A construção de jornal como estratégia de compreensão e desenvolvimento dos conteúdos esportivos na Educação Física | |||
*Faculdade de Educa ção Física. UnicampProf. Academia de Ensino Superior – Sorocaba **Faculdade de Educação Física. Unicamp (Brasil) |
Ms. Eduardo Fantato Rodrigues* Dr. Paulo Cesar Montagner** |
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Resumo Esta comunicação apresenta considerações e observações sobre uma atividade de construção de jornais pelos alunos na aula de Educação Física a partir de elementos e conteúdos esportivos presentes na própria mídia. Através de análise de conteúdo dos jornais e dos diálogos estabelecidos com os alunos do ensino público da 9º série do ensino fundamental (8º série antiga) foi possível trabalhar e discutir o referencial teórico (Ferrés, 1996; Orozco-Gomes, 1997; Betti, 1998; Feres Neto, 2003) e averiguar as suas (dos alunos) concepções sobre temas relativos a seleção de conteúdo, forma e abordagem dispensada as informações, atribuição de significados e proximidades com o cotidiano. Tais elementos trazem importantes indícios da contribuição à Educação Física ao tratar a mídia como recurso (meios técnicos para transmissão dos conteúdos) e conteúdo (informações, interpretações e significados) nas aulas. Unitermos: Educação. Educação Física. Mídia. Jornal.
Esse texto foi apresentado no 4º Seminário Nacional “O Professor e a Leitura do Jornal” |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 125 - Octubre de 2008 |
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Introdução
Falar sobre os meios de comunicação atualmente é adentrar numa complexidade de significados e possibilidades. A interação do conteúdo com as pessoas ocorre das mais diversas formas, complementando-se a todo instante ao mesmo tempo em que adquire e re-adquire significados nos contextos e interações de cada sujeito.
A compreensão da mídia a partir de suas estruturas, sobretudo o entendimento dos significados que lhes são atribuídos pelas sujeitos que recebem sua informação, são aspectos que devem dialogar constantemente com a questão educacional, uma vez que trata de uma visão e possibilidade muito presente no cotidiano desses.
No campo de intervenção da Educação Física é possível identificar diversos enfoques que interferem na atuação prática do professor, e sobretudo na concepção que os alunos desenvolvem acerca do fenômeno. Dentre essas possibilidades é necessário observar o papel da mídia no processo de ensino-aprendizagem da Educação Física.
Desta forma é preciso considerar o que essas informações esportivas representam para os alunos. Como refletem e interferem na concepção de esporte. São informações presentes no dia-a-dia, trazendo conceitos, práticas e características específicas, que combinadas com os interesses, anseios e necessidades deles próprios, desenvolvem significados para a prática esportiva.
Assim, dentro de diversas possibilidades de desenvolver um trabalho balizado por essas reflexões, apresenta-se uma atividade de exploração dos conteúdos esportivos presente nos veículos de divulgação de informação escrita seguida de uma proposta para confecção de um jornal durante atividades de aula, através da junção de reportagens e comentários trazidos e debatidos pelos alunos, com discussão sobre os conteúdos escolhidos e o processo de formação do jornal.
Essa atividade foi realizada em uma escola da rede pública estadual de ensino com alunos da 9º série do ensino fundamental (8º série antiga) como parte integrante de dissertação de mestrado defendida na Faculdade de Educação Física da UNICAMP.
Mídia e Educação
Considera-se necessário compreender a mídia como uma forma de inter-relação, tendo em vista que seus conteúdos interagem com os dos sujeitos e são incorporados no seu cotidiano, cria-se uma reorganização dos padrões de interação social.
Para lidar com os conteúdos midiáticos, o processo de ensino-aprendizagem na Educação Física deve ter espaço para a apropriação decorrente da interação das pessoas, e os aspectos da interação neste caso, como aponta Pires (2000) “[...] devem ser tematizados no plano educacional crítico, como aprendizagem a ser buscada para o agir social solidário, participativo e cooperativo,...” (p.81/82)
É tarefa impossível não citarmos Paulo Freire para reforçar o argumento da intimidade que deve existir entre os contextos dos alunos.
