Interfaces entre o esporte a educação para a paz e o desenvolvimento humano |
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* Mestre em Ciências Sociais Aplicadas – UEPG Vinculado aos grupos de pesquisa: Esporte, Lazer e Sociedade, UEPG (pesquisador); Gestão de recursos humanos para o ambiente produtivo - UTFPR (pesquisador). Docente da Educação Física das Faculdades Integradas de Itararé-SP. ** Mestre em Educação – Unimep/SP Docente da Educação Física e Turismo - UEPG. Docente da Pedagogia e Educação Física das Faculdades Integradas de Itararé. Coordenador do Observatório de Violências nas Escolas (AIE/SP). |
José Roberto Herrera Cantorani* Nei Alberto Salles Filho** (Brasil) |
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Resumo O texto a seguir vai buscar as interfaces entre Esporte, Educação para a Paz e Desenvolvimento Humano. Para isso analisa o “Relatório da Força Tarefa entre Agências das Nações Unidas sobre o Esporte para o Desenvolvimento e a Paz” (ONU,2003) e ampara-se também em estudos sobre o esporte e lazer desenvolvidos por Norbert Elias e conceitos relativos à paz e à conflitos trabalhados por autores que trafegam pelo estudo da educação para a paz. O relatório trata do Esporte como elemento favorecedor das metas de desenvolvimento do milênio estabelecidas pela ONU e apresenta algumas possibilidades concretas para tal realização. Porém, de maneira geral, a abordagem sobre o tema “Esporte e Paz” apresenta uma fragilidade conceitual que vai ser examinada com maior detalhamento ao longo do artigo. Unitermos: Esporte. Educação para a paz. Desenvolvimento humano. |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 124 - Setiembre de 2008 |
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O esporte e o lazer na sociedade
As obras de Norbert Elias a respeito da sociedade e do esporte possibilitam a compreensão destes fenômenos e também do lazer – todos em desenvolvimento –, dentro da perspectiva de excitação e de emoção compensadora ou, melhor dizendo, de equilíbrio, reclamadas por grande parte das atividades de lazer, entre elas o esporte. Há de se salientar que nesta perspectiva o esporte é um componente do lazer.
Em “O Processo Civilizador”, por exemplo, já se pode enxergar alguns contornos sobre o modo de vida altamente civilizado, e Elias aponta: "[...] Tudo o que se pode dizer hoje é que, com a civilização gradual, surge certo número de dificuldades específicas civilizacionais".
Para Norbert Elias e Eric Dunning, o esporte, e o lazer, uma vez que o primeiro está contido na esfera do segundo, parece ter sido ignorado como objeto de reflexão sociológica e de investigação porque é considerado como algo que se encontra situado no lado que se avalia de modo negativo no "complexo dicotômico de sobreposição convencionalmente aceite como, por exemplo, entre os fenômenos de 'trabalho' e 'lazer', 'espírito' e 'corpo', 'seriedade' e 'prazer', 'econômico' e 'não econômico'" (ELIAS, N., DUNNING, 1992, p 17).
De acordo com a crítica dos autores, no quadro de tendência que orienta o pensamento reducionista e dualista ocidental contemporâneo,
[...] o desporto é entendido como uma coisa vulgar, uma atividade de lazer orientada para o prazer, que envolve o corpo mais do que a mente, e sem valor econômico. Em conseqüência disso, o desporto não é considerado como um fenômeno que levante problemas sociológicos de significado equivalente aos que habitualmente está associado com os negócios ‘sérios’ da vida econômica e política. (ELIAS, N., DUNNING, 1992, p 17)
Contudo, para esses mesmos autores,
O desporto pode ser utilizado como uma espécie de "laboratório natural" para a exploração de propriedades das relações sociais, como, por exemplo, a competição e a cooperação, e conflito e harmonia, que parecem ser, segundo a lógica e os valores correntes, alternativas que se excluem mutuamente, mas que, neste contexto, no que se refere à estrutura intrínseca do desporto, possuem uma interdependência evidente e muito complexa. (ELIAS, N., DUNNING, 1992, p 18)
Esta é uma teoria que permite avaliar o significado social do esporte, e consequentemente do lazer, e que, nessa linha, se esforça, entre outras coisas, por estabelecer os fundamentos da teoria sociológica das emoções. Esta teoria procura também sublinhar o controle individual e social da violência e os processos de longa duração que podem ser observados a este respeito. Em síntese, é uma teoria que permite compreender o esporte e a sociedade na perspectiva do desenvolvimento.
