Avaliação postural em participantes do programa de prevenção e reabilitação cardiopulmonar e metabólica do núcleo de cardiologia e medicina do exercício |
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*Fisioterapeuta graduada pela Universidade do Estado de Santa Catarina **Mestranda da Universidade do Estado de Santa Catarina (Brasil) |
Fernanda Calado Carneiro* Letícia Calado Carneiro** |
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Resumo Este estudo teve como objetivo a realização de avaliações posturais e de dor nos participantes do Programa de Prevenção e Reabilitação Cardiopulmonar e Metabólica (PPRCPM). Participaram 43 indivíduos de ambos os gêneros com faixa etária entre 44 e 82 anos. Para avaliação da postura foram utilizados: uma ficha de avaliação e um Simetrógrafo. Cada sujeito foi observado nos planos sagital e frontal. Encontrou-se uma média de idade de 62,33 anos (±8,91). Os desvios mais evidentes foram: anteriorização da cabeça (74%); hiperlordose cervical (58%); protusão e elevação do ombro respectivamente (88% e 63%); hipercifose dorsal (48%); inclinação pelvica (40%); hiperlordose lombar (51%); joelhos valgos e varos respectivamente (33%) e (23%). Do total de pacientes 56% apresentaram quadros de dor, os locais mais comuns foram: a região lombar (50%), ombros (37%) e joelhos e pernas (25% cada). Portanto, a prescrição de atividade física deve levar em consideração os devios da postura, o quadro álgico e as restrições funcionais de forma individual. Dessa forma fica evidenciada a necessidade da inserção de uma avaliação cinético-funcional e postural no protocolo dos (PPRCPM) que poderá auxiliar a traçar os exercícios adequados para cada paciente. Unitermos: Postura. Idosos. Reabilitação cardíaca. |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 125 - Octubre de 2008 |
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Introdução
Com o aumento da longevidade, o número de pessoas idosas vem aumentando consideravelmente. Estima-se que no ano de 2030, o número de idosos poderá chegar a setenta milhões nos países desenvolvidos. No Brasil, as projeções para o ano de 2025, indicam que a população total aumentará cinco vezes em relação à de 1950. Segundo dados do Ministério da Saúde, a população brasileira de idosos, em 1996, era de 7,8 milhões e, entre 1950 e 2020, e crescerá 16 vezes o número de pessoas acima de sessenta anos de idade no país (LACOUR e MARINI, 2006).
Devido o aumento da média de idade dos indivíduos ocorre crescimento de doenças e distúrbios orgânicos associados ao envelhecimento, com ênfase para as doenças crônico-degenerativas. Essas alterações levam a disfunções em vários órgãos e funções no idoso, como distúrbios da marcha e da mobilidade (MACIEL e GUERRA, 2005).
Na velhice ocorrem muitas alterações em todos os sistemas, principalmente no sistema músculo-esquelético; é nessa fase que a prática regular de exercícios físicos torna-se extremamente importante e pode contribuir para evitar complicações ou até recuperar a vitalidade perdida. Segundo Pickles (1998) a diminuição do nível de atividade física pode ser um fator contribuinte para o aumento da curvatura da coluna vertebral no plano sagital, pela redução de massa óssea e maior incidência de fraturas.
Segundo Filho e Netto (2000), as doenças degenerativas das articulações, especialmente as da coluna cervical, lombossacra e extremidades inferiores podem causar dor, articulações instáveis, fraqueza muscular, devido a hipotrofia que resulta do desuso e descondicionamento causado por dor e/ou falta de exercícios, essas condições podem contribuir para um andar instável e prejudicar a capacidade de endireitamento do corpo após perda de equilíbrio. Associado a essas alterações ocorre a diminuição da função sensorial, diminuição dos receptores de tato e pressão plantar dos pés, que informam o sistema de informação sobre a base de sustentação do corpo e também a diminuição da propiocepção modificam a percepção da posição do corpo tanto estática como dinâmica. Devido a todas essas alterações decorrentes da idade, justifica-se a importância da avaliação postural como prevenção, no sentido de amenizar essas condições na população escolhida. Em novembro de 2004, os participantes do PPRCPM (Programa de Prevenção e Reabilitação Cardiopulmonar e Metabólica) possuíam uma média de idade de 62 anos idade a qual caracteriza esta população como idosa, de acordo com a classificação da Organização Mundial da Saúde (CARVALHO, 2004).
