O profissional de Educação Física e sua responsabilidade frente ao processo de inclusão |
|||
*Licenciada em Educação Física pela ULBRA, campus Carazinho **Mestre em Educação (UPF), docente do curso de Educação Física ULBRA, campus Carazinho ***Doutora em Psicologia do Desenvolvimento (UFRGS), docente da Faculdade de Educação da UPF. |
Ana Paula Zarth* Patrícia Carlesso Marcelino Siqueira** Tatiana Bolívar Lebedeff*** |
|
|
Resumo
O presente trabalho
buscou analisar, de forma teórica e prática, os fatores
necessários para incluir pessoas com necessidades especiais nas aulas de
Educação Física das escolas da zona urbana do município de Não - Me -
Toque,
bem como as principais dificuldades encontradas pelos professores que
atendem a essa demanda e o que pensam acerca do referido tema. Este estudo
teve como população e amostra 20 professores, sendo 13 do sexo masculino e 7
do sexo feminino, aos quais aplicou-se um questionário semi-estruturado onde, de acordo com os resultados obtidos
constatou-se que somente 25%
desses professores sentem-se aptos para trabalhar com pessoas com
necessidades especiais em suas aulas. Também foi possível constatar que 50%
acreditam que a inclusão influencia positivamente no ambiente escolar e 31%
mencionaram que o profissional de Educação Física deve ser qualificado para
atuar no processo inclusivo. Com a pesquisa realizada percebeu-se que ainda
existe muito preconceito por parte da escola, família e sociedade, assim
como falta de interesse e preparação dos educadores físicos, tornando a
inclusão escolar um processo cada vez mais difícil em nossa atualidade,
porém, se houvesse colaboração e conscientização de todos os segmentos,
seria um grande avanço no processo educativo.
Unitermos:
Profissional de Educação Física. Inclusão. Escola. |
|||
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 122 - Julio de 2008 |
1 / 1
Introdução
Este texto tem como objetivo discutir a inclusão educacional de pessoas com necessidades especiais na perspectiva do Profissional de Educação Física. O impacto que a inclusão vem causando no meio escolar, nas instituições especializadas e entre os pais de alunos com necessidades especiais provocou o aparecimento de muitas dúvidas e vieses de compreensão, que acabam adiando a implementação de ações em favor da disponibilização da escola para todos.
“Preconceitos, antigos valores, velhas verdades, atitudes e paradigmas conservadores da educação ainda ocultam o verdadeiro sentido dessa inovação” (Stainback e Stainback, 1999, p. 02).
Com o princípio da Inclusão, a Educação Física escolar deve ter como eixo fundamental o aluno e, sendo assim, desenvolver as competências de todos os discentes e oportunizar aos mesmos as condições para que tenham acesso aos conteúdos que esta disciplina propõe, com participação plena, adotando para tanto estratégias adequadas, evitando a exclusão ou alienação. A concepção de cultura corporal do movimento amplia a contribuição da Educação Física Escolar para o pleno exercício da cidadania, apontando para um processo de ensino e aprendizagem centrado no desenvolvimento de capacidades e habilidades motoras, cognitivas, sócio-culturais e afetivas.
A atenção do profissional de Educação Física pelo trabalho com pessoas com necessidades especiais é relativamente nova, há tempos esses alunos eram liberados das aulas, eram encaminhados à biblioteca da escola, ou algo parecido, faziam pesquisas, ou até mesmo não faziam nada, e isso para eles eram as aulas de Educação Física, longe das práticas de esportes e de atividades físicas. Uma série de acontecimentos espelha e vem produzindo uma mudança gradativa na maneira de encarar a tratar a pessoa com necessidade especial, para o qual a atividade física pode significar melhores condições de vida e maior inserção social. Para que se possa chegar a essa situação, é necessário que haja espaços físicos sem barreiras arquitetônicas, conhecimento das técnicas de orientação, da língua dos surdos e, principalmente, respeito à individualidade presente entre as pessoas (Diehl, 2006).
Segundo Fonseca (1995), a problemática das pessoas com necessidades especiais reflete a maturidade humana e cultural de uma comunidade. Há implicitamente uma relatividade cultural, que está na base do julgamento que distingue entre “deficientes” e “não-deficientes”. Essa relatividade obscura, tênue, sutil e confusa, procura de alguma forma, “afastar” ou “excluir” os “indesejáveis”, cuja presença “ofende”, “perturba” e “ameaça” a ordem social.
“A inclusão social e a inclusão de pessoas com necessidades especiais no ensino regular é um aprendizado que ocorre de forma lenta e gradual em nosso país. Espera-se que no futuro a escola inclusiva junto com a família e sociedade, possam realmente oferecer uma boa qualidade de ensino para todos, sendo que isto não fique sendo apenas uma "utopia"” (Aguiar e Duarte, 2005).
Refletindo sobre a formação do profissional em Educação Física, que culturalmente vem privilegiando o desenvolvimento de capacidades e habilidades físicas, pode-se dizer que o papel do professor dessa área é acompanhar a evolução com uma postura ética e responsável diante das diversidades e suas necessidades.
Desta maneira, o texto apresenta dois momentos: no primeiro será problematizado o papel e os conhecimentos necessários para a formação do educador físico frente a inclusão. No segundo momento, será apresentada uma pesquisa realizada com educadores físicos de um Município da região Norte do estado do Rio Grande do Sul que investigou as concepções destes profissionais com relação ao processo inclusivo em suas práticas.
1. Desenvolvimento e Crianças com Necessidades Especiais
O conceito de pessoas com necessidades especiais não se limita a um grupo de crianças, jovens ou adultos que tenham algum tipo de deficiência mental, limitações sensoriais ou neurológicas. É um conceito que abrange qualquer diferenciação ou necessidade de recursos pedagógicos diferenciados no processo de aprendizagem escolar (Skliar 2001).
O autor ainda aborda que incluir a educação das crianças dentro da discussão educativa global não significa, apenas, incluí-las fisicamente nas escolas comuns, mas hierarquizar os objetivos filosóficos, ideológicos e pedagógicos da Educação Especial.
Podem-se incluir nesse conceito, as crianças com atraso na escolarização, com dificuldades escolares não permanentes, com um “simples” atraso ou disfunção na fala, com menor possibilidade de atenção concentrada nas atividades escolares, com dificuldades de relacionamento com os colegas, bem como aquelas que não participam das atividades e as que apresentam condutas agressivas (Macedo apud Rosseto 2005).
Não há dúvida de que a avaliação educativa – como sistema vertical, unilateral, descontextualizado, de poder, atemporal, conservador, etc. – pode produzir influências negativas no desenvolvimento da vida de um sujeito, inclusive desviar seu destino social, institucional, cognitivo e afetivo (Skliar, 2001).
Nesse sentido, é necessário rever os paradigmas que sustentam a prática do educador físico, pois uma prática centrada na avaliação de resultados, na performance, dificilmente possibilitará a participação de todos. É necessário que o educador físico investigue e conheça as necessidades psicomotoras, afetivas, de aprendizagem e motoras de cada criança de sua sala para que possa planejar sua prática de maneira inclusiva.
