Educação ambiental na dança de salão (danças sulistas): uma experiência no Rio de Janeiro Environmental education through ball dance (southern dances): an experience in Rio de Janeiro |
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Mestre em Ciências Biológicas, Universidade Federal do Paraná. Secretaria Municipal da Saúde do Município de Curitiba. Faculdade Anchieta de Ensino Superior do Paraná - FAESP. |
Maristela Zamoner mzamoner@sms.curitiba.pr.gov.br (Brasil) |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 120 - Mayo de 2008 |
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Introdução
Para Dias (1992), a expressão "educação ambiental" teria surgido durante um encontro de educadores na conferência de Keele, na Inglaterra em 1965. Segundo Leff (2001), a educação ambiental implica em consciência a respeito dos processos socioambientais emergentes. Para o autor, é importante a participação dos cidadãos na tomada de decisões e a transformação dos métodos de pesquisa e formação a partir de uma ótica holística e enfoques interdisciplinares.
No Brasil, a Lei N° 9.795, de 27 de abril de 1999 dispõe sobre a educação ambiental, instituindo a Política Nacional de Educação Ambiental. Segundo esta lei, Art. 1o "Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade".
A importância e a natureza transversal/interdisciplinar da educação ambiental são reconhecidas na educação formal brasileira (Brasil, 1997). Na educação informal as iniciativas são crescentes (Giesta, 2002). Muitas práticas inovadoras vêm ocorrendo nos mais diversos âmbitos (Carvalho, 2001), inclusive através de oficinas de dança de salão (Zamoner, 2007a) e uma diversidade de outras estratégias nesta mesma atividade (Zamoner, 2007b).
Os ritmos de valsa e marcha alemãs popularizaram-se na Região Sul do Brasil. Um dos motivos atribui-se a uma festa relevante para economia local (Blumenau), a Oktoberfest (Silveira, 1999), cuja criação está relacionada a uma problemática ambiental local.
De acordo com Soares (2004), a região do Vale do Itajaí, onde se localiza Blumenau, caracteriza-se pela vegetação montanhosa e alto índice pluviométrico. Segundo a autora, ocorrem chuvas intensas e de curta duração, que resultam em enchentes, cuja maior devastação data dos anos de 1983 e 1984, levando inclusive a vítimas fatais.
Segundo Eigenheer (1999), as tragédias das enchentes que afetam metrópoles brasileiras estão relacionadas, dentre diversos fatores, ao mau gerenciamento do lixo urbano, feito pela própria população. O autor reforça que os plásticos obstruem galerias e canais, consecutindo em diversos prejuízos.
Farah e Barboza (2000) relacionam o lixo como fator comprometedor dos recursos hídricos do território catarinense, juntamente com danos decorrentes da agricultura, metais pesados, efluentes domésticos e industriais. Nesta região, as enchentes aumentaram juntamente com a ocupação humana (Frank, 1995). A grande enchente de 1983 está relacionada à forma de ocupação humana daquele ambiente nos períodos imediatamente anteriores (Poleza, 2003). Para Jacobi (2003), a degradação ambiental, como a que resulta do processo desordenado de urbanização, amplia as visões sobre a educação ambiental, que deve ser politicamente voltada para transformação social.
Soares (2004), afirma que a criação da festa anual da cerveja, a Oktoberfest de Blumenau, foi a alternativa encontrada em 1983 para reanimar a população atingida pela enchente (muitos deles descendentes de alemães). Esta é a segunda maior festa da cerveja do mundo, inspirada na primeira, a Oktoberfest de Munique, Baviera, na Alemanha (Silva, 2004). As razões desta festa inspiraram a criação de diversas outras (Amaral, s/d).
A Instrução Normativa nº. 1, de 7 de março de 2005 regulamentou o Subsistema Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental (SINVSA). Suas atribuições abrangem: coordenação, avaliação, planejamento, acompanhamento, inspeção e supervisão das ações de vigilância relacionadas às doenças e agravos à saúde no que se referem a diversos fatores, inclusive desastres naturais como as enchentes. Também é sua atribuição promover estudos, intercâmbios de experiências, democratização de conhecimento na área, orientações e ações educativas. Desta forma, pesquisas e ações educativas voltadas à prevenção de enchentes contribuem também para o trabalho do SINVSA.
A proposta desta pesquisa é avaliar a experiência da oficina "Danças sulistas", realizada na cidade do Rio de Janeiro/RJ, em que se ensinou valsa e marcha alemãs por meio de uma abordagem ambiental.
MetodologiaA pesquisa foi realizada na Cidade do Rio de Janeiro/RJ, onde ocorreu o "V Salão Rio Dança", promovido pelo mantenedor da Agenda da Dança de Salão Brasileira, Marco Antonio Perna (1997).
O evento, ocorrido de 7 a 10 de junho de 2007, oportunizou ao público uma diversidade de oficinas e palestras.
A oficina de "Danças sulistas" foi ministrada por:
Maristela Zamoner: educadora com vasta produção científica nas áreas de dança de salão, educação ambiental, educação em saúde, graduada em Ciências Biológicas, especialista em Educação Ambiental, mestre em Ciências Biológicas, docente no ensino superior e professora de dança de salão há mais de 10 anos;
Clóvis Teixeira Filho: educador com produção científica nas áreas de dança de salão, educação e comunicação, graduado em Publicidade e Propaganda, especializando em Marketing, iniciou suas atividades como professor de dança de salão em 2000.
