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A formação de grupos na organização das atividades 

físicas e desportivas no 1º ciclo do ensino básico

 

*Licenciatura em Ensino Básico – 1º Ciclo

**Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa

Universidade de Aveiro

(Portugal)

Artur Gomes* | Filipa Costa*

artur.gomes@ua.pt | fcosta@ua.pt

Joana Cunha* | Joana Simões*

joana.cunha@ua.pt | joanasimoes@ua.pt

Susana Gomes* | Rui Neves**

susanabgomes@ua.pt | rneves@ua.pt

 

 

 

Resumo

          O presente estudo debruça-se sobre a problematização do processo de formação de grupos de alunos e as decisões de organização das atividades Físicas e Desportivas (AFD) por parte dos seus professores.

          Para a realização do nosso estudo, foram observadas sessões de AFD de duas turmas do 1º e 4º ano de escolaridade, bem como aplicados questionários junto de professores que são responsáveis pelas AFD nas escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico (CEB).

          Em função dos resultados e da sua análise podemos evidenciar que, apesar de todos os modelos organizativos, bem como os tipos de formação de grupos serem igualmente aceites e credíveis, as escolhas variam de professor para professor, uma vez que cada um dá mais ou menos relevância aos critérios de escolha consoante os seus alunos e as suas características tendo sempre presente a realidade do próprio contexto educativo.

          Unitermos: Modelos organizativos. Formação de grupos. Primeiro ciclo do ensino básico. atividades físicas e desportivas.

          

Trabalho realizado durante o ano lectivo 2007/2008, âmbito da disciplina de Didáctica da Expressão e Educação Físico-Motora
da Licenciatura em Ensino Básico – 1º Ciclo, no Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa – Universidade de Aveiro (Portugal)

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - Nº 128 - Enero de 2009

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Introdução

    O presente trabalho, tem como objectivo principal analisar a forma como a organização das atividades Físicas e Desportivas (AFD) podem, ou não, influenciar a formação de grupos.

    De acordo com os modelos organizativos referenciados na documentação do Ministério da Educação (1992), para apoio à área curricular de Educação Física (EF), podemos constatar a existência de cinco modelos organizativos: exercício ou concurso individual, percurso, circuito, grupos e áreas de trabalho. Tal como a mesma documentação indica, “existem formas típicas de organização dos alunos e da actividade, cada uma delas com características e exigências próprias, podendo assim corresponder a intenções pedagógicas diferentes, que possibilitam que todos os alunos beneficiem do máximo tempo de prática em cada aula”. Cada um destes modelos remete para o desenvolvimento de competências específicas, o que impede a substituição de um em detrimento de outro, sendo que, todos eles são condicionados por vários factores, entre eles, a motivação dos alunos. Para que estes grupos estejam presentes nas AFD é necessário realizar escolhas, que podem ser efectuadas pelo professor ou pelos alunos. Todo este processo de escolha de alunos a integrar grupos, constituem métodos estratégicos utilizados pelo professor para motivar os alunos e para que a aula decorra de forma organizada e enriquecedora para as crianças.

    A nossa observação incidiu em duas turmas do 1.º e 4.º anos da Escola do Curro N.º 1 – Canelas, Vila Nova de Gaia no âmbito das AFD e como forma de completar e clarificar algumas das opções observadas no decorrer das sessões a que assistimos elaborámos um questionário que foi entregue a professores responsáveis por leccionar as AFD.

    A análise e comparação de dados que realizámos permitiram ter um conhecimento mais aprofundado dos modelos organizativos das AFD e estar em contacto directo com a realidade educativa.

