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Treinamento em ginástica rítmica no estado do Paraná

 

*Graduada em Educação Física pela Universidade Estadual de Maringá.

Especialista em Ginástica Rítmica pela UNOPAR

Professora do Colégio Regina Mundi

**Graduada em Educação Física pela Universidade Estadual de Maringá.

Especialista em Ginástica Rítmica pela UNOPAR

Professora do Departamento de Educação Física da UEM

***Doutora em Educação Física pela Faculdade de Educação Física da UNICAMP

Professora do Departamento de Educação Física da UEM

Líder do Grupo de Pesquisa em Ginástica - CNPq

****Doutorando em Biologia Celular pela Universidade Estadual de Maringá

Professor Departamento de Educação Física da UEM

Fernanda Soares Nakashima*

Lorena Nabanete dos Reis**

Ieda Parra Barbosa-Rinaldi***

Wilson Rinaldi****

parrarinaldi@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

Resumo
          Este estudo descritivo, buscou mapear a estrutura organizacional de equipes paranaenses de Ginástica Rítmica, com destaque no cenário nacional, a fim de subsidiar, por meio de referencial teórico, o treinamento nesta modalidade. Para tanto, foi realizada uma entrevista semi-estruturada com técnicas das duas equipes selecionadas. A entrevista continha questões sobre a estrutura organizacional e periodização dos treinamentos das equipes de base. Concluiu-se que há estrutura em nível organizacional e de planejamento, porém no que diz respeito à referenciais teórico-científicos, percebe-se que a escasses de estudos e pesquisas brasileiras que posssam subsidiar o treinamento interferem nos trabalhos. O estudo trouxe contribuições para que novos trabalhos se iniciem de forma mais solidificada e, para que os trabalhos já existentes se reestruturem a fim de conseguirem alcançar melhores resultados.
          Unitermos: Ginástica Rítmica. Treinamento desportivo. Programa de treino.


Abstract

          This descriptive study had a goal to mape the organization of teams from the state os paraná that had good results at the national gimnastics, to give some base material as reference for the training of this sport. for this, it was made an half structuralized interview with the coachs of the two selected teams. the interview had questions about the organizational structure and the program of the training of the base teams. it was concluded that ther is an organization and planning, but there is not a consistent theorical and scientific reference to fundament the work, what limited the study according the training program. even this way, the study brought contributions for new works in rhythmic gimnastics to be more solid in their fundaments and for the existent works to restructure themselvs to reach better results.
          Keywords: Rhytmic Gymnastics. Sportive training. Training program.

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - Nº 123 - Agosto de 2008

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Introdução

    O treinamento desportivo em qualquer esporte segue um programa sistematizado que visa a melhora do rendimento dos atletas. Um bom programa de treinamento se desenvolvido com comprometimento, responsabilidade e competência profissional, influencia significativamente nos resultados em competições. Laffranchi (2001, p. 3) confirma isso quando cita que as performances:

    Nada mais são do que um produto real de um treinamento planejado conscientemente em seus mais variados detalhes. Produto de uma organização e aplicação de um trabalho multilateral que visa o desenvolvimento harmonioso de todo o corpo da ginasta, assim como a adaptação de seu organismo às exigências específicas da modalidade.

    Na Ginástica Rítmica (GR) não é diferente, e além do mais é uma modalidade que possui muitas particularidades, o que de certa forma, inviabiliza a utilização das teorias do treinamento desportivo que são aplicadas para a maioria das modalidades, e que não contemplam as especificidades das ginásticas. E é justamente por falta de referencial teórico que muitas vezes uma equipe escolhe um programa de treino baseando-se e reproduzindo experiências exclusivamente empíricas e modelos já existentes. Essa é uma realidade que não deveria acontecer, já que “este processo (treinamento) deve ser conduzido com base em princípios científicos para garantir modificações orgânicas que influenciarão significamente na capacidade de rendimento da ginasta” (LAFFRANCHI, 2001, p.11).

    Os modelos de organização de treinamento nos quais às equipes brasileiras se baseiam geralmente vem de outros países, normalmente da Europa, que já têm uma maior tradição na área da ginástica. O que acontece quando esses métodos são trazidos ao Brasil, é que as realidades de trabalho, bem como o próprio biotipo das ginastas, hábitos e a cultura em geral são muito diferentes e, conseqüentemente as adaptações acabam tendo que acontecer. Assim, até que as devidas adequações ocorram, é despendido muito tempo com tentativas e experimentações em busca do que parece surtir resultados positivos.

    Na atualidade a GR brasileira teve um grande desenvolvimento em se tratando de resultados internacionais, conquistou uma vaga nas duas últimas olimpíadas. Pensamos que este avanço reflete uma melhor estruturação no treinamento da modalidade e que, no decorrer dos anos, sendo constantemente revista e modificada, aos poucos, foram encontrados melhores caminhos para trabalhá-la.

    Atualmente, o nível técnico apresentado pelas ginastas em competições nacionais é perceptivelmente superior ao de tempos atrás. As equipes brasileiras têm criado uma cultura própria de treinamento, no sentido de realizar um trabalho de base mais adequado aos novos desafios que vão surgindo na modalidade, tendo em vista que a mesma está em constante mudança e com exigências cada vez maiores.

    Entre as equipes brasileiras, o Estado do Paraná vem se destacando em nível de resultados nacionais e internacionais. Além disso, geralmente o número de clubes paranaenses participantes é predominante sobre os demais estados. Acreditamos que isto esteja relacionado à diversos fatores, como por exemplo: o fato deste estado ser um dos precursores da modalidade no país; a uma busca incessante dos técnicos no aperfeiçoamento e atualização dos métodos de treinamento; visitas de treinadoras de outros países que transmitem sua experiência e conhecimentos aos interessados pela área; bem como, a realização de estudos e pesquisas junto a diferentes escolas de treinamento (Russa, Búlgara, Cubana, entre outras)

    Neste contexto, resolvemos investigar o que tem contribuído para que equipes paranaenses estejam constantemente alcançando resultados de destaque nacional na GR. Assim, estabelecemos as seguintes questões norteadoras para nosso estudo: A forma como as equipes paranaenses organizam o treinamento seria a mais adequada à preparação das ginastas? O que, de acordo com os estudos na área do treinamento desportivo e específicos da modalidade, pode realmente favorecer o desenvolvimento do trabalho?

