Influência das atividades acadêmicas na escolha pela área de atuação profissional em Educação Física: um estudo de caso sobre o currículo generalista dos cursos de licenciatura |
|||
*Mestre em Educação. Professor dos Cursos de Bacharelado e Licenciatura em Educação Física da Universidade do Extremo Sul Catarinense **Doutor em Educação professor do PPGE/UFSM. (Brasil) |
Victor Julierme Santos Da Conceição* Hugo Norberto Krug** |
|
|
Resumo Este estudo foi caracterizado dentro do paradigma empírico-analítico como descritivo, onde se objetivou investigar a influência das atividades práticas dos alunos do curso de Educação Física, na escolha pela atuação profissional. Foi aplicado um questionário aberto a 31 acadêmicos que cursavam a disciplina de Estágio Profissionalizante, sendo as respostas analisadas de acordo com a freqüência percentual dos indicadores. Fica evidente, que ocorre uma especialização precoce dos acadêmicos antes mesmo de ingressar no curso de graduação. O que preocupa nesta conclusão é que quando em situação escolar, os professores não proporcionam, com o mesmo grau de conhecimento, outros conteúdos trabalhando as diversas manifestações da cultura de movimentos. Unitermos: Educação Física. Formação de professores. Atuação profissional. |
|||
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 125 - Octubre de 2008 |
1 / 1
Introdução
Além de agregar-se á um debate político intermitente sobre os efeitos do processo de reconhecimento legal do profissional de Educação Física, tanto na formação profissional como na prática docente nos diferentes espaços institucionais onde a Educação Física acontece, também se observa dificuldades para situar e legitimar a Educação Física como campo científico (MOLINA NETO, 2002).
Ser professor não é apenas ensinar conteúdos, mas sim ser um coadjuvante na formação de um cidadão, cúmplice das mudanças sociais. O professor deve estar atento a toda e qualquer transformação na sociedade, estando atualizado e seguindo as diretrizes do projeto político pedagógico.
Segundo Oliveira (1993), a formação profissional acontece numa prática curricular ultrapassada, alienada e reprodutivista que reforça a formação de um profissional desqualificado e despreparado à iniciação de transformações sociais, estando este embrulhado num currículo com um projeto pedagógico progressista. Portanto, criar estratégias rumo ao verdadeiro desmascaramento de nossa realidade, com o compromisso de uma nova proposta de formação do profissional de Educação Física é uma tarefa imprescindível ao avanço da área.
Segundo estudo realizado por Delgado (1999), alunos dos cursos de Educação Física de Campinas tiveram dificuldades de ingressarem no mercado de trabalho, sendo os motivos relacionados com a formação acadêmica e o baixo salário. Além de formar pesquisadores e bons professores, deve a universidade ser capaz também de habilitar seu profissional para o desenvolvimento de atuação competente, crítica e comprometida, sempre em favor da comunidade que utiliza seus serviços.
O profissional (professor) de Educação Física não foge desta temática, pode-se dizer, que o fato da grande descaracterização dos cursos formadores de professores, leva a escolhas por áreas fora do contexto educacional. Desta forma, o profissional perde o seu caráter docente, podendo até afirmar que em outras formas de atuação esse não seja considerado um professor. No entanto, continua utilizando procedimentos didáticos metodológicos obtidos em disciplinas voltadas para a atuação pedagógica. Desta forma, o profissional/professor, quando em atuação escolar, passa por grande exclusão gerada pela desconsideração e inoperância deste profissional. Estas questões levam a nada mais nada menos que uma desvalorização da área, tanto no meio escolar como fora do meio escolar.
A partir destas reflexões elaborou-se o seguinte problema de pesquisa:
“As atividades diárias, realizadas antes e durante o curso pelos acadêmicos, influenciam na escolha da área de atuação do futuro profissional de Educação Física?”.
Desta forma, objetiva-se com este estudo, verificar se as atividades diárias, antes e durante o curso, realizadas pelos acadêmicos são influenciadoras na escolha pela área de atuação do futuro profissional de Educação Física.
Para facilitar a abordagem do objetivo geral, este foi desmembrado nos seguintes objetivos específicos:
Conhecer as atividades mais realizadas pelos acadêmicos antes de iniciar o curso de Educação Física;
Analisar se essas atividades influenciaram na escolha pra ingressar no curso de Educação Física;
Identificar as atividades mais realizadas pelos acadêmicos durante o curso de Educação Física;
Verificar a área de atuação profissional dos acadêmicos; e a relação entre a escolha profissional e as atividades realizadas pelos mesmos antes e durante o curso de Educação Física.