Literatura

Modelos de organização da aula de Educação Física e AFD: suas condicionantes

    As situações da prática que envolvem actividade motora podem ser entendidas como “oportunidades de prática, organizadas para que todos os alunos tenham o máximo tempo de actividade motora significativa (…)” (ME, 2001). Deste modo, o professor pode optar por proporcionar aos alunos várias situações de aprendizagem adoptando diferentes modelos organizativos nas AFD. Contudo é sempre importante ter em conta os diversos factores que, directa ou indirectamente, influenciam o normal desenvolvimento de uma sessão de AFD (características dos alunos e das atividades, condições materiais, a intenção pedagógica do professor, a dimensão da turma. (ME, 1992)

    O professor deve também ter a capacidade de gerir o tempo de aula, mas para que esta seja conseguida é necessário ter em atenção a escolha dos modelos organizativos tanto para as diversas fases da aula como para os alunos em cada situação específica, de modo a que o nível de motivação seja elevado (NEVES, 2008).

    Assim, os modelos organizativos são considerados como uma referência fundamental do processo de ensino – aprendizagem, tendo cada um deles com características e exigências próprias. São eles: o exercício ou concurso individual, o percurso, o circuito, os grupos e, por fim as áreas de trabalho (ME, 1992).

    As escolhas do professor acerca da forma como se organiza a aula devem basear-se em factores que condicionam a sua acção como as características dos alunos, a intenção pedagógica do professor, as características da actividade, as condições materiais e a dimensão da turma (ME, 1992), não sendo os únicos têm capital importância.

A aula de EF e AFD: modelos organizativos, gestão do tempo e motivação dos alunos

    O professor não deve prender a gestão do tempo de aula com questões que não envolvam directamente a actividade física, como o equipar e o desequipar dos alunos, e deve ter a preocupação de ser razoável no tempo de explicação das atividades, dando assim mais oportunidade aos alunos para experienciar e descobrir por si próprios (Petrica, 1993).

    Existem outras preocupações que o professor não deve desvalorizar, como a boa organização dos locais de exercitação e a adequada disposição dos aparelhos sendo também factores de uma boa gestão de tempo de aula (Piéron e Piron, 1981). Por outro lado é importante que o professor tenha em conta o tempo que despende na organização da aula, isto é, na organização do material e na sua colocação (Phillips e Carlisle, 1983).

    Outro factor a ter em conta é a motivação dos alunos, que também pode variar consoante o tipo de organização que o professor propõe e, assim sendo, exercícios em que esteja presente a competição beneficiam, não só, a socialização dos alunos mas também a sua motivação para a realização de diversas tarefas.

Formação de grupos de alunos nas aulas de EF e AFD

    As aulas de EF constituem um verdadeiro estímulo ao desenvolvimento físico, psicológico e social. Neste sentido, a formação de grupos de alunos pode tornar-se um processo complexo que influenciará, positiva ou negativamente, não só a aula de Educação Física como, também, a pessoalidade dos intervenientes. Para que tal não aconteça negativamente, o professor deve conhecer os seus alunos ao nível físico, psicológico e social e adoptar diferentes estratégias na formação de grupos de trabalho consoante as características dos alunos e os objectivos das atividades a realizar em grupo.

    Neste sentido, o professor pode optar por formar diferentes tipos de grupos (Loures, 2002): o grupo – turma, o grupo – reduzido, aos trios e aos pares ou individual. Contudo para a realização destes grupos é necessário fazer a escolha dos elementos de cada grupo, a que pode ser feita pelos diferentes intervenientes da aula (Loures, 2002). A escolha pode partir do professor ou este dar a oportunidade que os seus alunos escolham os seus grupos. Existem ainda outros critérios que por norma são utilizados quando são os professores a formar os grupos. Estes critérios são: critérios aleatórios (lista de nomes, a cor da camisola, a disposição em que se encontram, etc.) e critérios funcionais (idade, sexo, tamanho, peso, altura, força, comportamento, aptidão física, etc.) (Loures, 2002) que podem ser ideais para formar grupos homogéneos ou grupos heterogéneos.