Para tal, essa pesquisa teve como objetivo analisar as alterações posturais nos pacientes do PPRCPM/NCME/CEFID/UDESC associando os casos de dor aos desvios posturais.
Método
A amostra foi composta por 43 pacientes de ambos os sexos, com faixa etária variando entre 44 e 82 anos de idade, sendo a média de idade de 62,33 anos (±8,91), 24 homens (55,8%) e 19 mulheres (44,2%). Todos participantes do Programa de Prevenção e Reabilitação Cardiopulmonar e Metabólica do Núcleo de Cardiologia e Medicina do Exercício (PPRCPM/ NCME/CEFID/UDESC).
Após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) os pacientes do NCME foram convidados a participar do estudo. Primeiramente foi preenchida a ficha de identificação onde foram registrados os dados pessoais, a anamnese e a escala subjetiva de dor. Em seguida foi realizada a avaliação postural utilizando uma ficha de avaliação e o simetrógrafo. Os dados foram coletados na sala de avaliação da Clínica de Fisioterapia - CEFID/UDESC. Cada avaliação teve duração média de 30 minutos.
Ao iniciar a avaliação, o indivíduo foi instruído a ficar descalço e apenas com roupas adequadas para que se pudesse realizar a avaliação. O indivíduo posicionou-se atrás do simetrógrafo, em cima de uma marca colocada no chão a 20 centímetros do aparelho, com os pés afastados aproximadamente à largura dos ombros, os braços soltos ao lado do corpo e olhando para frente. Durante a coleta o avaliador posicionou-se a uma distância de três metros do avaliado, sentado em uma cadeira com encosto. No primeiro momento da avaliação postural o sujeito foi observado no plano frontal atrás do simetrógrafo (Fig. 1 à esquerda), colocando o eixo longitudinal do corpo paralelo à linha mediana do simetrógrafo, a seguir observou-se os seguintes parâmetros: cabeça, ombros, escápulas, dorso, pelve, joelhos e pés.
No segundo momento da avaliação postural o sujeito foi observado no plano sagital, o ombro direito ou esquerdo paralelo à linha mediana do simetrógrafo (Fig. 1 à direita), observou-se os seguintes parâmetros: cabeça, cervical, ombro, dorso, pelve, lombar, joelho.
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Figura 1. Avaliação Postural no Plano Frontal à esquerda e no Plano Sagital à direita.
Obedecendo aos objetivos deste estudo, foi realizada a estatística descritiva: distribuição, médias aritméticas ( ), desvios padrões ( s ) na caracterização dos dados.
Resultados
1. Locais de dor e desconforto referido pelos pacientes
Referiram dor 56% (24 indivíduos) dos 43 indivíduos da amostra geral. O registro dos valores citados pode ser observado detalhadamente no gráfico a seguir. Os indivíduos foram orientados a registrar todo o desconforto corporal, independente da região, sendo possível referir dor em mais de um local do corpo.
Figura 2. Locais de dor e desconforto referido pelos pacientes.
2. Avaliação postural Plano frontal (vista anterior e posterior) e Plano sagital (vista lateral)
A Tabela 1 é referente à observação dos desvios posturais encontrados nos pacientes na visão anterior (plano frontal). Foram analisados desvios na cabeça, nos ombros e na pelve.