    Dessa forma, o presente estudo busca por meio do mapeamento da organização de treinamento destas equipes e, baseado em referenciais teóricos, apresentar indicativos que possam subsidiar o desenvolvimento de um trabalho com a GR.

    Atualmente no Brasil, as ginásticas encontram-se em evidência devido aos resultados internacionais conquistados nos últimos anos. A representação do nosso país em campeonatos mundiais, Panamericanos e Jogos Olímpicos notificados pelos meios de comunicação fizeram com que houvesse uma divulgação das modalidades ginásticas, despertando o interesse pela prática e incentivando o surgimento de novas equipes de ginástica artística e, em especial, de ginástica rítmica que é o foco deste estudo.

    De acordo com Laffranchi (2001, p.3), “O alto rendimento na Ginástica Rítmica só pode ser encontrado nas bases científicas de treinamento, suporte de metodologias que sistematizam as grandes performances procuradas”. Porém, verificamos a escassez de estudos sobre o treinamento desportivo específico que possam servir de suporte ao profissional da área que deseja iniciar um trabalho, ou mesmo para os que já o desenvolvem, mas buscam aprimorar a estruturação do programa a ser aplicado em sua equipe.

    Assim, em geral parece que os treinamentos desenvolvidos em ginástica rítmica no Brasil se apóiam muito mais no senso comum, na experiência prática do profissional, do que em referencial teórico que dê sustentabilidade ao trabalho realizado. Assim, as diversas equipes do país estabelecem diferentes programas de treinamento e muitas delas sem apresentar rigor no que diz respeito a seguir um planejamento sem base científica.

    Quando percebemos que as equipes paranaenses tratadas no estudo alcançam constantemente os melhores resultados nos campeonatos nacionais, nos questionamos se a base científica do treinamento que desenvolvem seria o mais adequado ou se seriam outros fatores os responsáveis por seus resultados. Em geral, poucas equipes do país têm seu treinamento organizado com base no treinamento desportivo, portanto, quem se aproxima um pouco das bases científicas já mostra resultados diferenciados. Outro aspecto é que, a estrutura (física e humana) de treino da maioria das equipes é deficitária, assim as equipes que conquistaram algum espaço e apoio, acabam apresentando bons resultados.

    Mediante as considerações apresentadas, surgiu o interesse em entender como essas equipes organizam seu trabalho, para que ao analisá-los a partir de referenciais teóricos, possamos estabelecer indicativos que possam contribuir para a estruturação de um treinamento em GR.

    Estabelecemos como foco do estudo as categorias de base e infantil, por serem as categorias trabalhadas nas duas equipes pesquisadas, e por acreditar que o trabalho de iniciação na modalidade é fundamental para a qualidade do desenvolvimento das ginastas, refletindo no desempenho em competições futuras. Para tanto, neste estudo estabelecemos como objetivo geral: Mapear a estrutura organizacional das equipes paranaenses de ginástica rítmica com destaque no cenário nacional, a fim de subsidiar por meio de referencial teórico o treinamento nesta modalidade. E, como objetivos específicos: Identificar como ocorre o processo de formação das ginastas desde a iniciação até a categoria infantil; e, Verificar como se dá a organização do treinamento das diferentes categorias;

Metodologia

    Essa pesquisa caracteriza-se como do tipo descritiva, que de acordo com Cervo e Bervian (1996) é aquela que procura observar, registrar, analisar, classificar e interpretar os fatos ou fenômenos (variáveis), sem que o pesquisador interfira neles ou os manipule. Este tipo de pesquisa tem como objetivo fundamental a descrição das características de determinada população ou fenômeno.

    Tendo em vista os campeonatos promovidos pela Federação Paranaense de Ginástica e Confederação Brasileira de Ginástica dos anos de 2003 e 2004, o universo de pesquisa abrange os centros de treinamento que tiveram participação e destaque1 nos mesmos na categoria infantil. Neste estudo serão tratados como: equipe 1 e equipe 2.

    A população foi composta pelos técnicos responsáveis por cada equipe selecionada para o estudo. Foram entrevistados três técnicos, sendo dois da equipe 1 e um da equipe 2.

    Para selecionar as duas equipes que seriam tratadas no estudo, verificamos os resultados dos campeonatos nacionais, encontrados nos relatórios anuais da Federação Paranaense de Ginástica, escolhendo as que mais se destacavam. Foi então elaborada uma entrevista semi-estruturada, baseada em questões relacionadas ao programa de treinamento utilizado, desde as categorias de base até a categoria infantil das equipes participantes da pesquisa. A validação do questionário foi feita por meio de um estudo piloto realizado com uma técnica da equipe de GR de um clube de Maringá, que respondeu as questões da entrevista e, a partir dos dados colhidos, as mesmas foram reavaliadas para que pudéssemos colher informações mais consistentes ao entrevistar as técnicas das equipes selecionadas para o estudo.

    Os dados foram coletados pelos pesquisadores no mês de julho de 2005. Para tanto, as pesquisadores se dirigiram ao local de treinamento da equipe 1 e realizaram a entrevista com as técnicas responsáveis do local. A entrevista com a treinadora da equipe 2 foi realizada durante o campeonato paranaense infantil realizado no município de Maringá.

    Os dados foram tratados por meio de análise de conteúdo, que consiste segundo Bardin (1977) em um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrições dos conteúdos das mensagens obter indicadores quantitativos ou não, que permitem a interferência de conhecimentos relativos às condições de produção/ recepção das mensagens.

Apresentado a ginástica rítmca

    A GR baseia-se na combinação de movimentos corporais com manipulação de aparelhos manuais (corda, arco, bola, maças e fita), transformando-se em uma atividade de execução de técnicas altamente complexas. Nesta modalidade as ginastas devem executar uma coreografia (série) composta por uma seqüência de elementos corporais, coordenados com o manuseio do aparelho, e com acompanhamento musical. É uma das poucas modalidades que permitem trabalhos coletivos e individuais.

    Os elementos corporais dividem-se em um grupo fundamental, em que estão movimentos de pivots, ondas, saltos, equilíbrios e flexibilidades; e outros grupos de movimentos como: deslocamentos variados, saltitos, giros, balanceamentos e circunduções. Para que esses movimentos específicos da modalidade sejam realizados de forma satisfatória, é necessário ser feito um trabalho com foco nas qualidades essenciais à modalidade, tais como a força, a resistência muscular, a flexibilidade, o equilíbrio, o ritmo, a coordenação e a agilidade.