Métodos e estratégias para a formação de grupos em EF e AFD

    As dimensões do espaço e os materiais disponibilizados, bem como o número de alunos face a esse espaço e à quantidade de material existente, podem condicionar as decisões do professor no que toca à formação de grupos. (ME, 1992)

    Neste sentido, verificamos que grande parte das situações de aprendizagem na área da EF requer diversos tipos de organização de grupos para a realização dos diferentes modelos organizativos a que esta área se propõe. Assim, no que toca à formação de grupos, o professor deve ter em conta algumas estratégias:

  • Promover situações de exercício simples a pares e em grupos de três alunos, estabelecendo funções de modo a proporcionar o inter -relacionamento directo do aluno com os restantes colegas;

  • Reduzir o tamanho dos grupos quando se pretende introduzir habilidades novas ou mais complexas para assim simplificar a organização;

  • Evitar a fixação das preferências dos alunos nas atividades, promovendo assim a variabilidade das acções e das interacções em situações que favoreçam a facilidade de cooperação;

  • Tentar identificar condutas hábeis por parte dos alunos mais inibidos, valorizando essas habilidades e chamando a atenção dos colegas para que todo o tipo de estereótipos sejam evitados;

  • Organizar grupos de modo a evitar situações conflituosas entre os alunos, fazendo com que os alunos “mais activos” se organizem em grupos com colegas que inibam conflitos ou comportamentos de desvio;

  • Constituir grupos com características de maior heterogeneidade possível para que se estabeleçam grupos na turma que sejam equilibrados e onde não se verifique uma separação dos mais aptos em relação aos menos aptos.

  • Procurar agrupar os alunos por níveis de desempenho quando estes participam em exercícios de domínio de habilidades em “grupos - tarefa”, sem deixar que se instale um modelo de agrupamento fixo. Pode-se transpor esta dificuldade introduzindo no grupo um colega com melhor nível de prestação que apoiará os companheiros no exercício. (ME, 1992)

Metodologia

A.     Observação das sessões de AFD no 1º ciclo

1.     Caracterização da turma observada

    Para cumprir os objectivos do trabalho de campo, foram observadas, num total de 6 sessões, turmas do 1.º ciclo do Ensino Básico da Escola EB1/JI do Curro – Agrupamento Vertical de Canelas, Vila Nova de Gaia. A observação incidiu sobre duas turmas do 1.º ano e do 4.º ano de escolaridade com a seguinte caracterização:

2.     Procedimento em campo para a recolha de dados

    Os dados das observações foram recolhidos através de gravações vídeo em suporte digital e de observações directas realizadas durante o tempo das sessões. Todas as observações realizadas no decurso das sessões de AFD foram registadas contemplando aspectos referentes ao tipo de actividade e sua duração, tipo de modelo organizativo dessa actividade e ao tipo de grupo formado sinalizando-se o momento da sessão (parte inicial, fundamental e final) a que determinada actividade estava a decorrer. Durante a sessão foi também realizada uma cronometragem temporal de dois em dois minutos, identificando e registando os modelos organizativos observados.

3.     Análise e discussão dos resultados

    Para a análise e discussão dos resultados, usaram-se as filmagens recolhidas no local da realização das sessões de AFD onde se procedeu a uma observação do modo como se desenvolveu toda a sessão, tendo sempre em conta os propósitos a que este trabalho de campo se destina: observação dos modelos de organização da sessão, tipos de formação de grupos e o modo como estes dois aspectos se interligam nas sessões de AFD. Cada sessão observada foi analisada posteriormente por escrito, através, também, dos esquemas que achámos necessários a uma melhor compreensão da referida análise. Cada esquema contemplava um conjunto de aspectos que diziam respeito ao tipo de atividades desenvolvidas na sessão, ao tipo de modelos organizativos explorados, ao tipo de grupo e ao tempo de cada actividade, discriminando também o momento da sessão em que ocorreram tais atividades. Quanto à análise da gestão do tempo da sessão de AFD realizada durante as observações, os dados recolhidos foram interpretados através de várias leituras e de uma análise tanto vertical como horizontal de forma a perceber que tipo de padrão regia as escolhas do professor, não só durante a sessão de AFD, como também durante todas as sessões observadas para o mesmo ano de escolaridade.