Segundo Gil (1999), esta pesquisa se caracteriza como descritiva, tendo como objetivo primordial descrever características de uma determinada população.
O presente estudo foi desenvolvido com 31 acadêmicos do curso de Licenciatura Plena em Educação Física cursando a disciplina de Estágio Profissionalizante, selecionados intencionalmente, pois foi considerado que estes acadêmicos já tinham passado por todas as disciplinas obrigatórias e complementares do quadro curricular do curso.
Como instrumento de coleta das informações, foi utilizado um questionário semi-estruturado, constituído por 11 questões abertas. Justifica-se a sua escolha, por ser um instrumento que possibilite atingir um grande número de pessoas ( GIL, 1999), ao mesmo tempo em que o sujeito possa responde-lo no seu tempo e da forma que melhor escolher ALVES-MAZZOTTI e GEWANDSZBAJDER (1998) . Este instrumento foi aplicado em uma reunião marcada pela coordenação do curso para tratar questões de interesse dos estagiários, aproveitando o maior número de acadêmicos reunidos neste período, analisando os dados utilizando a estatística descritiva contendo freqüência de indicadores e percentual das respostas.
Apresentação e discussão dos resultados
Tabela 1. Atividades de preferência dos acadêmicos antes de ingressar no curso de Educação Física. n=31
Atividade |
f |
% |
Esportes coletivos |
20 |
64,5 |
Esportes individuais |
5 |
16,0 |
Atividades na academia |
5 |
16,0 |
Exercícios na natureza |
1 |
3,0 |
Observando-se a tabela 1, percebemos que as atividades de maior preferência entre os acadêmicos antes de ingressarem no curso de Educação Física, estão muito relacionadas às atividades esportivas, pois quando questionados, 64,5% preferiam os esportes coletivos, 16% preferiam esportes individuais, 3% realizavam esportes na natureza e 16% exercícios na academia. Nota-se ainda que os esportes coletivos eram em sua maioria o futebol e estes juntamente com os esportes individuais, relacionavam-se com a Educação Física escolar.
Justificamos este fato pela abordagem tecnicista, que ainda é utilizada pelos professores de Educação Física nas escolas, pois o esporte institucionalizado é conteúdo obrigatório em diversas escolas da rede de ensino municipal estadual. Segundo Gallardo (2000), os ideais liberais da sociedade, sustentam que o esporte, levará a criança a aprender que entre ela e o mundo existem os outros, e que para a convivência social, a obediência a certas regras incontestáveis e imutáveis é necessário. Assim, as determinações legais indicam que, a partir da 5° série a programação deve incluir iniciação esportiva entre outras atividades do conteúdo.
Tabela 2. Atividades de maior preferência dos acadêmicos durante o curso de Educação Física. n=31
Atividade |
f |
% |
Academia |
9 |
29,0 |
Esportes Coletivos |
7 |
22,5 |
Atividades Extracurriculares |
4 |
12,9 |
Pesquisa |
3 |
9,6 |
Ed. Física Escolar e Adaptada |
3 |
9,6 |
Atividade Complementar de Graduação.(ACG) |
2 |
6,4 |
Todas |
2 |
6,4 |
Extensão |
1 |
3,2 |
Analisando-se a tabela 2, verificamos 29,0 % dos acadêmicos preferem a área de academia; 22,5% os esportes coletivos; 12,9% as atividades extracurriculares; 9,6% a Educação Física Escolar e Adaptada; 9,6% os projetos de pesquisa; 6,4% Atividade Complementar de Graduação; 6,4% preferem todas as atividades realizadas; e 3,2% projetos de extensão. Estes dados ainda mostram a grande influência das vivências anteriores, como forma de seguir uma área onde tenham prazer em atuar. Realizando uma sucinta comparação entre as tabelas 1 e 2 percebemos que os acadêmicos continuam preferindo as mesmas atividades citadas como maioria na tabela 1 (esportes coletivos e atividades de academia). Notamos uma grande relação entre o antes e durante o ingresso no curso, pois os acadêmicos preferem as mesmas atividades que realizavam antes do curso. Mostrando uma suposta influência na área de após o curso.