Porque não estabelecer uma ‘intimidade’ entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos (FREIRE, 1996:30).
Já podemos nos referir a um enraizamento dessas idéias, não há nenhuma novidade revolucionária sobre a necessidade de se incorporar os saberes cotidianos ao processo de ensino aprendizagem. Mas ainda existem alguns pontos que devem ser observados e debatidos, sobretudo na insistência que nós professores temos em julgar o que é mais educativo e mais atrativo para ensinar nossos alunos. Não seriam eles os mais capazes de indicar do que mais gostam, do que acham mais importante, do que lhes desperta mais a atenção?
Sem dúvida que um processo de ensino tenha de seguir linhas curriculares, que tenha procedimentos teóricos e metodológicos bem definidos, porque senão, não seria uma forma mais elaborada e não cumpriria com seus objetivos educacionais, isto é , deixar simplesmente a mercê do interesse e da valoração dos alunos, não faz o menor sentido, tampouco é essa “liberdade” que estamos propondo, mas é igualmente sem sentido não considerar e de fato utilizar essa “bagagem” que o aluno trás consigo como referência de intervenção, para desta forma intervir e dar instrumentos para que o aluno compreenda sem perder o prazer e admiração pelo fenômeno.
Observa-se uma dificuldade das questões educacionais em adequar o ensino a situações que poderão ser utilizadas pelos alunos, em decorrência de uma contemplação separada entre situações práticas, reais, necessárias e do interesse dos alunos com a proposta de intervenção.
Muito se fala das potencialidades das mentes das crianças, mas, nos contextos educacionais, raramente essas potencialidades podem ser vistas em plena ação. Aceitamos o pressuposto da educação centrada na criança, contudo não prestamos atenção ao que elas estão realmente expressando. (MARTINS, 2003, p.33)
Inserir essas conexões que os alunos trazem de sua vida cotidiana, interpretações e significados são imprescindíveis para uma intervenção pedagógica, haja visto que trazem consigo valores e uma conseqüente contextualização das práticas e conteúdos. Ocorre uma impressão de significados que deve ser considerada e explorada nas relações entre esporte, educação e mídia, impressão de significados essa que refere-se ao:
que as pessoas aplicam sobre a informação, a partir de suas experiências e interações para dar sentido e forma para aquilo que lhes é incorporado no cotidiano. As pessoas imprimem em sua própria compreensão, a partir de suas vivências, dos ambientes, das interações e de suas expectativas, o significado para a informação, para o fato, e desta forma as suas manifestações de apreço, de contemplação, de desgosto e de valor é produto dessa complexidade (RODRIGUES, 2006, p.119)
Orozco Gomez (1997) fala da preferência das crianças favorecerem os meios de comunicação em detrimento à Escola, apontando inclusive que essas aprendem mais e com maior efetividade com os diversos meios de comunicação do que com o professor, e ainda menciona:
Enquanto na escola queremos produzir uma situação propícia para o ensino-aprendizagem, os meios de comunicação estão reproduzindo situações reais, que se não tem muito que ver com o ensino, tem a ver e muito mais com a facilitação da aprendizagem. (OROZCO-GOMEZ, 1997, p. 60)
É necessário enfatizar que as mídias sozinhas não provocam mudanças sociais e culturais, mas o impacto das mensagens é algo que não se consegue mensurar nem padronizar, justamente pelos valores e contextos que se interpolam na recepção e apropriação das mensagens. (SANTAELLA, 1996). Desta forma faz-se necessário ter ciência desses valores e contextos que são carregados pelos sujeitos no processo de aprendizado.
Uma possibilidade concreta de valorizar esses contextos, é permitir a expressão dos sentimentos e emoções suscitadas pelos conteúdos nos alunos. E através dessa impressão de significados que ocorre, que faz “sentido” para eles, desenvolver as atividades com vistas ao aprendizado.
