A possibilidade da inserção de conteúdos específicos da Educação Física em provas de vestibulares |
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*Licenciado em Educação Física pela UFSCar Professor de Educação Física da Escola Cooperativa Educativa, São Carlos **Professor Adjunto do DEFMH/UFSCar, São Carlos (Brasil) |
Rodrigo Sentini Fernandez* Glauco Nunes Souto Ramos** |
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Resumo Há algum tempo a Educação Física, como componente curricular obrigatório nas escolas, vem apontando a defesa do ensino de conhecimentos/conceitos para que os alunos possam conhecer/saber temas como: saúde, atividade física, cooperação, competição, respeito às diferenças, cidadania, estética, lazer, mídia, entre outros. Diante disto, o objetivo deste trabalho foi verificar a possibilidade de existência de uma prova específica do componente curricular Educação Física para ser abordada no vestibular, bem como diagnosticar quais assuntos específicos da referida área poderiam fazer parte de tal prova. A pesquisa teve um caráter qualitativo, com a aplicação de questionários, buscando saber a opinião de graduandos em Educação Física e de Coordenadores de Curso de graduação em Educação Física das universidades públicas do Estado de São Paulo, Brasil. A partir dos dados coletados, foi possível observar uma divisão simétrica dos que são favoráveis à inclusão dos conteúdos relacionados à área e dos que são contrários à sua inserção. No que se refere aos conteúdos possíveis de serem solicitados, nota-se uma grande incidência de temas, como: o esporte e a cultura corporal, a importância da Educação Física diante de populações especiais e a conexão do componente curricular com assuntos da área biológica e da saúde. Como consideração final os dados apontam que, para que ocorra essa inserção dos conhecimentos da área no vestibular, é preciso que tanto a Educação Física na escola quanto as Instituições de Ensino Superior passem por uma reestruturação. Unitermos: Educação Física escolar. Conhecimentos. Vestibular. Ensino Médio. |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 126 - Noviembre de 2008 |
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Introdução
Além de um simples momento livre ou de descanso dentro do período escolar ou mesmo de uma perspectiva que valoriza os mais habilidosos, os mais velozes e os mais fortes fisicamente, defendemos que as aulas de Educação Física deveriam enfatizar conhecimentos/conceitos para que os alunos possam conhecer/saber e, eventualmente, adquirir hábitos sadios e adequados para suas vidas em relação aos assuntos que ela trata, tais como: saúde, atividade física, cooperação, competição, respeito às diferenças, cidadania, estética, lazer, mídia, entre outros. E, desta forma, a área passe a ser encarada com maior seriedade e respeito pelos alunos, pelos professores e pela própria comunidade escolar.
Sendo um componente curricular obrigatório da Educação Básica como todos os outros, por que não inserir conteúdos/conhecimentos específicos da área em uma prova de seleção para o ingresso em uma universidade? Acreditamos que através das devidas modificações no sistema de avaliação e, com a cobrança de tais conteúdos/conhecimentos referentes à Educação Física, seja possível ocorrer uma mudança na maneira de ver o componente curricular, à medida que a Educação Física seria beneficiada especialmente no Ensino Médio, “onde são freqüentes os problemas com dispensa dos alunos” (DARIDO et al., 1993, p.112).
Caracterização da Educação Física no ensino médio
Através de algumas observações, conversas com alunos e professores de Educação Física e da própria literatura da área, constatamos que ao longo dos anos escolares há um desinteresse por parte dos alunos com relação à prática das aulas de Educação Física. Isso pode ser justificado pelo fato de, no Ensino Médio, haver a necessidade de uma maior dedicação às demais disciplinas da grade curricular, tidas como prioritárias, à medida que serão exigidas nas provas de vestibulares de diversas instituições de nível superior (RIBEIRO, 2005).
Gruppi, citado por Lorenz e Tibeau (2003), afirma que as aulas de Educação Física perdem o significado no Ensino Médio, pois, se não percebidas pelos alunos como atividade recreativas e de lazer, são consideradas como uma prática específica de atividades esportivas. Isto é, a partir das atitudes e condutas dos seus professores, os alunos deixam de perceber e descobrir outros conteúdos pertinentes à área, que podem/devem ser trabalhados nas aulas de Educação Física. Quando abordadas através desta maneira, as aulas deixam de fazer sentido para os alunos, já que não há uma sistematização dos conteúdos, não há a explicitação dos seus objetivos, de suas metodologias e nem dos critérios avaliativos aos alunos. Com isso, as aulas de Educação Física acabam associadas às atividades supracitadas.