    Outro aspecto importante na GR, é que entre essas habilidades, a flexibilidade, é essencial para a execução dos elementos corporais, pois esta valência permite a amplitude de movimento das diferentes partes do corpo, uma das características principais deste esporte (LAFFRANCHI, 2001). Devido a este fator é que é importante o início da prática da modalidade durante a infância. A partir dos dez anos de idade, o processo de ossificação vai limitando a possibilidade de movimento de determinadas articulações que vão perdendo sua capacidade elástica, dificultando assim, um trabalho de desenvolvimento da flexibilidade (LLOBET, 2000).

    Os exercícios ginásticos possuem forma correta de execução pré-definida e contida no código de pontuação, e a cada um é atribuído um valor de acordo com o nível de dificuldade. As atletas realizam os movimentos da série e os árbitros verificam se a realização de cada um deles foi correta, reconhecendo assim, os valores que lhe são atribuídos.

    Diante disso, é necessário um treinamento intensivo e detalhista do exercício competitivo, baseado em inúmeras repetições dos movimentos, para que estes sejam automatizados e, com cada vez mais chances de acerto no momento da apresentação. Sobre isso, Laffranchi (2001, p.3) afirma que “sendo um desporto que objetiva alcançar, dia-a-dia, a perfeição técnica, horas de treinamento são utilizadas para a formação de uma ginasta”.

    O aspecto técnico da ginástica rítmica tem evoluído muito, sobretudo nos últimos 20 anos, e “hoje, meninas executam com facilidade elementos que antes campeãs mundiais consideravam grande sucesso” (RÓBEVA, 1991, p.48). Segundo análise de Laffranchi (2001, p. 135) “o nível dos resultados observados atualmente na Ginástica Rítmica é tão elevado, que somente as garotas que se dedicaram à atividade desportiva durante muitos anos são capazes de se aproximar desse nível ou até mesmo superá-lo”. Assim, verificamos o rejuvenescimento desse desporto, pois a maioria das praticantes inicia a prática entre 5 e 9 anos, já que, segundo a autora, as performances ginásticas máximas só podem ser atingidas se as bases esportivas necessárias forem lançadas desde a infância.

    Quanto ao biótipo da atleta, Róbeva (1991, p. 37) coloca que “preferem-se meninas com desenvolvimento do sistema muscular, pernas longas, charmosas”. Segundo Llobet (2000), o perfil físico verificado das ginastas de elite mundial é: estatura mediana, músculos finos, quadris estreitos, flexibilidade global e pouco tecido adiposo. Dessa forma, existe uma certa exigência para que as ginastas sejam muito magras, porém, com a musculatura desenvolvida.

Treinamento desportivo: conceitos

    Há muito que falar sobre treinamento desportivo atualmente. Neste tópico tentamos trazer alguns conceitos que julgamos necessários para o entendimento e relação com a especificidade deste estudo, que é a do treinamento da ginástica rítmica.

    Treinamento é uma prática que leva à melhoria de uma condição. Isso pode se detectar em qualquer atividade da vida cotidiana, como podemos observar em Barbanti (2001: 3) que “tanto um atleta quanto uma pessoa aprendendo datilografia estão treinando suas atividades, embora com objetivos distintos”. Podemos então definir treinamento, de uma maneira informal, como Weineck (1999: 18) “exercício, cuja finalidade é o aperfeiçoamento em uma determinada área”.

    Contudo, esse estudo volta-se para o treinamento físico e neste já são envolvidos alguns outros fatores. Trata-se de exercícios físicos com o objetivo de desenvolver e aprimorar as atividades motoras e preparar esportistas para níveis elevados de rendimento. Barbanti (2001: 3) define esse tipo de treinamento como: “uma repetição sistemática de movimentos que produzem reflexos de adaptação morfológica e funcional, com o objetivo de aumentar o rendimento num determinado espaço de tempo” .

    Para que um treinamento dê resultados satisfatórios é preciso que haja um processo sistemático baseado em princípios científicos capazes de garantir modificações orgânicas necessárias para a adaptação do corpo ao treinamento. Assim, “a organização, a estruturação e o controle do treinamento podem auxiliar de forma decisiva, no ganho de performance de alto rendimento” (GOMES, 2002: 18).

    Vale destacar que o treinamento físico inclui fatores determinantes para que se alcance o objetivo de aumento de performance, isto porque deve levar em consideração a complexidade da essência humana. Portanto, é necessário também o conhecimento em diversas áreas afins tais como Fisiologia, Psicologia, Sociologia, Anatomia, entre outras, e que, além disso, o profissional saiba aliar seu planejamento à escolha dos exercícios, pois de acordo com Weineck (1999: 23) “a extensão e a velocidade com que se atinge um bom desempenho esportivo depende da escolha correta dos exercícios”.

    Outro fator que deve ser levado em consideração é a faixa etária com a qual se trabalha. É necessário que se tenha um trabalho adequado com a fase maturacional do indivíduo para que não se cometam erros no sentido de prejudicar seu desenvolvimento, nem de estar realizando um trabalho que não venha proporcionar os resultados almejados. Dessa forma, abordaremos a seguir aspectos do treinamento na infância e na juventude, já que esta idade é o foco deste estudo.

    Tendo em vista que crianças são indivíduos em formação e, como tais apresentam características diferentes dos adultos, torna-se lógico pensar que o treinamento que se desenvolve na infância não deve ser o mesmo aplicado aos adultos. Ele vai diferir principalmente no que diz respeito aos objetivos, programas e procedimentos, já que se trata de um processo a longo prazo, no qual aspectos do crescimento e desenvolvimento devem ser priorizados (WEINECK, 1999: 97).