É o que Joan Ferrés (1996) propõem com o método compreensivo, preocupado com abordagens que se tornam extremamente racionais e analíticas, e descartam assim, a magia, as emoções e sensações suscitadas, a capacidade de impacto dos meios, tal abordagem (método compreensivo) auxilia a extrair as informações das crianças e possibilita o que ele chama de “aprender sem negar o prazer. Ou melhor, de aprender pelo prazer e graças ao prazer.” (FERRÉS, 1996: 81)
Desenvolver uma reflexão critica do aluno ao conteúdo midiático, considerando os interesses por de trás daquela competição, daquelas informações, reportagens e detalhes simplesmente não traz nenhum beneficio, tomando-a com fim em si mesma, principalmente porque não adquire sentido para o aluno, que vê naquilo algo satisfatório, com emoções e significados. Ao passo que utilizar esse envolvimento possibilita ao professor 'entrar' no "universo de coisas que fazem sentido" ao aluno, despertar seu interesse para desta forma trabalhar seus conteúdos pedagógicos de forma crítica.
Independente do que se considera valioso ou não, do que é traçado no planejamento pedagógico, as crianças recebem das mídias "um conjunto de conhecimentos que lhes são mais adequados para localizar-se e mover-se no mundo, em sua vida cotidiana." (Orozco Gómez, 1997, p.60) O autor aponta ainda um desafio propondo destacar qual a "relevância entre que faz a escola e o que oferecem os meios de comunicação de massa as crianças para a sua vida diária." (p.61), pensadas pelo olhar da criança, obviamente.
Educação Física e Esporte na Mídia: redes complementares de informação
O esporte adquire significados expressivos no cotidiano das pessoas como: conteúdos, fontes de credibilidade, entretenimento e informação. Tal rotina denota vivências que estão além das práticas, identificados pelos próprios indíviduos (alunos) que assumem e atribuem diferentes sentidos para o esporte, que não depende apenas da prática, mas que carrega emoções, informação, lazer, muitas vezes até servindo de estimulo e posterior complementação para a vivência prática. (RODRIGUES, 2006)
As novas gerações possuem um contato com esporte pela mídia maior do que gerações anteriores. Betti (2001) aponta sobre uma tendência da assistência anteceder a prática (o primeiro contato com prática esportiva ocorre pela mídia), e complementa dizendo que o distanciamento entre a experiência da prática e a de assistir interferem na forma e no "significado da prática esportiva das crianças e jovens, que querem imitar o que vêem na TV..." (p.127), acrescenta-se ainda a experiência de lidar com comentários e debates suscitados pela “falação esportiva” comentada por Umberto Eco (XXX), na qual a continuidade dada pelos jornais, internet , televisão, enfim dos distintos meios, permance na pauta cotidiana.
Há um impacto na forma como percebe-se e pratica-se o esporte, provocado pela utilização do esporte pela mídia. Betti (1998) realça que se deve interpretar a mídia no processo pedagógico, e preparar o aluno para ser também um consumidor do Esporte-Espetáculo, com o cuidado de se desenvolver uma postura e visão crítica e reflexiva. Acompanhar o Esporte-Espetáculo pelas mídias, desde o evento ao vivo até a leitura de informações que o cercam e geram expectativas e discussões, é uma realidade cultural das pessoas, uma diferente visão e interação com os fatos.
Sobre considerar o contexto e as experiências das crianças no processo de ensino e compreensão da mídia e do esporte, Betti (1998) diz:
A consciência crítica, a humanização, a elevação dos patamares de civilização só podem ser propostas às novas gerações com base no seu contexto de vida, na sua linguagem, nas suas novas formas de comunicação e compreensão do mundo, que incluem a tecnologia audiovisual. Na cultura esportiva das crianças e dos jovens, tomam parte tanto o esporte como prática corporal ‘real’ como formas ‘virtuais’ do esporte telespetáculo, dos jogos de videogame e computador. (p. 149)
Essas novas formas de comunicação dos conteúdos, são complementares. Hoje a velocidade da internet e do celular, bem como a integração entre elas propicia uma circulação de informações, imagens e sons que acompanham o ritmo dos jovens (ou esses acompanham aquele!?). E cada uma delas mantém suas características e significados implícitos no seu formato.
