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Utilização de software de edição de imagens
na determinação de ângulos em biomecânica

 

Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC

Centro de Ciências da Saúde e do Esporte – CEFID

Laboratório de Pesquisas em Biomecânica Aquática

Florianópolis, SC

(Brasil)

Gustavo Ricardo Schütz

Alessandro Haupenthal

Caroline Ruschel

Marcel Hubert | Helio Roesler

gugaschutz@terra.com.br

 

 

 

Resumo

          Este estudo teve por objetivo verificar a possibilidade da utilização de um software de edição de imagens comercial para a verificação de ângulos em análises cinemáticas bidimensionais. Foram utilizadas imagens de 36 saídas do bloco na natação, provenientes de um estudo anterior realizado no Laboratório de Pesquisas em Biomecânica Aquática do CEFID/UDESC. As imagens foram digitalizadas e analisadas de forma bidimensional através da utilização do sistema Peak Motus 4.03 e do software de edição de imagens CorelDRAW 10. Para análise estatística utilizou-se a correlação de Pearson, a um nível de significância de 1% (a = 0,01). Na comparação dos dados obtidos através da utilização das duas formas de análise foi encontrada alta correlação (r = 0,99) o que sugere a aplicabilidade e validade do software comercial. A importância deste fato se deve ao menor custo e à maior acessibilidade a softwares de edição de imagens em relação a sistemas utilizados em análises biomecânicas.

          Unitermos: Software. Edição de imagens. Biomecânica.

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 122 - Julio de 2008

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Introdução

    Analisar algo consiste em dividir em partes menores e então examiná-las. Na Biomecânica não ocorre diferente e as análises partem de pressupostos qualitativos e quantitativos. Em análises qualitativas ocorrem verificações subjetivas das características mecânicas do desempenho; já em análises quantitativas, variáveis que afetem o desempenho são mensuradas, quantificadas e expressas através de números [1].

    Outro diferencial entre análises qualitativas e quantitativas são as possibilidades de utilização e a aplicabilidade prática. De maneira geral, a quantificação de variáveis referentes ao desempenho é realizada por meio de instrumentos, muitas vezes de alto custo e de acessibilidade restrita em se tratando de atletas e treinadores.

    McGinnis [1] cita que a maioria das análises biomecânicas quantitativas apóia-se em algum tipo de gravação visual, definindo assim variáveis cinemáticas. Winter [2] e Nigg [3] destacam a grande evolução no desenvolvimento de softwares e hardwares para análises bidimensionais (2D) e tridimensionais (3D). No entanto, a comercialização desses sistemas agrega marcas próprias e encarece o produto, dificulta o acesso a estes instrumentos.

    Dentro de um crescente de evolução tecnológica, o desenvolvimento de máquinas fotográficas e filmadoras digitais possibilita a fácil e rápida reprodução das imagens em um microcomputador. Aliado a isto, com o desenvolvimento de softwares para processamento de imagens, apareceram ferramentas antes só encontradas em softwares específicos para análises biomecânicas. Isto possibilitou a quantificação de variáveis de uma forma mais econômica e acessível.

    A aplicabilidade destes softwares para a Biomecânica se torna possível a partir de sua validação. Desta forma, objetivou-se verificar a possibilidade da utilização de um software de edição de imagens comercial para a verificação de ângulos em análises cinemáticas bidimensionais.

Método

    Os dados obtidos são referentes ao trabalho de Pereira [4], no qual participaram três nadadores. Cada nadador realizou 12 saídas do bloco na natação, totalizando 36 saídas.

    Para aquisição das variáveis cinemáticas foi utilizada uma câmera de vídeo SuperVHS com freqüência de aquisição de 60Hz. Em seguida, os dados cinemáticos foram analisados com a utilização do sistema Peak Motus® versão 4.03 e com a utilização do software para edição de imagens CorelDraw 10® versão 10.410.

