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A pedagogia do futsal no contexto educacional da escola

 

*Licenciada em Educação Física – UNESP/Bauru; Especialista em Pedagogia do Esporte Escolar
UNICAMP e em Educação Física Escolar – CEUCLAR/Batatais.

**Licenciada em Educação Física – UNESP/Bauru; Especialista em Pedagogia do Esporte Escolar – UNICAMP.

(Brasil)

 Larissa Beraldo Kawashima*

larissa@fc.unesp.br

Maíra de Freitas Branco**

mafbranco@hotmail.com

 

 

 

 
Resumo

          O estudo aborda a problemática do esporte na escola e tem como objetivo sugerir uma sistematização dos conteúdos do futsal no âmbito da educação física escolar (ensino fundamental – 1ª a 8ª séries). O ensino do futsal no contexto escolar tem três eixos exploratórios: o como ensinar (procedimentos pedagógicos), o que ensinar (conteúdos) e o quando ensinar (séries do ensino fundamental). Os conteúdos do futsal escolar abrangem desde as habilidades mais simples como o domínio do corpo e atividades de manipulação de bola para as séries iniciais do ensino fundamental até habilidades especificas de cada função tática dos jogadores e sistemas de ataque e defesa para as ultimas séries do ensino fundamental, procurando diversificar ao máximo a prática do aluno. Assim, com a vivência prática aliada aos conceitos teóricos, o profissional de Educação Física conseguirá propor mudanças (e mudar) o ensino do esporte da escola e, consequentemente, da educação física escolar.

          Unitermos: Esporte. Escola. Futsal.

 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 119 - Abril de 2008

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Introdução

    Esporte na escola e esporte da escola... especialização precoce e diversificação... fragmentação de conteúdos e sistematização de conteúdos... Dentre os discursos e propostas idealistas que se contrapõem à realidade praticada na escola, como deveria ser trabalhado o futsal escolar?

    A realidade escolar atual têm no esporte seu conteúdo fundamental e único, delimitando em bimestres as modalidades esportivas coletivas (voleibol, basquetebol, handebol e futsal) e reproduzindo o esporte do clube na escola, ou seja, esporte na escola. Sob a ótica de que o clube atende apenas a um segmento social e, ainda, possui materiais diversos para a prática esportiva (bolas para todos os alunos) e possibilita a homogeneidade dos praticantes (sexo e idade), podemos afirmar que o esporte do clube é igual ao esporte da escola? Pensando especialmente nas escolas públicas, o contexto educacional é adverso ao clube, à contabilizar os materiais (geralmente inexistentes), sem falar no grupo heterogêneo, não só no sexo e idade, mas características sociais. Então, deve existir o esporte da escola e não apenas instituir o esporte na escola! O esporte neste sentido deve ser compreendido como facilitador no processo educacional, concebido como meio de integração e formação do aluno (PAES, 2001). Assim, deve estar vinculada aos objetivos estabelecidos pelo projeto pedagógico da escola que transcendem os objetivos de uma prática esportivizada com fim somente na prática (PAES, 2002).

    A educação física escolar enfrenta entraves que são agravados pelo desinteresse, desinformação, utilização de pedagogias inadequadas, entre outras características do profissional que atua na área. A especialização precoce é um problema grave constantemente presenciado na escola, pois os professores tentam transformar crianças em atletas, inspirados pela glória da vitória nos diversos jogos escolares. Neste caso além de gerar problemas como estresse na competição, saturação esportiva, lesões, formação escolar deficiente, ausência da diversificação de movimentos e reduzida participação em jogos e brincadeiras (SANTANA, 2003a), cultiva ainda a exclusão dos menos aptos. O esporte é trabalhado de forma desorganizada, sem a continuidade e a evolução necessária ao aprendizado, sendo que há o hábito de repetir os conteúdos nas diferentes fases do ensino, por exemplo o futsal trabalhado na 4ª série é o mesmo da 6ª série, que por sua vez é o mesmo do 2º colegial (PAES, 2002).