Sobre algumas características dos conteúdos da mídia, temos o que Santaella (1996), classifica como:
provisoriedade: a manutenção de determinado assunto é efêmero e passageiro, segue uma dinâmica baseada em despertar interesse, explorar emoções;
mobilidade: circulação da informação entre as mídias em seus veículos,
proliferação: de veículos e da própria mídia.
Para ilustrar a autora expõe sobre o envelhecimento da informação dentro da mídia, que dura conforme o ritmo imposto por ela própria sobre determinada informação. São diferentes os tempos de duração de uma informação nas distintas mídias, seja no jornal, na televisão, internet, radio, etc.
"Envelhecimento precoce da informação que só pode durar de acordo com um ritmo do tempo que a própria mídia impõe sobre aquela informação. Assim sendo, o tempo de duração de uma informação numa revista semanal, por exemplo, é diferente do tempo de duração dessa mesma informação num jornal diário, que será também diferente de um jornal televisivo, etc." (SANTAELLA, 1996, p. 36)
Há uma tendência de redes inter complementares, conforme denomina Santaella (1996) considerando-se os potenciais e possibilidades de cada veículo. Tais elementos interferem na diversidade de recepção dos sujeitos, uma vez que a mensagem recebe vários tratamentos para ser transmitida conforme as características e interesses de cada veículo de mídia. Há uma interação entre as mídias que gera, desenvolve e dá continuidade, complementando e explorando o conteúdo dentro de suas características.
"..., são várias facetas de informação que um só receptor vai adquirindo à medida que passa de uma mídia a outra: de um ouvinte a espectador, de espectador a leitor, enquanto vai gradualmente formando sua opinião acerca da realidade a partir de uma multiplicidade de fontes." (SANTAELLA, 1996, p.38)
Essas facetas são recheadas de significados que ganham importância na medida que estabelecem maiores conexões com ox contextos cotidianos dos alunos.
O hipertexto na internet é efêmero, dinâmico, facilmente editado, sua “veracidade” pode ser comprovada pelo número de páginas relacionadas a ele indicadas pelos sites de busca, pode reproduzir facilmente o que foi visto na TV, editado, modificado ou na íntegra, junto a comentários de especialistas ou anônimos.
O videogame é mais ou menos real de acordo com aquilo que representa e possibilita de sensação em relação à aquilo que está fundamentado, isto é, um jogo de tênis de um videogame que possibilita movimentos com o braço pode ser mais real se a força que aplico no movimento exercer influência na ação do jogo eletrônico, uma ação que representa uma prática concreta e que vem carregada de informações comprrendidas facilmente pelo aluno.
A televisão nessa linha de evolução dos recursos tecnológicos é cada vez mais um centro de variedades e especialidades, milhares de canais e um controle remoto. A seleção da informação ainda que tudo pareça idêntico de certa forma pertence ao telespectador. Os avanços a tornam cada vez mais interativa e integrada com esses novos recursos (celulares, Tv digital, computador, etc.)
E o jornal? Está com os dias contados ? Uma discussão em moda, mas que não entraremos aqui no mérito de sua extinção ou não extinção. Hoje os jornais permanecem impressos e também se colocam via internet, alguns apenas mantém sua existência no espaço virtual. Que relação complementar ele ainda pode exercer sobre os demais ?
Se antes ele era o espaço de aprofundamento das matérias lidas na TV e ouvidas no rádio de forma superficial, e hoje ele pode virtualmente apresentar as imagens e sons junto ao seu conteúdo, como podemos imaginar a tendência desse veículo e principalmente discutir suas funções e contribuições para o processo de ensino e leitura.