Tabela 3. Área futura de atuação profissional dos acadêmicos de Educação Física após a formatura. n=31
Área |
F |
% |
Atividades na academia |
13 |
42,0 |
Educação Física escolar |
9 |
29,0 |
Pesquisa e universidade |
6 |
19,0 |
Escolinhas e clubes |
3 |
10,0 |
A tabela 3, mostra-nos que a área de atuação profissional mais desejada pelos acadêmicos do curso de Educação Física apresenta 42,0% de preferência, que corresponde a atividades de academia. Já 29,0% escolheram a Educação Física escolar; 19,0% preferem seguir a docência em ensino superior e 10,0% querem atuar em escolinhas e clubes.
Segundo Oliveira (1998), atuação profissional de Educação Física hoje passa por cinco grandes áreas:
Escolar (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio;
Saúde – hospitais, clínicas de recuperação, clínicas de reeducação motora, centros de tratamento de distúrbios motores, mentais e outros;
Lazer- clubes, hotéis, estâncias hidrominerais, hotéis fazenda, sesc, sesi, animação de festas e outros;
Esportes, profissional e amador (clubes esportivos, empresas, prefeituras, clubes sociais e etc;
Empresa – industria, academias, escolas de natação escola de tênis, escolinha de forma em geral.
A escolha dos acadêmicos pelas diferentes áreas de atuação profissional, fica prevista pelo grande leque de oportunidades que o mercado de trabalho abre para o profissional de Educação Física, com destaque para a atuação em academias e escolas desportivas que estão em grande fase de expansão.
Oliveira (1998), também afirma que a profissão e o profissional de Educação Física estão em plena fase de transformação na atuação e formação. Atualmente, grande parte dos profissionais que saem dos cursos de graduação se dirigem à iniciativa privada para oferecer sua força de trabalho, apesar de ser ainda a escola a que mais absorve o profissional.
Tabela 4. Influência do curso de Educação Física na atuação profissional do acadêmico. n=31
Opinião |
f |
% |
Não |
15 |
48,3 |
Sim |
14 |
45,3 |
Mais ou menos |
1 |
3,2 |
Sem resposta |
1 |
3,2 |
Na tabela 4, mostra-nos a opinião dos acadêmicos sobre a influência que o curso de Educação Física e sua grade curricular, tem sobre a escolha da futura atuação profissional, pois 48,3% dizem “não” e 45,3% afirmam que sim o curso influencia na escolha plena área de trabalho.
Segundo Petrica (1987); Onofre (1991); Carreiro Da Costa (1994) e Matos (1994) , a formação profissional que ocorre nos cursos de licenciatura é uma tarefa complexa que requer uma formação sólida para que o professor consiga definir o que ensinar, porque ensinar, para que ensinar e como ensinar.
De acordo com Onofre (1991), a formação acadêmica parece não influenciar o processo de pensamento e ação de futuros professores e, conseqüentemente não está contribuindo para a melhoria da prática da Educação Física nas escolas. Sendo assim Taffarel (1992), salienta que a precariedade dos cursos de formação profissional de ensino de Educação Física fica evidente nos processos acadêmicos que ocorrem sob os auspícios de uma instituição de ensino superior, no caso em cursos de licenciatura e bacharelado em Educação Física e Esportes.
Concordando com Freitas (1992), que cita dois problemas curriculares que deveriam ser repensados para melhor orientar a formação profissional de Educação: a)A organização dos cursos de maneira etapista, 1° abordagem teórica, depois a prática, como se o conhecimento pudesse ser adquirido para depois ser colocado em prática; b)A fraca qualidade da formação teórica do profissional, e o que estaria faltando é privilegiado a prática.
Considerações finais
Neste momento do estudo utilizaremos os dados apresentados anteriormente, para realizar uma observação reflexiva dos fatos. Salienta-se que fica claro a grande influência das vivências do cotidiano, na escolha da área de atuação pelo futuro profissional de Educação Física. Esta forma de “escolher”, passa por um processo de reconstrução de interesses que ultrapassam a vontade do estudante, interesses esses que são manifestados pelo “modismo” nas áreas de atuação profissional mais vigentes no contexto histórico.
A claridade dos fatos releva o excesso de conhecimento em áreas a fins, deixando outras vivências, que poderão ser determinantes na complementação da sua formação, a quem do fundamental para a construção de um profissional completo.
O acadêmico do curso de Educação Física está se especializando em áreas que tinham um interesse antes do próprio ingresso no curso de formação. Este fato pode ser considerado como uma especialização precoce, que com certeza será uma barreira para a sua profissão.