B.     Questionários recolhidos

1.     Caracterização do grupo de professores inquiridos

    De um total de 28 professores inquiridos, 13 são do género feminino e 15 do género masculino, com idades compreendidas entre os 22 e os 41 anos. Quanto ao tempo de serviço docente, o grupo de professores inquiridos caracteriza-se do seguinte modo: menos de 5 anos – 10; 5-10 anos – 14; mais de 10 anos - 4. A maioria exerce a sua actividade profissional em escolas do 2.º e 3.º ciclo, sendo destacados para desenvolver as sessões de AFD a alunos do 1.º CEB, sendo que apenas 3 deram aulas de EF no 1.º ciclo como professores do 1.º ciclo, em regime de monodocência.

2.     Procedimento em campo para a recolha de dados

    Para a realização do nosso estudo, os dados foram recolhidos através de inquéritos anónimos dirigidos a professores de EF responsáveis pela AFD no 1.º CEB. Este inquérito tratava-se de um conjunto de questões que se dividiam em quatro grandes capítulos:

  1. Questões relativas a algumas características dos alunos;

  2. Questões relativas aos modelos de organização da sessão de AFD;

  3. Questões relativas à formação de grupos;

  4. Este capítulo surge como forma de conclusão do nosso inquérito onde as questões relativas aos modelos organizativos e à formação de grupos são agrupadas, de modo a responder à grande questão: “Como é que a organização da sessão de AFD influencia a formação de grupos?”

    Como nota, é relevante dizer que no início do questionário, optou-se por formular questões relativas às características dos alunos, contudo, o seu objectivo não era analisar os seus resultados do ponto de vista do estudo para a temática do trabalho, mas sim utilizar as respostas como auxílio para, assim, as compreender no plano dos modelos de organização e a formação de grupos, uma vez que estas opções devem ser tomadas tendo como base fundamental a dimensão da turma e o conhecimento dos alunos a que se destinam as aulas.

e.     Análise e discussão dos resultados

    Após a recolha dos inquéritos, estes foram analisados a partir do tipo de respostas dadas a cada questão e frequência de uma mesma resposta de inquérito para inquérito. Após a referida contagem, utilizaram-se representações gráficas e tabelas de resultados para apresentar a análise e interpretação de todos os dados necessários para cumprir os objectivos do nosso estudo.

Resultados, sua análise e discussão

Observação das aulas

    Tomando como ponto de partida a observação das sessões do 1.º e 4.º ano de escolaridade, verificámos que os modelos mais usados nas AFD são os grupos, o exercício ou concurso individual e as estafetas.

    Deste modo, repartindo a sessão nas suas três fases (parte inicial, parte fundamental e parte final) percebemos que na parte inicial o concurso individual é o modelo mais utilizado, seguido do trabalho em grupos.

    Por outro lado, na parte fundamental da sessão os modelos pelos quais os professores optam com mais frequência são os grupos e as estafetas.

    Por sua vez, na parte final o modelo mais usado são os grupos contudo, é de ressaltar que em algumas das sessões observadas não houve a realização desta última parte.

    No que respeita à formação de grupos verificámos que no 1.º ano o professor é o principal responsável por essa tarefa sendo as suas escolhas sustentadas aleatoriamente.

    Contudo, no 4.º ano essa tarefa é partilhada com os alunos sendo os principais critérios apontados a aleatoriedade e a afinidade entre os alunos.

    Neste estudo, outro aspecto que analisámos foi a homogeneidade e/ou heterogeneidade dos grupos. Neste contexto, verificámos que tanto no 1.º como no 4.º ano os grupos prezam pela heterogeneidade ao nível das capacidades físicas conferindo assim equilíbrio, sendo que, os alunos podem cooperar e aprender uns com os outros.

