A ética nas aulas de Educação Física do Colégio Pedro II, Unidade Tijuca II |
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Especialista em Educação Física Escolar pelo Departamento de Educação Física da UFF Docente da rede pública estadual e do Colégio Pedro II |
Jonas Henrique Almeida da Silva professorjonashenrique@gmail.com (Brasil) |
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Resumo Esse trabalho foi desenvolvido no ano de 2008 como propostas do departamento de Educação Física e Folclore do Colégio Pedro II – Unidade Tijuca II, para vivenciar o tema transversal ética, junto aos alunos das turmas 802, 804, 1101, 1103, 1105, 2102, 2104, 2106, 1201 e 1203. Ele surgiu a partir do planejamento participativo e teve por objetivo apresentar,discutir, ressignificar e vivenciar todo o processo do tema transversal. Ao término verificamos a ampliação no repertório dos educandos, envolvendo as diferentes dimensões dessa temática, além disso, as vivências proporcionaram aos alunos uma aprendizagem reflexiva, autônoma e significativa. Unitermos: Ética. Educação Física. Cultura corporal. Legitimação. Conteúdos. |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 132 - Mayo de 2009 |
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O professor de natação não pode ensinar o aluno a nadar na areia fazendo-o imitar seus gestos, mas leva-o a lançar-se na água em sua companhia para que aprenda a nadar lutando contra as ondas, fazendo seu corpo coexistir com o corpo ondulante que o acolhe e repele, revelando que o diálogo do aluno não se trava com seu professor de natação, mas com a água. O diálogo do aluno é com o pensamento, com a cultura corporificada nas obras e nas práticas sociais e transmitidas pela linguagem e pelos gestos do professor, simples mediador.
Marilena Chaui
Na introdução do tema transversal: Ética, há explícito que nos costumes, manifesta-se um aspecto fundamental da existência humana: a criação de valores. Os diversos grupos e sociedades criam formas peculiares de viver e elaboram princípios e regras que regulam seu comportamento. Esses princípios e regras específicos, em seu conjunto, indicam direitos, obrigações e deveres. Não há valores em si, mas sim propriedades atribuídas à realidade pelos seres humanos, a partir das relações que estabelecem entre si e com a realidade, transformando-a e se transformando continuamente. Assim, valorizar significa relacionar-se com a natureza, atribuindo-lhe significados que variam de acordo com necessidades, desejos, condições e circunstâncias em que se vive. Pela criação cultural, instala-se a referência não apenas ao que é, mas ao que deve ser. O que se deve fazer se traduz numa série de prescrições que as sociedades criam para orientar a conduta dos indivíduos. Este é o campo da moral e da ética.
Conceito de Ética
A palavra Ética representa algo que tem inúmeras significações. È um vocábulo que permite ser interpretado de acordo com a cultura da região na qual é invocada. Quando as pessoas passaram a viver em comunidades, necessitaram de
A moralidade é tida como o conjunto de crenças, princípios, regras que norteiam o comportamento humano, a moral é o campo em que dominam os valores relacionados ao bem e ao mal, como aquilo que deve ser buscado ou de que se deve afastar. O conteúdo dessas noções ganha concretude no interior de cada contexto social específico e varia enormemente de sociedade para sociedade, de cultura para cultura, em cada situação concreta, intervêm interesses, estabelecem-se poderes, emergem conflitos. O que é importante assinalar é que a moralidade é componente de todas as culturas e a dimensão moral está presente no comportamento de cada pessoa em relação com as outras, das culturas e dos povos entre si. (PCN, 1999, p.43).
Na justificativa de legitimar a Educação Física no Colégio Pedro II – Unidade Tijuca II com as turmas 802, 804, 1101, 1103, 1105, 2102, 2104, 2106, 1201 e 1203, observamos o alcance da especificidade que a ela é dada considerando-se que é finalidade da Educação Física na escola, integrar e introduzir os alunos no mundo da cultura física, formando o cidadão ético que vai usufruir partilhar, produzir, reproduzir e transformar as formas culturais da atividade física (o jogo, o esporte, a dança, a ginástica).
Nós podemos citar a organização das ações da Educação Física com fundamentação teórica, planejamento adequado, conteúdos sistematizados e metodologias participantes.
Nesse sentido, estamos trabalhando a Educação Física numa perspectiva de transformação, rompendo com os padrões impostos pela classe dominante do esporte de rendimento. Pois este reflete os ideais do liberalismo econômico instalado em nossa sociedade onde alguém tem que perder para que outro possa ganhar.
Diante do exposto podemos compreender o nosso compromisso como educadores desde já. A partir de então, começamos a desenvolver um trabalho na condição de professor de Educação Física, com várias tentativas de legitimação da Educação Física com a temática ética, buscando a superação, primeiramente, da concepção de Educação Física que alguns professores têm, de uma disciplina responsável apenas de cuidar do corpo ou de recrear os alunos para passar o tempo, onde o lugar do raciocínio e do pensamento é o espaço dentro da sala de aula. Desta forma estamos procurando conscientizar e refletir sobre a importância da ética nas aulas de Educação Física e não como um tema a parte.