A oficina, proposta para iniciantes, teve a duração de duas horas e atendeu 10 alunos entre 22 e 58 anos de idade. Inicialmente, foi procedido um diagnóstico escrito para verificar o perfil da turma, se os participantes reconheciam a ligação entre enchentes e dança de salão e se admitiam a possibilidade da discussão de assuntos relacionados a meio ambiente em aulas dança de salão.
Os conteúdos de dança de salão foram selecionados de modo a representar os três estados da Região Sul do Brasil: Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Desta forma, a seqüência de atividades da oficina foi:
os professores foram apresentados aos alunos e vice-versa;
foi realizado o diagnóstico escrito por meio de formulários de perguntas;
procedeu-se alongamento/aquecimento de preparação para o início da prática de dança de salão;
foi apresentado e praticado o Curinga (Demário e Zamoner, 1997), passo de dança social ("dois e dois"; "dois por dois" etc.) utilizado em diversos ritmos tanto na cidade de Curitiba (Paraná) quanto em outras regiões;
foram ensinadas e praticadas as técnicas da marcha e da valsa alemãs (passo básico e variações) com abordagem histórica e ambiental, ilustradas com fotografias dos trajes típicos e das enchentes ocorridas no município em que acontece a Oktoberfest, Blumenau (Santa Catarina);
discutiu-se a questão das danças gaúchas (Rio Grande do Sul), cujo ensino e prática estão organizados por Centros de Tradição Gaúcha (CTG) e o fato de que muitas delas partem do Curinga;
procedeu-se alongamento de finalização e agradecimento dos professores pelo interesse dos alunos no tema;
foi realizado o pós-diagnóstico escrito por meio de formulários de perguntas;
o momento final caracterizou-se pelas despedidas e trocas de contatos entre todos os participantes.
Durante o ensino da marcha e da valsa alemãs, os professores apresentaram o contexto sócio-ambiental que favoreceu a popularização destas danças na Região Sul do Brasil, especialmente no que diz respeito às enchentes no Estado de Santa Catarina. Foram explanados os eventos agravantes das enchentes, enfocando fatores como o processo de urbanização que, geralmente, provoca descarga de dejetos nos rios. Discutiu-se a importância do gerenciamento adequado dos resíduos (lixo) e o que está ao alcance de todo cidadão, não só para prevenir enchentes, mas também para minimizar os problemas ambientais decorrentes de processos de urbanização.
O diagnóstico e o pós-diagnóstico foram analisados comparativamente para verificar possíveis mudanças de concepções dos alunos.
Resultados e discussãoParticiparam alunos de diversos estados do Brasil, dentre eles: São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul. O percentual de mulheres foi de 60% e de homens 40%.
O diagnóstico sobre o perfil educacional da turma revelou que a minoria dos alunos havia cursado no máximo até o ensino fundamental e o restante distribuiu-se igualmente entre alunos que concluíram o ensino médio e o ensino superior (Gráfico I).
A distribuição do tempo de prática da atividade de dança de salão em meses pode ser vista no gráfico II, demonstrando que, do ponto de vista da experiência com dança de salão, a turma é bastante heterogênea.
Em relação às idades, a distribuição está apresentada no gráfico III. Também em relação às idades a turma apresentou-se bastante heterogênea.
A atuação profissional dos alunos participantes da oficina pode ser observada no gráfico IV. Novamente a heterogeneidade se revela, agregando alunos, professores, estudantes e profissionais de diversas áreas.
A abordagem cultural foi apontada pelos alunos como uma das características específicas que mais gostaram na oficina (Gráfico V).
A maioria dos alunos, não apontou características que menos gostou. Os que o fizeram, foram: um aluno que gostaria de ver apresentação das danças que foram ensinadas e dois queriam praticar as danças gaúchas, que são organizadas e propagadas pelos Centros de Tradição Gaúcha (CTG).
Foi solicitado no pós-diagnóstico que os alunos atribuíssem uma nota de 0,0 a 10,0 para a oficina. Metade dos alunos, 50%, atribuiu nota 10,00. A média das notas foi 9,0. No diagnóstico, a maioria dos alunos não reconheceu a relação entre dança de salão e "enchentes", já no pós-diagnóstico, após a oficina, a maioria demonstrou que passou a entender esta relação (gráfico VI). Resultado semelhante foi obtido por Zamoner (2007a) ao realizar estratégia de educação ambiental por meio de oficina de dança de salão.
No próprio diagnóstico foi possível perceber que a maioria dos alunos entendia a possibilidade da relação entre meio ambiente e dança de salão. No pós-diagnóstico o percentual de alunos que faz esta relação aumentou (Gráfico VII).
ConclusãoA estratégia da oficina de dança de salão "Danças sulistas" foi eficiente para favorecer a percepção da relação entre a dança de salão e o meio ambiente, incluindo o problema ambiental das enchentes. Uma vez que o aluno busca esta atividade e através dela percebe um problema ambiental, suas causas e formas de prevenção, conclui-se que os espaços em que se pratica e ensina dança de salão podem se configurar adequados também para a formação da cidadania por meio da educação ambiental.
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