Questionários

    Uma vez que a primeira parte do questionário consistia na recolha de dados para a contextualização dos próprios inquiridos, passaremos para a análise da segunda parte do questionário. Esta consistia em averiguar quais os modelos organizativos mais utilizados pelos professores e quais as variáveis que intervinham nessa escolha. Relativamente aos modelos de organização, podemos concluir, através dos resultados representados no gráfico abaixo, que, no geral, os professores optam por modelos de organização bastante variados, embora exista maior prevalência nos grupos, nas estafetas e nos circuitos. Verificámos, também que, apesar de os circuitos serem recomendados para crianças com algum nível de autonomia (Neves, 2008), alguns dos professores inquiridos que assinalaram este modelo como um dos mais frequentes nas suas aulas leccionam o 1.º e 2.º ano de escolaridade.

    Relativamente aos momentos da aula em que os professores optam por colocar em prática os modelos seleccionados, verificámos que, na parte inicial, é predominante a adopção do exercício ou concurso individual e dos grupos, com 41% e 27% respectivamente, apurando assim que, quase 70% dos professores optam por um destes dois modelos para esta fase da aula. Neste sentido, os poucos professores que respondem à questão sobre que exercícios realizam com este tipo de modelos, as respostas são “aquecimento articular” (Q9) e “aquecimento e relaxamento” (Q10).

    No que toca à parte fundamental da aula, as opções tomadas pelos professores são mais variadas, já que a escolha da opção dos grupos é justificada através da “manipulação de objectos e jogos de pontaria, equilíbrio, etc.” (Q.6) e “jogos de socialização” (Q9) e, por sua vez, as estafetas como forma de “trabalhar a velocidade e coordenação motora e os equilíbrios” (Q6) e “exercícios de manipulação, perícia e velocidade” (Q10), justificando esta opção afirmando que “os exercícios de carácter competitivo motivam mais as crianças” (Q6).

    Por último, na parte final da aula, a maioria dos professores apontam como opção a realização de exercícios em grupo ou de estafetas, sendo a utilização deste último modelo justificada no Q6 como a “arrumação do material”.

    Passando agora para a apresentação e análise das variáveis que intervêm na escolha dos modelos de organização, pudemos verificar que, apesar de cada professor ter em atenção diferentes variáveis, no geral os resultados não apresentam nenhuma tendência significativa, isto é, de um modo geral, todas elas são tidas como relevantes no momento da formação dos grupos, de forma mais ou menos idêntica. Existe apenas um inquirido que apresenta como outra variável para a escolha dos modelos a utilizar os “aspectos motivacionais” (Q6).

    A terceira parte do nosso questionário destinava-se à recolha de informação sobre a formação dos grupos, por quem são feitos e quais os critérios subjacentes no momento da sua formação.

    A primeira questão colocada tinha como objectivo que os professores conseguissem responder qual o modelo organizativo que utilizavam com mais frequência (exercício ou concurso individual ou grupos de trabalho). No entanto, ao analisarmos as respostas dadas, pudemos verificar, tal como mostra o gráfico, que a grande maioria dos inquiridos usa maioritariamente a formação de grupos de trabalho nas suas aulas, ao contrário do resto dos inquiridos (36%) que não se consegue decidir sobre qual o modelo que predomina nas suas aulas, respondendo à questão dizendo que utiliza ambos, consoante os objectivos e os propósitos pedagógicos da aula.

    A segunda questão foi formulada com o intuito de perceber por quem eram realizados os grupos de trabalho nas aulas. Perante as hipóteses dadas e as respostas, verificámos que, na sua grande maioria, estes grupos são da responsabilidade do professor e nenhum professor opta sempre por facultar aos alunos a oportunidade de formarem os grupos, uma vez que este processo levaria mais tempo da aula e também devido aos critérios utilizados pelos alunos nessa formação (critérios esses que serão analisados no seguimento desta análise). Apesar de tudo isto, 39% dos professores demonstra confiar, algumas vezes, nas escolhas dos seus alunos, dando-lhes oportunidade de formar os seus grupos.