1.1. A corporeidade e a psicomotricidade
A Psicomotricidade, segundo Sousa (2004), pode ser definida como o campo transdisciplinar que estuda e investiga as relações e as influências, recíprocas e sistêmicas, entre o psiquismo e a motricidade, e esta é entendida como o conjunto de expressões mentais e corporais, envolvendo funções tônicas, posturais, somatognósicas e práxicas que se suportam e sustentam.
Desta forma, Jovilet apud Cabral, Lanza e Tejera (1998) abordam que a Psicomotricidade é a motricidade em relação e, aprofundando seus estudos, ainda diz que quando a motricidade é vista como expressão essencial das atividades pulsionais e tomada na rede de relação de objeto, fala-se em psicomotricidade.
A Educação Psicomotora constitui uma formação de base indispensável a toda criança, apresentando ou não necessidades especiais, assegurando o seu desenvolvimento funcional, levando em conta as suas possibilidades, e ajudando-a na sua afetividade a expandir-se e equilibrar-se através do intercâmbio com o outro ou com objetos, adaptando-se ao ambiente. As vivências corporais se inter-relacionam e têm interferência em qualquer manifestação humana, em qualquer atividade, seja ela lúdica, de prazer, seja de pesquisa e busca de conhecimento, seja, enfim, de criação, construção ou comunicação.
A dimensão psicomotora, compreendida como parte do mundo psíquico interno e das possibilidades simbólicas e racionais do ser humano, pode constituir uma abordagem importante no caso de bloqueios, desvantagens, paradas ou atrasos evolutivos, como também no caso de imaturidade maior ou menor.
A Educação Psicomotora dá espaço ao mundo motor da criança, a sua expressão, através de atividades corporais, lúdicas, espontâneas e livres, numa relação com o educador capacitado a compreender o que se passa nesse cenário e como é o processo evolutivo subjacente. É a partir da relação psicomotora que o educador ajuda a criança em sua expressão pessoal, em suas pesquisas e na busca de conhecimento, permitindo-lhe exprimir suas vivências afetivas e, sobretudo, manifestar seu desejo. (Cabral, Lanza e Tejera, 1998, p. 28)
Desenvolver a comunicação intrapessoal proporciona e facilita a conexão/relação consigo mesmo a partir da vivência e relação com seu próprio corpo, oportunizando a consciência corporal e a consciência espaço temporal mediante tudo o que o cerca. Também deve-se estimular a percepção, a atenção, as inteligências como um todo, provocando inúmeras capacidades de expressão e autonomia corporal.
Ajudar a criança no seu processo de auto-conhecimento, visando a estabelecer novas interações com o outro a partir da relação psicomotora livre, criativa e/ou dirigida é de total responsabilidade de um educador:
“Todos somos indivíduos globais. Seres que agem inteligentemente, de modo adaptativo e criativo, para transformar o mundo, implicando-se corporalmente em sua ação. Um ser que possui e é, ele mesmo, um corpo que fala e se estrutura com a linguagem, estruturando o próprio sujeito. É o sujeito que vive, indissolúvel e completamente, sua corporalidade, em dois níveis: um estruturado, com atividades motoras elaboradas tanto no sentido da busca de conhecimento inicialmente sensório-motor e, a seguir, lógico, racional, sobre si, o mundo e os outros, quanto no sentido da adaptação social e cultural. Outro, com atividades expressivas, gestos e atitudes que são projeção do mundo interno.” ( Cabral, Lanza e Tejera 1998, p. 28)
O homem se afirma no mundo pela motricidade, se realiza, dá razão à vida. Pela motricidade ele dá registro de sua existência e cumpre sua condição fundamental de existência. A motricidade, segundo Freire apud Catunda (2002), é o sintoma do mais complexo de todos os sistemas: o corpo humano.
Pela corporeidade ele dá testemunho de sua condição, de sua condição de corpo. A corporeidade integra tudo o que o homem é e pode manifestar neste mundo, espírito, alma, sangue, ossos, nervos, cérebro, etc. A motricidade é a manifestação viva desta corporeidade, é o discurso da cultura humana. “A imagem corporal é a figuração de nosso corpo, formado em nossa mente, ou seja, o modo pelo qual ele se apresenta para nós. Ela representa uma forma de equilíbrio entre as funções psicomotoras e a sua maturidade “(Sousa , 2004, p. 81-82).
Conforme Lévi-Strauss apud Mendes e Nóbrega (2004, p.32), desde que nascemos nosso corpo traz a história que se nos concebe como indivíduos da espécie humana universal, perpetuada graças à interação entre indivíduos diferentes, responsável pela diversidade individual e étnica, demonstrando que a diversidade é fundamental para a manutenção dos seres humanos:
A questão da corporeidade é vista como condição humana, mas não como uma realidade fixa, e sim como processo em construção. É compreendida de forma mais consistente quando complementada pela percepção das imagens corporais que se constituem no imaginário social. Isso quer dizer que, quando o homem começa a pensar além de sua experiência corporal e passa a olhar seu próprio corpo, esse olhar se processa sob a percepção das imagens corporais construídas em sociedade, sendo essa primeira imagem conscientemente corpórea, constituída individualmente, obedecendo aos modelos impostos pelos valores culturais de sua época .
O corpo é a nossa possibilidade de existência. Imperfeito, maravilhoso, ao mesmo tempo em que se mostra, esconde muito do que é registrado durante suas vivências, sendo capaz de questionar as separações e fixações impostas pela ciência clássica. Incapaz de apresentar respostas preestabelecidas como uma máquina, pois para o ser vivo a aquisição de um hábito verdadeiro é incorporação de uma forma suscetível de transformar-se.
Conforme os estudos de Oliveira apud Sousa (2004), o corpo é o ponto que o ser humano possui para conhecer e interagir com o mundo, e que este ponto de referência serve de base para o desenvolvimento cognitivo, para uma boa alfabetização e aprendizagem motora. Num primeiro momento, a criança visualiza esses conceitos através de seu corpo e só depois é que os visualiza nos objetos entre si.
Desta forma, deve-se levar em conta o que dizem Mendes e Nóbrega (2004, p. 133):
Assim refletimos sobre algumas possibilidades do corpo em movimento. Corpo que joga, que corre, que dança, que caminha ou que nada. Que pisca e se estende, que rola e enrosca, que vibra, que sacode. Que foge. Corpo que ri, que chora, que grita, que sofre. Corpos que se expressam fazendo aflorar as diversidades de sentidos criadas a partir do movimento.
Brondani (2001) destaca a importância da corporeidade tida como condição fundamental de existência. É elucidada pela presença do homem no mundo, é por meio do corpo que se compreende o outro, mas, mesmo percebendo-se de várias maneiras, cada um é um conjunto daquilo que os outros vêem nele, como ele se percebe, embora não seja possível a visão de sua completude. A autora ainda ressalta que por outro lado, em se tratando do corpo, é possível afirmar que este integra tudo que diz respeito à motricidade humana, ao domínio do espaço, aos gestos e expressões corporais.