O jornal é ainda uma fonte de acesso amplo a informações, primeiro pelos limites de acesso que boa parte da população tem a uma internet por exemplo. Depois, outro fator que podemos elencar como argumento sobre a tendência de sua importância é o surgimento e proliferação de jornais populares, a preços acessíveis.
Assim, como trabalhar esse veiculo de informação, de forma a explorar suas possibilidades de estímulos a leitura, debate e reflexão, foi o foco dessa comunicação.
O jornal na aula de Educação Física
Como estabelecer essas relações entre “aquilo que faz sentido” para o aluno, os significados das mensagens dos veículos e como trazê-los para dentro da aula, são questões que devem estar na mente do professor, para desenvolver uma atividade que envolva esses aspectos junto com seus objetivos curriculares.
Referindo-se a questão do audivisual, mas que pode ser expandido de uma forma mais ampla, Babin e Kouloumdjian (1989) abordaram duas formas de conseguir compreender tais diferenças de significados e interpretações que os conteúdos adquirem. Apontam que as primeiras ações que devem ser tomadas são: ler, escutar e perguntar. “Antes de qualquer metodologia rigorosa, impõe-se a escuta humana mais aberta possível”. (p.17).
Essa reflexão remete-nos a Martins 92003) citada no início do texto quando do discurso sobre as potencialidades das crianças e da falta de atenção que é dada ao que realmente expressam.
O segundo ponto apontado por Babin e Kouloumdjian (1989) é o compreender pela experiência, no qual relatam a necessidade de se expor ao fenômeno e sentir os “choques” ali presentes.
Aqui observamos que o jornal ou a leitura da informação é, ou espera-se , hábito do professor e possui determinados significados , ou seja, ele está inserido nessa experiência, está exposto, tanto quanto os alunos. Mas o que ocorre é uma experiência baseadas em quadros de referências distintos e com conseqüente impressões de significados.
Nessa ótica acreditamos que trabalhar a construção do jornal a partir da leitura, organização estruturação de uma linha e objetivos de publicação, seguidas de posterior interpretação, análise e discussão, pode ser uma atividade que enriquece o processo de relação que os alunos estabelecem com a mensagem midiática e conseqüentemente como constroem a concepção de esporte, tendo como um dos pontos de referência esse conteúdo processado por mecanismos que ele pôde de certa forma vivenciar, ter a sua experiência e ser ouvido.
Objetivos
Identificar através das atividades, as concepções que constroem acerca do fenomeno esportivo e como observam-no como conteúdo no jornal, o que dizem em relação às diferentes funções e manifestações contextualizadas, quais os ambientes que estabelecem o contato, as interações com outras formas de acesso que possuem, opiniões, sentimentos, interesses que atribuem, com quem compartilham e vivenciam essas experiências, qual a inserção em suas relações cotidianas.
Destacando sobre tudo como foco das atividades propostas:
Estimular leitura e interação com o conteúdo esportivo diferente da prática propriamente dita (ação habitual e predominante na relação com o fenômeno esportivo)
Estimular a utilização da mídia impressa entre os alunos
Identificar elementos de como interagem com os conteúdos esportivos da mídia.
Reflexões sobre o ensino do esporte e incorporação das experiências esportivas da mídia no processo pedagógico.
Aspectos norteadores da intervenção
Atividade dinâmica orientada e analisada segundo procedimentos metodológicos fundamentados na Análise de Conteúdo (Bardin, 2004) e no Método Compreensivo. (Ferrés, 1996)
Considerando esses conceitos pensou-se em atividades que estimulassem os alunos a manifestarem suas opiniões, que os envolvessem, partindo de situações presentes no seu dia-a-dia, e que trazidas para um ambiente no qual são desenvolvidas atividades de maneira organizada, pudessem ser discutidas e complementadas pela atuação do professor
Para tal ação é necessário que ocorre uma pré-elaboração dos objetivos e parâmetros das atividades desenvolvidas, com o cuidado de não torná-la sem significado dentro do conteúdo curricular, deve ser desenvolvida com o propósito de estimular os alunos a refletirem sobre os conteúdos cotidianos e de identificarem como eles próprios lidam com isso na prática. Fazer o aluno perceber a si mesmo, ou seja, as suas formas de compreensão, as suas interpretações, é um ponto crucial para estabelecer uma intervenção com profundidade.
