Efeitos da exposição à altitude no desempenho físico | |||
Estudante do último ano do curso de Educação Física pela Universidade Paulista (Brasil) |
Raphael Camargo de Araújo |
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Resumo A intensidade do exercício é reduzida em altitude devido a uma baixa pressão parcial de oxigênio (pO2). Uma permanência adequada na altitude desenvolve uma série de alterações fisiológicas que melhoram o transporte de oxigênio. Essas adaptações podem ser agudas ou crônicas, e visam aumentar o fluxo sanguíneo para compensar a redução na concentração de oxigênio e aumentar a concentração de hemoglobina. O processo de aclimatação varia de acordo com o tempo de exposição e o nível de altitude, durante esse processo pode ocorrer o acometimento de alguns problemas de saúde relacionados à hipóxia se não tomadas as devidas precauções. O maior interesse da realização do treinamento em altitude é o aumento no conteúdo de hemoglobina, que melhora o transporte de oxigênio e aprimora o desempenho aeróbio, gerado através de um aumento na síntese do hormônio eritropoetina. O modelo de viver em uma altitude média e treinar em uma altitude menor mostra-se como o método que produz os melhores resultados no desempenho. O objetivo deste artigo é revisar as adaptações fisiológicas geradas pela exposição à altitude e seus efeitos no desempenho físico. Unitermos: Exercício em altitude. Aclimatação. Hemoglobina. Eritropoetina. |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - Nº 129 - Febrero de 2009 |
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Introdução
Pela menor disponibilidade de oxigênio, a intensidade do exercício é reduzida na altitude, e as adaptações geradas por essa exposição são os principais fatores a serem avaliados quando há programada uma competição em altitude elevada.
Uma permanência adequada na altitude desenvolve uma série de alterações fisiológicas, que visam um melhor transporte de oxigênio. Buscando aprimorar a entrega de oxigênio aos tecidos, muitos atletas de elite usam do treinamento na altitude para aperfeiçoarem a preparação física e melhorarem o desempenho ao nível do mar. O tempo de exposição e o nível de altitude são os principais fatores que podem levar a um desempenho otimizado, ou a prejuízos para a saúde do atleta. (WILBER, STRAY-GUNDERSEN, LEVINE, 2007; MAZZEO, 2008).
Muitos autores citam uma evolução na condição física de atletas que utilizaram do treinamento em altitude, embora com grandes variações na metodologia aplicada.
O objetivo deste artigo é revisar as adaptações fisiológicas geradas pela exposição à altitude e seus efeitos no desempenho físico.
Efeitos da exposição à altitude
Ao realizar um exercício físico na altitude, temos dois tipos de estresses aos quais o corpo mais responde e se adapta, o exercício e a hipóxia, que é a quantidade reduzida de oxigênio num ambiente, e afeta diretamente a intensidade do exercício.
Ao nível do mar, segundo Mcardle, Katch e Kacth (2003), o ar exerce uma pressão barométrica de 760 milímetros de mercúrio (mmHg), com um percentual de oxigênio de cerca de 20,93%. Mazzeo (2005) descreve que na altitude, o ar ambiente continua contendo 20,93% de oxigênio, porém, a pressão barométrica é menor conforme ascendemos a níveis maiores de altitude, fazendo com que diminua o número de moléculas de oxigênio por unidade de volume, ou seja, uma menor pressão parcial de oxigênio (pO2).
Citado por West (2004), o consumo máximo de oxigênio (VO2 max) é reduzido à 85% do valor ao nível do mar, numa altitude de 3.000 m. A 5.000 m de altitude, esse valor é de apenas 60% do valor conseguido ao nível do mar, e no pico do Monte Everest (8.848 m) o consumo máximo de oxigênio fica em menos de 30% do valor ao nível do mar.
As alterações fisiológicas, como conseqüência da hipóxia, ocorrem nos primeiros momentos de exposição à altitude.
Essas adaptações são fundamentais para o fornecimento de oxigênio aos tecidos, seguidas por adaptações crônicas que podem levar meses.