De tal modo, o movimento assume o caráter de objeto da ação educativa física e, ao mesmo tempo, o meio de obter a dimensão física da educação, isto é, a prática educativa através do movimento corporal. Concebendo a dimensão física da educação como um dos caminhos para alcançar o desenvolvimento integral, mapeando o papel das atividades físicas na formação geral do sujeito.
Desta forma, Mendes e Nóbrega (2004, p. 135) afirmam que:
Pensar em uma nova agenda do corpo na educação geral e na escola em particular é inicialmente compreender, que o corpo não é um instrumento das práticas educativas, portanto, as produções humanas são possíveis pelo fato de sermos corpo. Ler, escrever, contar, narrar, dançar, jogar, etc são produções do sujeito humano que é o corpo.
Brondani (2001), aborda que, ao conjunto de saberes, métodos e técnicas centradas no corpo e no movimento, enquanto meios de formação tanto pessoal como social, recebe o nome de Educação Física, e por haver uma dimensão física na educação e uma dimensão pedagógica da Educação Física, pode-se dizer que cada uma delas tem muito a oferecer a outra.
1.2. A questão da afetividade
Segundo Chalita (2001) o pleno desenvolvimento do educando trata de ampliar a responsabilidade da educação para as habilidades sociais e psicológicas, priorizando a afetividade, o equilíbrio, a convivência plural.
Para que um grupo possa se constituir, é fundamental que se estabeleça uma relação de respeito mútuo. Respeitar alguém significa respeitar suas individualidades, suas formas de expressões e imagem, suas origens, suas escolhas, suas opiniões, seus limites e seus sentimentos. É através do vínculo afetivo que o processo de desenvolvimento pessoal e social se torna possível, pois tem um papel essencial em toda e qualquer ação que objetiva mudanças, transformações, funcionando como elo de uma corrente que liga indivíduos, favorecendo a ampliação do modo de sentir e perceber a si mesmo e ao outro (Serrão e Baleeiro 1999, p.32).
O respeito mútuo fundamenta as relações interindividuais entre professor e alunos nas salas de trabalho. Em conseqüência disso, os alunos se sentem à vontade no sentido de expressar suas opiniões, idéias, desejos, intenções, pois estão seguros de que não correm o risco de serem taxados de incapazes, ignorantes, ingênuos, etc (Mantoan , 2001).
Araújo (1998) comenta que na realidade concreta do dia-a-dia, cada um de nós, sujeitos psicológicos, somos constituídos (e nos constituímos) de um corpo biológico. Esse organismo sente fome, mas também sente prazer, sente raiva, amor e ódio. Sente-se tudo isso a partir das interações com nosso mundo interno e externo, que é objetivo e subjetivo, e nessa relação construímos uma capacidade cognitiva de organizar e reorganizar as experiências vividas. Portanto, fala-se de um ser que é biológico, afetivo, social e cognitivo ao mesmo tempo, sem que um desses aspectos possa ser considerado mais importante do que o outro, já que qualquer perturbação em algum desses subsistemas afeta o funcionamento da totalidade do sistema.
Conforme Mantoan (2001), o desenvolvimento sócio-afetivo é fruto de um contexto que se define por princípios de liberdade, respeito e responsabilidade, sendo o mundo social a fonte e o limite de suas realizações. Também se percebe que se encontram muitas relutâncias por parte de famílias que não crêem na possibilidade de seus filhos se desenvolverem socialmente, pois não conseguem reconhecê-los como pessoas capazes para tal.
Dessa forma, sabendo que a criança apresenta necessidades especiais a longo prazo ou permanentes, os pais (e, neste cão, muitas vezes, os professores) deparam-se com uma jornada que é completamente diferente daquela que haviam imaginado, podendo estarem despreparados e ficarem apavorados.
Lentamente as pessoas envolvidas com a situação de diferença acumulam uma enorme quantidade de informações com relação à saúde física - fala, habilidades sociais e técnicas motoras finas e amplas. Além disso, os pais e a família devem tomar decisões enquanto descobrem seu caminho por meio de novos sistemas, de novas culturas e de novas políticas. Tudo isso em um momento em que eles já estão cientes da necessidade de fazer “o melhor” para seu filho (Wise e Glass, 2003).
De acordo com Serrão e Baleeiro (1999), a aceitação das diferenças individuais e do jeito de ser de cada um possibilita a compreensão de que a diferença é um elemento que enriquece, mostrando outras formas de ser e fazer.
Com relação ao educador físico, cabe a este profissional a organização de um ambiente de respeito mútuo em sala de aula, abrindo espaço para a participação cooperativa de todos sem comparação de performances. O relacionamento com a família é fundamental neste aspecto. Conversar com os pais sobre suas expectativas, seus medos, desejos e investigar, principalmente quais são as expectativas, medos e desejos da própria criança são atitudes indispensáveis para a prática inclusiva.
1.3. A aprendizagem e o desenvolvimento motor
Segundo Gorgatti e Costa (2005), a crescente participação de atividades físicas, seja ela de forma auto-orientada, seja sob orientação e intervenção profissional, realizada individualmente, em grupos de condições similares ou em grupos diversos, demanda uma atitude profissional que permita ajustar as experiências de aprendizagem aos ideais, necessidades e potencialidades do praticante em relação à cultura corporal de movimento almejada.
De acordo com Rosseto (2005), em relação às dificuldades de aprendizagem, existem dois tipos de situações que se estabelecem no encontro professor-aluno: a primeira, quando os professores com muita eficiência e tranqüilidade, aprendem com as dificuldades que o aluno traz e aprimoram seu processo de ensino, com o que o aluno minimiza sua situação de incapacidade para a aprendizagem; a segunda, quando de forma improvisada, o professor enfrenta de forma “dolorida”, com muita queixa e imobilismo as dificuldades que esse educando traz para a sala de aula.
Nessa situação os alunos constroem uma experiência desestimulante com a aprendizagem, assumem o fracasso no aprender como uma questão pessoal, não como algo que pode estar na relação entre sujeitos da aprendizagem. Então terminam como fortes candidatos à exclusão do ambiente escolar.
Gallahue e Ozmun (2005), definem o aprendizado como um processo interno que produz alterações consistentes no comportamento individual em decorrência da interação da experiência, da educação e do treinamento com processos biológicos. Sua construção tem fortes vínculos com o estado de desenvolvimento de um indivíduo, relacionando-se diretamente com a prática, ou seja, o aprendizado é um fenômeno no qual a experiência é pré-requisito; o desenvolvimento, em oposição, é um processo que pode ocorrer independentemente da experiência.
Nesse contexto, Mello (2005) constata que a educação especial, não só recebe alunos com necessidades especiais mas também os atende nas suas especificidades, com recursos, com serviços e com currículos apropriados para garantir a sua aprendizagem. É de responsabilidade, pois, da educação especial organizar-se e adaptar-se para trabalhar com a diversidade, com a diferença, por isso mesmo optando por práticas pedagógicas distintas das convencionais.