Segundo Bracht (1999, p. 24):
Mais recentemente alguns autores (Coletivo de Autores, 1992; Bracht, 1992; Betti, 1992) vêm reforçando a necessidade de construção de uma teoria da EF, entendida esta como uma prática pedagógica, ou seja, uma repedagogização do teorizar na EF, uma vez que essa prática pedagógica foi quase que alijada do campo enquanto objeto. A construção de um corpo teórico com base num discurso pedagógico, que posso filtrar e reconverter à luz da lógica desse campo, a influência “externa” do sistema esportivo, é elemento importante para a construção da autonomia (pedagógica) da EF.
Britto, citado por Lorenz e Tibeau (2003), em seu estudo, constatou que existe uma falta de contextualização nas aulas de Educação Física, à medida que 74,4% dos alunos de um colégio afirmaram que nas aulas “práticas” não existem explicações teóricas do conteúdo ministrado. Além disso, os alunos têm grande interesse em buscar conhecimentos teóricos do componente curricular.
Diante dessa constatação, torna-se evidente a falta de contextualização em que estão inseridas as aulas de Educação Física. Além disso, muitos profissionais da área preocupam-se apenas em trabalhar a prática pela prática em suas aulas, deixando de lado os conhecimentos teóricos pertencentes à Educação Física. Com isso, os alunos não têm um embasamento para pesquisas e estudos desses conteúdos, indicando a necessidade de haver um equilíbrio entre a teoria e a prática, inclusive na Educação Física.
Rabelo et al. (1999), apresentam a hipótese de que, além das horas de lazer em frente aos eletroeletrônicos, não haveria um interesse das escolas em promover atividades físicas no ano de preparação para o vestibular, observando-se uma diminuição das horas relacionadas à prática de exercícios físicos nas atividades extra curriculares. Para os autores, essa diminuição está ligada ao empenho dos alunos no processo seletivo de uma universidade, seguida do processo de recolocação no mercado de trabalho, o que poderá gerar o hábito da inatividade física.
Diante disso, fica explícito que um dos motivos para a desvalorização da Educação Física na escola é o aspecto social, pois, desde cedo os jovens são cobrados pela sociedade, pelo que farão no seu futuro profissional e não pela sua formação de ser humano como um todo. Com isso, a Educação Física é deixada de lado, mesmo sendo muito prazerosa para muitos, pois, não será algo imprescindível nos processos seletivos para o ingresso no ensino superior.
Portanto, defendemos que seja de suma importância mudar esse panorama e, através de uma pesquisa bem elaborada, selecionar conteúdos específicos e coerentes que representem conhecimentos da nossa área, modificar estratégias no processo de ensino e de aprendizagem, efetuar reflexões mais amplas e consistentes, deixando de ser apenas uma atividade em quadra e mal direcionada.
Diante disto, o objetivo deste trabalho é verificar como alunos de um curso de Licenciatura em Educação Física e Coordenadores de Curso de graduação em Educação Física de universidades públicas do Estado de São Paulo pensam a inclusão de uma prova específica do componente curricular Educação Física para ser abordada no vestibular, comum a todos os cursos, visando o ingresso de candidatos em curso superior, bem como diagnosticar quais conteúdos, conhecimentos e assuntos específicos da Educação Física escolar poderiam fazer parte de tal prova específica.
Processo metodológico
Como forma de coletar informações para este trabalho, foram consultados vinte e oito alunos do curso de Licenciatura em Educação Física da Universidade Federal de São Carlos, no interior do Estado de São Paulo, ingressantes no ano de 2005, acerca de quais temas e conhecimentos teórico/prático da área poderiam ser contemplados em uma prova de vestibular comum a todos os cursos.
Além disso, foram consultados nove Coordenadores de Curso (CC) de graduação em Educação Física de cinco universidades públicas do Estado de São Paulo (três estaduais e duas federais), através de duas perguntas abertas enviadas por mensagem eletrônica (e-mail), acerca da possibilidade ou não da existência de tal prova, bem como, sobre os assuntos, conteúdos e conhecimentos relacionados que eles elegeriam para fazer parte de uma prova para o ingresso em um curso superior.