Esse processo de adaptação recebe o nome de aclimatação à altitude, como veremos em detalhes.
Aclimatação
Os principais ajustes que ocorrem em resposta a exposição aguda à altitude são a hiperventilação e um maior débito cardíaco (em repouso e em exercício submáximo). Exposições prolongadas à altitude proporcionam ajustes que ocorrem de maneira mais lenta, para melhorar a tolerância à hipóxia, como um equilíbrio ácido-básico dos líquidos corporais, um aumento no número de hemácias e maior concentração de hemoglobina.
Os efeitos da aclimatação variam conforme a altitude e a individualidade biológica. Uma adaptação plena a uma altitude média, pode ser apenas uma adaptação parcial a altitudes maiores.
O tempo ideal necessário para a aclimatação, numa média geral, fica em torno de 15 dias para uma altitude de 2.500 m, a partir daí, cada aumento de 610 m necessita de uma semana adicional para uma aclimatação plena. As adaptações produzidas pela aclimatação dissipam-se em cerca de 20 dias após retorno ao nível do mar. (FOSS, KETEYIAN, 2000; MUZA, 2007).
Mazzeo (2008) cita também que há uma síntese aumentada das catecolaminas (adrenalina e principalmente noradrenalina), hormônios produzidos pela medula supra-renal, em resposta a exposição às grandes altitudes. Esses hormônios ajudam no processo de adaptação a um ambiente com menor quantidade de oxigênio. A adrenalina acelera a freqüência cardíaca e aprimora a contratilidade do miocárdio, aumentando assim o fluxo sangüíneo para os músculos, o consumo de oxigênio e a mobilização de glicogênio. A melhora na saturação do oxigênio arterial ocorre com a aclimatação, diminuindo o estresse hipóxico e diminuindo os níveis de adrenalina. Já a noradrenalina tem seus níveis plasmáticos semelhante aos observados ao nível do mar em exposição aguda à altitude, atingindo seus níveis máximos após 4-6 dias de exposição a uma grande altitude. Entre seus principais efeitos está a constrição aumentada das arteríolas e vênulas, resultando em aumento da pressão arterial.
Transporte de oxigênio no sangue
O oxigênio pode ser dissolvido no plasma e transportado até os tecidos numa quantidade relativa de 3% a 4% do consumo total por minuto. O transporte efetivo do oxigênio dos pulmões até os tecidos é realizado pela hemoglobina, uma proteína presente nas hemácias, que além de carrear O2 tem uma importante função na manutenção do pH sangüíneo. A molécula de hemoglobina é constituída de quatro subunidades, onde cada subunidade pode transportar uma molécula de oxigênio. (MARZZOCO, TORRES, 2007).
As hemácias, também chamadas de eritrócitos ou glóbulos vermelhos, onde estão presentes as hemoglobinas, são células anucleadas e sem mitocôndrias, sendo portanto células exclusivistas de glicose, que produzem energia unicamente através da glicólise.
A hemoglobina mostra-se com a afinidade reduzida pelo oxigênio quando os níveis de 2,3-bisfosfoglicerato (2,3-BPG) estão altos. O 2,3-BPG é formado a partir do 1,3-bisfosfoglicerato, um intermediário na degradação da glicose. Os níveis de 2,3-BPG aumentam em condições de hipóxia prolongada, como a permanência na altitude. É uma adaptação à diminuição na oferta de oxigênio, que visa compensar essa disponibilidade diminuída com um aumento da liberação de O2 pela hemoglobina. Com uma afinidade reduzida pelo oxigênio, a hemoglobina o libera de maneira mais eficiente. (FOSS, KETEYIAN, 2000; MARZZOCO, TORRES, 2007).