    Será o fim da educação física escolar e do esporte escolar? O que fazer? O aspecto relevante para a construção de uma proposta pedagógica que norteie o esporte da escola (e todo o conteúdo da educação física) é a sistematização dos conteúdos, relevando os diferentes níveis de ensino e a diversificação dos conteúdos. No caso do futsal (não diferente dos outros conteúdos), deve-se obedecer a uma sequência de aprendizagem, respeitando as características dos alunos em cada faixa etária, e trabalhando o esporte de forma organizada e sistematizada (PAES, 2001). A diversificação de movimentos, das práticas e manifestações (neste caso, dentro do futsal), ampliam o universo de possibilidades dos alunos, já que a educação física escolar dispõe de uma diversidade de formas de abordagem para a aprendizagem, entre elas as situações de jogo coletivo, os exercícios de preparação corporal, de aperfeiçoamento, de improvisação, a imitação de modelos, a apreciação e discussão, os circuitos, as atividades recreativas, enfim, todas devem ser utilizadas como recurso para a aprendizagem (BRASIL, 1998).

    Mas todo este discurso não terá lógica alguma se não for sustentado por algumas palavras chaves, que são princípios indispensáveis para o desenvolvimento integral dos alunos: autonomia, inclusão, cooperação, convivência, participação e as inteligências múltiplas. Assim, este texto tem o objetivo principal de sugerir uma sistematização dos conteúdos do futsal no âmbito da educação física escolar (ensino fundamental – 1ª a 8ª séries).

Como ensinar o futsal na educação física escolar?

    A educação física é uma disciplina pedagógica permeada de pensadores e professores preocupados com a melhoria do seu tratamento pedagógico no contexto escolar. Os procedimentos pedagógicos são os mais diversificados e todos complementares, pois a escola atende a sociedade, e atender a sociedade é lidar com contextos socioculturais expressivos, além das características físicas e desenvolvimentistas que cada aluno apresenta. A idéia básica é que o professor, ao ensinar futsal na escola, deve ter conhecimentos sobre os procedimentos de ensino e escolher os mais adequados para a realidade de sua escola e de cada turma que trabalha. Neste sentido, citaremos alguns procedimentos de ensino que possam nortear o ensino do futsal na escola.

    Como principal facilitador do ensino do futsal, destacamos a importância do jogo no processo de formação do aluno, como é defendido por Freire e Scaglia (2003), Paes (2002) e Rangel-Betti (2001). O jogo é o procedimento pedagógico mais utilizado na escola porque necessita de poucos materiais, o que já se sabe é escasso nas escolas. Através do jogo, a sociedade se desenvolve, o aluno é motivado a aprender, as habilidades são aperfeiçoadas, desenvolvem a criatividade, a cognição e aprendem a resolver problemas e a tomar decisões. Além de estimular a inclusão e o desenvolvimento das inteligências múltiplas, entre outros (BALBINO, 2002).

    Nos primeiros anos (1ª a 4ª série) é importante trabalhar a ludicidade, como destaca Santana (2003b):

    “Principalmente nos primeiros anos de aprendizado, deve-se veicular o componente lúdico. Os jogos da cultura infantil têm essa característica. Praticando jogos já conhecidos, fica mais fácil para o professor ensinar o que a criança ainda não sabe e deve aprender. O lúdico é a ponte. Essa atitude de aprender com prazer, brincando, sinaliza para outra: gostando de como aprendem esporte, as crianças poderão incorporá-lo definitivamente em suas vidas” (SANTANA, 2003b).

    Ainda nos quatro primeiros anos do ensino fundamental, destacamos a importância de não trabalhar conteúdos específicos de cada esporte coletivo, no caso o futsal, e sim com elementos comuns a todos eles, para que não ocorra a especialização precoce e, ainda, o privilégio da técnica. Com a utilização de jogos também relevaremos a lógica do jogo, assim a técnica será aprendida em decorrência dos jogos, sendo estes propósitos defendidos pelos autores Claude Bayer (1992), Júlio Garganta (1995) e Roberto Paes (2002). Estes autores também preconizam que os esportes coletivos possuem princípios operacionais comuns: sistemas ofensivos e defensivos. Estes princípios, pressupõe-se que devam ser ensinados a partir da 4ª série e os sistemas específicos do futsal, a partir da 5ª série, com utilização de sistemas simples.