Cada professor possui a sua forma de atuar, os seus princípios e conceitos, assim, com base nos princípios de mimesis e de recepção dos conteúdos de uma forma dinâmica e interativa por parte das pessoas, discutidos anteriormente, a criatividade e os recursos acessíveis para cada um permitem uma gama de possibilidades para a utilização dos conteúdos esportivos na mídia como recurso e conteúdo integrante das aulas de Educação Física, uma riqueza de atividades que extrapola os exemplos aqui ilustrados.
Como parâmetros para as atividades propostas estabelecemos três bases de observação que consideramos importantes para extrair aspectos significativos da prática:
Envolvimento: forma e intensidade manifestadas através de gestos, expressões, discussões, comentários e ainda a prolongação do tema, a formação de argumentos e grupos (não constituídos espacialmente, mas no campo de idéias).
Espontaneidade: observando-se a espontaneidade dos conteúdos ou a necessidade de estimulação do debate.
Dimensões de análises: especificações temáticas dos conteúdos para análise, conforme: concepção sobre o esporte, o esporte na mídia; ambientes onde se estabelecem as interações com o fenômeno; inserção do fenômeno na rotina; com quem são vivenciadas e compartilhadas a interação com os fenômenos, e quais os sentimentos, percepções e significados que atribuem ao fenômeno.
Desta forma as atividades tiveram como foco final a elaboração de um jornal impresso, através da junção de reportagens e comentários, com debate sobre os conteúdos escolhidos e o processo de formação do jornal, seguido de apresentação das idéias e debate.
Foram seguidos os seguintes passos em linhas gerais:
Esclarecimento das atividades que seriam desenvolvidas
Organização dos grupos de trabalho
Solicitação para trazerem jornais, reportagens ou textos extraídos de alguma fonte informativa que abordassem o esporte
Seleção das folhas , formato e disposição gerais do jornal
Seleção das reportagens e conteúdos
Distinção de funções para cada membro do grupo (funções por eles definidas)
Seleção do titulo e justificativa para o mesmo
Discussão interna no grupo sobre os conteúdos e posicionamento deles perante a informação
Organização e formatação do jornal, disposição, interação reportagem e comentários, formas de chamar atenção
Exposição do jornal para os demais grupos
Discussão sobre as diferenças e sobre os jornais especificamente
Discussão geral sobre a atividade
A riqueza de informação e debate
Diferente interpretação sobre o mesmo fato
Na atividade de elaboração do jornal, baseados num quadro em que ambos os grupos trouxeram, um dos temas construídos pelos alunos se referia aos investimentos, estruturas e resultados de uma equipe de futebol que representa a cidade em categorias menores. Um grupo, influenciado por alguns alunos que participavam de equipes de outras modalidades da cidade posicionou-se contrário aos investimentos e estrutura fornecida pela prefeitura aquele projeto, comparando as informações com a precariedade da estrutura que vivenciavam em outro contexto. O outro grupo com o mesmo quadro de informações explorou e destacou que aquilo significava um fator importante para a cidade, um modelo de projeto que poderia ser seguido pelas demais, dada a organização e resultados obtidos.
Isso denota as diferenças de incorporação e envolvimento com o texto e resultou em construções diferenciadas em sua essência a partir do mesmo quadro de informações. É possível notar claramente os significados atribuídos na interpretação da mensagem os valores e significados carregados de suas experiências e interações. O debate que se sucedeu caminhou justamente para a questão das individualidades e do contato de cada um com as situações concretas, que interferiam na forma como interpretaram tal quadro.