A mioglobina, uma proteína semelhante a uma subunidade da hemoglobina, é encontrada em grande quantidade no músculo, funcionando como um reservatório adicional de oxigênio. Por ter uma afinidade maior por oxigênio em relação a hemoglobina, em qualquer pO2, a mioglobina recebe o O2 transportado pela hemoglobina e o libera em condições de pO2 muito baixas, para ser utilizado pelas mitocôndrias das células musculares. (LEHNINGER, NELSON, COX, 2007; ROBACH et al, 2007)
Policitemia
A baixa pressão parcial do oxigênio, associada com os efeitos da altitude, estimula um aumento na produção de eritropoetina pelos rins, em resposta a uma hipóxia arterial. O hormônio eritropoetina, também chamado de hormônio eritrócito-estimulante, age na medula óssea de ossos longos, estimulando a produção, que leva a um aumento, das hemácias, condição esta denominada policitemia. (MCARDLE, KATCH, KATCH, 2003; GORE, CLARK, SAUNDERS, 2007).
Além da exposição à altitude, outras práticas induzem a um aumento no número de hemácias, como a permanência em câmaras de hipóxia artificial, com a quantidade de oxigênio controlada por filtração do gás ou diluição de nitrogênio, reduzindo a pO2 ambiente, prática recentemente incluída na lista de substâncias/métodos proibidos da Agência Mundial de Anti Doping (WADA – World Anti Doping Agency), a aplicação de eritropoetina endógena e o doping sanguíneo, ambos proibidos pelo COI (Comitê Olímpico Internacional). (BARROS NETO, 2001; WILBER, 2005).
Em um estudo realizado por Levine e Stray-Gundersen (1997) apud Wilber, Stray-Gundersen e Levine (2007), após 22 horas por dia de exposição, durante 4 semanas de permanência numa altitude de 2.500 metros, corredores treinados exibiram aumento significativo de 5% no volume de hemácias, 9% na concentração de hemoglobina e uma melhora de 4% no VO2max avaliado em esteira.
Com a síntese de eritropoetina elevada, aumenta a produção de hemácias, e consequentemente o número de hemoglobina disponível, melhorando a capacidade de ligação do oxigênio. É sugerido por Weineck (2005) que posteriormente à produção de hemácias, o número de moléculas de hemoglobina por hemácia também seja aumentado, portanto, ocorre um aumento no número e no tamanho das hemácias, e com isto, um aumento da viscosidade do sangue, o que torna o trabalho cardíaco maior.
Durante a exposição contínua à uma altitude de em média 2.200 m, a eritropoetina atinge seu pico de liberação dentro de 24-48 horas e depois declina próximo aos níveis basais. (GORE, CLARK, SAUNDERS, 2007). Entretanto o processo de policitemia é lento, levando vários dias para aumentar a produção de hemácias. (WEST, 2004).
Segundo Grover e Bärtsch (2001) apud Gore, Clark e Saunders (2007), a elevação dos níveis de eritropoetina nas primeiras horas de permanência na altitude representa o período em que a produção excedeu o consumo pela medula óssea, a qual subsequentemente aumentou o consumo do hormônio, levando a uma alta na produção de hemácias, e finalmente a um equilíbrio. Apesar de uma produção elevada, os níveis de eritropoetina ficam próximos aos níveis basais, pois seu consumo também é aumentado, o que impede a avaliação de alterações em sua concentração após a exposição inicial.
A exposição a um ambiente hipóxico, como a altitude, ativa o fator de transcrição HIF-1 (hypoxic-inducible factor 1) que controla uma ampla gama de genes envolvidos na produção de hemácias. (ROBACH et al, 2007). Sob condições de pO2 normal, o HIF-1 é rapidamente degradado. Em condições hipóxicas, o complexo HIF-1 é estável, ativando a transcrição e estimulando a produção de eritropoetina, além de outros efeitos fisiológicos, como atuar no transporte da glicose, na atividade de enzimas glicolíticas, em respostas inflamatórias e no metabolismo dos ossos. (WANG, SEMENZA, 1996 apud WILBER, STRAY-GUNDERSEN, LEVINE, 2007).