    O simples fato de estar em crescimento, sofrendo uma série de alterações no organismo – de ordem física, psíquica e afetiva – acaba influenciando o desenvolvimento motor e proporcionando melhoria no rendimento esportivo. Muitas são as discussões a respeito do assunto. Até que ponto o treinamento em crianças seria realmente efetivo para aumento de performance? Isso não poderia prejudicar seu desenvolvimento, trazendo lesões físicas ou privando o indivíduo de outras atividades? Para que isso não aconteça, Weineck (1999: 97) defende que para adotar um treinamento visando o desempenho esportivo nas idades menores, alguns fatores devem ser analisados: deve haver exames físicos, afim de identificar e prevenir possíveis lesões conseqüentes do treinamento; a opção pela prática deve ser da criança e não imposta; o treinamento deve se adequar à idade física e mental da criança; o treinamento não deve prejudicar os estudos; o treinamento não deve inibir a possibilidade da criança se interessar por outra modalidade.

    Estudos na área, como o de Gomes (2002: 177) apontam que o objetivo principal do treinamento na infância é o desenvolvimento motor e intelectual, devendo-se dar ênfase ao ensino dos principais hábitos motores. Ao se tratar da sistematização do treinamento de crianças, geralmente a literatura divide os períodos nos quais encontram-se diferenças nas fases do desenvolvimento. Pelo fato do presente estudo abranger as idades de iniciação até a categoria infantil da ginástica rítmica, que compreendem dos seis aos 12 anos, discorreremos aqui sobre essas fases específicas.

    Weineck (1999) identifica como o início da fase escolar o período dos seis aos dez anos e aponta que nesta fase de iniciação, a criança apresenta uma natural necessidade de movimentação, uma boa condição física e também boa relação entre força e coordenação. Isso acaba trazendo o interesse pelo esporte e caracterizando uma fase de aprendizado ótima. Porém, o autor atenta para o fato de que apesar da grande capacidade de aprender novos movimentos, a criança nessa idade não os fixa tão facilmente. Portanto, os esforços para esse período devem ser no sentido de repetir os novos movimentos para que sejam incorporados ao repertório motor da criança, buscando a melhoria da coordenação.

    Em um artigo sobre o treinamento da velocidade no jovem, Cunha (2000: 34) escreve que nesta idade o aumento da capacidade das crianças para executar os movimentos é progressivo e que o desenvolvimento multilateral é importante para o desenvolvimento da coordenação. O autor acrescenta ainda que por meio de brincadeiras e jogos, as crianças aprenderão a coordenar o movimento das pernas e braços e conseqüentemente se movimentarão mais rapidamente. Essa importância do trabalho multilateral também é reconhecida por Barros (2000: 17) em um estudo sobre o treinamento de força em jovens, no qual afirma que se deve “procurar sempre um trabalho multilateral, aproveitando para o desenvolvimento de outras capacidades físicas”.

    É possível verificar que nesta faixa etária, o treino vai atuar no sentido de proporcionar uma facilitação da aprendizagem de habilidades de base, melhorando a coordenação, o que provavelmente trará um aprimoramento das capacidades motoras, levando a melhores desempenhos.

    Ainda dentro da classificação das etapas por idade de Weineck (1999), dos dez anos até o início da puberdade é o período que o autor define como “a idade escolar tardia”. Nesta fase, movimentos de maior dificuldade já podem ser aprendidos devido às adaptações fisiológicas que ocorrem no organismo, com relação à capacidade de força, aumento de massa corporal e equilíbrio, o que vai proporcionar um maior domínio do próprio corpo. Deve-se dar grande importância a essa fase, pois é considerada como a melhor fase para o aprendizado e, não sendo aproveitada pode acarretar dificuldades posteriores na aprendizagem de outros movimentos. Os exercícios devem ser variados, porém já os direcionando para o refinamento da técnica esportiva. Cunha (2000: 37) afirma que neste período “é ainda importante manter o caráter multilateral do treino, mas englobando já uma maior especificidade”.

    Dessa forma, de acordo com Weineck (1999: 110) o que pode ser observado é que há uma certa progressão, uma relação entre essas duas fases, sendo que “as bases coordenativas para o bom desempenho posterior devem ser obtidas nas idades escolares inicial e tardia”, tendo atenção para que não haja a automatização de movimentos incorretos, pois posteriormente eles serão de difícil correção.

    Sendo assim, é importante que o profissional que trabalhe com a iniciação e categorias menores de ginástica rítmica conheça esses princípios e os leve em consideração durante sua atuação profissional, sobretudo em consonância com as especificidades do treino em GR.

O treinamento na ginástica rítmica

    O que se busca quando se fala em elevar o rendimento físico nas disciplinas esportivas é, de fato, aumentar a eficácia por meio dos melhores meios de desenvolvimento do treinamento, ou seja, desenvolver suas bases e seus componentes com o objetivo de elevar o nível de performance.

    Se a ciência do treinamento desportivo em geral já apresenta uma grande complexidade, envolvendo fatores internos e externos, quando ela se aplica à ginástica rítmica, muitas outras particularidades devem ser levadas em consideração. A GR tem como característica a busca pela perfeição na execução dos movimentos corporais e com os aparelhos, sendo assim necessária a atenção nos pequenos detalhes. Dessa maneira, bons resultados só serão possíveis com comprometimento dos profissionais responsáveis e uma sistematização do trabalho. Assim, Laffranchi (2001: 3) afirma que: “o alto rendimento na Ginástica Rítmica só pode ser encontrado nas bases científicas do treinamento, suporte para o desenvolvimento de metodologias de trabalho que sistematizam as grandes performances procuradas”.

    Por apresentar características tão específicas, é necessário que haja uma grande adaptação do treinamento na GR, no que diz respeito às capacidades motoras exigidas pela modalidade e também com relação às individualidades de cada atleta. Serrão, Tricoli (2005: 145) tratam da relevância de se ter o conhecimento das especificidades da ginástica quando enfatizam que “a importância de se identificar as características fisiológicas e as capacidades motoras envolvidas na prática de determinada modalidade esportiva é a possibilidade da elaboração de programas de treinamento mais específicos e mais eficientes”.

    Assim, além de um treinamento que possibilite um condicionamento físico generalizado, há ainda que se levar em conta as capacidades físicas da modalidade, no caso da GR, a flexibilidade, a coordenação, o ritmo, o equilíbrio, a resistência (anaeróbica, muscular localizada e aeróbica), a agilidade e a força explosiva (LAFFRANCHI, 2001).