Tabela 1. Freqüência em percentual dos desvios posturais (visão anterior)
Segmento corporal |
Tipo de desvio |
f (%) |
Cabeça |
rotação |
23% |
inclinação e rotação |
16% |
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Inclinação |
12% |
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Ombros |
elevação |
63% |
depressão |
21% |
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Pelve |
inclinação |
40% |
A Tabela 2 é referente à observação dos desvios posturais encontrados nos pacientes na visão posterior (plano frontal). Foram analisados desvios: nas escápulas, na coluna dorsal, nos joelhos e pés.
Tabela 2. Freqüência em percentual dos desvios posturais (visão posterior)
Segmento corporal |
Tipo de desvio |
f (%) |
Escápulas |
báscula lateral |
19% |
báscula medial |
2% |
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Coluna dorsal |
gibosidade |
37% |
Joelhos |
valgos |
33% |
varos |
23% |
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Pés |
valgos |
16% |
planos |
9% |
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planos e varos |
5% |
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planos e valgos |
2% |
Na Tabela 3 estão os desvios posturais observados nos pacientes na vista lateral (plano sagital). Foram analisados desvios na cabeça, coluna cervical, nos ombros, na coluna dorsal, pelve, coluna lombar e joelhos.
Tabela 3. Freqüência em percentual dos desvios posturais no plano sagital
Segmento corporal |
Tipo de desvio |
f (%) |
Cabeça |
anteriorização |
74% |
Coluna cervical |
hiperlordose |
58% |
Ombros |
retificação |
2% |
protusão |
88% |
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Coluna dorsal |
hipercifose |
48% |
Pelve |
retificação |
12% |
retroversão |
30% |
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anteversão |
26% |
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Coluna lombar |
hiperlordose |
51% |
retificação |
21% |
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Joelhos |
flexo |
21% |
hiperextensão |
19% |
Discussão
Foi verificada uma prevalência de desvios posturais em todos os casos analisados tendo uma freqüência maior nos seguintes segmentos corporais: cabeça (anteriorização 74%); cervical (hiperlordose 58%); ombro (protusão 88%; elevação 63%); coluna dorsal (hipercifose 48%); pelve (inclinação 40%); coluna lombar (hiperlordose 51%); joelhos valgos e varos respectivamente (33%) e (23%). Pode-se observar que as maiores alterações posturais ocorreram no plano sagital.
Muitas das alterações citadas corroboram com as modificações posturais relatadas por Pickles (1998) e Moreira (2001), que também observaram alterações em conseqüência da idade manifestando-se principalmente no plano sagital. Os mesmos autores citaram como alterações o aumento da curvatura cifótica da coluna torácica, a lordose lombar, o aumento do ângulo de flexão do joelho, o deslocamento da articulação coxofemoral para trás e a inclinação do tronco para frente. Essas alterações começam a aparecer além dos 40 anos de idade e contribui para a redução da estatura e para a posição inclinada que caracteriza muitas pessoas da terceira idade.
Dos pacientes analisados 56% apresentaram quadro de dor, ou seja, mais da metade da amostra. Destes a maior incidência de desconforto foi na região lombar, com 50%, a dor nessa região pode estar associada a doenças comuns do envelhecimento e a hiperlordose que foi característica nesses indivíduos. A hiperlordose possivelmente advém de uma anteversão pélvica, associada à retração da musculatura do iliopsoas e dos paravertebrais lombares, que pode ser exacerbada pela protusão e fraqueza abdominal que muitos possuem nessa idade. Para Katch e Mcardle (1996) os principais fatores envolvidos na "síndrome da dor lombar" são: fraqueza muscular, principalmente na região abdominal e a baixa flexibilidade articular no dorso e nos membros inferiores.