    A terceira questão propunha que os professores identificassem os critérios pelos quais se regiam para a formação dos grupos de trabalho. Neste sentido, a maior parte dos professores inquiridos afirmaram que tinham preferência pela formação de grupos heterogéneos, justificando esta opção principalmente de duas formas: a primeira é o facto de que, em jogos de competição, os grupos devem ser heterogéneos para que a competição exista de forma equilibrada e para que não haja uma oposição entre “mais fortes” e “mais fracos”. A segunda é para que os mais capacitados na realização das diferentes habilidades motoras possam ajudar os menos capacitados com o objectivo de estes evoluírem, uma vez que os “mais aptos” servem de modelo.

    Relativamente aos critérios utilizados para a formação de grupos por parte do professor, os inquiridos referiram os mais variados critérios a ter em conta para fazer a diferenciação dos alunos, realçando-se bastante a importância que as capacidades físicas de cada aluno revelam nesta escolha, importância essa que foi destacada pelos professores e que se prende com as justificações já apresentadas para a preferência dos grupos heterogéneos.

    É ainda de salientar que um dos inquiridos (Q26) assume que “devido a estes alunos precisarem de muito contacto uns com os outros por causa das suas dificuldades, faço sempre grupos de 3 para se ajudarem”, o que não corrobora com nenhuma das conclusões retiradas até aqui em relação à formação de grupos de trabalho, não deixando, por isso, de ser uma opção válida, já que o professor tomou esta opção com o conhecimento das características dos seus alunos.

    Para além de conhecermos os critérios utilizados pelos professores, achámos, também, pertinente inquiri-los sobre quais os critérios que eles consideram que são utilizados pelas crianças quando estas têm oportunidade de formar os grupos. Assim, verificámos que a ideia que tínhamos estereotipado de que grande parte das crianças gostava de se agrupar por género (meninas para um lado e meninos para outro) não se verificou. Averiguámos, também, que tal como seria de esperar, um dos critérios que predomina na formação de grupos por parte das crianças são os laços afectivos, apesar de não sabermos que, com o seu desenvolvimento, estas vão não só escolhendo os seus grupos por amizades, mas também tendo em conta as capacidades físicas dos colegas. Isto acontece quando elas tomam consciência deste critério como uma mais-valia para o sucesso da sua equipa.

    A questão seguinte tinha como objectivo fazer com que os professores ponderassem sobre três aspectos que lhes foram dados como opção de resposta e nos indicassem qual ou quais deles, tinham em consideração na formação de grupos. Através da análise dos resultados representados no gráfico 21 constatámos que para além das características individuais dos alunos que já tinham sido identificadas como pertinentes nas decisões do professor, destaca-se as condicionantes externas (espaço e materiais) como um factor relevante no processo da formação de grupos.

    Analisando agora, individualmente, cada um destes aspectos, verificámos que, em relação às características individuais referidas pelos professores, estas vão ao encontro do que já foi identificado como critérios para a formação de grupos por parte dos professores.

    No que diz respeito ao tipo de práticas os professores referem a finalidade com que formam os grupos e para que tipo de actividade, pois, consoante a prática, o professor opta se será mais proveitoso para os alunos formar grupos heterogéneos ou grupos homogéneos.

    Em relação ao último aspecto, as condicionantes externas influenciam amplamente as decisões no que toca à formação de grupos, uma vez que “o material e o espaço são sempre escassos” (Q11), a “falta de espaços e materiais condiciona muito a diversificação dos exercícios” (Q9), levando assim a que seja necessário definir “o número de grupos de trabalho evitando longos períodos de tempo de espera” (Q6).

