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Educação Física escolar: o impacto do processo de inclusão

 

*Pós-graduadas no Curso de Especialização em Pedagogia do Esporte Escolar

**Orientador do trabalho e Docente

Faculdade de Educação Física da UNICAMP

(Brasil)

Carolina Reis da Silveira* | Larissa Beraldo Kawashima*

Daniela Eiko Itani* | Maíra de Freitas Branco*

José Júlio Gavião de Almeida**

carolunicamp@yahoo.com.br

 

 

 

Resumo

          O presente artigo aborda o tema inclusão escolar dentro da Educação Física, com perspectiva de uma análise e discussão sobre o impacto deste processo, utilizando como base para os estudos a pesquisa bibliográfica, usufruindo os livros, as dissertações, as teses e os periódicos referentes ao tema definido, da biblioteca da Faculdade de Educação Física da UNICAMP e da UNESP/Bauru. Discutem-se as dimensões da inclusão/exclusão presentes nas aulas de Educação Física, apontando os princípios de cooperação aplicados ao ensino dos Esportes, que serão capazes de potencializar ações no processo inclusivo somente se houver conhecimento e atuação pedagógica eficaz do professor da área.

          Unitermos: Jogos Cooperativos. Educação Física Escolar. Esporte. Inclusão.

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 119 - Abril de 2008

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Os primeiros passos...

    Preconceito, respeito... Igualdade, diferença... Exclusão, inclusão... Educação Física!

    Palavras intrigantes, importantes e presentes em nossas vidas. Estas não são simplesmente palavras escritas em um papel, mas sim ações, atitudes e sentimentos existentes nas aulas de Educação Física nas escolas. Tudo isso porque, ao darmos aulas para os educandos, trabalhamos com seres humanos integrais.

    Este trabalho, englobado no processo de pesquisa bibliográfica, Lakatos e Marconi (1991), teve e tem grande relevância em nossas descobertas científicas, visto que, aos profissionais de Educação Física, atuantes no ensino regular, com experiências diversas e concretas, é possível vislumbrar uma participação efetiva neste processo inclusivo.

    Dentro da dicotomia inclusão e exclusão, existem diferentes exemplos que podemos explanar. Um deles é, por vezes, de caráter competitivo e excludente, priorizando os conceitos de capacidades e habilidades motoras tais como: agilidade, velocidade, equilíbrio etc., no qual, muitas vezes, o menos habilidoso é deixado de “lado” pelo grupo, por ele próprio, ou até mesmo pelo professor. Exemplos desta natureza podem ser problemáticos se não forem respeitadas algumas considerações, tais como os diferentes níveis de potencialidade e oportunidade de participação. Entende-se assim, que é possível excluirmos tanto aqueles alunos com grande bagagem motora, que podem até se tornar atletas futuramente, quanto os que terão a Educação Física apenas como forma de manifestação participativa. Há muitas outras situações de exclusão além dos “talentos motores”, tais como: racial, de biótipo, das pessoas com alguma deficiência (física, auditiva, visual, mental e múltiplas), de gênero, entre outras.

    A existência de inúmeras e constantes indagações em nosso cotidiano profissional instigou-nos a questionar, discutir e tentar descobrir caminhos para a inclusão. Discutimos, neste artigo, as dimensões da inclusão/exclusão presentes nas aulas de Educação Física Escolar, considerando um de seus conteúdos: o Esporte. Além disso, apontamos, de forma breve, se os princípios da cooperação, aplicados ao ensino dos Esportes, são capazes de potencializar ações positivas no processo inclusivo.

    Na medida em que os educandos, inseridos em uma sociedade com diversidade cultural, social e econômica, são despertados a conhecer, aprender, compreender e respeitar as características do outro, eles também acabam conhecendo as suas próprias diferenças.

    Vê-se, portanto, que o tema INCLUSÃO é de extrema relevância para o desenvolvimento dos alunos, da turma em que eles estão englobados, dos professores, da escola em geral e, conseqüentemente, da sociedade em que estão inseridos. Eles são seres humanos, com direitos e deveres. São, acima de tudo, cidadãos.