Essas várias facetas que a informação adquire pela transição dentro da mídia interagem com os contextos, como vimos no caso dos alunos que compararam a informação de investimento no futebol da cidade e as relações que vivenciam na prática de outras modalidades, e passa por um processo de incorporação através dos valores e experiências que possuem para dar significado aquela informação
Elementos característicos atribuídos para obtenção de maior sucesso no jornal
Foi possível notar elementos de construção dos alunos e a percepção que eles tinham desse processo, de que eles detinham o “poder” de construir ou pelo menos repassar as informações conforme parâmetros por eles mesmo estabelecidos, percebido desde o processo de discussão do título do jornal, nas justificativas dos temas e linhas temáticas até ao formato de papel, tamanho, disposição das reportagens e comentários. Como ilustração apresenta-se um quadro das justificativas apontadas pelos alunos para a inserção das reportagens e seqüência do jornal.
Justificativas para escolhas das reportagens e formatos |
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Informa ções Polêmicas |
Informa ções Diretas |
Representa ção da Cidade |
Variedades de assuntos |
Conquistas |
Interesse habitual das pessoas |
Chamar aten ção de quem lê |
Expectativas das pessoas |
Prestigio da informa ção |
Fofocas e Brigas vendem |
Divulgar potencial |
Bastidores |
Passar as emo ções do jogo |
Resgate de not ícias antigas |
Curiosidades |
Opini ões e Comentários diferentes |
Intimidades de atletas |
Surgimento de novo astro do esporte |
Quadro 1. Justificativa dada pelos alunos para construção dos jornais na pesquisa de RODRIGUES (2006, p. 111)
É possível identificar a incidência de elementos pensados no público, nas expectativas e comportamento habitual quanto aos temas de interesse. A utilização de elementos do cotidiano dos receptores, com textos dos sujeitos para aproximar e dar mais veracidade e tornar-se mais atrativo para seu público, como observamos, é um recurso dos meios, e dentre alguns aspectos podemos abordar também nesta relação consolidada com o esporte na questão do espetáculo, a construção e difusão dos mitos.
O que Wolf (1998) classifica como gatekeepers, os responsáveis pelo processo de seleção das informações e conteúdos, foi vivenciado pelos alunos e contribui a medida que possibilita uma experiência da lógica e funcionamento por trás da informação que eles estão habituados.
A seguir seguem os quadros com os títulos, justificativas e descrição das características de cada um dos jornais desenvolvidas pelos próprios alunos
Jornal 1 |
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T ítulo |
N úcleo Esportes |
Justificativa |
Jun ção de parte do nome da escola com o conteúdo esportivo, e idéia de centralização de informações em um núcleo. |
Caracter ísticas |
Informa ções diretas, polêmicas, representação da cidade, variedade |
Jornal 2 |
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T ítulo |
Aniballados |
Justificativa |
Nomenclatura jovem, linguagem jovem |
Caracter ísticas |
destaque para cidade, principalmente em variedade e resultados de representa ção |
Jornal 3 |
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T ítulo |
Jornal Laranja |
Justificativa |
Pela cor do papel |
Caracter ísticas |
assuntos pol êmicos e curiosidades esportivas |
Jornal 4 |
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T ítulo |
Por dentro do Esporte |
Justificativa |
que fala de tudo sobre esporte e passar a id éia de quem esta falando é de dentro do esporte |
Caracter ísticas |
Falar de esportes da cidade e assuntos gerais do esporte |
Jornal 5 |
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T ítulo |
Esporte no N úcleo |
Justificativa |
Aliar o nome da escola ao tipo de informa ção oferecida |
Caracter ísticas |
Mat éria voltada ao destaque brasileiro no esporte e a informações que não são tão freqüentes |
Jornal 6 |
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T ítulo |
Baf ão no Núcleo |
Justificativa |
Usar uma g íria comum deles com o nome da escola |
Caracter ísticas |
Informa ções sobre diferentes assuntos e com algo mais voltado para a intimidade e particularidades das modalidades e dos atletas |
Jornal 7 |
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T ítulo |
Lance do N úcleo |
Justificativa |
Id éia de estar perto de tudo que acontece associado ao nome da escola |
Caracter ísticas |
Í dolos, polêmicas, mensagens que as pessoas estão acostumada |
Jornal 8 |
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T ítulo |
Muito mais que futebol |
Justificativa |
mostrar que é um jornal que faz mais do que só falar de futebol |
Caracter ísticas |
Pol êmica , matérias normais e esperadas., mexer com torcedor, opiniões diferentes |
Considerações finais
Foi possível observar o grande envolvimento com o conteúdo esportivo na mídia, a maneira como faz parte do cotidiano dos alunos a busca da informação esportiva e sua capacidade de estabelecer uma conexão com tal conteúdo; as diferenças de significados a partir de experiências e contextos individuais, e a criticidade despontada ao trabalhar com os mecanismos de produção e compreensão das mensagens.