Segundo Antônio Flávio Moreira e Tomaz Tadeu da Silva (2002):
(p. 7 e 8).“... o currículo é considerado um artefato social e cultural. Isso significa que ele é colocado na moldura mais ampla de suas determinações sociais, de sua história, de sua produção contextual. O currículo não é um elemento inocente e neutro de transmissão desinteressada do conhecimento social. O currículo está implicado em relações de poder, o currículo transmite visões sociais particulares e interessadas, o currículo produz identidades individuais e sociais particulares. O currículo não é um elemento transcendente e atemporal – ele tem uma história, vinculada e formas específicas e contingentes de organização da sociedade e da educação”
Diante do planejamento participativo procuramos vivenciar uma proposta concreta e realizável, na qual, dividimos pedagogicamente em mapeamento, vivências e aprofundamento. Em um primeiro momento os alunos foram conhecer o que é a ética através do conteúdo trabalhado no primeiro trimestre, onde conhecemos a história do futebol e como os princípios éticos se distanciaram na sua prática. Pois no início não existia a figura de um árbitro e como ele surgiu através da necessidade de controlar as jogadas violentas. Para isso assistimos a um filme: “A história do futebol – Um jogo mágico”. Depois utilizamos a música: “É uma partida de futebol” para discutirmos a temática ética a partir da letra da música: “Posso morrer pelo meu time / Se ele perder, que dor, imenso crime/ Posso chorar se ele não ganhar/ Mas se ele ganha, não adianta/ Não há garganta que não pare de berrar”. E ilustramos com algumas fotos:
Em seguida analisamos os padrões de organização da cultura dentro do futebol: Cultura
de massas
Analisamos que desporto é um produto da sociedade, mas tem alguma autonomia
dela. Esta autonomia dá ao desporto a possibilidade de ser visto como ator que
influencia a sociedade.
Na sociedade capitalista moderna, o desporto tem de ser visto essencialmente em
termos econômicos, é um importante artigo de consumo.
Há, portanto, um grande poder do mito. Ele atua sobre a imaginação das
pessoas, cria um sentimento transcendente de unidade entre o ser e o universo,
semelhante ao efeito da poesia. Para ser efetivo, o mito deve criar claridade
eufórica.
O mito tem a capacidade de fazer o indivíduo esquecer a realidade social em que
vive e passar a viver num mundo em que se sente.
O desporto hoje em nossa sociedade torna-se mito através das grandes campanhas
publicitárias, principalmente dos produtos Nike.
O desporto é uma agência social e econômica extremamente poderosa devido à
sua qualidade mitológica.
O mito tem a capacidade ideológica de apoiar a ordem social, econômica e
estrutura de poder vigente, escondendo as contradições e divisões da
realidade social.
Diante disto somos cobrados a todo o momento a realizar a inclusão dos alunos
neste processo, na visão de que a sociedade é que deve facilitar a inclusão
dos excluídos e a outra visão é que os excluídos que devem promover a
própria inclusão por competências individuais e se não conseguem são
culpados pelo fracasso por não terem se esforçado o bastante, mas vimos que
não existem excluídos deste processo, pois todos nós fazemos parte dele, o
que existe é que alguns são mais favorecidos que outros.
Precisamos refletir que a responsabilidade é da maioria desfavorecida de
lutarem pela transformação social.
Logo depois discutimos os preconceitos existentes que afastam a ética do
futebol.
Discutimos também sobre a violência no futebol sendo analisada a partir dos
hinos dos clubes e para isso os alunos confeccionaram cartazes:
No processo pedagógico das vivências os alunos construíram e vivenciaram o
futebol e futsal, o voleibol, o tênis, atividades de consciência corporal, a
transformação e utilização de materiais alternativos nas diversas lutas
(barbante, cabo de vassoura, garrafa plástica, TNT, bola de aniversário,
papelão, etc.). Nesta fase das vivências puderam vivenciar os elementos
históricos de cada atividade planejada, compreendendo, analisando, repensando,
criando e recriando novas formas de manifestações corporais atuais. Puderam
também construir novos materiais para a realização das práticas corporais.
Tudo isso fazendo parte dos conteúdos específicos e planejados da Educação
Física. E com isso não havendo a exclusão, garantindo acesso de todos os
alunos as atividades planejadas anteriormente, incluindo homens e mulheres nas
aulas, pois as aulas promovem um espaço de superação, confronto de
diferenças e rupturas de padrões preestabelecidos.
Desta forma os alunos podem vivenciar atividades para portadores de necessidades
especiais como o futsal sentado, voleibol sentado, futsal em duplas com os olhos
vendados. No sentido de percebermos a importância da ética nos diversos jogos
e com possibilidades de vivenciarmos as dificuldades dos portadores de
necessidades especiais, desenvolvendo assim, com essas atividades o espírito de
solidariedade, companheirismo, amizade, respeito às diferenças e limitações
de cada ser humano.