O aprendizado de habilidades cognitivas ou motoras se resume na afirmação de que os fundamentos de qualquer assunto podem ser ensinados a qualquer indivíduo, em qualquer idade, de alguma forma. Em outras palavras, o reconhecimento de estar “apto” é responsabilidade tanto do educador quanto do aluno.
“A aptidão, que é a combinação de “desenvolvimento” maturacional, apropriação ambiental e sensibilidade do educador, tem numerosas implicações para as oportunidades de aprendizado por toda a vida.”(Gallahue e Ozmun , 2005, p. 65)
A história do desenvolvimento da criança é uma evolução por meio de uma série de estágios, começando ao nascimento com respostas sensório-motoras simples, congênitas e culminando na adolescência num modo de funcionamento maduro.
Desenvolvimento é um processo contínuo que se inicia na concepção e cessa com a morte. Inclui todos os aspectos do comportamento humano e como resultado, somente artificialmente pode ser separado em “áreas”, “fases”, ou “faixas etárias”. Em seu sentido mais puro refere-se a alterações no nível de funcionamento de um indivíduo ao longo do tempo.
“Uma necessidade especial no começo da vida de um sujeito não há de ser o centro inevitável de seu desenvolvimento, pelo contrário, é a força motriz de seu desenvolvimento, ou seja, a criança não vive a partir de suas necessidades especiais, mas a partir daquilo que para ela resulta ser um equivalente funcional” (Skliar, 2001, p. 13).
Segundo Gallahue e Ozmun (2005), a tendência de exibir diferenças individuais é crucial. Cada pessoa é um indivíduo peculiar com sua própria escala de tempo para o desenvolvimento. Essa escala de tempo é a combinação da hereditariedade do indivíduo e das influências ambientais. Embora a seqüência do aparecimento de características desenvolvimentista seja previsível, o índice de aparecimento pode ser bastante variável. Portanto, a adesão rígida à classificação cronológica de desenvolvimento por idade não tem apoio ou justificativa.
Assim, Curtiss apud Mello (1997, p. 24) comentam que:
As crianças serão beneficiadas em seu desenvolvimento, se puderem criar, aprender e descobrir, juntamente com o movimento que o próprio corpo lhes possibilita, e é esta descoberta que estamos empenhados em proporcionar, para que realmente possa usar seu corpo, como instrumento de seu próprio desenvolvimento.
Atualmente, a Educação Física tem muita importância no programa de educação geral. As atividades físicas e os esportes de todos os tipos são orientados para melhorar a postura, o desenvolvimento, o condicionamento, a saúde e também nos servem para a recreação e diversão (Adams, Daniel, Cubbin e Rullman 1985).
Assim, se a Educação Física pretende atender às reais necessidades da criança, precisa ter como ponto de partida a compreensão das mudanças no seu comportamento motor, com o objetivo de identificar tais necessidades .
2. O Educador Físico e a Inclusão
A Educação Física é uma prática que se utiliza de um mosaico de práticas corporais, envolvendo diferentes cidades, diferentes contextos, diferentes escolas e principalmente alunos e alunas diferentes. Uma proposta pedagógica de Educação Física deve possuir a abertura e a plasticidade para considerar as diferenças de contexto e as riquezas que podem ser promovidas ou resgatadas de uma cultura local.
As características dos grupos de alunos e alunas também são consideradas para ampliar as possibilidades pedagógicas das aulas, assim a Educação Física deve utilizar-se de boas aprendizagens (Falkenbach, 2002, p. 32).
As aulas de Educação Física, sob a perspectiva da necessidade pedagógica, requerem que sejam organizadas e desenvolvidas de tal maneira que não haja exclusões nem generalizações.
Assim:
Buscando a exercitação física educativa otimizada, particularizada a cada aluno, mas em ambiente coletivo, onde todos pedagogicamente, formalmente são iguais, apenas os conteúdos de cada aula poderiam ser adequados a determinadas particularidades de alunos que por atividades e necessidades ímpares, possam ter certa participação diferenciada durante as aulas (Pereira, 1997, p. 81).
O compartilhamento de responsabilidades em situações de inclusão de crianças no contexto educacional é fundamental.
A marca das experiências com resultados positivos apóia-se num pressuposto extremamente simples: a construção de um projeto-processo coletivo. Responsabilidade tem estreita correlação com liberdade. Diferentes graus de responsabilidade e de liberdade resultam em distintas propostas e tentativas, portanto, o sucesso será maior à medida que se encontrem maneiras para compartilhar as vivências (Gorgatti e Costa 2005, p. 21).
De acordo com Pereira (1997), garantir um espaço para compartilhar tentativas, socializar os medos e as angústias, problematizar mitos e tabus e criar coletivamente formas de enfrentamento de resistência são tópicos essenciais para uma ação confiante.
Soler (2002), enfatiza que, para desenvolver o processo de inclusão em uma escola, as primeiras pessoas a serem trabalhadas são os professores, e estes devem entender plenamente o sentido da inclusão, ou seja que quem se adapta é a escola ao aluno e não o aluno à escola. Nesse sentido, a escola e os professores deverão ter uma atitude investigativa e propositiva. Investigativa no sentido de conhecer o aluno e propositiva de forma a disponibilizar um ambiente de aprendizagem que realmente inclua este aluno.
Segundo Diehl (2006), o sucesso da aprendizagem está em explorar talentos, atualizar possibilidades, desenvolver predisposições naturais de cada aluno. As dificuldades, deficiências e limitações precisam ser reconhecidas, mas não devem conduzir ou restringir o processo de ensino. Para ensinar toda a turma, o professor não utiliza o falar, o copiar, e o ditar como recursos didáticos básicos. Ele partilha com seus alunos a construção/autoria dos conhecimentos produzidos em uma aula, restringindo o uso do ensino expositivo. Em sua aula os alunos passam a interagir e a construir ativamente conceitos, valores e atitudes. Esse professor arranja e explora os espaços educacionais com seus alunos, buscando perceber o que cada um deles consegue apreender do que está sendo estudado e como procedem ao avançar nessa exploração.
A Educação Física escolar pode estimular a cooperação como forma de aproximar as diferenças, antes reforçando a auto-estima de quem se sente diferente, e fazendo com que, ao final, todos estejam jogando e vivendo em comum-unidade. A cooperação está vinculada à comunicação, à confiança e ao desenvolvimento de habilidades positivas de interação social .
As aulas de Educação Física, para Pereira (1997), concentram-se no conjunto professor-aluno-conhecimento , (teoria, prática e inter-relacionamentos dos exercícios físicos) e ainda ressalta que a Educação Física é um meio para a realização humana.
De acordo Falkenbach (2002), os alunos nas aulas de Educação Física participam das diversas experiências corporais para as quais são provocados. Ao serem ajudados por professores e colegas, acabam por descobrir novos modelos. As relações entre os colegas provocam o simbolismo e a necessidade de comunicação nos participantes. Desta forma, Gramsci apud Pereira (1997) ressalta que o professor de Educação Física necessita desenvolver os conteúdos de forma a socializar a cultura, a buscar formar hábitos culturais novos, criar novas necessidades nos alunos no geral. O autor ainda aborda que:
Criar uma nova cultura não significa apenas fazer individualmente descobertas originais, significa também, e sobretudo, difundir criticamente verdades já descobertas, socializá-las (p. 82).