As universidades elencadas foram: Universidade de São Paulo (USP e USP LESTE), Universidade Estadual Paulista (UNESP, compreendendo os três campi universitários: Rio Claro, Bauru e Presidente Prudente), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
Gostaríamos de compartilhar a nossa compreensão em relação aos CC de graduação em Educação Física como sendo os professores/profissionais que, no momento desta pesquisa, ocupavam a referida função em suas instituições de ensino superior e emitiram suas opiniões acerca dos nossos questionamentos. Contudo, não entendemos como sendo a opinião ou visão dos demais docentes que compõem os respectivos cursos de graduação em Educação Física ou dos próprios cursos.
Da mesma forma, entendemos que os alunos participantes desta pesquisa não representam a opinião da totalidade dos alunos do curso de Licenciatura Educação Física da UFSCar. Com isso, pretendemos evitar qualquer tipo de associação, confusão ou generalização dos suejitos desta pesquisa com as respectivas instituições e/ou cursos de graduação.
Apresentação, análise e discussão dos dados
Como forma de preservar o nome dos participantes (alunos e CC) e, no caso dos Coordenadores de Curso de graduação em Educação Física, não associar às suas respectivas instituições de ensino superior, os sujeitos desta pesquisa foram denominados aleatoriamente através de números, como: CC 1, 2, 3... ou, Aluno 1, 2, 3...
A partir dos dados coletados foi possível observar que 50% dos atuais CC que responderam às questões concordam com a inserção de conteúdos relacionados ao componente curricular em uma prova de vestibular, enquanto a outra metade acha inviável.
Como pontos principais daqueles que são a favor da inclusão de temas, podemos destacar a resposta de um dos CC ressaltando que, como parte da Educação Básica, assim como os outros componentes curriculares, a Educação Física deve ter os seus conteúdos trabalhados para esse fim (CC 2).
Outro coordenador, também favorável à tal inclusão, justificou-a destacando a importância do “movimento humano como meio de transmissão de cultura e conhecimento” (CC 3).
Nesse sentido, Medina (1986, p.34) anunciava que o componente curricular Educação Física deve ser entendido como “disciplina que se utiliza do corpo, através de seus movimentos, para desenvolver um processo educativo que contribua para o crescimento de todas as dimensões humanas”.
Um dos alunos participantes da pesquisa, por sua vez, justifica a inclusão do componente curricular com a seguinte afirmação:
Acredito que o vestibular em Educação Física seria muito proveitoso, tanto para os vestibulandos quanto para os professores do ensino fundamental e médio. Para os alunos seria bom para que eles ingressassem no ensino superior com um conhecimento mais abrangente de cultura corporal e, por outro lado, seria bom para os professores, pois haveria maior seriedade com relação à disciplina (Aluno 7).
Por outro lado, as respostas que não concordaram em incluir os conteúdos da Educação Física nas provas vestibulares, buscaram esclarecer que os conteúdos cobrados em uma prova de vestibular devem estar relacionados com os conhecimentos básicos dos componentes curriculares tidos como “mães”, como afirma um dos coordenadores:
As provas de vestibular são compostas por questões nas áreas chamadas 'mães', ou seja, testam o pleiteante em relação a seus conhecimentos básicos nas áreas de Humanas (História/Geografia/Idiomas..), Biológicas (Biologia/Química..) e/ou Exatas (Matemática/Física..). Isso porque esses conhecimentos formam a base dos conhecimentos necessários a qualquer área de 'especialização' que ocorre na graduação (CC 4).
Temos ainda a opinião de outro participante: “apesar da Educação Física fazer parte do conteúdo formal no ensino médio, a Educação Física se caracteriza como uma área de conhecimento aplicada” (CC 5).
Visualizamos com tais respostas a tradição da escola e dos vestibulares em valorizar o conhecimento conceitual em detrimento da tradição prática e procedimental da área da Educação Física que, com raras exceções, esquece ou ignora aquele tipo de conhecimento. Salientamos que tal oposição se estabelece, inclusive, na perspectiva científica que vê a Educação Física como não ciência ou como uma área de intervenção profissional e, por isso, menos importante ou menos valorizada que as ciências mães (Matemática, Física, Química, Biologia...).
Bracht (1999, p.48) afirma:
Os saberes tradicionalmente transmitidos pela escola provêm de disciplinas científicas ou então, de forma mais geral, de saberes de caráter teórico-conceitual. Entendo que, diferentemente do saber conceitual, o saber de que trata a EF (e a Educação Artística) encerra uma ambigüidade ou um duplo caráter: a) ser um saber que se traduz num saber-fazer, num realizar “corporal”; b) ser um saber sobre esse realizar corporal.