    Chegamos aí em uma parte fundamental da discussão: as capacidades físicas, ou como são também chamadas, qualidades físicas, capacidades motoras, qualidades motoras, etc. No entanto, para Barbanti (2001: 41) é importante distinguir as capacidades físicas das habilidades físicas: “a ‘capacidade’ refere-se mais às qualidades inatas de uma pessoa, como um talento, um potencial” (exemplos: força, resistência, flexibilidade etc.); já a “‘habilidade’ refere-se a coisas aprendidas, desenvolvidas, como a habilidade para jogar futebol, basquetebol, tênis etc. As capacidades são essenciais para o rendimento motor” (p. 41).

    Nesse sentido, as principais capacidades motoras relacionadas com nosso objeto de estudo são: força, velocidade, resistência e a flexibilidade. Essas capacidades, de acordo com Laffranchi (2001), são trabalhadas na preparação física das ginastas.

    Como um dos principais referenciais do treinamento desportivo aplicado à ginástica rítmica é a obra de Laffranchi (2001), julgamos interessante mencionar como a autora separa componentes do treinamento.

    Temos a preparação física, que é dividida em preparação física geral e específica, sendo que na primeira são trabalhadas a flexibilidade, a resistência muscular localizada, a resistência aeróbica e a força explosiva; na segunda tem-se como objetivo desenvolver também a flexibilidade, o ritmo, a agilidade, o equilíbrio, a resistência muscular localizada, a resistência anaeróbica e a coordenação.

    O segundo componente que aparece é a preparação técnica, que tem foco na repetição dos movimentos, para que com exigentes correções se busque a execução do movimento com maior perfeição possível e de forma a economizar esforço. Nesta fase, a autora divide o exercício em inteiro, por partes e isolado. Em cada fase da periodização, de acordo com as cargas que se devem aplicar, dá-se ênfase ao trabalho de cada um desses exercícios.

    A preparação tática é o terceiro componente que Laffranchi (2001) apresenta e, segundo a mesma, é a parte que “tem por objetivo conseguir a vitória nas competições” (p. 95). Ela envolve principalmente a montagem de coreografias, na qual deve-se tomar cuidado com os mínimos detalhes, como escolha da música, dos exercícios que farão parte da composição, da criação de elementos originais, entre outros.

    Por último, a autora apresenta a preparação intelectual e psicológica, que é o que vai proporcionar à ginasta condições para a atividade que realiza. Isso vai desde o entendimento do treinamento, passando pela motivação, até assegurar condições de suportar o treinamento e se preparar para, no momento de pressão de uma competição, executar o exercício com a melhor qualidade possível, e ter isso como recompensa de um bom trabalho.

    Nem sempre essa recompensa virá na forma de um primeiro lugar nas competições, mas com certeza poderá resultar da satisfação de deixar a quadra de competições seguro de que deu o melhor de si mesmo e que fez tudo o que lhe estava ao alcance, seja pela satisfação pessoal ou seja por haver recebido o maior de todos os reconhecimentos: o aplauso do público! (LAFFRANCHI, 2001: 100).

    Dessa maneira, acredita-se que seja possível sistematizar um treinamento desportivo na GR, fundamentado nas teorias e princípios do treinamento, que traga resultados de acordo com os objetivos traçados. Isso só será possível quando o treinamento das capacidades técnicas estiver aliado ao das capacidades físicas, pois eles têm uma relação muito estrita. Tanto melhor as ginastas suportarão as repetições do treinamento técnico sem alterar nível de execução dos movimentos, quanto melhor estiverem preparadas fisicamente.

Análise e discussão dos resultados

    Neste estudo buscamos entender o que vem contribuindo para que as equipes 1 e 2 estejam em posições de destaque nas competições nacionais. Dessa forma, consideramos necessário primeiramente investigar como ocorre o desenvolvimento da GR nestas equipes, para num segundo momento relacionar estes dados com os referenciais teóricos que tratam do assunto.

    Para que fosse possível obter tais informações, elaboramos uma entrevista semi-estruturada, analisando fatores como: a estrutura, a forma como é organizado o trabalho na iniciação e na categoria infantil, a seleção das ginastas, entre outros; e esta foi aplicada em três treinadoras responsáveis pelo trabalho com as equipes pesquisadas.

O trabalho de iniciação à ginástica rítmica

    Sobre a estruturação das turmas de iniciação, verificamos a partir da resposta das professoras pesquisadas que a equipe 1 desenvolve um projeto no município com aproximadamente 600 crianças participantes, que devem ingressar entre quatro e dez anos. Na equipe 2, participam por volta de 350 crianças, com idades entre cinco e 12 anos. Apesar de existir uma certa diferença entre os dois clubes no que diz respeito à faixa etária, percebemos que ambas as equipes abrangem a idade de seis a oito anos que, de acordo com Róbeva, Rankélova (1991), é a mais conveniente, devido à possibilidade de atrair e prender a atenção das crianças.

    Para a divisão das turmas, na equipe 1 é realizado um teste de aptidão física e, depois, considera-se a faixa etária. O número de alunas em cada turma é de vinte a vinte e cinco. A professora coordenadora supervisiona o trabalho e existe uma outra professora responsável exclusivamente pelas turmas iniciantes, que recebe o auxílio de estagiárias que estam cursando educação física. Já na equipe 2, ocorre o processo inverso para a divisão das turmas, se comparado com a equipe 1, pois primeiramente é levada em consideração a faixa etária e depois a aptidão física para o esporte. Para o desenvolvimento do trabalho existe uma professora responsável pela escolinha que trabalha juntamente com ex-ginastas e com estagiárias que estam cursando educação física.

    É importante destacar a relevância de existir nas equipes uma professora responsável e auxiliares, pois nesta fase, na qual é formada a base dos elementos corporais, é fundamental uma atenção especial à correção dos erros, pois:

    como a Ginástica Rítmica é um esporte em que a complexidade dos movimentos do corpo e do aparelho é grande, e a ânsia pelo aprimoramento e aperfeiçoamento da execução é constante, deve-se buscar a técnica de base correta desde os primeiros dias da ginasta dentro do ginásio (LAFFRANCHI, 2001 p.136).

    Dessa forma, acreditamos que tendo uma turma com aproximadamente vinte crianças, a participação de mais de um profissional acaba sendo uma condição neecessária para que o trabalho aconteça de forma satisfatória.