Foi observado neste estudo que muitos pacientes também relataram desconforto na região dos ombros, cervical e tórax. A presença de dor nessa região pode estar associada às alterações posturais como a hiperlordose cervical, hipercifose dorsal, anteriorização da cabeça e protusão dos ombros. Segundo Lourenço e Battistela (1994), a redução da região anterior dos corpos vertebrais que resulta em compressão e colapso de vértebras, com estreitamento dos discos e dos espaços intervertebrais, determina uma série de deformidades na coluna e modificações posturais. Estas alterações posturais podem surtir efeitos sobre o sistema respiratório dos idosos, que sofre progressiva diminuição de seu desempenho em decorrência de alterações estruturais e funcionais. A principal alteração fisiológica do envelhecimento relacionada a caixa torácica consiste na diminuição de sua complacência. Essa redução deve-se possivelmente à calcificação da cartilagem costal e das articulações costo-vertebrais bem como ao estreitamento dos espaços intervertebrais (JANSSENS, PACHE e NICOD, 1999)
A região das pernas, joelhos e quadril também ocuparam um importente lugar na classificação dos locais de dor. Os joelhos valgos e varos podem levar a quadros de dor provavelmente devido aos desgastes já existentes ocasionados por estes desvios que muitas vezes estão presentes desde a infância e adolescência e que provavelmente não foram corrigidos. Tais desgastes podem influenciar nos fatores que resultam em quadros de osteoartrose e osteoporose entre outras doenças associadas ao envelhecimento. Segundo Martin (1994) a osteoartrite (OA) é uma doença articular crônico-degenerativa que evidencia desgaste da cartilagem articular, na qual, dentre as articulações de sustentação de peso, o joelho e o quadril são os mais freqüentemente afetados.
Embora as pesquisas tenham pouco sucesso em elucidar a patogênese da OA de joelho, alguns fatores de risco para esta doença encontram-se bem estabelecidos. Por manifestar - se em cerca de 50% dos idosos com mais de 65 anos e em 80% dos acima de 75 anos, o envelhecimento inclui-se entre estes fatores. Além do envelhecimento, a obesidade, lesões ou cirurgias prévias, esforço ocupacional ou recreacional cumulativo, mau alinhamento articular e fraqueza muscular são alguns dos fatores que também predispõem à OA (ALTMAN et al,1986 e FELSON et al, 1995).
Seja qual for a causa do desalinhamento postural, esse pode vir a implicar em algum tipo de compensação e conseqüentemente em dor, fato que pode influenciar na prática de atividade física dos pacientes.
Conclusão
Considerando que os participantes do NCEM encontram-se em sua maioria na terceira idade e em processo de envelhecimento, é importante ressaltar a presença de uma equipe multidisciplinar compondo um programa de reabilitação cardíaca.
A prática de exercícios físicos auxilia na qualidade de vida destes pacientes, no entanto, deve-se ficar atento aos desvios posturais e queixas de dor, para que estes não venham a interferir no cotidiano dos pacientes ao ponto de interromper a prática de atividade física. Por essa razão sugere-se que antes de iníciar a prática de exercícios físicos é interessante a realização uma avaliação postural e cinético funcional para ser traçado o perfil de cada paciente e a partir daí possibilittar a indicação da atividade física mais adequada.
Agradecimentos
Agradecemos ao Dr. Tales de Carvalho – coordenador do programa - e à todos os participantes do Programa de Prevenção e Reabilitação Cardiopulmonar e Metabólica do Núcleo de Cardiologia e Medicina do Exercício.
Referências bibliográficas
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Carvalho, T. Caracterização da População de um programa de Prevenção e Reabilitação de Doenças Cardiopulmonares e Metabólicas. In: I Jornada Científica do Núcleo de Cardiologia e Medicina do Exercício: Anais da I Jornada Científica do Núcleo de Cardiologia e Medicina do Exercício. Florianópolis. 2004;
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Filho ETC, Netto MP. Geriatria: Fundamentos, Clínica e Terapêutica. São Paulo: Atheneu, 2000.
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Katch IF, Mcardle DW. Nutrição Exercício e Saúde. 4. ed. Rio de Janeiro: Médica e Cientifica – Medsi, 1996.
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Pickles B. Fisioterapia na terceira idade. São Paulo: Santos,1998.
revista
digital · Año 13 · N° 125 | Buenos Aires,
Octubre de 2008 |