Diante das respostas dos graduandos em Educação Física participantes da pesquisa, foi possível observar que, cerca de 32% deles, indicam não concordarem com tal inclusão do componente Educação Física no vestibular, à medida que pensam ser essencial que ocorra uma reestruturação dos conteúdos relacionados à área, para a viabilização de tal proposta. Entendem que a atual Educação Básica no sistema de ensino brasileiro, englobando os Ensinos Infantil, Fundamental e Médio, não promove um trabalho continuado que prepare o aluno/candidato com conteúdos adequados.
Esse pensamento pode ser ilustrado pelas seguintes afirmações:
Considerando a forma que a Educação Física Escolar é ministrada, na maioria das escolas, até os dias de hoje, torna-se impossível propor uma prova específica teórica para o ingresso nos cursos de graduação, já que o conteúdo teórico da disciplina é muito reduzido, quando não inexistente. Portanto, só poderemos considerar tal situação quando houver mudanças drásticas nos conteúdos e formas de ensinar a Educação Física. Logicamente, isto é possível, pois (...) podem trabalhar além das capacidades físicas e habilidades motoras, a relação destas com o mundo exterior; e através destas relações construir um cidadão que consiga aplicar, reproduzir ou até mesmo melhorar, através dos conhecimentos específicos da Educação Física, a sua realidade (Aluno 12).
Antes de se pensar em formas de avaliação para vestibular, deve-se pensar na situação da Educação Física nas escolas: quando é obrigatória, dificilmente é levada a sério, coexiste mas não reprova, e muitas vezes os alunos são dispensados das aulas. A partir do momento que os vestibulandos não tiveram oportunidades durante o seu desenvolvimento, fica difícil exigir algo que eles nunca viram ou pouco fizeram (Aluno 28).
Ressaltamos que, apesar da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996), estabelecer que “a Educação Física, integrada à proposta da escola, é componente curricular da Educação Básica ajustando-se às faixas etárias e às condições da população escolar...”, ainda reflete um perspectiva de desvalorização e uma visão simplista e arcaica que se tem da nossa área: “...sendo facultativa nos cursos noturnos”.
Além disto, há a Lei 10.793, de 01 de dezembro de 2003 (BRASIL, 2003), que indica casos específicos para dispensas das aulas de Educação Física, a saber: àquele que cumprir “jornada de trabalhado igual ou superior a seis horas”, “maior de trinta anos de idade”, “estiver prestando serviço militar inicial ou que, em situação similar, estiver obrigado à prática da educação física”; “que tenha prole”.
De imediato, nos surge o questionamento: se há tantos casos como os citados acima onde os alunos da Educação Básica brasileira podem ser dispensados das aulas deste componente curricular ou este é facultativo como no caso dos cursos noturno, como cogitar a possibilidade de estar presente nos processos vestibulares?
Apesar de tais considerações e constatações, mantivemos a intenção e a realização desta pesquisa para que, eventualmente, pudessemos/possamos avançar com algumas outras questões relacionadas.
Uma delas é a existência de conteúdos/conhecimentos possíveis de serem trabalhados com alunos da Educação Básica. Aliás, este foi um dos pontos perguntados aos sujeitos da pesquisa, isto é, quais conteúdos e/ou temas da Educação Física escolar poderiam ser solicitados em uma prova de vestibular.
A partir da análise das respostas obtidas junto aos graduandos em Educação Física, foi possível perceber que alguns temas foram recorrentes, tendo uma maior incidência nas respostas dos futuros profissionais da área, a saber: o esporte e a cultura corporal, a importância da Educação Física diante de populações especiais e a conexão do componente curricular com assuntos da área biológica e da saúde, com temas interdisciplinares.
Um dos temas analisados diz respeito ao esporte e suas ramificações. Assuntos como: discussões das regras das diferentes modalidades; relação do esporte com a sociedade e a sua influência nas diferentes classes sociais; relação entre o esporte e a mídia; associação do esporte com a saúde; a questão envolvendo o uso de anabolizantes, entre outros. Além disso, a sua relação com jogos, brincadeiras e práticas cooperativas.