Sobre o relatório
Entre julho de 2002 e março de 2003, a Organização das Nações Unidas (ONU) reuniu uma Força Tarefa entre Agências Internacionais para discutir e analisar as ações que envolvem o esporte no sistema das Nações Unidas. O trabalho foi denominado de “Força Tarefa entre as Agências das Nações Unidas sobre o Esporte para o Desenvolvimento e a Paz”. As Agências participantes, todas com experiência na utilização do esporte em seu trabalho foram: Organização Internacional do Trabalho (OIT), Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (UNDP), Organização Mundial da Saúde (OMS), Voluntários das Nações Unidas (UNV), Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para Refugiados (UNHCR), Fundo de Emergência das Nações Unidas para as Crianças (UNICEF), Escritório das Nações Unidas para o Combate às Drogas e ao Crime (UNODC) e Programa Conjunto das Nações Unidas para o HIV/AIDS (UNAIDS).
Como objetivos da Força Tarefa estiveram a promoção da utilização coerente do esporte em atividades relacionadas à Paz e ao Desenvolvimento da Humanidade, buscando atingir as Metas de Desenvolvimento do Milênio (MDMs), propostas pelas Nações Unidas. Basicamente as MDMs remetem à valorização e respeito à vida, o combate à fome e injustiças, diminuição e controle de doenças, cuidado com o meio ambiente e desenvolvimento sustentável e novas formas de relações humanas, mais éticas, solidárias e não violentas. O documento elaborado pela Força Tarefa foi intitulado “Esporte para o Desenvolvimento e a Paz: em direção à realização das metas de desenvolvimento do milênio”. Utilizaremos para nossa análise a tradução do Relatório para a língua portuguesa, disponível no site do Ministério do Esporte (www.esporte.gov.br) em formato de arquivo pdf. De maneira geral o documento vem organizado por temas, todos argumentando em favor do esporte como ferramenta fundamental rumo às MDMs. Os itens principais remetem às questões tratadas abaixo.
Inicialmente o documento trata do potencial do esporte como ferramenta para o desenvolvimento e a Paz, em que ressalta a importância de valores presentes no esporte, como a cooperação e o respeito. O conceito definido pela Força Tarefa é que o esporte conforma-se em “todas as atividades físicas que contribuem para a boa forma física, para o bem-estar mental e para a interação social” (RELATÖRIO, 2003, p.03). Nesse sentido, o conceito inclui desde práticas de brincadeiras, recreação até o esporte organizado, casual e competitivo.
Na continuidade, tratando do esporte na busca das MDMs, o relatório traça considerações sobre o esporte e saúde, sobre o aumento de doenças não contagiosas no mundo (cardiovasculares, diabetes, câncer, etc.); o aumento do sedentarismo e os benefícios do esporte para a saúde e para a economia. Em seguida fala sobre o esporte e a educação, entendendo o esporte como uma “escola para a vida”. Ainda reforça o caráter inclusivo do esporte, dando exemplos de sua utilização em campos de refugiados e durante as guerras. Termina este ponto chamando a importância da educação física no desenvolvimento de uma cultura esportiva, enfatizando que:
A educação física é um componente essencial da educação de qualidade e uma parte integral da aprendizagem por toda a vida. Negligenciar a educação física reduz a qualidade da educação, com futuros impactos negativos na saúde pública e nos orçamentos da saúde. A educação física é a única matéria no currículo escolar que focaliza especificamente o corpo – seus próprios, assim como os dos outros – e os ajuda a lidar com muitos dos desafios enfrentados por jovens, incluindo o risco do HIV/AIDS e outras doenças sexualmente transmitidas e os perigos do tabaco e das drogas. Oferecer aos alunos a oportunidade de praticar esporte na escola assegura que recebam uma educação completa, que trate do corpo, da mente e do espírito. (RELATÖRIO, 2003, p.18)
Outro aspecto levantado pelo relatório é a percepção do esporte como auxílio ao desenvolvimento sustentável, onde afirma que programas esportivos bem sucedidos contribuem para a sustentabilidade, tanto no aspecto econômico quanto em relação ao meio ambiente. Ressalta a importância de estratégias locais e a articulação com propostas regionais, nacionais e internacionais. Trata também do esporte como desenvolvimento social relatando experiências em vários países em relação ao apoio de propostas para drogados, portadores de deficiências e menores infratores.