Assim, o planejamento profissional de um programa deve contemplar o desenvolvimento do saber, do saber fazer, do saber ser e do saber conviver, o que pressupõe considerar o ser humano na sua totalidade incluídos aos domínios cognitivo, motor, emocional e social .
Nesse sentido, Canfield (1998) alerta que o professor precisa saber quem é seu aluno, do que ele precisa, de seus limites, de seus desejos, para que o seu fazer pedagógico seja revestido de importância na vida do aluno. O professor precisa saber do poder da sua aula, da possibilidade que tem de poder proporcionar um ambiente ótimo de aprendizagem para seus alunos, não só no aspecto motor, mas no seu todo.
De acordo com Pereira (1997, p. 82), a concepção de Educação Física se volta didaticamente pra a realidade concreta. É nesse mundo, nesse momento, em meio às contradições sócio-econômico-culturais, em que as aulas acontecem, em que o professor e alunos vivem e devem necessariamente, buscar a felicidade, exercer a sua humanização.
O programa desejado, de inclusão, é audacioso na medida em que prevê qualidade de ensino para todos, pois exigirá mais recursos disponíveis nas escolas para atender às necessidades decorrentes dos programas vigentes e, ainda de um maior envolvimento docente quanto a sua formação e reflexão, o que tem causado inquietação aos professores, pois cabe a eles a responsabilidade de organizar as aprendizagens do aluno supostamente diferente dos outros, ordenando um espaço onde as trocas entre todos sejam facilitadoras de aprendizagens (Rosseto, 2005).
Segundo González (2002), com a educação inclusiva os professores têm possibilidades de:
criar clima adequado para a interação e a cooperação;
motivar os alunos, produzindo expectativas positivas e utilizando reforços de auto-estima e reconhecimento;
aceitar a diferença como componente da normalidade;
fomentar a convergência de todos os educadores por meio da atividade em equipe.
A Educação Física Inclusiva é a parte da Educação Social que se volta “particularizadamente”, para o corpo humano, e sob a exigência da unidicidade corporal, acontece pedagogicamente, a partir dos processos motores. Ela não pode ser entendida e desenvolvida sem seu obrigatório relacionamento com a totalidade da Educação Escolar (Pereira, 1997).
Os benefícios da inclusão na Educação Física são inúmeros, pois quando se participa com outras pessoas acontece um aumento de auto-estima, melhoria da competência física e social e também um aumento na variedade de modelos sociais propícios pela diversidade dos participantes. Ao longo dos anos, formou-se a idéia de que é muito difícil lidar com portadores de necessidades especiais, e como diz Rosadas apud Soler ( 2002):
Mas, para se descobrir o que é bom para eles, é preciso, antes de tudo, saber como são, para entendê-los melhor, e assim equacionar de forma mais equilibrada as atividades a eles destinadas.
Desta forma, os profissionais de Educação Física devem, segundo Gorgatti e Costa (2005, p.18):
“Assumir um papel transformador com a competência específica da área, sendo atores vivos que constroem, mantêm e alteram significados sobre a área, sobre si próprios e sobre as atividades pelas quais respondem”.
Uma atitude profissional que assume princípios baseados nas diferenças individuais é, segundo Sherrill apud Gorgatti e Costa (2005), extremamente essencial, assim a construção de uma atitude positiva voltada para as capacidades do participante e não para sua deficiência, constitui verdadeiro desafio na abordagem feita nos cursos de preparação profissional.
O processo educativo inclusivo traz sérias implicações para os docentes e para as escolas, que devem centrar-se na busca de rever concepções, estratégias de ensino, de orientação e de apoio para todos os alunos, a fim de que possam ter suas necessidades reconhecidas e atendidas, desenvolvendo o máximo de suas potencialidades.
Para tanto, Ramos (2005) enfatiza que é necessário uma efetiva preparação de profissionais de educação, que proporcione um desenvolvimento contínuo pedagógico e educacional que resulte numa nova maneira de perceber e atuar as com diferenças de todos os alunos em classe. Preparação que os faça conscientes não apenas das características e potencialidades dos seus alunos, mas de suas condições para ensiná-los em um ambiente inclusivo, assim como da necessidade de refletirem constantemente sobre a sua prática, a fim de modificá-la quando necessário.
Segundo González (2002), não existe, porém, uma receita a ser seguida. É importante que o professor seja apoiado e orientado no cotidiano escolar, de maneira a ser capaz de refletir de forma crítica e constante sobre sua prática com base em recursos teóricos e metodológicos, a fim de recriá-la constantemente.
Esta reflexão não deve se restringir apenas a uma teorização para compreender e explicar a prática, mas ser efetivamente crítica, de modo que, sempre que necessário, seja capaz de reformular e recriar a realidade vivenciada em classe.
O processo de inclusão exige do educador um lastro de formação que lhe permita ter consciência e clareza das problemáticas com que se defronta na escola. De alguns tempos para cá, de acordo com Pires (2006), em nosso país, paralelamente ao debate sobre inclusão em nossas universidades e em algumas de nossas escolas, como alimento desse debate, vem sendo produzido um corpo de saberes que começa a ter consistência, porque sistematizado, metodologicamente orientado e submetido a critérios éticos, cujos valores lhe emprestam a coerência.
O principal objetivo que a Educação Física deve tentar obter no trabalho com pessoas com necessidades especiais é a sua total reintegração na sociedade, com autonomia, liberdade, criatividade e alegria. Os outros objetivos complementares também são tentados, como melhora da condição motora, domínio do corpo para o desempenho de atividades biopsicossociais e um desenvolvimento sócio-cultural (Soler, 2002).
O plano didático deve ser elaborado não mais mediante os parâmetros pré-estabelecidos, mas levando em conta a realidade dos alunos da classe. Cabe ao professor a tarefa de adequar-se ao seu “público”. A avaliação deve ser feita considerando o potencial do aluno, e não as exigências do sistema escolar. Fazer da observação atenta o seu mais importante instrumento de tomada de decisão.
Essa observação deve igualmente alimentar o momento de reflexão pós-aula, no qual a aula será submetida à avaliação em todos os seus aspectos e se planejarão as ações futuras (Ramos, 2005).
Novas pesquisas foram feitas e mostraram que de acordo com Junior (2004), a pessoa com necessidades especiais pode muito mais do que se imaginava, mas o que acaba acontecendo na prática é o desprezo total de seu potencial. E este é um dos principais papéis da inclusão. Trata-se, portanto, da Educação Física aplicada em condições especiais, visando uma população especial, que necessita de estímulos de desenvolvimento global. Sendo o seu objetivo geral a reintegração do aluno na sociedade, e seu objetivo específico a melhora da sua condição motora, cognitiva e social, tornando-o mais independente, autônomo, crítico, cooperativo, enfim, feliz.