    Conforme Coelho (2001), um ser humano, recheado de sentimentos humanitários, sabe e vive a grandeza de todo e qualquer parceiro, principalmente quando este é diferente de nossos referenciais. Assim, devemos evidenciar a pessoa, como um ser humano, antes de qualquer diferença. O fato é que somos diferentes! Vale ressaltar que não desejamos ocultar a diferença e sim evidenciá-la de forma que ela não seja “ridicularizada”, mas respeitada. O respeito à diferença deve ser estimulado no processo de ensino escolar para ser concretizado dentro e fora deste contexto.

Um caminho...

                        ...Inclusão Social: A Escola

    A inclusão é um processo que envolve dinamismo, mudanças de atitudes e muita reflexão em torno da escola e da sociedade (CARVALHO, 1998). A inclusão, na concepção de Ferreira (1993), nada mais é do que inserir, introduzir, fazer parte, não apenas com outro indivíduo, mas sim com todas as pessoas de “modo igualitário”, pois vivemos em uma sociedade e não isolados uns dos outros. Deste modo, um mundo inclusivo é aquele em que todas as pessoas têm oportunidades de ser e estar inseridas na sociedade de forma participativa.

    Por inclusão entendemos ser um processo que engloba a educação inclusiva, que é sua prática ao setor educacional. A inclusão remete ao conceito de inclusão social como argumenta Sassaki (1997, p. 41):

    Conceitua-se inclusão social como o processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade. A inclusão social constitui, então, um processo bilateral no qual as pessoas, ainda excluídas, e a sociedade buscam, em parceria, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação de oportunidade para todos (SASSAKI, 1997, p. 41).

    Pensando no conceito de inclusão acima descrito, podemos verificar a importância de respeitar as pessoas como seres humanos acima de qualquer coisa, estes, cidadãos, possuidores de deveres e direitos.

    Direitos humanos são os direitos fundamentais de todas as pessoas, sejam elas mulheres, negros, homossexuais, índios, idosos, portadores de deficiência, populações de fronteiras, estrangeiros migrantes, refugiados, portadores de HIV positivo, crianças e adolescentes, policiais, presos, despossuídos, e os que têm acesso à riqueza. Todos, enquanto pessoas, devem ser respeitados, e sua integridade física protegida e assegurada. (BRASIL, 1998a, p.61).

    Uma das práticas sociais mais importantes para a formação cidadã das pessoas é a educação escolar, cuja, uma das funções é ensinar os aspectos éticos, morais etc, abrindo oportunidades para discussões e reflexões nas aulas e permitindo a construção de princípios e valores dignos de uma vida em sociedade.

    Para se obter uma escola inclusiva é importante compreender e reconhecer as diferenças de cada pessoa, perceber que o tempo não é igual para todos. É de extrema importância não rotular os alunos. É tempo de acabar com o preconceito e a discriminação, refletindo e agindo em busca de uma cidadania mais justa para todos (LIMA, 2001). Diferenciar e classificar os alunos dentro das suas possibilidades de atuação e participação em aula são atos de grande importância para o professor e completamente distintos da famosa “rotulação”. Sabe-se que é a partir dessa diferenciação e classificação que o planejamento irá se desenvolver e ser modificado conforme as necessidades de cada turma.

    Então, vê-se que no universo escolar, dentro de uma proposta de planejamento de Educação Física, aos poucos percebemos que não há uma “receita mágica”. Não basta simplesmente usá-la quando a dificuldade surge. No entanto, temos em mãos “ingredientes”, que vão se organizando conforme os interesses da turma e a necessidade da mesma. Logo, faz-se necessário a elaboração de um “caminho”, de um “mapa” ou de uma trilha para onde iremos “caminhar” junto com os alunos, englobando os “ingredientes” ao longo do ano. Esse “mapa” corresponde ao planejamento. O planejamento não deve assumir um papel inflexível. Temos que trabalhar conforme as necessidades do grupo. Ao longo da caminhada, muitas vezes, é preciso desviar o trajeto e para isso alguns atalhos podem existir, outros percursos podem surgir... Não serão atalhos aleatórios, mas sim coerentes com a proposta pedagógica da escola e com os interesses de cada turma.

    A escola inclusiva é uma escola para todos, e deve se inserir neste mundo inclusivo no qual as desigualdades não devem ser aspectos que atrapalhem o aprendizado e a convivência dos alunos.