    Na primeira análise as imagens foram digitalizadas e analisadas no sistema Peak Motus. Através do sistema foram definidos os quadros referentes aos instantes do último contato com a plataforma de saída (saída do bloco) e do contato da mão do nadador com a água (entrada na água), resultando em 72 imagens (36 saídas do bloco e 36 entradas na água). O sistema permite a identificação dos pontos anatômicos e determinação dos ângulos formados durante o movimento [5].

    Foram então verificados dois ângulos importantes para a performance de saída do nadador, sendo o ângulo de saída do bloco dado pela reta formada entre os pontos anatômicos acrômio e maléolo (FIGURA 1), em relação a horizontal; e o ângulo de entrada na água, determinado pela reta formada pelos pontos estilóide ulnar e trôcanter do úmero (FIGURA 2), em relação a horizontal. Foi definido no trabalho de Pereira [4], que o ângulo que se forma abaixo do nadador seria o mais indicado e relacionado com o seu desempenho de saída.

Figura 1. Determinação do ângulo de saída do bloco.

Figura 2. Determinação do ângulo de entrada na água.

    As figuras resultantes da análise pelo sistema Peak Motus, com a determinação dos pontos anatômicos e identificação das retas para formação dos ângulos, foram utilizadas então para uma segunda análise, através do software CorelDRAW 10 (na ferramenta Angular Dimension Tool), determinando os valores de ângulos de acordo com os procedimentos realizados pelo sistema Peak Motus. A utilização da mesma imagem digitalizada pelo sistema Peak Motus para verificação no CorelDRAW 10 elimina a possibilidade de erro quanto à determinação dos pontos anatômicos.

    Para a segunda análise foram selecionadas de forma aleatória 24 imagens (12 saídas do bloco e 12 entradas na água) e os resultados obtidos foram correlacionados aos valores da primeira análise.

    Para análise estatística utilizou-se a correlação de Pearson, a um nível de significância de 1% (a = 0,01).

Resultados

    Na Tabela 1 são apresentados os valores em graus referentes às imagens nas diferentes análises. As imagens 1 a 12 correspondem aos valores para ângulo de saída e das imagens 13 a 24 os valores de ângulo de entrada na água.

Tabela 1. Valores obtidos nas diferentes análises.

Imagem

º (Peak Motus)

[graus]

º (CorelDRAW)

[graus]

1

11,38

11,56

2

17,16

16,98

3

17,10

17,14

4

16,48

16,19

5

18,18

18,42

6

15,52

15,84

7

14,64

14,52

8

13,28

12,83

9

10,44

10,71

10

11,53

11,75

11

13,17

12,97

12

11,90

12,28

13

28,86

29,10

14

31,06

30,97

15

26,56

26,32

16

32,15

32,15

17

27,81

28,00

18

22,58

22,43

19

42,81

42,81

20

30,26

29,64

21

30,57

30,50

22

39,10

38,40

23

31,83

31,38

24

27,42

27,82

    Considerando-se por base a medição do sistema Peak Motus, foi determinando a correlação entre os métodos. Para tal foi calculado o coeficiente de correlação de Pearson (“r” de Pearson), o qual é utilizado para verificar a relação entre duas variáveis. O critério utilizado para a interpretação do real significado do valor “r” é calculado pelo coeficiente de determinação (“r2”) e expresso em percentagem [6], visualizados na Tabela 2. Juntamente é apresentado o erro médio e o erro máximo encontrados.

Tabela 2. Correlação e erro entre os métodos.

Ângulo de saída

Ângulo de entrada

Todos

“r” de Pearson

0,9948

0,9982

0,9995

Significância de “r” [%]

98,96

99,94

99,90

Erro Médio [º]

0,11

0,23

0,18

Erro Máximo [º]

0,45

0,70

0,70

    Na Figura 3 é apresentado o gráfico de correlação linear entre as verificações pelo Peak Motus e pelo CorelDRAW 10.