Um segundo tema apresentado pelos alunos foi sobre a importância da atividade física para pessoas com alguma necessidade especial, física ou mental, desde a inclusão dessas pessoas na sociedade através da Educação Física, até atividades desenvolvidas especificamente para um determinado grupo, como diabéticos, obesos, idosos, cardiopatas e hipertensos, por exemplo.
Alguns conteúdos tidos como importantes pelos graduandos, parecem estar ligados às ciências biológicas e saúde, buscando trazer uma colaboração do componente curricular para assuntos relacionados à Biologia, Química, Anatomia, Fisiologia, Bioquímica, Nutrição, Psicologia e Cinesiologia.
Diante das respostas manifestadas pelos Coordenadores de Curso, é possível perceber uma divisão dos conteúdos relacionados ao componente curricular Educação Física em dois grupos: um de caráter conceitual e outro de caráter procedimental.
Para Ramos (2000, p. 3), “a dimensão conceitual se caracteriza pela abordagem de conceitos, fatos e princípios; refere-se à construção das capacidades intelectuais”. Nesse contexto, os conceitos pertinentes à Educação Física escolar tornam-se importantes, buscando tratar assuntos que possam ensinar e influenciar os alunos desde os primeiros anos escolares até a vida adulta.
No que diz respeito à dimensão procedimental, Ramos (2000, p. 4) afirma que “está intimamente relacionada ao saber fazer, que envolve o tomar decisões e realizar ações coordenadas buscando alcançar um determinado objetivo”.
A partir desta conceituação, é possível visualizar alguns temas mais ligados à dimensão conceitual, como o exposto em um trecho da resposta de um dos coordenadores acerca de quais conteúdos seriam possíveis de serem inseridos em uma prova de vestibular:
conteúdos mais ligados ao domínio conceitual, como por exemplo, exercício físico e saúde; qualidade de vida e exercícios físicos; ética no esporte; consumo e exercício físico; mídias e padrões de corpo; lazer e qualidade de vida; políticas públicas de lazer e de esporte; o esporte de alto-rendimento e a saúde; as mídias e as mercadorias esportivas; mídias e alteração de regras dos esportes (CC 2).
Indo ao encontro desta resposta, Ramos e Ferreira (2000, p.4), sugerem várias possibilidades de inserção do tema transversal saúde nas aulas de Educação Física, entre elas:
Em aulas cujo conteúdo central seja o futebol, por exemplo, explicitar aos alunos a importância e a necessidade de se realizar exercícios de aquecimento e alongamento das principais musculaturas envolvidas naquela prática esportiva, apresentando informações claras e justificando sua realização, evitando, desta maneira, as famosas “dores do dia seguinte” e, mais do que isto, possibilitar a autonomia do aluno em relação à atividade física e saúde.
Ainda é destacada a importância da “educação física como área do conhecimento” (CC 3.
Se tal componente curricular possui inúmeros conteúdos/conhecimentos possíveis de serem trabalhados em suas aulas, por que os professores da área abdicam deste recurso? Sabemos das características e tradição da área em relação à formação dos futuros professores de Educação Física, das limitações de espaço físico para as aulas de Educação Física que, em geral, não possui uma sala própria, da resistência da direção da escola e dos próprios alunos, porém, é preciso ousar para poder ver a Educação Física ampliar seus horizontes.
Será que se estes conteúdos/conhecimentos fossem eleitos para serem cobrados em uma prova de caráter seletivo para o ingresso em curso superior haveria uma atitude diferente dos cursos de formação profissional, dos professores, dos alunos e da direção da escola? Esta indagação tem nos acompanhado durante toda a realização deste trabalho e sabemos das dificuldades em respondê-la.
Para Betti (2002), o ideal para a Educação Física seria que o esporte, o jogo, a dança, a ginástica, a luta etc., fossem adaptados como meio de tornarem-se conteúdos do componente curricular.
Assim sendo, esses temas poderiam ser trabalhados com base na dimensão conceitual, seja em ambientes tradicionalmente utilizados por outros componentes curriculares (como a sala de aula, o anfiteatro, a biblioteca...), fazendo uso de recursos tecnológicos (retroprojetor, data show), exibindo filmes, utilizando os recursos disponíveis para transmitir os conhecimentos pertencentes à área, ou em ambientes externos utilizados predominantemente pela Educação Física, buscando a vivência do conteúdo descoberto ou aprendido no caráter conceitual.
Como indicado anteriormente, conteúdos de cunho procedimental também foram enfatizados nas respostas dos CC, caracterizando uma nova categoria para efeito de análise e discussão dos dados.