    A inclusão social de um indivíduo pressupõe relação social, convivência, adaptação institucional, aprendizagem de normas, leis e valores do grupo, tornando a socialização um processo interativo (CALABRESI e MACHADO, 2001), no qual o indivíduo e a sociedade são agentes influenciados e influenciadores. Propõe-se a valorização da diversidade humana, vida e aprendizagem com todas as pessoas juntas, descoberta da contribuição que cada pessoa pode oferecer, exercício da independência pessoal nas decisões, otimização da autonomia, o aumento na equiparação de oportunidades e a adaptação da sociedade às necessidades humanas (TOLOCKA, 2001).

    Pode-se observar, no Brasil, a criação de estatutos e leis que tentam garantir a inclusão social, tais como o Estatuto das pessoas com Deficiência – Decreto Lei no. 3.298/99 - ou a indicação da modalidade de Educação Escolar a ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para educandos Portadores de Necessidades Especiais – Decreto Lei no. 9.394/96. Ambos os decretos desafiam a estabilidade das propostas de atividades motoras, que são realizadas apenas para grupos homogêneos. Tais decretos analisam a diferença como problema e não como valor. Deste modo, indica-se a inclusão de alunos com deficiência em aulas de Educação Física, que tem em sua tradição dispensar alunos que estejam fora da “normalidade”. Além disso, advoga-se o direito a uma prática desportiva em que haja mais do que respeito ao heterogêneo numa sociedade onde o Esporte promove agrupamentos de pessoas similares (TOLOCKA, 2001).

    Os parâmetros curriculares nacionais, do Brasil, advogam um princípio muito importante para a prática da Educação Física Escolar, que é o princípio da inclusão, dizendo que:

    [...] a inclusão do aluno é o eixo fundamental que norteia a concepção e a ação pedagógica da Educação Física Escolar, considerando todos os aspectos ou elementos, seja na sistematização de conteúdos e objetivos, seja no processo de ensino e aprendizagem, para evitar a exclusão ou alienação na relação com a cultura corporal de movimento. (BRASIL, 1998b, p.30).

    Ainda, que:

    [...] a sistematização de objetivos, conteúdos, processos de ensino e aprendizado e avaliação têm como meta a inclusão do aluno na cultura corporal de movimento, por meio da participação e reflexão concreta e efetiva. Busca-se reverter o quadro histórico da área de seleção entre indivíduos aptos e inaptos para as práticas corporais, resultante da valorização exacerbada do desempenho e da eficiência. (BRASIL, 1998b, p. 19).

    Estes princípios devem sustentar os trabalhos desenvolvidos no âmbito escolar, possibilitando, desta forma, a participação de todos.

Um atalho...

                    ...Cooperação, Esporte e Inclusão

    Baseando-se em Sassaki (1997), temos alguns princípios básicos da inclusão: a valorização do indivíduo, a aceitação das diferenças, o convívio com a diversidade e o aprendizado através da cooperação. Tendo em vista tudo isso, podemos caminhar por “atalhos” a fim de atingir o objetivo da inclusão.

    Assim, a cooperação, além de poder ter uma conexão direta com a inclusão, também possui alguns conceitos básicos a serem conhecidos. Segundo Brotto (2000), o processo de cooperação parte do individual para o grupal ou social.

Figura 1. O processo de cooperação

    Cooperação, de acordo com Ferreira (1986, p.479) é uma palavra originária do latim, que significa o “ato ou efeito de cooperar”. Esta significa “operar ou obrar simultaneamente, trabalhar em comum; colaborar, cooperar para o bem público; cooperar em trabalhos de equipe; ajudar, auxiliar, colaborar”.

    Os Jogos Cooperativos tiveram origem em meados de 1950 devido às preocupações da valorização exacerbada da individualidade e da competição excessiva, e da necessidade de criar atividades que desenvolvessem e/ou conscientizassem as habilidades interpessoais positivas em busca da “Paz Mundial”. O Brasil começa a se preocupar com essas questões aproximadamente em 1980 (BROTTO, 2001).

    Estes jogos possuem dois eixos principais: a participação de todos e um objetivo comum do qual todos se beneficiam. Nos esportes, a questão da cooperação é muito importante, principalmente entre os integrantes da mesma equipe. Mas podemos pensar também com relação a todos os atletas, pois estes cooperam com a regra para a realização do jogo.