O Relatório também levanta a questão do esporte e voluntariado, enfatizando o esporte como espaço de criação de vínculos favorecedores à participação comunitária. Somam-se ao voluntariado as iniciativas pertinentes à busca pela Paz (aspecto analisado adiante no texto). No item relacionado ao esporte e comunicação, o Relatório destaca a importância do esporte como meio de comunicação universal entre os povos e mobilização social, chamando a atenção da importância da mídia esportiva e dos Organismos Internacionais do esporte (COI, FIFA, etc.). Outro ponto a ressaltar é a discussão da importância do esporte no combate ao HIV/AIDS.
Em síntese, as questões básicas propostas no Relatório da Força Tarefa são as levantadas acima. Depois destas são tratadas questões ligadas à estruturação de ações, mobilização de parceiros e como supor estratégias positivas para o esporte. A seguir nos deteremos, de maneira mais aprofundada, no item que trata do esporte e a Paz.
Esporte e Paz
Embora possamos defender a importância do esporte nos moldes propostos pelo Relatório da Força Tarefa, não podemos deixar de entender que o esporte, ao longo da história, também foi largamente utilizado para finalidades bem opostas (imposição de força internacional, imposição de raças “superiores”, “doping”, esporte como “comércio”) o que nos faz crer que os conceitos e valores universais propostos ao esporte devem ser relativizados e devem também ser alvo de análises mais reflexivas. Isso é necessário por não termos um consenso mundial em relação a temas como saúde, meio ambiente, violência, desenvolvimento sustentável, educação, entre outros temas fundamentais da humanidade.
Nessa direção procuramos analisar a dimensão sobre o esporte e a Paz contida no documento. Ela serve como parâmetro para balizar a necessidade de examinarmos todos os itens do Relatório, o que não é intenção do presente artigo. Em relação ao esporte e a Paz o Relatório diz:
O poder do esporte pode ser usado como uma ferramenta para evitar conflitos assim como um elemento da construção da paz sustentável. Quando aplicados eficazmente, programas de esportes promovem a integração social e a tolerância. Esses valores fundamentais são os mesmos que são necessários para a paz duradoura. Particularmente em ambientes de pós-guerra (pós-conflito), pode ajudar a reduzir tensões e a gerar o diálogo. (2003, p.26)
Da dimensão relatada acima, é importante perceber que o Relatório destaca que o esporte é positivo “quando aplicado eficazmente”. Porém não existe aprofundamento sobre o que ou como seria essa aplicação eficaz de programas esportivos. Nota-se que nesse caso, a interpretação pode ser diferente para governos, para entidades, associações e pessoas. O Relatório prossegue com a seguinte consideração:
Já que as habilidades e os valores ensinados através do esporte são compatíveis com os esforços para promover a paz, as atividades esportivas devem ser consideradas como um elemento de apoio dos programas em áreas de pós-conflito e de alta tensão.
É imperativo que os programas de esporte para a paz enfatizem os valores positivos e o potencial de união do esporte e que sejam oferecidos em ambientes seguros que sejam agradáveis e livres de pressão.
As iniciativas relacionadas ao esporte requerem liderança responsável e bem treinada.
Como idioma internacional, o esporte deve ser considerado como um meio prático de comunicar mensagens de paz e ajudar a encontrar soluções não violentas para os problemas. (2003, p.29)
Mais uma vez fala-se de valores e habilidades positivas, liderança responsável e treinada, e soluções não violentas para problemas. Aqui, também, não existe aprofundamento sobre como devem ou deveriam ser as metodologias de intervenção prática com as atividades esportivas, especialmente porque muitas das formas de ensinar e aprender esporte nos dias atuais está relacionada à conflitos, violência, etc. Para ampliar as questões acima e contribuir na reflexão indagamos: Como pensar esporte e paz se na competição esportiva encontra-se presente a violência? A competição em si não seria uma forma de conflito? Como analisar o esporte e a paz quando em em ambiente de briga entre torcedores? Como fica a idéia de idioma esportivo universal? Como pensar as Olimpíadas (doping, patrocínio, dinheiro e marketing)? Como pensar esporte e paz quando os “valores” pretensamente “universais” são manipulados por pessoas, entidades e até por governos? Será que pensamos todos iguais sobre “Esporte é Saúde”, “Esporte é Vida”, entre outras frases de efeito?