    Por último, optámos por questionar os professores se consideravam que a formação dos grupos influenciava os níveis de motivação dos seus alunos. As respostas foram claras quando 96% dos professores considera que influencia, apenas um inquirido manifestou a sua opinião afirmando que não havia influência e outros dois inquiridos consideram que os alunos, tratando-se de AFD já estão motivados.

    Inerentes aos resultados do gráfico acima representado encontram-se as mais variadas justificações da forma como a formação de grupos influencia os níveis de motivação dos alunos. Deste modo, passaremos a citar algumas das por nós consideradas mais pertinentes e as que se repetem com mais frequência nas respostas dos inquiridos. Muitos dos professores que responderam ao nosso questionário consideram que esta motivação se encontra interligada com a competição, isto é, em exercícios com competição, se os alunos se encontrarem num grupo considerado por eles equilibrado ficam mais motivados para a actividade: “ se os alunos não estiverem num grupo equilibrado a sua motivação é menor” (Q16) ao invés o autor do Q28 afirma “se os alunos não gostarem do grupo perdem a motivação”. A formação dos grupos “motiva mais os alunos que às vezes se sentem postos à parte” (Q21) assim como serve “para eles poderem ter referência junto deles para poderem realizar a actividade o melhor possível e devido ao sucesso alcançado com isso, a motivação será maior” (Q25).

    Por fim, o nosso questionário tinha um quarto grupo onde existia apenas uma questão: “Como é que a organização da aula de Educação Física influencia a formação de grupos?”. O objectivo desta questão era que os professores que estão em contacto directo com os alunos nas aulas planeadas e organizadas por eles nos ilustrassem as suas perspectivas em relação a este tema. No entanto, alguns dos inquiridos não responderam e grande parte dos que responderam fizeram-no de uma forma vaga: “Depende de várias coisas”. No entanto, houve, também, alguns que responderam ao encontro das nossas expectativas: “A formação de grupos varia com a organização da aula e com as atividades propostas” (Q24); “A formação de grupos é sempre influenciada pela organização da aula. O professor só sabe realmente que tipo de grupos tem de fazer se souber quais os modelos de organização da aula. É diferente fazer grupos em estafetas e em vagas” (Q5).

Conclusões

  • Parece existir uma diferença entre os modelos organizativos escolhidos pelo professor de ano para ano de escolaridade uma vez que este aspecto constitui uma condição essencial, para que questões como as características individuais e condições externas, influenciem também esta escolha.

  • No 4º ano de escolaridade, o professor parece utilizar de forma mais abrangente e exigente os modelos organizativos como, por exemplo, as áreas de trabalho, uma vez que exigem maior autonomia por parte dos alunos.

  • No 1º ano de escolaridade, de uma forma geral, o professor opta maioritariamente por aplicar exercícios em concurso individual para promover, assim, a aprendizagem de novas habilidades por parte dos alunos. O mesmo acontece quando se fala de estafetas ou percursos.

  • No 4º ano de escolaridade, as estafetas e os percursos também são utilizados, contudo, o professor opta pelo uso do factor competição, uma vez que grande parte das competências ou já estão adquiridas ou estão em fase de consolidação pelos alunos.

  • No 1º ano, as estafetas são executadas sem competição, pois este modelo organizativo, muitas vezes, faz com que as crianças descurem das técnicas adjacentes a cada exercício, uma vez que a sua grande, e por vezes única, finalidade é ganhar. Assim, em exercícios sem competição, os alunos conseguem realizar as tarefas com mais calma, aumentando a correcção na execução das mesmas.

  • Uma vez que grande parte dos exercícios da parte inicial têm como principal objectivo a mobilização motora geral, o professor opta por:

    • Exercício ou concurso individual, no 1º ano de escolaridade, para atingir eficazmente o objectivo anteriormente referido, aplicando, desta forma, o ensino individualizado/ diferenciado.

