, mostrar para eles que não é bem assim, que sou capaz” (Entrevista número 8).

    Obviamente não podemos deixar de ressaltar a importância do incentivo da família, da motivação que a família traz aos atletas no dia a dia, mas principalmente nos campeonatos, nos jogos. A presença da família é fator motivacional para dedicação em quadra, para busca pela vitória, para estarem participando desses jogos, conforme exemplifica a observação:

    “Clima tranqüilo entre os atletas em relação ao jogo, mas agitação por parte dos próprios familiares que compareceram em grande número para assistir a final. As equipes se preparando. A participação de familiares em volta da quadra, incentivando a prática do futsal é grande. Alguns atletas da ACERGS mais ansiosos para disputa da final do torneio, clima de motivação é total, os familiares incentivam nas arquibancadas” (Observação número 4).

    Percebemos a importância desses eventos, das pessoas que se envolvem com os eventos, que batalham para criar oportunidades às pessoas participarem da sociedade. Através do esporte essas pessoas possuem uma possibilidade de demonstrar seus valores, suas qualidades.

Considerações finais

    O desenvolvimento do estudo que se debruçou sobre o tema do paradesporto futsal para pessoas com deficiência visual trouxe a tona uma temática que foi além dos aspectos e dos fundamentos do desporto. A presente investigação se envolveu com os aspectos motivacionais dos atletas deficientes visuais da ACERGS na busca e na manutenção de sua atividade esportiva do paradesporto futsal.

    O desenvolvimento da investigação permitiu alinhavar algumas compreensões no sentido de buscar respostas ao problema do estudo que foi investigar que fatores motivacionais foram predominantes para os atletas iniciarem e se comprometerem com as atividades desenvolvidas pela equipe do paradesporto futsal da ACERGS. Assim destacamos:

  1. os objetivos do grupo de para-atletas deficientes visuais vão além da busca de desenvolver a saúde, desempenhar atividade física, promover qualidade de vida ou, até mesmo, a busca de vitórias nas competições. Os participantes destacam motivações impulsionadas pelo desejo de demonstrar tudo em que são independentes, apesar de suas deficiências;

  2. os para-atletas deficientes visuais acreditam que a prática esportiva pode ser uma maneira de serem reconhecidos de forma mais ampla pela sociedade. É um momento em que podem demonstrar habilidades e buscar espaços de reconhecimento pessoal. O reconhecimento como cidadãos, independentemente de serem deficientes. Poder integrar a sociedade e ser útil nela;

  3. as relações interpessoais o convívio com outras pessoas que enfrentam semelhantes dificuldades fazem com que os deficientes superem e aceitem suas dificuldades tanto físicas como psicológicas;

  4. o esporte é um meio de o deficiente visual descobrir-se valorizado e estimado pela família e sociedade. Tal reconhecimento é um fôlego extra na sua capacidade de lutar e galgar autonomia e independência.

    Queremos ressaltar que o estudo ainda destacou a importância do grupo, dos amigos e da família que é responsável pela participação na equipe de paradesporto futsal da ACERGS. É possível compreender o quanto o esporte é importante na vida desses para-atletas pelos laços de afetividade que são exercitados nos encontros de treinamentos tornando o desporto um meio de conquistas pessoais e de desenvolvimento humano dos participantes.

Referências

  • BRAGHIROLLI, EM. BISI, GP. RIZZON, LA. et. al. Psicologia geral. Porto Alegre: Vozes, 2001.

  • DAVIDOFF, L. Introdução à psicologia. São Paulo: McGraw-Hill, 2001.

  • DINIZ, D. O que é deficiência. São Paulo: Brasiliense, 2007.

  • DUARTE, E. Inclusão e acessibilidade: contribuições da educação física adaptada. Revista da Sobama Dezembro 2005, Vol. 10, n.1, Suplemento, pp. 27-30 Unicamp.

  • MACHADO, AA. Importância da motivação para o movimento humano. In: Perspectivas Interdisciplinares em Educação Física. São Paulo: Soc. Bras. Des. Educação Física, 1995.

  • RIBEIRO, SM. Inclusão e esporte: um caminho a percorrer. In: Sociedade Brasileira de Atividade Motora Adaptada. Temas em educação física adaptada/Sociedade Brasileira de Atividade Motora Adaptada. [s.l.]: SOBAMA, 2001.

  • RODRIGUES, PA. Motivação e performance. Monografia (Graduação em Educação Física) - Universidade Estadual Paulista, Rio Claro/SP, 1991.

  • SASSAKI, RK. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.

  • SAWREY, JM. TELFORD, CW. Psicologia educacional. Rio de Janeiro: Livro Técnico e Científico, 1976.

  • STIGGER, MP. Esporte, lazer e estilo de vida: um estudo etnográfico. Campinas: Autores Associados, 2002.

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