    Tomando por base o mesmo autor, é possível oferecer aos educandos diferentes níveis de cooperação dentro dos Esportes, fazer também muitas atividades com a SIMPLICIDADE, sem perder a MOTIVAÇÃO e o PRAZER de se jogar COM o outro. Não há rigidez na aplicação dos diferentes tipos de Jogos Cooperativos. O que existem nos jogos e que podem ser descobertos pelo grupo de alunos e professor são novas soluções e novos caminhos.

    As características principais, de acordo com Brotto (2001), dos Jogos Cooperativos estão descritas no esquema abaixo:

Figura 2. Características dos Jogos Cooperativos

    Nos jogos cooperativos, a liderança circular é estimulada, a vontade de continuar jogando também. Todos são aceitos como são e pelo que são. Há ajuda mútua e confiança. PERSEVERAR é preciso, além do desejo de continuar jogando JUNTO.

    Assim, os jogos cooperativos podem realmente ser um interessante “atalho” no ensino de um dos conteúdos da Educação Física, o Esporte. Podemos constatar alguns exemplos de aplicação dos jogos cooperativos no esporte em Brown (1994), Deacove (2002), Brotto (2001), Paes (2001).

    No entanto, vale ressaltar que os princípios da cooperação, aplicados ao ensino dos Esportes, serão capazes de potencializar ações positivas no processo inclusivo somente se houver conhecimentos específicos da área da Educação Física. Os profissionais devem compreender o esporte e os jogos cooperativos, buscando as suas interações e inter-relações para auxiliar o processo de inclusão. Sua atuação pedagógica deve ser, obviamente, eficaz, não se esquecendo da sua função como agente pedagógico e sua importância no processo educacional. Se nada disso ocorrer, os jogos cooperativos perderão seu significado dentro deste complexo processo de ensino-aprendizagem e não estimularão em nada a inclusão, tornando-se um “atalho” falso e vazio.

Conclusão

    Vê-se, portanto, que os Jogos Cooperativos também podem se tornar um ótimo instrumento dentro do processo pedagógico, voltado para a Educação Física Escolar. Um de seus propósitos, nessa direção, percebe-se pela potencialidade de desenvolver o conteúdo Esporte através destes jogos e que, por sua vez, podem contribuir com o processo de inclusão. Conteúdos estes necessários de conhecimento para ser trabalhado e aplicado nas escolas, levando em consideração as suas condições sociais, culturais, políticas e econômicas.

Referências bibliográficas

  • BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais. Brasília, 1998 a.

  • BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Educação Física. Brasília, 1998b.

  • BROTTO, F. O. Jogos cooperativos: se o importante é competir, o fundamental é cooperar! Santos: Re-novada, 2000.

  • ______. Jogos cooperativos: o jogo e o esporte como um exercício de convivência. Santos: Projeto Cooperação, 2001.

  • BROWN, G. Jogos cooperativos: teoria e prática. São Leopoldo: Sinodal, 1994.

  • COELHO, V. A inclusão é estar na vida! In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE MOTRICIDADE HUMANA, 2. 2001, Muzambinho. Anais... Muzambinho: SBMH, 2001 (CD-ROOM).

  • CALABRESI, C. A. M.; MACHADO, A. A. Inclusão social e educação física escolar: o jogo psicológico real. Motriz, Rio Claro, v. 7, n. 1, p. S197, 2001.

  • CARVALHO, E. R. Temas em educação especial. Rio de janeiro: WVA, 1998.

  • DEACOVE, J. Manual de jogos cooperativos: joguem uns com os outros e não um contra os outros. Santos: Projeto Cooperação, 2002.

  • FERREIRA, A. B. de H. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

  • ______. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

  • LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. de A. Fundamentos de metodologia científica; 3. ed. São Paulo: Atlas, 1991.

  • LIMA, S. M.; RIBEIRO, S. Inclusão e esporte: um caminho a percorrer. Revista da SOBAMA, Curitiba, v. 6, n. 1, p.36-46, 2001.

  • PAES, R. R. Educação física escolar: o esporte como conteúdo pedagógico do ensino fundamental. Canoas: Ulbra, 2001.

  • SASSAKI, R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.

  • TOLOCKA, R.E. Motricidade humana e atividades motoras adaptadas. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE MOTRICIDADE HUMANA, 2001, Muzambinho. Anais... Muzambinho: SBMH, 2001 (CD-ROOM).

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revista digital · Año 13 · N° 119 | Buenos Aires, Abril 2008  
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