A produção de hemácias envolve aumento no suprimento de ferro, componente da hemoglobina, e além de poder resultar em falta de ferro para outros compartimentos corporais, pessoas com reservas insuficientes de ferro podem não responder efetivamente aos efeitos da aclimatação. (HERSHKO, 2007).
No trabalho de Robach et al (2007) foram examinados os efeitos da hipóxia sobre proteínas do metabolismo do ferro (HIF-1, IRP- iron regulatory proteins, IRE – iron regulatory elements e TfR – transferrin receptor) no sangue e no músculo vasto lateral de jovens adultos, avaliados ao nível do mar e depois de 7-9 dias de aclimatação a uma altitude de 4.559 m. Foi percebido um aumento no número de hemoglobina, acompanhado de uma diminuição na concentração muscular de mioglobina, sugerindo que o aumento na necessidade de ferro pelos estímulos hipóxicos resultaram em mobilização de ferro muscular. Deve-se lembrar que o trabalho utilizou-se de um curto período de permanência na altitude e não houve controle alimentar citado.
Problemas de saúde relacionados à altitude
Além das adaptações geradas para uma permanência mais confortável, pessoas expostas à altitude correm o risco de desenvolver alguns problemas de saúde decorrente da quantidade diminuída de oxigênio. Esses problemas, na maioria das vezes, estão ligados a uma subida rápida a grandes altitudes, não respeitando o período de aclimatação, e geralmente desaparecem com a descida para altitudes menores. As condições problemáticas mais comuns que afetam as pessoas na altitude são: Mal agudo das montanhas, Edema pulmonar das grandes altitudes e Edema cerebral das grandes altitudes.
Nas principais enfermidades ligadas à exposição à altitude, a primeira providência indicada é descer o mais rápido possível para altitudes menores. Em alguns casos, o diagnóstico preciso da enfermidade é dificultado pelos efeitos da altitude, podendo não haver a distinção entre um possível problema de saúde e o processo de aclimatação. O mais indicado é realizar uma ascensão gradual, respeitando o tempo necessário para as adaptações fisiológicas, reduzindo assim a possibilidade de desenvolver algum problema de saúde, e ter disponível um cilindro de oxigênio suplementar para uma eventual emergência.
Buss e Oliveira (2006) falam sobre a importância da alimentação para praticantes de exercício na altitude. Com o aumento na taxa metabólica basal de 400 à 600 kcal por dia, juntamente com uma redução no apetite e no consumo alimentar, muitas vezes ocorre uma diminuição do peso da pessoa exposta à altitude (anorexia), caso não ocorra um replanejamento nutricional.
Desempenho físico na altitude
A diminuição da saturação da hemoglobina com o oxigênio leva a reduções do VO2max na altitude. Como conseqüência de que cada litro de sangue estará transportando menos oxigênio por minuto, a freqüência cardíaca é aumentada para compensar a quantidade reduzida de oxigênio, aumentando sua velocidade de transporte. (POWERS, HOWLEY, 2006).
Em comparação, exercícios de característica predominantemente anaeróbicas, de curta duração, não apresentam queda no desempenho ou dificuldade na realização em conseqüência dos efeitos da altitude. (WEINECK, 2005).
Mazzeo (2008) relata em seu estudo que a exposição à altitude não provocou mudanças nas vias metabólicas anaeróbicas e que exercícios de alta intensidade que utilizam de energia de forma não-oxidativa (anaeróbico) poderiam não apresentar melhoras após períodos de treinamento na altitude.
Outros resultados mostram que o limiar de lactato ocorre em uma intensidade de exercício mais baixa em hipóxia, comparado a um ambiente em normóxia, e a concentração de lactato sangüíneo é mais alta em hipóxia, sugerindo um aumento na ativação do Sistema Nervoso Simpático, o que estimularia a degradação do glicogênio e a glicólise, contribuindo para um aumento no acúmulo de lactato. (OGURA et al., 2005, LORENZ et al., 2006).