Figura 3. Relação linear entre as diferentes verificações.

Discussão

    Os resultados confirmam que para uma análise bidimensional o software comercial utilizado tem validade para a identificação de ângulos em biomecânica. É importante ressaltar que os cuidados necessários que precedem a análise são os mesmos que se adotam em análises bidimensionais utilizando sistemas de cinemetria. Cuidados com o posicionamento das câmeras, calibradores, marcação dos pontos anatômicos, etc. são amplamente abordados na literatura [1,2,3,7].

    As limitações do uso do software de edição de imagens são as mesmas encontradas para análises bidimensionais em relação a análises tridimensionais. Na análise bidimensional não se consegue obter a rotação dos segmentos corporais, a diferença de posição entre o lado esquerdo e o lado direito do corpo, etc. Mas apesar da análise com um software comercial de imagens ser mais limitada e talvez de demandar maior trabalho para ser confeccionada (por serem possíveis somente análises quadro a quadro, diferentemente aos sistemas utilizados em Biomecânica que otimizam este processo), sua utilização pode ser realizada por pesquisadores que não possuem acesso a um software especializado, dando oportunidade a um maior número pesquisadores ou profissionais realizar trabalhos com análise angular. Assim, para trabalhos que necessitem a análise de somente determinados eventos ou instantes, esta pode ser uma ferramenta de grande valia.

    Neste trabalho, apesar de terem sido utilizados dois exemplos de ângulos definidos como absolutos, ou seja, calculado em relação à orientação do segmento no espaço [7], há também a possibilidade da análise de ângulos relativos pelo software, através da medição do ângulo formado entre o eixo longitudinal de dois segmentos [7].

    São mostrados, nas Figuras 4 e 5, exemplos em que analisaram o comportamento angular em eventos específicos. Os trabalhos são experiências do Laboratório de Pesquisas em Biomecânica Aquática, em que foi utilizado o CorelDRAW 10, na verificação de ângulos.

Figura 4. Determinação do ângulo do quadril durante a postura de escora de um velejador.

Figura 5. Determinação do ângulo do joelho durante uma passagem sobre a plataforma de força na marcha subaquática.

    A Figura 4 exemplifica uma verificação do ângulo do quadril do velejador em uma postura comumente utilizada durante o velejar. Já na Figura 5 é apresentada a verificação do ângulo do joelho no instante de início do impulso na marcha em ambiente aquático. Nestes dois exemplos foram analisados ângulos relativos.

Considerações finais

    A utilização deste software em verificações de ângulos em análises cinemáticas bidimensionais demonstrou aplicabilidade e validade. A importância deste fato se deve ao menor custo e maior acesso destes softwares de edição de imagens em relação a sistemas utilizados em análises biomecânicas.

Referências

  • McGINNIS, P. M. Biomechanics of sport and exercise. New York: Human Kinetics, 1999.

  • WINTER, D. A. Biomechanics and motor control of human movement. 3.ed. New Jersey: John Wiley & Sons, 2005.

  • NIGG, B. M., HERZOG, W. Biomechanics of the musculoskeletal system. 2.ed. England: John Wiley & Sons, 1999.

  • PEREIRA, S. M. A Influência das variações de altura e inclinação dos blocos de partida na performance de nadadores. Dissertação de Mestrado. Florianópolis: Universidade do Estado de Santa Catarina, 2001.

  • PEAK MOTUS MOTIONS MEASUREMENT SYSTEMS. Peak Start Manual. Versão 4.0, 1998.

  • THOMAS, J. R., NELSON, J. K. Métodos de pesquisa em atividade física. Porto alegre: Artmed, 2002.

  • HAMILL, J., KNUTZEN, K. M. Bases biomecânicas do movimento humano. Manole, 1999.

Agradecimentos

    À Suzana Matheus Pereira por permitir o uso de seus arquivos.

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