Com base nessa dimensão prioritariamente prática, podemos salientar uma das respostas dos coordenadores:
poderiam ser solicitados nesta prova alguns conhecimentos de natureza procedimental (saber fazer), como: como calcular a freqüência cardíaca mais adequada para a queima calórica; saber calcular o índice de massa corporal; como elaborar um programa de condicionamento físico para alguém que quer manter seu peso (CC 2).
Acreditamos que um dos caminhos das aulas de Educação Física nas escolas seja o de compartilhar conhecimentos tanto nas aulas teóricas quanto nas aulas práticas. Conhecimentos estes que devem ter um embasamento teórico, para que o conteúdo não seja dado ao acaso, com o intuito que o aluno apreenda, assimile e possa fazer usufruir durante a sua vida, além de conscientizá-lo sobre possíveis problemas e conseqüências de uma vida sedentária, como o exposto ppor outro coordenador, que salientou: “Acredito que conteúdos associados à prática regular de atividade física desde a idade escolar, são importantes de estarem presentes” (CC 1).
Nesse contexto, um dos participantes desta pesquisa defende a inserção de alguns temas característicos ou oriundas da Educação Física para as outras áreas do conhecimento, demonstrando que ao longo dos anos as pessoas poderão utilizá-los em suas diferentes carreiras profissionais, mesmo que este não seja aplicado no exercício da sua profissão, mas ao menos desta forma, o indivíduo terá o conhecimento sobre a importância de determinados conceitos durante a vida diária:
Influências culturais de atividades esportivas, tais como atletismo. Pois a maioria das pessoas caminham, correm, saltam e arremessam alguma coisa ao longo da vida profissional em diversas carreiras (CC 3).
Ainda diante dessas questões sobre quais conteúdos da Educação Física escolar poderiam ser solicitados em uma prova de vestibular, foi destacada a importância das “atividades para portadores de necessidades especiais” (CC 3), como uma forma de inclusão social.
Considerações finais
A partir da realização desse trabalho foi possível observar uma clara divisão entre aqueles que são favoráveis a uma possível inserção dos conteúdos relacionados à Educação Física e aqueles que se posicionam de maneira contrária.
O ponto central dessa divergência parece se relacionar ao contexto em que o componente curricular está inserido na educação brasileira nos dias de hoje. Ou seja, a própria legislação, a falta de sistematização dos conteúdos, o descomprometimento dos professores para com os alunos, a supremacia da dimensão procedimental nas aulas, a desvalorização da área perante os demais componentes curriculares, entre outros fatores, colaboram para essa divisão de opiniões.
Outro ponto muito discutido entre os profissionais da área diz respeito ao conceito referido à Educação Física. Seria a Educação Física uma ciência ou uma área de intervenção pedagógica?
Por outro lado, é possível destacar uma aproximação das respostas dos estudantes de Educação Física e dos Coordenadores de Curso de graduação em Educação Física participantes desta pesquisa, no que diz respeito aos conteúdos que podem ser cobrados em uma prova de vestibular, tais como: a relação e influência da Educação Física com a saúde, as temáticas relacionadas aos esportes, bem como a abordagem interdisciplinar.
Para que ocorra essa inserção dos conteúdos da área em provas de processos seletivos, é preciso que as Instituições de Ensino Superior passem por uma reestruturação. No entanto, acreditamos que essa modificação na estrutura dos vestibulares esteja distante de ocorrer, principalmente, no âmbito da Educação Física, haja vista a necessidade e urgência desta se reestruturar para que os conhecimentos sejam melhores compartilhados pelos profissionais da área, dando identidade e sentido para as aulas de Educação Física na escola e, posteriormente, possam ser melhor identificados para existir a possibilidade da sua solicitação.
Referências
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______. Lei n. 10.793, de 01 de dezembro de 2003. Altera a redação do art. 26, parágrafo 3º, e art. 92 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 2 dez. 2003. Seção 1, p. 3.
DARIDO, Suraya C. et al. Vestibular em educação física: perspectivas de relacionamento com o primeiro e segundo graus. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Campinas, v. 16, n. 2, p. 108-113, 1993.
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RABELO, Lísia M. et al. Fatores de risco para doença aterosclerótica em estudantes de uma universidade privada em São Paulo. Arq Bras Cardiol, Brasília, v. 27, n. 5, p. 569-574, 1999.
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