O que não é dito sobre a Paz
Temos convicção que o Relatório aqui analisado de maneira inicial é um marco positivo para o esporte, por isso buscamos contribuir para que as questões universais por ele levantado possam ter repercussões mais concretas e verdadeiras no cotidiano. Para pensar as relações entre esporte e paz, nos remetemos aos estudos de Jares (2002). Para este autor é necessário rever os conceitos de paz sobre os quais temos nos apoiado historicamente. Para Jares, a paz sempre veio atrelada a dois aspectos dominantes, porém igualmente limitados conceitualmente. O primeiro enfoque é o da paz como mera “ausência de guerra”. Nesse sentido diz que a paz, em última instância, fica ligada ao Estado, sem o poder de intervenção do cidadão, ou seja, as pessoas ficam reféns de decisões de outros, no caso, governantes. O segundo enfoque, igualmente limitado conceitualmente, entende a paz como um estado de harmonia, serenidade, a ausência de conflitos e, nesse sentido, se aproxima da dimensão da religiosidade, ficando o entendimento sobre a paz num sentido altamente subjetivo.
Em ambos os casos, dois conceitos chave deixam de ser considerados. O primeiro é o entendimento de violência e o segundo é a noção de conflito. Para Jares e demais estudiosos da Educação para a Paz (EP), como Galtung, a paz é justamente o contrário das idéias acima. Como expressa Galtung (apud JARES, 2002, p.65),
[...] em primeiro lugar, a paz já não é o contrário de guerra, mas sim de sua antítese, que é a violência, dado que a guerra é só um tipo de violência, mas não o único.
Em segundo lugar a violência não é unicamente a que se exerce mediante a agressão física direta ou por meio de diferentes artifícios bélicos que se podem usar, mas é preciso levar em conta também, outras formas de violência menos visíveis também, mais difíceis de reconhecer, mas também mais perversas no sentido de produzir sofrimento humano.
A citação acima faz menção ao que Galtung chama de violência direta (de pessoas) e violência estrutural (estruturas de governo, de sociedade, etc.). Isso nos faz perceber que o Relatório da Força Tarefa, embora traga inúmeras possibilidades, ainda não trata de maneira crítica os conceitos que defende. Assim, no caso do esporte, a violência direta, que ocorre na própria prática acaba ficando sem consideração.
Outro conceito importante de ser pensado, em relação à paz, é a noção de conflito, que não é tratada especificamente no Relatório. Segundo Arenal (1989, p.22) “[...] o conflito é um processo natural e necessário em toda a sociedade humana, é uma das forças motivadoras da mudança social e um elemento criativo essencial nas relações humanas”. Nesse sentido, a EP procura entender o conflito numa perspectiva positiva, ou seja, a paz não é a ausência de conflito (que são inerentes aos seres humanos), mas sim, sua perspectiva criativa, no sentido em que os enfrentamentos criam novas formas de relações.
Para a ampliação do entendimento deste conceito de conflito lembramos novamente Norbert Elias. De acordo com os estudos deste sociólogo, nas sociedades contemporâneas, inclinações para expor em público excitações do tipo sérias, que ameacem a ordem estabelecida, estão cada vez mais reduzidas. Para serem considerados normais, os adultos dessas sociedades devem controlar a tempo a sua excitação. Espera-se desses, um comportamento adequado e igualmente condizente com o nível organizacional atingido pela atual sociedade. O efeito disto é um comportamento padronizado e um estilo de vida rotineiro, sem riscos para si e para os outros.
Trata-se de um controle social em exercício, porém, auto exercido. Este controle, do qual não se pode fugir, pois cada indivíduo o põe em prática, a si mesmo e aos outros, reduz ao máximo as oportunidades de excitações agradáveis. Assim, as características das necessidades individuais de lazer são socialmente desenvolvidas com base nessa falta de oportunidade de se expressar de forma prazerosa. Não obstante, as características das atividades específicas de lazer, ainda que mais complexas, desenvolvem-se no sentido de suprir tais necessidades.
Assim, se o homem – com inclinações ao conflito – se vê socialmente vetado à explosões comportamentais, factualmente, encontra nas atividades de lazer – entre elas o esporte – a possibilidade de suprir necessidades que possam surgir deste alto padrão de controle.
Os conceitos de catarse e mimese apresentados por Elias e Dunning elucidam como se conformam, socialmente, as atividades de lazer.
Os autores encontraram em Aristóteles um conceito bastante sugestivo, o conceito de catarse. Aristóteles, por sua vez, formulou a sua interpretação a partir de fatos estudados na fisiologia. A palavra catarse vem do conceito médico, ligado ao expulsar de substâncias nocivas do corpo, uma limpeza do corpo por meio de uma purga. Aristóteles propunha em sua tese, num sentido figurado, que a música e a tragédia provocavam algo similar nas pessoas.