Após uma adaptação crônica à altitude, percebe-se que um exercício de intensidade sub-máxima, que na fase aguda produzia altos níveis de lactato sangüíneo, não provoca os mesmos aumentos, mantendo uma quantidade menor na produção de lactato, fenômeno este denominado paradoxo do lactato. (MCARDLE, KATCH, KATCH, 2003).
Uma provável explicação, segundo Gore, Clark e Saunders (2007), é um aumento das proteínas MCT1 e MCT4 (monocarboxylate transportes) que facilitam o transporte de lactato e H+, e teriam sua produção aumentada em resposta a exposição à altitude.
Weineck (2005) relata que a hipóxia pode induzir a uma diminuição do pensamento analítico, o que compromete a capacidade de tomar decisões, além de uma diminuição da capacidade de reação, que prejudica a coordenação dos movimentos e aumenta o risco de lesões.
Já um estudo realizado por Szubski, Burtscher e Löscher (2007) mostrou que adaptações neuromusculares periféricas e centrais são semelhantes em hipóxia e em normóxia, sendo que a hipóxia não resulta em aumento da fadiga central, e que a recuperação da força de contração é mais rápida em hipóxia, o que sugere uma alteração na fosforilação das isoformas de miosina, podendo assim aumentar a força de contração.
Durante a realização de exercício na altitude, o principal substrato energético utilizado é o glicogênio, por ser o substrato que mais gera ATP por litro de oxigênio consumido. (BUSS, OLIVEIRA, 2006). A utilização de ácidos-graxos para produção de energia durante a realização de exercícios físicos na altitude não seria interessante, pois além de ter um ritmo mais lento de oxidação, a produção de energia através destas fontes utilizaria de um volume maior de oxigênio, o que levaria a uma redução na intensidade do exercício.
A concentração reduzida de oxigênio, exercícios realizados acima do limiar de lactato e uma alta degradação de glicogênio podem levar a um estado de fadiga precoce.
Os resultados do estudo de Kohin et al. (2001) mostraram que o trabalho isolado de fibras musculares individuais, sem a presença de fatores extracelulares, é afetado pela hipóxia, apresentando um declínio na produção de força, apesar da ausência de fatores circulantes. Acompanhada da diminuição da força, foi percebido uma queda no pico de cálcio, sugerindo uma baixa na sensibilidade miofibrilar ao cálcio, dificultando a contração. Uma breve pré-exposição à hipóxia melhorou a produção de força e as mudanças nos canais de cálcio, melhorando a recuperação da célula durante exposição subseqüente à hipóxia.
O principal interesse da realização do treinamento em altitude é a melhora na capacidade de transporte de oxigênio no sangue, através de um aumento na conteúdo de hemoglobina. Na revisão elaborada por Gore, Clark e Saunders (2007), abordou-se a possível influência de outros fatores que contribuem para a melhora no desempenho físico, além do aumento no volume de hemácias, como a melhora na economia do movimento. A economia do movimento é a quantidade de energia necessária para manter uma velocidade constante do movimento (MCARDLE, KATCH, KATCH, 2003) e os possíveis mecanismos para melhorá-la após um período de exposição à altitude incluem melhoras no processo de excitação e contração muscular, que levam a um desempenho com menor custo energético, através de reduções no acúmulo de co-produtos como ADP, Pi e H+, e melhora na eficiência mitocondrial. (GREEN et al., 2000 apud GORE, CLARK, SAUNDERS, 2007).
A melhora na economia do movimento ocorre independente do ambiente de treinamento, mas neste caso, a melhora no desempenho ao nível do mar após um período de treinamento na altitude, com relação a economia do movimento, acontece por um aumento na produção de ATP por mol de oxigênio e por diminuição do custo de ATP para a contração muscular. (WILBER, 2007).
Treinamento e altitude
Pessoas treinadas quando expostas à altitude apresentam uma redução no VO2max maior do que pessoas destreinadas. (POWERS, HOWLEY, 2006).
Atletas de elite usam o treino em altitude à muito tempo, embora a eficiência desta prática, em relação a melhora no desempenho ao nível do mar, ainda seja questionada por estudos. (WILBER, 2007).