    Com relação ao conteúdo trabalhado na iniciação, percebemos que tanto a equipe 1 quanto a equipe 2 têm como ponto de partida os movimentos naturais e construídos (andar, correr, saltitar, girar), inserindo progressivamente os movimentos específicos da modalidade. A diferença que encontramos entre os dois clubes é que, na equipe 1, nesta fase já é iniciada de forma lúdica a experimentação de aparelhos manuais oficiais e alternativos, enquanto a responsável pela equipe da equipe 2 não citou a utilização destes, parecendo não haver um trabalho neste sentido.

    A ausência da utilização dos aparelhos talvez não seja um fator que possa prejudicar o trabalho de iniciação, já que a aprendizagem da técnica corporal é entendida como prioridade nesta fase (RÓBEVA, RANKÉLOVA, 1991). Porém, a autora não descarta a importância do contato com os aparelhos já desde a iniciação, salienta que “no primeiro ano devem aprender as normas elementares da técnica do toque nos aparelhos” (p.55), e que é importante que tenham contato com todos. Acrescenta ainda que, as crianças devem trabalhar com aparelhos de tamanho proporcional ao seu, para que erros não aconteçam levando ao desgosto e à frustração.

    Acreditamos que a experimentação de aparelhos nesta fase inicial pode ser vista como uma estimulação que poderá vir a contribuir para um desenvolvimento mais amplo, pois, além de aproximar a criança da característica da modalidade, pode trazer benefícios para sua formação. Tais benefícios são reconhecidos por Nista-Pícollo (1995: 65) quando afirma que “atividades com bola, maça, fita, arco e corda estimulam a criança na participação da aula, ao mesmo tempo em que desenvolvem fatores cognitivos e sociais, além dos motores”.

    Ainda relacionado às turmas de iniciação, buscamos verificar junto às professoras pesquisadas se existe algum tipo de avaliação para acompanhar o desenvolvimento das crianças, bem como auxiliar na detecção de talentos. Nas duas equipes são realizadas avaliações, porém de formas distintas. Na equipe 1 são realizadas duas avaliações no decorrer do ano: a primeira ocorre seis meses após o início das aulas e a outra no final do ano. São aplicados testes de flexibilidade e é observado o somatotipo, junto ao repertório motor adquirido. Na equipe 2 é feita uma única avaliação durante o festival de encerramento do ano, na qual as crianças são observadas em suas performances.

    No entanto, observamos que o principal objetivo destas avaliações é selecionar as alunas que têm pré-disposição para o esporte, podendo integrar as equipes de competição. Porém, a falta de métodos cientificamente comprovados para tais testes, faz com que estes sejam realizados de forma empírica, baseados na experiência das professoras, o que atualmente acontece na detecção e seleção de talentos esportivos, assim como afirmam Lanaro Filho (2001) e Róbeva, Rankélova (1991).

    Os critérios levados em consideração para essa escolha são semelhantes entre as equipes, que procuram meninas que tenham o somatotipo considerado ideal, ou seja, magras e longilíneas, boa flexibilidade, controle do movimento corporal e maturidade (amadurecimento cognitivo e emocional) para a realização das tarefas. A preferência de idade para a seleção das ginastas para a equipe também é semelhante, entre seis e oito anos, o que vai ao encontro da afirmação de Lanaro Filho (2001: 33):

    Quanto a idade adequada para a seleção de talentos visando iniciar um treinamento sistematizado em uma especialidade ou modalidade esportiva, pode-se dizer que isto deveria ocorrer por volta dos 11 aos 14 anos (...). No entanto, algumas modalidades esportivas, em função de características muito específicas, tais como a ginástica artística, a ginástica rítmica desportiva e a natação, entre outras, necessitam que essa seleção seja realizada um tanto precocemente, em razão do aproveitamento das fases sensíveis para a obtenção de determinadas habilidades motoras e ou melhorias de determinadas capacidades motoras, como por exemplo alto graus de flexibilidade nas articulações, o que só é possível por volta dos seis aos nove anos.

    A partir do momento em que são selecionadas, as alunas passam a fazer parte de um treinamento específico, voltado para as particularidades da GR, buscando desenvolver as capacidades físicas necessárias para as exigências da modalidade. Inicia-se a preparação para o universo competitivo, que ocorre quando elas atingem a idade de 9 a 11, em que de acordo com o regulamento específico da modalidade, previsto pela Confederação Brasileira de Ginástica (2006) é correspondente à categoria pré-infantil. Nesta fase as ginastas participarão de suas primeiras competições, adquirindo experiência para integrar a equipe infantil, categoria escolhida como foco do estudo, e que trataremos a seguir.

Equipe infantil

    Quando a equipe alcança o nível competitivo, passa a ser necessária uma organização diferenciada e, assim, o que norteia o desenvolvimento e a estruturação do programa de treinamento é o objetivo ao longo prazo a que se propõem. Assim como afirma Laffranchi (2001: 11) “O treinamento desportivo, abordado como um conjunto planejado e organizado de meios e procedimentos, evidencia a necessidade de se planejar sistematicamente a atividade a ser desenvolvida no processo como um todo, tendo em vista objetivos pré-determinados”.

    Ao analisarmos as entrevistas, constatamos que tanto a equipe 1 quanto a equipe 2, trabalham para que suas ginastas alcancem o alto-nível no esporte. Porém, o fato da primeira visar resultados internacionais nas provas de conjunto, e a segunda equipe visar resultados nas provas de individual, já faz com que sejam evidenciadas as diferenças entre elas na forma como desenvolvem o treinamento da modalidade.

    Na equipe 1, a categoria infantil é composta por dez ginastas, apesar de acreditarem ser ideal o número de 12 atletas, para que treinando dois conjuntos simultaneamente (seis ginastas para cada um – 5 titulares mais 1 reserva), exista a garantia de que possíveis desistências não atrapalhem o andamento do trabalho. A equipe dispõe de duas treinadoras, sendo uma responsável e outra atuando como auxiliar. Na equipe 2, a equipe infantil é formada por oito ginastas e a equipe técnica por duas professoras mais quatro auxiliares que se revezam entre todas as categorias, inclusive a do infantil.