O termo mimético, por sua vez, no sentido literal é imitativo. Conquanto, é, pelos autores, utilizado num sentido mais alargado e figurado. Nesse aspecto, constitui-se em uma característica comum em todas as atividades de lazer classificadas com essa denominação. A excitação mimética, na perspectiva individual e social, é desprovida de perigo e pode ter um efeito catártico.
Observações sobre o efeito catártico que formas miméticas de lazer proporcionam nas pessoas, e a busca cada vez maior por essas formas de lazer, acentuam a concepção de que as pessoas procuram nas atividades de lazer não o atenuar das tensões, mas sim, uma tensão específica, uma forma de excitação normalmente evitada e/ou vetada na vida cotidiana.
Assim, é preciso refletir sobre a conceituação “esporte e paz” de uma forma mais ampla, considerando sempre a existência e desenvolvimento do homem e da sociedade. É claro que o esporte pode e deve ser usado como ferramenta para o alcance e implantação da paz, mas, para isso é preciso ter o conhecimento de todas as suas dimensões.
Pensando nos conceitos mais claros sobre violência e conflito, podemos começar a aproximar as contribuições do Relatório com o esporte em nossas comunidades, cidades, através de formas de ensiná-lo, de pensá-lo, em políticas públicas, etc.
Possibilidades
Conforme discutimos brevemente nesse artigo, a relação entre esporte e paz é muito positiva. Porém, uma questão fundamental que se coloca é que cada vez mais se intensifica o campo de estudo e pesquisa sobre a paz. Logo, qualquer possibilidade de pensar as interfaces entre os temas carece de análise mais adequada. O próprio Relatório já faz esse alerta:
O potencial do esporte como ferramenta para o desenvolvimento e a paz ainda precisa ser plenamente apreendido. A utilização do esporte permanece fora do pensamento convencional das Nações Unidas. Ao mesmo tempo em que o esporte e a brincadeira são repetidamente reconhecidos como um direito humano, nem sempre são considerados como uma prioridade e já foram até mesmo chamados de “direitos esquecidos”. (2003, p. 06)
O que fica como alerta – na tentativa de que o Relatório da Força Tarefa não fique no nível da utopia, mas que efetivamente seja pensado como possibilidade de tradução cotidiana, nas escolas, clubes, nas secretarias/departamentos de esporte (municipais/estaduais) e nos governos nacionais – é a fundamental importância de discutir seriamente os conceitos de paz e desenvolvimento humano. Como ressalta Rabbani (2003, p. 63):
[...] nem toda educação leva à paz e que a uma sociedade cuja a paz não é resultado do processo educativo, por mais civilizada e materialmente desenvolvida que seja, é uma sociedade que violenta seus membros e ameaça constantemente os demais.
Assim, apenas falar e informar sobre paz, sem discutir historicamente os contextos onde o esporte tem a pretensão de tornar-se um instrumento contra a violência, pode ser uma atitude arriscada. O risco é o de aceitar qualquer ação “louvável” ou “espirituosa” em nome do esporte, mas que, no fundo, podem estar repleta de outras intenções, inclusive a de fomentar violências de toda a ordem. Ficam as ressalvas e a intenção de que cada vez mais nos aproximemos do movimento da “pesquisa pela paz”, já presente no mundo todo e que cresce a cada dia no Brasil. Articulado ao movimento de pesquisa pela paz que seja reafirmada a importância do esporte como instrumento para a paz e o desenvolvimento humano. Mas, que seja um esporte pensado de maneira pedagógica e sistemática, com profissionais preparados e conscientes de como pensar sociedades mais justas e democráticas.
Referências bibliográficas
ARENAL, C. La noción de paz y la educación para la paz. Cruz Roja Española: Madrid, 1989.
ELIAS, N., DUNNING, E. A busca da excitação. Lisboa: DIFEL, 1992.
ELIAS, N. O Processo civilizador: uma história dos costumes. Rio de Janeiro: Zahar, 1994. 1 v.
JARES, X. Educação para a Paz: sua teoria e sua prática. Porto Alegre: Artmed, 2002.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Esporte para o Desenvolvimento e a Paz: em busca das metas de desenvolvimento do milênio. Relatório da Força Tarefa entre Agências das Nações Unidas sobre o Esporte para o desenvolvimento e a Paz. Nações Unidas, 2003.
RABBANI, M.J. Educação para a paz: desenvolvimento histórico, objetivos e metodologia. In: MILANI, F. (org.) Cultura da Paz: mapas, bússolas e estratégias. Salvador: INPAZ, 2003.
revista
digital · Año 13 · N° 124 | Buenos Aires,
Setiembre de 2008 |