Gore, Clark e Saunders (2007) classificam os níveis de altitude em: Nível do mar de 0 – 1.000 metros; baixa altitude de 1.000 – 2.000 metros; média altitude de 2.000 – 3.000 metros; grande altitude de 3.000 – 5.000 metros; altitude extrema de 5.000 – 8.848 metros.
Diferentes metodologias de treinamento são utilizadas para aprimorar o desempenho físico através dos benefícios da aclimatação à altitude, como veremos em detalhes.
Viver e treinar na altitude (Live High + Train High)
O modelo original de treinamento em altitude foi o de viver e treinar em altitudes médias (live high + train high, LH+TH) que mesmo sendo utilizado por várias décadas, seus benefícios em aprimorar o desempenho físico ao nível do mar continuam incertos. Uma potencial limitação do treinamento em condições hipóxicas é o fato de que muitos atletas são incapazes de atingir o nível de intensidade necessário para gerar as mudanças fisiológicas que aprimorariam o desempenho, e em muitos casos, retornavam ao nível do mar num estado de destreino, com reduções de 3–8% no desempenho físico. (LEVINE, STRAY-GUNDERSEN, 2005; WILBER, STRAY-GUNDERSEN, LEVINE, 2007).
Viver no baixo e treinar na altitude (Live Low + Train High)
Embora o nome indique treinamento na altitude, no modelo LL+TH (live low + train high), o atleta vive e treina ao nível do mar, com curtos períodos de hipóxia (5 -180 minutos) onde respira através de máscara um gás com a porcentagem de oxigênio reduzida durante o intervalo de recuperação ou durante a sessão de treino. O método é principalmente indicado como um meio de pré-aclimatação antes de ascensão à altitude para atletas que pretendem competir ou treinar em regiões altas. (WILBER, 2007; MUZA, 2007).
Muza (2007) acrescenta que o método LL+TH parece fornecer os benefícios da aclimatação para soldados antes deles ascenderem a regiões de grandes altitudes para operações militares, embora não haja estudos que comprovem a eficácia deste método em prevenir o acometimento de mal agudo das montanhas.
Viver na altitude e treinar no baixo (Live High + Train Low)
O modelo de viver na altitude e treinar num local mais baixo (live high + train low, LH+TL) foi desenvolvido por Levine e Stray-Gundersen em 1992, e mostrou ser eficiente por atletas de diferentes aptidões. (LEVINE, STRAY-GUNDERSEN, 2005).
Neste modelo o atleta vive na altitude para obter os benefícios da aclimatação (aumento na produção de eritropoetina, resultando no aumento de hemácias) e treina num local mais baixo para conseguir atingir a intensidade de treino semelhante a do nível do mar. Atletas que usam o método LH+TL vivem e/ou dormem em uma altitude moderada (2.000 – 3.000 metros) e treinam em uma elevação baixa (< 1.500 metros). (POWERS, HOWLEY, 2006; WILBER, 2007).
Gore e Hopkins (2005) afirmam que o método LH+TL produz uma alteração fisiológica aumentando o desempenho aeróbio numa média de 1%.
Segundo Levine e Stray-Gundersen (2005) a melhora no VO2max, e consequentemente melhora do desempenho, estão relacionadas ao aumento do volume das hemácias, e seria conseguido através da exposição à altitude e de uma intensidade adequada de treinamento.
Mas Gore e Hopkins (2005) acreditam que tais mudanças são mais prováveis de erros na avaliação do que de adaptações fisiológicas à altitude, sugerindo que a alteração no volume das hemácias em vários estudos parece ser diretamente proporcional à possibilidade de erro na avaliação. Os autores ainda citam que o VO2max pode ser aumentado por esforço voluntário no processo de avaliação, e que a melhora no desempenho poderia ser devido a um efeito placebo da vivência na altitude, acreditando que a economia do movimento é o componente mais provável de mediar os efeitos do método LH+TL.