    O professor Wilton Santana (comunicação pessoal, 27 de novembro de 2003) destaca quatro tipos de atividades motoras para ensinar o futsal: as tarefas que são vivências do gesto motor sem a preocupação com o aprimoramento técnico; as brincadeiras que são jogos presentes na cultura popular e infantil; os jogos reduzidos, com espaço e número de jogadores reduzidos, preservando-se ou não a unidade do jogo; e os jogos adaptados, quando joga-se a quadra toda, podendo-se alterar ou não o número de jogadores, com regras adaptadas e preservando ou não a unidade do jogo (cooperação, oposição, finalização e diversidade).

    Outro ponto importante a ser destacado é o bom nível de relacionamento entre os alunos e com o professor - sendo essenciais para a aprendizagem dos conteúdos propostos - e a aprendizagem social e reflexiva dos alunos. Uma sugestão é a estrutura das aulas compostas de reuniões com os alunos para planejamento e decisões prévias sobre a aula, realização do jogo ou atividade eleita, paralisação do jogo para discussão, reflexão e propostas para continuidade da aula, testagem da solução e variantes e, avaliação e planejamento da aula seguinte. O professor deve buscar o consenso e aceitação entre os alunos com ampla flexibilidade no desenvolvimento do conteúdo (BRACHT, 1992). Contudo, devemos incentivar os alunos a construírem as atividades ou jogos para a aprendizagem do futsal na escola (FREIRE, 1989).

    Assim, sugeridos alguns meios de trabalharmos com os conteúdos do futsal escolar, possibilitamos ao profissional de educação física escolar utilizá-los segundo suas necessidades e objetivos das aulas.

O que e quando ensinar o futsal na educação física escolar?

    O ensino fundamental, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998), é dividido em ciclos, sendo a 1ª e 2ª séries constituintes do 1º ciclo, 3ª e 4ª séries do 2º ciclo, 5ª e 6ª séries do 3º ciclo e, 7ª e 8ª séries do 4º ciclo. Para o ensino fundamental, os conteúdos do futsal para a educação física escolar serão, de modo geral: domínio do corpo, habilidades básicas, manipulação de bola, passe, recepção, drible, finalização (PAES, 2002), habilidades específicas do futsal – domínio, controle, condução, chute, cabeceio, passe, drible, finta, marcação, antecipação, proteção de bola e habilidades do goleiro (SANTANA, 2003c) e sistemas.

    A organização de um cronograma de conteúdos representado pelo Quadro 1 será estabelecido levando em conta que nos dois primeiros ciclos devem ser trabalhados os esportes coletivos de modo global, ou seja, será trabalhado os elementos do futsal, mas sem nomear o esporte diretamente, e não haverá divisão por bimestres. À partir do terceiro ciclo o futsal poderá ser trabalhado separadamente dos outros esportes coletivos. Nesta fase indica-se a utilização do jogo de futsal formal (5 contra 5) ao final de todas as aulas, propondo e auxiliando aos alunos a colocarem em prática os conteúdos aprendidos durante a aula.

Quadro 1. Cronograma de conteúdos do futsal para o ensino fundamental.

Série

Conteúdos

Orientações didáticas

Domínio do corpo

Habilidades básicas

Jogos de regras da própria cultura infantil.

Jogos pré-desportivos.

Jogos reduzidos.

Jogos adaptados.

Jogos com ou sem unidade de jogo.

Brincadeiras.

Manipulação de bola

Habilidades básicas

Passe

Recepção

Drible

Sistemas de ataque e defesa comuns aos esportes coletivos

Início ao futsal:

Prévia dos fundamentos específicos do futsal.

Habilidades específicas (domínio, controle e condução de bola)

Sistemas:

ofensivos (situações 1X1, 2X1,..., diversidade)

defensivos (1X1, 2X2, 1X2,..., diversidade) – habilidade: marcação.

Incentivar aos alunos construírem seus próprios jogos à partir de materiais ou objetivos sugeridos pelo professor.

Tarefas (Circuitos de atividades).

Brincadeiras.

Jogos reduzidos.

Jogos adaptados.