Os alunos se atentaram para as escolhas das reportagens, baseados na necessidade de diversificar o conteúdo trazendo informações sobre outras modalidades diferentes do futebol, ofertando espaços similares, e considerando a necessidade de se falar sobre eventos de renome, sobre polêmicas, sobre a cidade e sobre o próprio futebol por questões tradicionais e de atrativos para o púbico do jornal.
Destacaram a presença de reportagens sobre o mesmo assunto mais abordadas de maneiras diferentes, ressaltando aspectos diferentes, inclusive sobre uma ótica positiva e outra negativa, o valor e necessidade de se trabalhar reportagem de cunho polêmico e atrativo, com assuntos não tão essenciais para o esporte, mas com curiosidades.
O ponto mais forte da discussão foi a construção das reportagens a partir dos interesses que eles atribuem ao jornal, podendo caracterizar uma matéria de acordo com os objetivos, se é mais sentimentalista, se é mais polêmico ou se é mais informativo, abordando desta forma o mesmo fato de diferentes maneiras, inclusive no mesmo jornal.
Tais atividades enriquecem a interação que o aluno estabelece com o esporte. Cotidianamente habituado ao esporte na sua forma prática e mediada, pode através de intervenções como esta, aliar ambas dentro de um contexto de reflexão e aprendizagem que é o ensino da Educação Física, aproximando contextos que estão inseridos na sua rotina e muitas vezes apesar da proximidade entre eles, não é alvo de uma reflexão e observação aprofundada.
Assim fica o debate e reflexão sobre as atividades, de forma que possam ser inseridas nos projetos pedagógicos como ferramentas e como conteúdos propriamente ditas, levando a uma análise crítica do aluno em relação ao fenômeno, mas sempre com o que observamos nos comentários de Joan Ferrés (1996), sem extrair o prazer, ao contrário, através dele desenvolver uma gama de possibilidades, despertando questões latentes nos alunos.
Referências
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BARDIN,
L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2004.
BETTI, M. A janela de vidro: esporte, televisão e educação física.
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FERRÉS, J. Televisão e Educação. Porto Alegre: Ed. Artes Medicas, 1996.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários a pratica educativa. São Paulo. Paz e Terra, 2004.
MARTINS, M. C. Criança e mídia: “diversa-mente” em ação em contextos educacionais. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes, Multimeios, Campinas. 2003.
OROZCO-GOMEZ,
G. Professores e Meios de Comunicação: desafios e estereótipos.
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RODRIGUES, E.F. Esporte e Mídia: Interfaces e significados dos
conteúdos esportivos atribuídos pelos alunos. 2006. 217f.
Dissertação de mestrado - Universidade Estadual de Campinas. Faculdade
de Educação Física,. Campinas, 2006.
SANTAELLA, L. A cultura das mídias. São Paulo: Experimento, 1996.
THOMPSON, J.B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. 5º ed. Petrópolis: Ed. Vozes. 1998.
WOLF, T. Teorias da Comunicação. Portugal: Ed. Presença,1998.
revista
digital · Año 13 · N° 125 | Buenos Aires,
Octubre de 2008 |