    Na equipe 1, a professora responsável acompanha a equipe quando esta progride para as categorias seguintes, já que a experiência com esta forma de atuação do treinador mostrou ter trazido melhores resultados. Acreditamos que a permanência da mesma técnica na equipe, no decorrer dos anos, possa facilitar que se mantenha um padrão de execução dos movimentos, característica importante quando se trata das provas de conjunto, já que de acordo com Laffranchi, (2001: 20) “as ginastas de conjunto devem possuir características físicas muito semelhantes umas em relação as outras, formando um grupo o mais homogêneo possível”.

    Na equipe da equipe 2, a professora coordenadora juntamente com as auxiliares trabalha não só com a categoria infantil, mas também com a pré-infantil, juvenil e adulto. Ela acredita que esta forma de organização possibilita que exista uma análise mais ampla sobre a ginasta, já que cada professora apresenta pontos de vista diferentes e, dessa forma mais erros poderão ser detectados e corrigidos. Pensamos que esta seja uma forma válida, desde que haja um consenso entre os profissionais no que diz respeito a um padrão técnico na execução dos movimentos, baseado em referenciais que comprovem a sua validade. Caso contrário isso poderia tornar a ginasta confusa quanto a forma correta de realizá-los e prejudicar sua atuação.

    As divergências quanto ao padrão de execução dos movimentos pode ser um reflexo da escassez de referenciais teóricos, que faz com que as técnicas se baseiem principalmente nas próprias experiências práticas, muitas vezes sem reflexão sobre as mesmas. Talvez por uma valorização dessa experiência, encontramos ex-atletas atuando como auxiliares, sem formação acadêmica. As técnicas parecem preferir a assistência de uma pessoa que vivenciou a modalidade, mesmo sem ter formação profissional, do que preparar um profissional que não teve contato anterior com a GR. Acreditamos que isso aconteça devido a busca imediata por resultados, já que essa preparação demandaria tempo.

    Sabemos que uma equipe que almeja alcançar o alto nível no esporte necessita do mínimo de condições de trabalho tais como: local apropriado, profissionais capacitados, materiais adequados e apoio financeiro. Por essa razão consideramos importante apresentar como é a estrutura das equipes pesquisadas.

    Tanto a equipe 1 quanto a equipe 2, contam com uma estrutura física com ginásio exclusivo, tablado e aparelhos oficiais e demais instrumentos necessários para bom desenvolvimento do trabalho tais como: espelho, barra, colchões, espaldar, plintos, aparelho de som, entre outros. Além disso, ambas recebem apoio de profissionais de áreas afins. As duas equipes possuem fisioterapeuta e ainda contam com professora de ballet (equipe 2) e nutricionista (na equipe 1).

    Para melhor compreender o trabalho das equipes, foram abordadas questões relacionadas à periodização e organização do processo de treinamento. Na equipe 1, após ser estabelecido o objetivo anual, é feito um planejamento e os treinos iniciam já no mês de janeiro. Os treinos são distribuídos em cinco dias por semana, cada um com duração de quatro horas e meia a cinco horas. Dentro da rotina de treinamento são inseridas aulas de Ballet adaptado às características da GR, preparação física geral e específica, treino da resistência muscular localizada, treino da potência e flexibilidade e manejo de aparelhos. Esses componentes variam em intensidade e tempo utilizados em cada sessão, de acordo com a fase do programa.

    O período de treinamento na equipe tem seu início também no primeiro mês do ano, após serem estabelecidos os objetivos anuais, com ênfase nas competições nacionais individuais. A equipe tem seis sessões de treino semanais, com duração de quatro horas e meia a cinco, cada uma delas. Percebemos que os componentes do treino são, em sua maioria, exercícios específicos e voltados à competição. São estipuladas metas diárias que determinam um número de execuções corretas dos exercícios de todas as séries de competição. E, segundo a técnica, de acordo com estatísticas realizadas, isso tem aumentado o rendimento de suas ginastas nos campeonatos. A intensidade do treino também varia de acordo com o plano e os períodos competitivos.

    Tendo em vista os estudos existentes na área, percebemos que as equipes apresentam uma sistematização que vem em parte ao encontro do que propõem as teorias do treinamento desportivo. Na organização do programa de treinamento, são utilizados referenciais teóricos que podem dar suporte a sua elaboração, porém sempre adaptando à realidade da modalidade e da equipe. Para que ocorra essa adaptação, é necessário que a treinadora tenha uma certa experiência na ginástica e o conhecimento das características e necessidades de suas ginastas. Uma das referências citadas na entrevista das duas equipes foi a obra de Laffranchi (2001) que é baseada na experiência da autora como técnica, e nas teorias do treinamento desportivo. Esta trata especificamente do treinamento na Ginástica Rítmica.

    A técnica da equipe 2 acredita que a experiência é o principal fator que norteia o seu trabalho, assim como estágios realizados em outros países, e contatos anteriores com outros esportes, de onde ela traz um know how que é transferido para a GR. A treinadora reconhece não haver um referencial guia, utilizando assim o que lhe parece conveniente à sua realidade.

    Embora, de certa forma, exista cada vez mais a busca pela fundamentação teórica na estruturação das equipes pesquisadas, notamos que a experiência empírica é ainda um dos fatores que prevalecente. Relacionada a questão da periodização do treinamento, as respostas demonstram-se inconsistentes para que fosse possível compreender como esta é realizada. O que nos faz entender que apesar da organização não se tem uma planificação sólida, um planejamento detalhado onde o trabalho seja baseado.

    De fato a experiência é um aspecto importante no trabalho do profissional, contanto que seja feita uma reflexão sobre a própria prática, relacionando os resultados obtidos com o que foi desenvolvido, para que assim se possa aprimorar o que foi válido e rever o que pode ser modificado. Contudo, somente isto não é o suficiente, pois levaria apenas a reprodução dos modelos de treinamento que parecem ser eficientes. É preciso que a reflexão da prática seja subsidiada por referenciais de cunho teórico-científico que dêem suporte à realização de um trabalho consciente.

Considerações finais

    Levando em consideração os aspectos discutidos no decorrer do estudo, pudemos concluir que foi possível fazer um levantamento da estrutura organizacional das principais equipes paranaenses de ginástica rítmica e, de certa forma, apontar contribuições para que novos trabalhos se iniciem de forma mais solidificada e, para os trabalhos já existentes se reestruturem a fim de conseguirem alcançar melhores resultados. Encontramos algumas limitações durante a pesquisa, no que diz respeito à inconsistência de algumas respostas, o que nos impossibilitou de analisar com mais profundidade a periodização do treinamento, fazendo com que obtivéssemos apenas a noção da estrutura e da organização do treino.