Os jogos cooperativos são uma alternativa produtiva para se trabalhar a inclusão na Educação Física, e segundo Orlik apud Moreira, 2003, p.108:
Os Jogos Cooperativos têm como característica principal a participação de todos, onde todos cooperam, vencem e nenhum deles perde. Foram criados para que as pessoas, e as crianças em especial, pudessem jogar de maneira divertida enquanto aprendessem coisas positivas a respeito de si mesmas, dos demais com quem jogam de modo como devem comportar-se no mundo. A cooperação é um meio eficaz a favor de uma retomada de consciência, contribuindo para diminuir a distância que separa pessoas, cidades, nações, países, enfim, incluindo todas as diferenças.
Existem algumas atitudes que devemos evitar no trabalho com portadores de necessidades especiais.
O professor de Educação Física na Educação Especial, durante a atividade, deve observar individualmente cada criança, e descobrir suas necessidades e, a partir daí, planejar suas aulas. É muito importante que as crianças sintam-se desafiadas e estimuladas a cada vez aprender mais (Soler, 2002).
Tendo em vista a enorme gama de conhecimentos necessários para a realização de uma educação física inclusiva, buscou-se conhecer a realidade de um grupo de professores de um Município da Região Norte do RS a fim de compreender quais as concepções e práticas de inclusão estão sendo realizadas por esses educadores em seu dia-a-dia na sala de aula. Os resultados desta investigação, que auxiliam a compreender a inclusão na Educação Física, serão apresentados no tópico a seguir.
3. A inclusão na perspectiva de educadores físicos
A Educação Física adota atitudes de respeito mútuo, dignidade e solidariedade em situações lúdicas e esportivas, repudiando qualquer espécie de violência, e de acordo com Soler (2002), cada vez mais valorizando o conceito de inclusão. Profissionais ligados à Educação Física estão sendo chamados para atuar junto a essa população especial, e surge uma questão: estariam esses profissionais preparados para receber e orientar pessoas com necessidades especiais?
A natureza das dificuldades encontradas pelos profissionais são, geralmente: problemas de aprendizagem, problemas de disciplina e necessidades educativas especiais. Estes, ressentem-se da falta de uma formação específica para o atendimento adequado de alunos com necessidades especiais.
Soler (2002) aborda que o papel do professor de Educação Física na Educação Especial, como em qualquer outra modalidade de ensino, é o de criar desequilíbrios, apresentando ao seu aluno o novo e o desconhecido, pois diante do desafio a criança tende a assimilar o conhecimento, utilizando os recursos motores e mentais que possui.
Provocar desequilíbrios, porém, não é deixar a criança à deriva, ela deve estabelecer uma ligação entre o conhecido e o desconhecido. O professor deve buscar identificar em suas aulas quais as necessidades e capacidades de cada pessoa, e com isso procurar potencializar sua autonomia.
O professor de Educação Física deverá fazer as adequações necessárias nas regras, nas atividades, na utilização do espaço, em materiais para estimular, tanto o aluno com necessidades especiais como em todo o grupo, possibilidades que favoreçam a sua formação integral.
Pires (2006) reflete que diante das dificuldades de tal enfrentamento, alguns educadores chegam a afirmar que seria mais producente que esses alunos, em vez de procurarem a escola pública que não lhes pode oferecer as condições de uma autêntica inclusão, permanecessem em clínicas ou instituições especializadas que contam com profissionais para atendê-los.
Para conhecer as concepções que um grupo de educadores físicos tinha com relação à inclusão foi aplicado um questionário semi-estruturado para os educadores físicos do Município de Não-Me-Toque, localizado na região norte do Estado do Rio Grande do Sul, que trabalham no ensino fundamental, nas escolas particulares e públicas da zona urbana. Responderam os questionários 20 educadores físicos, com um tempo de atuação escolar entre mais ou menos três e quinze anos, sendo destes 13 do sexo masculino e 7 do sexo feminino, com idades entre 22 e 54 anos.
As respostas foram tabuladas e, a seguir, serão apresentados gráficos ilustrativos dos resultados encontrados.
Gráfico 01. Você tem ou já trabalhou com alunos com necessidades especiais em suas aulas?
Fonte: Primária, Educadores físicos de Não-Me-Toque 30/10/2007
De acordo com o gráfico 01, na presente pesquisa 70% dos professores pesquisados, mencionaram que ainda não trabalharam com alunos com necessidades especiais e, 30% relataram que já trabalharam ou têm alunos com necessidades especiais em sua classe.
Conforme Stainback e Stainback (1999, p. 30), a inclusão há poucos anos era considerada irrealista pela maioria das pessoas até mesmo discutir a possibilidade de educar os alunos, incluindo aqueles com alguma necessidade educacional especial, nas escolas e nas turmas regulares. Agora, isso está sendo feito, em um número pequeno, porém crescente.
Gráfico 02. Em caso afirmativo, quais foram as dificuldades que você encontrou/vivenciou neste trabalho?
Fonte: Primária, Educadores físicos de Não-Me-Toque 30/10/2007
De acordo com o gráfico 02, dos professores participantes da pesquisa 35% afirmaram que o preconceito por parte dos demais alunos é um fator que dificulta muito o trabalho de inclusão. Outros 25% de entrevistados citam a falta de uma preparação profissional específica e 15% dos profissionais não têm segurança para adaptar as atividades conforme necessidade especial encontrada. Outra parte, 10% sentiram dificuldades quanto à estrutura física, 5% na comunicação, 5% relataram que o preconceito dos pais e professores influi de maneira negativa e 5% encontraram dificuldades por desinteresse do próprio aluno com necessidades especiais.
Segundo Pires (2006), a natureza das dificuldades encontradas pelos profissionais são: problemas de aprendizagem, problemas de disciplina e necessidades educativas especiais. Estes, se ressentem da falta de uma formação específica para o atendimento adequado de alunos com necessidades especiais. A maioria tem apenas o curso de magistério para o Ensino Infantil e Fundamental, e somente excepcionalmente um ou outro tem curso de pedagogia ou licenciatura.
De acordo com Rosseto (2005, p. 45), em relação às dificuldades de aprendizagem, existem dois tipos de situações que se estabelecem no encontro professor-aluno: primeiro, quando os professores com muita eficiência e tranqüilidade, aprendem com as dificuldades que o aluno traz e aprimoram seu processo de ensino, com o que o aluno minimiza sua situação de incapacidade para a aprendizagem; o segundo, quando de forma improvisada, o professor enfrenta de forma “dolorida”, com muita queixa e imobilismo as dificuldades que esse educando traz para a sala de aula.
Nessa situação os alunos constroem uma experiência desestimulante com a aprendizagem, assumem o fracasso no aprender como uma questão pessoal, não como algo que pode estar na relação entre sujeitos da aprendizagem. Então terminam como fortes candidatos à exclusão do ambiente escolar.
Gráfico 03. Você acha que sua escola dispõe de todos os recursos necessários para garantir uma boa educação para os alunos com necessidades especiais?