Wilber, Stray-Gundersen e Levine (2007) avaliaram qual seria a “dose” ideal de exposição à altitude para obter-se os maiores aumentos de eritropoetina no modelo LH+TL. Seus resultados recomendam que para a aquisição de benefícios efetivos desse método de treinamento, os atletas precisariam de uma exposição à 2.000 - 2.500 metros, por no mínimo 4 semanas com uma exposição diária de 22 horas ou mais. Os autores salientam que a pré-disposição genética leva a uma considerável variação individual.
Discussão
Somente para atletas com um nível de condicionamento bem alto torna-se significativo o treinamento em altitude como estímulo adicional, visto que a melhora no desempenho ocorre em uma porcentagem mínima.
Porém, essa melhora de 1% na capacidade de executar exercícios de características aeróbicas pode representar uma porcentagem maior do que a diferença entre o campeão e o vice de uma prova.
Na Corrida de São Silvestre de 2007 (15.000 metros) a queniana Alice Timbilili venceu com o tempo de 53:07 (minutos:segundos) seguida pela brasileira Marizete Rezende, que conseguiu a segunda colocação com o tempo de 53:36, uma diferença de tempo de apenas 0,91%. Em junho de 2008 na Maratona de Londres (42.195 metros) o queniano Martin Lel venceu com o tempo de 2:05:15 (horas:minutos:segundos), enquanto o terceiro colocado, o marroquino Abderrahim Goumri, concluiu a prova em 2:05:30, somente 0,2% a mais de tempo que o vencedor. Com a marca deste ano, Martin Lel obteve o novo recorde da prova, ficando com um tempo de apenas 0,66% a mais do que o recorde mundial em maratonas, que é do etíope Haile Gebrselassie com 2:04:26.
Portanto, diferenças mínimas no desempenho podem fazer uma enorme diferença para a carreira de atletas de elite.
Existem divergências sobre qual é o principal fator que leva a um desempenho aprimorado após um período de treinamento na altitude. Seja por aumento no número e volume das hemácias, melhora na eficiência mitocôndrial e na fosforilação das isoformas de miosina ou melhora na economia do movimento, há um consenso na literatura de que o VO2max e o rendimento de atletas após um período de treinamento em altitude são aumentados.
Viver e treinar na altitude pode ser uma alternativa viável para atletas que estão no período regenerativo, onde a intensidade do treinamento é de leve à moderada.
A exposição intermitente a hipóxia pode ser usada por atletas ou equipes cujos calendários de competição não permitem o tempo adequado de aclimatação, minimizando assim o aparecimento de possíveis complicações durante uma exposição aguda à altitude.
A permanência na altitude e o treinamento numa altitude menor parece ser o modelo ideal a ser adotado como uma alternativa de otimizar os resultados obtidos com o treinamento. De acordo com as adaptações geradas para melhorar o transporte de oxigênio, o período pré-competição seria o melhor momento para a aplicação deste método, visto que seus efeitos dissipam-se num curto espaço de tempo.
Conclusão
Um treinamento realizado de maneira correta, ao nível ideal de altitude respeitando os períodos de aclimatação, com um acompanhamento nutricional e atingindo a intensidade de treinamento adequada, certamente será um diferencial para o desempenho de atletas de endurance. Os riscos existem, mas podem ser controlados e anulados tomadas as devidas precauções.
O treinamento na altitude pode ser usado de diferentes formas, de acordo com a disponibilidade de tempo e fase de preparação. Ocorrem algumas dificuldades em comparar resultados de diferentes estudos referentes ao tema, principalmente pelo nível de altitude, tempo de exposição e acompanhamento nutricional aplicados, além da individualidade biológica que leva a grandes variações nos resultados.
A realização de estudos futuros deverá concluir se a melhora no condicionamento ocorre pelos efeitos da altitude, ou por um favorecimento genético com relação à hipóxia.
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digital · Año 13 · N° 129 | Buenos Aires,
Febrero de 2009 |