Jogos com unidade de jogo.

Jogos sem unidade de jogo.

Utilização de vídeos e textos sobre o assunto.

Observação de jogos ao vivo ou pela televisão.

Elaboração de painéis de exposição na escola, sobre diversos temas acerca dos conteúdos trabalhados no futsal.

 

Habilidades específicas (passe, recepção e chute-finalização)

Sistemas:

ofensivos: 2.1.1 (primeira bola perdida – no ataque)

defensivos: individual (habilidade: marcação)

contra-ataque.

Habilidades específicas (drible, finta e cabeceio)

Sistemas:

ofensivos: 1.2.1

defensivos: zona (habilidade: marcação)

contra-ataque.

Habilidades específicas (antecipação e proteção de bola)

Funções específicas de cada jogador (incluir habilidades do goleiro)

Sistemas:

ofensivos: 2.2

defensivos: zona e individual

contra-ataque.

Considerações finais

    O futsal (e o futebol) é o esporte mais popular do Brasil e, por isso, não podemos deixar de destacar sua relevância para a cultura corporal de movimento da escola e sua conseqüente influência na aprendizagem sociocultural e motora dos alunos.

    A discussão articulou os problemas presentes no contexto escolar, desde o tratamento que o esporte deve ter na escola, o que, quando e como devemos trabalhar o futsal (esporte) na escola. Com o objetivo de sugerir uma sistematização dos conteúdos para o futsal escolar (ensino fundamental – 1ª a 8ª séries), foram norteados procedimentos de ensino que enfatizaram a importância do jogo em sua interface com o esporte.

    Assim, com a vivência da prática aliados aos conceitos teóricos o profissional de educação física conseguirá propor mudanças (e mudar) a “cara” do ensino do esporte da escola e, consequentemente, da educação física escolar – área da educação ainda discriminada na escola.

Referências bibliográficas

  • BALBINO, Hermes Ferreira. Os jogos coletivos e as inteligências múltiplas na interface da relação homem e ambiente. In: MOREIRA, Wagner Wey e SIMÕES, Regina (org.). Esporte como fator de qualidade de vida. Piracicaba: UNIMEP, 2002.

  • BAYER, Claude. La enseñanza de los Juegos Desportivos Colectivos. 2ª edição. Barcelona, Espanha: Hispano Europea, 1992.

  • BRACHT, Valter. Educação física e aprendizagem social. Porto Alegre: Magister, 1992.

  • BRASIL: Parâmetros curriculares nacionais: educação física / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC SEF, 1997. (1º e 2º ciclos).

  • _____: Parâmetros curriculares nacionais: educação física / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC SEF, 1998. (3º e 4º ciclos).

  • FREIRE, João Batista. Educação de corpo inteiro: teoria e prática da educação física. São Paulo: Scipione, 1989.

  • FREIRE, João Batista; SCAGLIA, Alcides José. Educação como prática corporal. [Pensamento e ação no magistério] 1ª ed. São Paulo: Scipione, 2003.

  • GARGANTA, Júlio. Para uma teoria de los Juegos Desportivos colectivos. In: GRAÇA, A. e OLIVEIRA, J. (org.). O ensino dos jogos desportivos. 2ª ed. Porto: Universidade do Porto, 1995.

  • PAES, Roberto Rodrigues. A pedagogia do esporte e os jogos coletivos. In: Rose Jr., D. de. Esporte e atividade física na adolescência: uma abordagem multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2002. p.89-98.

  • _____. Educação física escolar: o esporte como conteúdo pedagógico do ensino fundamental. Canoas: Editora ULBRA, 2001.

  • RANGEL-BETTI, Irene Conceição. Jogos: possibilidades e adequações. In: Perspectiva em educação Física escolar, v.2, nº1, p. 20-30. (suplemento). s/e, 2001.

  • SANTANA, Wilton Carlos. (10/2003) Riscos de uma Especialização Precoce. Pedagogiadofutsal.com.br

  • _____. (05/2001) A Dimensão Educacional do Futsal. Pedagogiadofutsal.com.br

  • _____. Teoria das habilidades específicas do futsal. Pedagogiadofutsal.com.br

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