Fonte: Primária, Educadores físicos de Não-Me-Toque 30/10/2007
De acordo com o gráfico 03, no decorrer da pesquisa, 40% dos professores participantes, afirmaram que a sua escola dispõe de poucos recursos para atender os alunos com necessidades especiais, já 30% concordaram que sua escola está equipada adequadamente para receber essas pessoas. Outros 25% responderam que na sua escola não há nenhum recurso para esses indivíduos e 5% dos entrevistados preferiram não responder a essa pergunta.
Segundo Rosseto (2005, p. 43), o programa desejado de inclusão é audacioso na medida em que prevê qualidade de ensino para todos, pois exigirá mais recursos disponíveis nas escolas para atender às necessidades decorrentes dos programas vigentes e ainda de um maior envolvimento docente quanto a sua formação e reflexão, o que tem causado inquietação aos professores, pois cabe a eles a responsabilidade de organizar as aprendizagens do aluno supostamente diferente dos outros, ordenando um espaço onde as trocas entre todos sejam facilitadoras de aprendizagens.
Nesse contexto, Mello (2005, p.15) constata que a educação inclusiva, não só recebe alunos com necessidades especiais, mas também os atende nas suas especificidades, com recursos, com serviços e com currículos apropriados para garantir a sua aprendizagem. É de responsabilidade, pois, da educação inclusiva organizar-se e adaptar-se para trabalhar com a diversidade, com a diferença, por isso mesmo optando por práticas pedagógicas distintas das convencionais.
Gráfico 04. Você, como educador, sente-se apto para incluir pessoas com necessidades especiais em suas aulas?
Fonte: Primária, Educadores físicos de Não-Me-Toque 30/10/2007
De acordo com o gráfico 04, dos professores participantes da pesquisa, 40% não sabem se estão aptos para incluir pessoas com necessidades especiais em suas aulas e 35% afirmam que realmente não estão. Somente 25% acreditam que estão aptos para esse trabalho.
Segundo Pires (2006), diante das dificuldades de tal enfrentamento, alguns profissionais chegam a afirmar que seria mais producente que alunos com necessidades especiais, em vez de procurarem a escola comum que não lhes pode oferecer as condições de uma autêntica inclusão, permanecessem em clínicas ou instituições especializadas que contam com profissionais para atendê-los. O processo educativo inclusivo traz sérias implicações para os docentes e para as escolas, que devem centrar-se na busca de rever concepções, estratégias de ensino, de orientação e de apoio para todos os alunos, a fim de que possam ter suas necessidades reconhecidas e atendidas, desenvolvendo o máximo de suas potencialidades.
Segundo González (2002), não existe, porém, uma receita a ser seguida. É importante que o professor seja apoiado e orientado, no cotidiano escolar, de maneira a ser capaz de refletir de maneira crítica e constante sobre sua prática com base em recursos teóricos e metodológicos, a fim de recriá-la constantemente. Esta reflexão não deve se restringir apenas uma teorização para compreender e explicar a prática, mas ser efetivamente crítica de forma que, sempre que necessário, seja capaz de reformular e recriar a realidade vivenciada em classe.
Gráfico 05. Na sua opinião, qual a importância da família e da sociedade para a formação de uma pessoa com necessidades especiais?
Fonte: Primária, Educadores físicos de Não-Me-Toque 30/10/2007
De acordo com o gráfico 05, dos professores participantes da pesquisa, 34% afirmaram que o papel da família e da sociedade junto à escola, está em fazer com que a pessoa com necessidades especiais sinta-se aceita e integrada em seu contexto social. 25% relataram que estes devem ser os meios de socializar o indivíduo em qualquer contexto. 22% acreditam que a família e a sociedade influenciam positivamente na qualidade de vida e 19% acrescentaram que é na família e na sociedade que a pessoa com necessidades especiais precisa encontrar apoio psicológico, estímulo e carinho.
Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 no Art. 4º (p. 19), é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
De acordo com Fonseca (1995, p. 03-04), as necessidades sociais, a opinião pública e o interesse governamental, local e central, deveriam despertar para várias prioridades que permitam materializar, em termos gerais, a aceitação, a compreensão, a educação e a reabilitação de seres humanos com necessidades especiais. Na sociedade atual temos cada vez mais de aprofundar valores atitudinais compatíveis com os direitos humanos, pois em sentido lato todos os seres humanos possuem limitações e dificuldades, não esquecendo que qualquer um poderia ter nascido diferente, e ainda lembrando que todos podemos ser diferentes ou tornarmo-nos diferentes.
Considerações finais
De acordo com os dados obtidos e apresentados , percebe-se que 75% dos Profissionais de Educação Física que trabalham no ensino fundamental, nas escolas particulares e públicas da zona urbana de Não-Me-Toque (RS ), não estão ou não se sentem aptos a trabalhar com pessoas com necessidades especiais, o que evidencia uma insegurança e uma despreparação profissional neste contexto.
Também segundo os dados apresentados , percebeu-se uma realidade tendenciosa aos preconceitos e narrativas por parte dos professores , alunos e familiares das pessoas com necessidades especiais, o que evidencia ainda uma grande falta de informação sobre esse assunto.
Para que o processo de inclusão realmente aconteça, é necessário somarmos esforços e competências a fim de que se possa viabilizar a inserção das pessoas com necessidades especiais neste contexto de forma totalizadora e não fragmentada , pois somente a partir dessas premissas poderemos viabilizar a inclusão escolar juntamente com a inclusão social.
Os educadores físicos ao interagirem no processo de inclusão devem primar pela excelência na qualidade do atendimento aos alunos que apresentam necessidades especiais, realizando o seu papel com muita responsabilidade e ética profissional, mas para que isso ocorra, a qualificação profissional e a vontade de realmente exercer sua profissão devem andar juntas.
Ramos (2005) relata que é necessária uma efetiva preparação de profissionais de educação, que proporcione um desenvolvimento contínuo pedagógico e educacional que resulte numa nova maneira de perceber e atuar com as diferenças de todos os alunos em classe. Preparação que os faça conscientes não apenas das características e potencialidades dos seus alunos, mas de suas condições para ensiná-los em um ambiente inclusivo, assim como da necessidade de refletirem constantemente sobre a sua prática, com o intuito de modificá-la quando necessário.
Ao profissional de Educação Física, cabe não somente a responsabilidade de buscar a qualidade profissional e o ajustamento dentro dos contextos em que se atua, mas também interagir com a família, a sociedade e a escola, mostrando-lhes a importância e a responsabilidade que cada um possui perante o processo de inclusão.
Os profissionais de Educação Física deveriam, segundo Gorgatti e Costa (2005, p.18), assumir um papel transformador com a competência específica da área, sendo atores vivos que constroem, mantém e alteram significados sobre a área, sobre si próprios e sobre as atividades pelas quais respondem. Uma atitude profissional que assume princípios baseados nas diferenças individuais é, segundo Sherrill apud Gorgatti e Costa (2005, p. 18), extremamente essencial, assim a construção de uma atitude positiva voltada para as capacidades do participante e não para sua necessidade especial, constitui o verdadeiro desafio na abordagem feita nos cursos de preparação profissional.