    • Exercício ou concurso individual e grupos no 4º ano, uma vez que a necessidade de individualizar o ensino é menor (o que não significa que não seja importante) em contrapartida com os bons níveis de autonomia.

  • Verifica-se que, das poucas vezes em que ocorreu parte final nas sessões observadas, estas ocorreram através da repetição da mesma situação de exercício.

  • De uma forma geral, os grupos revelaram-se como uma boa forma de interacção e de promoção da socialização, tanto no 1º ano como no 4º ano de escolaridade.

  • Devido aos critérios que são geralmente utilizados pelas crianças e à falta de capacidade de organização, é o professor o responsável pela formação de grupos no 1º ano de escolaridade.

  • No 4º ano, o professor já atribui alguma responsabilidade aos seus alunos para formarem os grupos, uma vez que estes já possuem grande autonomia e consciência das capacidades físicas dos colegas. Contudo, neste momento, é necessária uma reflexão por parte do professor no que diz respeito ao conhecimento do que será mais favorável: constituir-se grupos mais ou menos heterogéneos face às características dos seus alunos.

  • O professor opta por grupos mais ou menos heterogéneos dependendo do tipo de atividades.

  • É de notar que a formação de grupos levada a cabo pelos alunos só acontece quando o professor conhece e confia nas opções dos alunos.

  • A formação de grupos heterogéneos no 4º ano é feita pelo professor, quando este pretende utilizar jogos e atividades que necessitem de um equilíbrio de aptidões entre equipas/ grupos.

  • No 1º ano, a existência de grupos homogéneos também ocorre, pois estes são bons para a aquisição de novas habilidades, facilitando a avaliação formativa por parte do professor e também para que as crianças consigam progredir nas aprendizagens. Estas, perante alunos de iguais níveis de aptidão, não se sentem inibidas no momento de mostrar dificuldades e progredir.

  • De uma forma geral, verifica-se que os professores consideram, igualmente importantes, todas as variáveis envolvidas no processo de selecção dos modelos organizativos, bem como no momento de formação de grupos.

  • Apesar de os grupos serem o modelo organizativo predominante, todos os inquiridos revelam uma certa dificuldade em escolher entre exercício ou concurso individual, grupos ou até ambos os modelos, considerando que os três são igualmente importantes e utilizados em diferentes momentos de aula.

  • Apesar dos muitos critérios que os professores apresentam como justificação na escolha dos grupos, é a capacidade/aptidão física dos alunos que é significativamente mais levada a cabo.

  • A formação dos grupos influencia o desenvolvimento das aulas e da motivação dos alunos envolvidos, podendo constituir-se como um processo bastante positivo de inclusão.

  • A maioria dos professores considera que os modelos de organização influenciam sempre e de forma determinante a formação dos grupos pois é a intenção colocada em cada actividade que será realizada utilizando determinado modelo que determinará que tipo de grupos e que características devem estes ter.

Considerações finais

    Os modelos de organização estão e estarão sempre em interacção com a formação de grupos na área de educação física e AFD, na medida em que o professor deverá fazer o equilíbrio entre essas duas questões a fim de se conseguir resultados ao nível da qualidade da aula de educação física, bem como dos níveis de participação dos alunos. Com isto, é possível concluir que a formação de grupos e a sua heterogeneidade permite adaptar-se a um leque maior de opções de atividades que, por sua vez, permite o uso de vários e diferenciados modelos de organização. Aqui, o conhecimento das características dos alunos por parte do professor torna-se fundamental no momento da tomada de decisões respeitantes à gestão da formação de grupos desde que estejam de acordo com as suas finalidades educativas. É neste sentido que o professor consegue uma múltipla escolha de atividades que permitirão o desenvolvimento de um maior número de competências por parte dos seus alunos, assumindo-se ele próprio como epicentro regulador da actividade organizativa da sessão de AFD e do sucesso na aprendizagem de cada aluno.

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revista digital · Año 13 · N° 128 | Buenos Aires, Enero de 2009  
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