Deixa-se claro, que esta especialização não está sendo colocada em ”cheque” no estudo, no entanto, questiona-se, a influência do currículo e do corpo docente às atribuições profissionais do futuro professor. Pois a experimentação de diferentes conhecimentos é de extrema importância para aumentar a gama de possibilidades que o Professor de Educação Física tem para atuar.
Uma das preocupações que este estudo apresenta é sem dúvida nenhuma, sobre o ato de lecionar em uma escola seja ela de cunho público ou privado. Pois esta passa a ser um “deságüe” para profissionais que procuram uma estabilidade financeira, e lá, desenvolvem atividades (Molina Neto, 2002), onde o cunho educacional é pouco reconhecido. Passando a Educação Física escolar trabalhar com propostas apenas mecanicistas, não reconhecendo o movimento como ato cultural. Massificando a chamada neutralidade que esta área passa para a comunidade escolar, desenvolvendo um desprestígio perante as outras disciplinas em relação a importância social da prática pedagógica da Educação Física.
Desta forma, uma política de participação deve ser implantada pelos departamentos de ensino, procurando a formação com um caráter emancipatorio. Desenvolvendo no acadêmico, uma visão abrangente da realidade que irá enfrentar no mercado de trabalho. Defende-se assim um modelo de currículo com participação de atividades complementares, oportunizando um maior número de vivências didático pedagógicas. Para assim, o aluno desenvolver o conhecimento pleno que o curso se propõe, formando professores íntegros de uma atuação docente, com uma capacidade crítica e reflexiva.
Sendo assim é de extrema importância que esta disciplina seja muito bem entendida pelos alunos da escola, pois só desta forma, será alcançado o respeito e o real conteúdo da disciplina no currículo escolar.
Referencias bilbiográficas
ALVES-MAZZOTTI, A. J. & GEWANDSZBAJDER, F. O Método nas Ciências Naturais e Sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. São Paulo, Pioneiro, 1998.1 MOLINA NETO, V. M. &
CARREIRO DA COSTA, F. R. Formação de Professores: Objetivos, Conteúdos e Estratégias. Revista da Educação Física, Maringá, v. 5 n° 1 p 26-39, 1994.
DELGADO, M. A. Ocupação do Mercado de Trabalho em Educação Física na Cidade de Campinas, Dividindo a Formação Profissional. Dissertação. Campinas: UEC, 1999.
FREITAS, L.C. Em Direção a uma Política para a Formação de Professores. Brasília nº54, abr/jun, 1992.
GIL, A. C. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 5 e São Paulo: Atlas, 1999.
GALLARDO, J. S. P. ; (coord). Educação Física: Contribuição a Formação Profissional. Ijuí: Unijui, 2000.
MATOS, Z. A. Avaliação Da Formação Dos Professores. Boletim Sociedade Portuguesa Educação Física, Lisboa /Portugal, n 10/11 p 53-78, verão/outono, 1994.
MOLINA, R. K. Capacidade de Escuta: Questões para a Formação Docente em Educação Física. Revista Movimento, Porto Alegre: UFRGS, v 8 n 1, 2002.
OLIVEIRA, A. A. B. de. A Formação Universitária Em Educação Física. In: V° Simpósio de Pesquisa em Educação Física, Anais, Florianópolis, UFSC, 1993.
OLIVEIRA, A. A. B. de. Mercado de Trabalho em Educação Física e a Formação Profissional: Breves Reflexões. In: Congresso Latino Americano de Educação Motora e II Congresso Brasileiro de Educação Motora, Anais. Foz do Iguaçu, 1998.
ONOFRE, M. T. de A. S. Elementos para a Reflexão Sobre Formação de Professores... de Educação Física. In: Boletim Sociedade Portuguesa Educação Física, Lisboa /Portugal, n 1 2° série p 75-95, primavera, 1991.
PETRICA J. M. A Formação de Professores de Educação Física nas Escolas Superiores. Revista de Educação Física e Desportos Horizonte, Lisboa/ Portugal. v IV, n 22, p 128-135, nov/dez 1987.
TAFFAREL, C. N. Z. Análise dos Currículos de Educação Física no Brasil Contribuições a o Debate. Revista de Educação Física, Maringá, v3, n1 p 48-56, 1992.
revista
digital · Año 13 · N° 125 | Buenos Aires,
Octubre de 2008 |