Referências
ADAMS, Ronald C.; DANIEL, Alfred N; CUBBIN, Jeffrey A. Mc; RULLMAN, Lee. Jogos, esportes e exercícios para o deficiente físico. Barueri SP, Ed. Manole, 1985.
AGUIAR, João Serrapião de, DUARTE, Édison -
ANTUNES, Celso. As inteligências Múltiplas e seus estímulos. São Paulo, Ed. Papirus, 8ª ed. 2002.
ARAÚJO, Ulisses Ferreira. O déficit cognitivo e a realidade brasileira - in: Diferenças e preconceitos: alternativas teóricas e práticas. São Paulo, Ed. Summus, 2ª ed. 1998.
BRONDANI, Vânia. A Dança no ensino fundamental: a percepção do professor de Educação Física.( dissertação de mestrado em Educação), UPF, 2001.
CABRAL, Suzana Veloso; LANZA, Avani Avelar; TEJERA, Mariza Estela. Educar vivendo: o corpo e o grupo na escola. Porto Alegre, Ed. Artmed. 2ª ed. 1998.
CATUNDA, Ricardo. Recriando a recreação. Rio de Janeiro, Ed. Sprint , 2ª ed. 2002.
CHALITA, Gabriel. Educação: a solução está no afeto. São Paulo, Ed. Gente, 2001.
CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA DO RIO GRANDE DO SUL. Disponível em: http://www.cref2rs.org.br/conselheiros/coselheiros.asp. Acesso em 26 out. 2007.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Ed. Saraiva, 39ª ed. 2006.
DIEHL, Rosilene Moraes. Jogando com as diferenças: jogos para crianças e jovens com deficiência. São Paulo: Phorte, 2006.
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Conanda. Brasília, 1990.
FALKENBACH, Atos Prinz. A Educação Física na Escola: uma experiência como professor. Lajeado, Univates, 2002.
FERREIRA, Vanja. Educação Física, Recreação, Jogos e Desportos. Rio de Janeiro, Ed. Sprint, 2ª edição. 2006.
FONSECA, Victor da. Educação especial: programa de estimulação precoce. Porto Alegre, Ed. Artmed, 2ª ed. 1995.
GALLAHUE, David L.; OZMUN, John C. Compreendendo o Desenvolvimento Motor: bebês, crianças, adolescentes e adultos. São Paulo, Ed. Phorte, 2005.
GARDNER, Howard. As 8 inteligências - in: Revista Mente e Cérebro / p. 82. 2007.
GONZÁLEZ, José Antônio Torres. Educação e diversidade: Bases didáticas e organizativas. Porto Alegre: Artmed 2002.
GORGATTI, Márcia Greguol; COSTA, Roberto Fernandes da. Atividade física adaptada. Barueri SP, Ed. Manoele 2005.
HAAS, Aline Nogueira; GARCIA, Ângela. Expressão corporal como meio educativo. in: Cadernos Universitários. Canoas, Ed. Ulbra 2001.
JONNAERT, Philippe; BORGHT; Cécile Vander. Criar condições para aprender: o sociocontrutivismo na formação do professor. Porto Alegre, Ed. Artmed, 2002.
JÚNIOR, Afonso. Aprendizagem por meio da Ludicidade. São Paulo: Sprint 2004.
MANTOAN, Maria Teresa Egler. Compreendendo a deficiência mental: novos caminhos educacionais. São Paulo, Ed. Scipione, 2001.
MAZZOTTA, Marcos J. S. Identidade dos alunos com necessidades educacionais especiais no contexto da Política Educacional Brasileira. - in: Revista de Educação da Universidade Federal Fluminense. Educação Especial e Inclusiva. 2003.
MELLO, Nalú Cordeiro de. Que educação é essa? - in: Educação Especial: olhares interdisciplinares. LEBEDEFF, Tatiana Bolívar; PEREIRA, Isabela Lima e Silva. Passo Fundo Ed. UPF 2005.
MENDES, Maria Isabel Brandão de; NÓBREGA, Terezinha Petrúcia da. Corpo, natureza e cultura: contribuições para a educação - in: Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, 2004.
MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Necessidades educacionais especiais. - in: Dicionário Interativo da Educação Brasileira - São Paulo: Midiamix Editora, 2002.
MIRANDA, Mônica Carolina. Os caminhos da cognição - in: Revista Mente e Cérebro. p. 70, 2007.
MOREIRA, Evandro Carlos, Educação Física Escolar: Desafios e Propostas. São Paulo: Cortez 2003.
PEREIRA, Flávio Medeiros. O cotidiano Escolar e a Educação Física Necessária. Pelotas, Ed. Universitária UFPEL 2ª ed 1997.
PIRES, Gláucia Nascimento. Cotidiano Escolar na Escola Inclusiva. Rio de Janeiro: Vozes, 2006.
PROCURADORIA FEDERAL DOS DIREITOS DO CIDADÃO. O acesso de Alunos com Deficiência às Escolas e Classes Comuns da Rede Regula. Ministério Público Federal: Fundação Procurador Pedro Jorge de Melo e Silva (organizadores) 2ª ed. rev. e atualiz. Brasília, 2004.
RAMOS, Rossana. Passos para a Inclusão. São Paulo: Cortez 2005.
ROSSETO, Maria Célia. Falar de inclusão, falar de que sujeitos. - in: Educação Especial: olhares interdisciplinares. LEBEDEFF, Tatiana Bolívar; PEREIRA, Isabela Lima e Silva. Passo Fundo Ed. UPF 2005.
SANTIN, Silvino. Educação Física: uma abordagem Filosófica da Corporeidade. Ijuí - RS, Ed. Unijuí, 2ª ed. 2003.
SANTOS, Clóvis Roberto dos. Educação Escolar Brasileira: estrutura, administração e Legislação. São Paulo, Ed. Pioneira Thomson Learning, 2ª ed. 2003.
SERRÃO, Margarida; BALEEIRO, Maria Clarice. Aprendendo a ser e a conviver. São Paulo, FTD, 1999.
SKLIAR, Carlos. Educação e exclusão: abordagens sócio-antropológicas em educação especial. Porto Alegre, Ed. Mediação, 1997.
SOLER, Reinaldo. Brincando e Aprendendo na Educação Física Especial. São Paulo: Sprint 2002.
SOUSA, Dayse Campos. Psicomotricidade: integração, pais, crianças e escola. Fortaleza, Ed. Livro Técnico, 2004.
STAINBACK, Susan & STAINBACK, William. Inclusão: um guia para educadores. Porto Alegre: Artmed, 1999.
VIEIRA, Péricles; BAGGIO, André. Complexidade, Corporeidade e Educação Física. Revista Digital. Buenos Aires. Disponível em: http://www.efdeportes.com. Acesso em 04 abr. 2006.
WIKIPEDIA.
WISE, Liz; GLASS, Chris. Trabalhando com Hannah: uma criança especial em uma escola comum. Porto Alegre, Ed. Artmed. 2003.
Outros artigos em Portugués
revista
digital · Año 13
· N° 122 | Buenos Aires,
Julio 2008 |