    Para que este mapeamento da estrutura das equipes fosse feito, foi necessário identificar a forma como ocorre o processo de formação das ginastas das categorias selecionadas para a pesquisa. Verificamos que há um processo que vai desde o ingresso das crianças à prática da ginástica rítmica, por meio das turmas de iniciação, passando pelos processos de avaliação até seleção para as turmas de treinamento. Este processo é organizado de forma semelhante em ambas as equipes pesquisadas, porém apresentam algumas diferenças de objetivos e, conseqüentemente nos detalhes da estruturação, o que nos possibilitou mostrar dois pontos de vista de trabalhos que vêm mostrando resultados significativos no cenário nacional da ginástica rítmica.

    Ao verificarmos a organização do treinamento nas diferentes categorias selecionadas para o estudo, foi possível perceber que as equipes têm uma estrutura física e apoio externo que as possibilita desenvolver um trabalho consistente e organizado. Organização esta, que apesar de existir, nos pareceu não estar completamente ligada a um embasamento teórico-científico, talvez por falta de material de estudo na própria área.

    Ainda assim, o estudo nos proporcionou obter dados que consideramos de grande valia para os trabalhos na ginástica rítmica e, portanto apresentamos algumas sugestões que acreditamos poder contribuir e auxiliar na estruturação de um programa de treinamento capaz de atender aos objetivos de se formar ginastas com um bom nível técnico e conseqüentemente alcançar bons resultados.

    Relacionada à questão da quantidade de alunas na iniciação, acreditamos que um grande número pode proporcionar maiores chances de que mais talentos sejam descobertos. Porém, é necessário que existam professores capacitados em número suficiente para que seja possível a divisão das turmas, caso contrário dificultaria o desenvolvimento do trabalho de base.

    Outro ponto importante é o critério utilizado para a organização dessas turmas. O interessante é que pelo menos seja considerada a faixa etária para que as aulas sejam mais adequadas ao nível de crescimento e desenvolvimento das crianças. Se possível, também acreditamos ser válida a separação de acordo com o desempenho apresentado pelas alunas, de forma que a turma em si tenha um ritmo de assimilação do conteúdo semelhante.

    No que diz respeito ao conteúdo trabalhado na iniciação, é necessário ter em mente que as crianças iniciam sem saber o que estão fazendo. Por isso, a introdução à modalidade deve ser feita de forma que progrida dos movimentos naturais e familiares a elas para aos poucos irem se aperfeiçoando em direção aos movimentos ginásticos simples. Atividades lúdicas também são importantes para estimular a motivação, assim como a utilização de aparelhos manuais, que podem também contribuir para o desenvolvimento motor das iniciantes.

    Para possibilitar a verificação do desempenho, bem como para um acompanhamento do desenvolvimento das alunas que demonstre o andamento do trabalho realizado, avaliações se fazem necessárias. Existe uma avaliação diária feita por meio de observação da professora com suas alunas, porém destacamos aqui a avaliação por testes em que sejam avaliados os níveis de flexibilidade, força, agilidade, coordenação, equilíbrio, entre outros. Isto possibilita que o trabalho tenha um referencial a mais que indique se este está caminhando de forma satisfatória ou se apresenta deficiências, podendo ser revisto, além de auxiliar na detecção de talentos.

    Quando as alunas são selecionadas para as equipes de competição, os treinos passam a ser mais específicos, visando à melhora de desempenho, porém é essencial dar atenção à faixa etária para a estruturação de um treinamento que respeite as características da idade. Um treinamento não adequado poderia não só ser ineficaz, como também prejudicar o desenvolvimento das atletas, com risco de lesões. Dessa forma, é necessário buscar referenciais teóricos que possam dar base para a formulação de um programa adequado, pois: “a otimização de um treinamento infantil e de jovens requer um conhecimento básico das condições vigentes em cada faixa etária. Somente este conhecimento possibilita estabelecer um treinamento adequado às necessidades de crianças e jovens” (WEINECK, 1999: 107).

    A importância de serem determinados os objetivos da equipe, tanto para o ano como em longo prazo, deve-se ao fato de que é a partir deles que a periodização do treinamento tem base para ser realizado. Esta periodização visa o alcance das melhores performances nas principais competições e nesta é feita a organização de tudo o que será realizado no treino: as preparações físicas geral e específica, o ballet, o trabalho de resistência muscular, entre outros, bem como a freqüência e as cargas que serão aplicadas em cada fase.

    Acreditamos que o planejamento, no caso de ser uma equipe em que existem várias treinadoras atuando, deve ser realizado conjuntamente para que exista a integração do trabalho, mesmo quando cada uma delas é responsável por uma categoria específica. Dessa forma, existe uma continuidade do que foi realizado, permitindo que a cada categoria as ginastas progridam, ao invés da estagnação ou da readaptação aos padrões de movimento impostos por cada treinadora.

    Existe ainda a possibilidade de cada técnica prosseguir com suas ginastas para as seguintes categorias. Este sistema é interessante pelo fato de que se mantém o mesmo estilo de treinamento e torna-se mais natural a continuidade do trabalho. Além disso, existe um maior conhecimento das professoras sobre suas ginastas, o que pode facilitar o relacionamento entre elas. Seria interessante também, que houvesse o contato entre as técnicas para que os trabalhos sejam avaliados com outros pontos de vista, isso para que haja apontamentos diferentes que colaborem para tornar a visão mais ampla e não se fechar em um sistema pré-estabelecido sem progressos.

    Enfim, entendemos a necessidade de que novos estudos continuem acontecendo e esperamos que a pesquisa aqui apresentada possa contribuir com a atuação do profissional da área da educação física, sobretudo da ginástica rítmica.

Nota

  1. Consideramos como destaque o resultado dos três primeiros lugares nos campeonatos nacionais.

Referências

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  • RÓBEVA, N. & RANKÉLOVA, M. Escola de campeãs: ginástica rítmica desportiva. São Paulo: Ícone, 1991.

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  • WEINECK, J. Treinamento ideal. 9ª. Ed: São Paulo: Editora Manole, 1999.

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