No que diz respeito sobre as regras dos diversos jogos, podemos vivenciá-las,
compreendê-las como importantes na realização dos esportes. Mas também os
alunos foram incentivados a criarem novas regras, sendo assim, construtores de
espaços éticos e de respeito mútuo.
Além disso, não trabalhamos apenas com um tipo de conteúdo. Proporcionamos
vivências em todos os elementos da cultura corporal. Percebemos a importância
da aprendizagem de conteúdos diversos e significativos para a aprendizagem da
ética.
Na fase de aprofundamento das lutas explicamos através de slides sobre
conhecimento histórico e filosófico e como podemos vivenciar as lutas na
escola. Histórico das Lutas (Origens, Tipos de lutas, Fundamentos filosóficos,
Fundamentos básicos comuns e Lutas na escola). As lutas como GARANTIA DA
SOBREVIVENCIA - Desde cedo o aprendizado de técnicas e do espírito de lutas
era passado as crianças a fim de garantir a sobrevivência própria e do grupo.
As lutas como Dominação - Alexandre o grande séc. III a.c - Império da
Macedônia. As lutas como Espetáculo - Duelos sangrentos como entretenimento:
Prisioneiros x prisioneiros / Prisioneiros x soldados / Prisioneiros x animais /
Faziam parte da política do pão e circo (panis et circencis). Como a
invenção da Pólvora - As lutas tomam um novo sentido: Cultural –
filosófico e Saúde. As Lutas como Esporte - Ganha um caráter mais prático
com fim na conquista de títulos. Tenta manter bases filosóficas;
Universalização e aculturação; Surgimento de organizações; Mídia e lutas
- Aumento do espetáculo televisivo; Grandes produções cinematográficas;
Competições locais e internacionais (Universalização de Regras). As lutas no
Brasil - Lutas indígenas (Brasil colônia); Surgimento da capoeira (império);
Influência do movimento imigratório. Elitização x Popularização -
Criação das federações e submissão das academias e associações; Lei
Pelé: Criação de ligas; Financiamentos públicos: Conanda /ME e Lei de
incentivo.
E por fim uma grande reflexão sobre os valores éticos das lutas: Quem
luta não briga... Quem tem disciplina prega a Paz!
Na fase de aprofundamento, dividimos a turma em grupos para pesquisarem e
apresentarem atividades temáticas sobre os jogos olímpicos: A
história dos jogos olímpicos; O
país sede; Os
jogos paraolímpicos; Doping; Os
esportes que não estiveram nos jogos e o porquê?
No processo avaliativo utilizamos um questionário aberto com as seguintes
perguntas: Do que mais gostou? Do que menos gostou? O que a Educação Física
contribuiu na sua formação ética como estudante e ser humano? O que você
achou da participação da turma e também da sua nas aulas de Educação
Física? Que nota você daria para a sua participação? Dê sugestões de
atividades a serem vivenciadas nas próximas aulas. Utilizamos também um quadro
aonde os alunos são motivados a responderem o que aprenderam nas aulas de
Educação Física.
E para a avaliação individual utilizamos alguns critérios importantes: Enfrentar
desafios colocados em situações de vivências dos elementos da cultura
corporal de movimento, respeitando, questionando e resignificando as regras
e adotando uma postura cooperativa; Estabelecer
algumas relações entre a prática de atividades corporais e a conjuntura
social; Valorizar
e apreciar diversas manifestações da cultura corporal, identificando suas
possibilidades de lazer e aprendizagem e criar possibilidades de ampliação
dos conteúdos da educação física escolar. Bibliografia Adorno,
T. W. Educação e Emancipação. Rio de Janeiro, Ed. Paz e Terra,
1995. ARANHA,
Maria Lúcia de Arruda. Filosofia da educação. 2ª ed. São Paulo:
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história nº 7. 1ª ed., Veranópolis – RS: edição Iterra, 2001. 72p. BRASIL.
Ministério de Educação e do Desporto. Secretaria de Ensino Fundamental. Parâmetros
curriculares nacionais: Secretaria de Educação Fundamental. Brasília,
MEC/SEF, 1997. BRASIL.
Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros curriculares
nacionais: ensino médio. Ministério da Educação, Secretaria de
Educação Média e Tecnológica. Brasília, MEC/SEMTEC, 2002. Castellani
Filho, Lino. Política Educacional e Educação Física. Campinas,
São Paulo: Autores Associados, 2002. Coletivos
de Autores. Metodologia do Ensino de Educação Física. São Paulo:
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Jr, Paulo. Educação Física Progressista. Ed.Loyola, São Paulo,
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M.A.T. Existe espaço para o ensino da Educação Física na escola
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Celso dos Santos. Planejamento: Projeto de Ensino-Aprendizagem e Projeto
Político- Pedagógico – elementos metodológicos para elaboração e
realização. São Paulo: Libertad, 10ª ed., 2002.
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