A formação contínua dos professores de Educação Física escolar La formación continua de los profesores de Educación Física The continuous formation of physical school education teachers |
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* Professora de Educação Física da ULBRA/SM. Especialista em Aprendizagem Motora; Mestre em Desenvolvimento Humano: Psicologia do Esporte. UFSM e Doutora em Psicologia pela PUCRS.**Professor de Educação Física e Mestrando em Educação – PPGE – Centro de Educação da UFSM *** Professor de Educação Física e Especializando em Gestão Escolar UCB.
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Maria Cristina Chimelo Paim* Alexandre Paulo Loro** Gilnei Tonetto*** |
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Resumo Num mundo marcado por constantes e rápidas mudanças torna-se imprescindível discutir sobre a importância da formação contínua à profissão docente. O principal objetivo desse trabalho então, é apresentar um estudo em que alguns professores de Educação Física relatam seu entendimento a respeito dos processos de Formação Contínua. Os colaboradores, todos atuantes em escolas da rede pública de ensino no município de Santa Maria/RS, responderam um questionário semi-estruturado, o que levou a constatar com evidência que a Formação Contínua é tida como sinônimo de cursos e que; a falta de tempo, a dificuldade para afastamento e os altos custos destacam-se como seus fatores limitantes. A Formação Contínua vem sendo desenvolvida, inclusive nas próprias escolas. Acredito que esta vem a ser uma das melhores possibilidades de formação docente e, respectivamente, da qualidade de ensino. Unitermos: Formação contínua. Professores. Educação Física.
Resumen En un mundo marcado por constantes y rápidos cambios se vuelve indispensable discutir sobre la formación continua de los docentes. El principal objetivo de este trabajo es presentar un estudio en el que algunos profesores de Educación Física relatan lo que entienden respecto de Formación Continua. Los Colaboradores, todos actuantes en escuelas de la red pública de educación en el Municipio de Santa Maria/Rio Grande do Sul, respondieron un cuestionario de preguntas semi-estructurado, lo que nos llevó a constatar que la Formación Continua para ellos es sinónimo de cursos y que, la falta de tiempo, la dificultad de obtener licencias en el trabajo y los altos costos se destacan como factores limitantes. La Formación Continua, esta siendo desarrollada inclusive en las propias escuelas. Creemos que esta viene a ser una de las mejores posibilidades de formación docente y respectivamente de calidad de la enseñanza. Palabras clave: Formación continua. Profesores. Educación Física.
Abstract The main objective of this work is to present a study in which some Physical Education teachers report their understanding of the Continuous Formation process. The collaborators, all working in public schools in the city of Santa Maria/RS answered semi-structured questions, which made us notice that the Continuous Formation consists of the continuity of courses but the lack of time and costs are the main reasons not to take them. But it is also developed, in schools. It’s believed that it is one of the best possibilities of teaching formation and, respectively, of the teaching quality. Keywords: Continuous formation. Teachers. Physical Education. |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 119 - Abril de 2008 |
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Introdução
No decorrer da história muitas mudanças ocorreram na educação. No entanto, algumas características e tendências ainda se fazem presentes, inclusive, em específico, na Educação Física escolar brasileira. Alguns destes aspectos não condizem mais com a nossa realidade. O momento atual é marcado por inúmeras mudanças: científicas, tecnológicas, paradigmáticas, etc. Independente da área do conhecimento, os profissionais necessitam ser multifuncionais e competentes. Hoje, o professor mais do que nunca, necessita atualizar-se constantemente para atender às necessidades educacionais escolares. Alarcão (2001) ao referir-se à Formação Continuada, coloca que a função dos docentes exige consciência de que sua formação nunca está finda, pelo contrário, encontra-se num constante vir a ser, primando pela qualidade de seu ofício e pela sua flexibilização diante de tantas mudanças.
Há alguns anos atrás se acreditava que, com o diploma de um curso superior qualquer profissional estaria capacitado a atuar pelo resto de sua vida na profissão. Com o profissional de Educação Física não foi diferente. Carrascosa (1996) relata que
(...) a formação de um professor é um processo a longo prazo, que não se finaliza com a obtenção do título de licenciado (nem mesmo quando a formação inicial tiver sido de melhor qualidade). Isso porque, entre outras razões a formação docente é um processo complexo para o qual são necessários muitos conhecimentos e habilidades, impossíveis de ser todos adquiridos num curto espaço de tempo que dura a Formação Inicial (CARRASCOSA, 1996: 10-11).
A Formação Inicial não é suficiente para assegurar um trabalho de qualidade. Conforme Hargreaves (2002), essa formação inicial é apenas o primeiro passo para a formação docente contínua. A educação é um conceito amplo de ensino, é um processo continuado de aprendizagem que não se encerra ao final do ensino médio, de uma graduação ou de uma pós-graduação, é um processo para toda a vida. Em contrapartida, Demo (2000) nos diz que a maioria dos professores não possui o hábito de aprender sistematicamente, pois internalizaram a idéia de que já aprenderam o que tinham de aprender, como se o seu ofício se resumisse simplesmente a ensinar, e ao educando apenas aprender.
Muitos profissionais entendem que a sua Formação Inicial e Continuada deu-se no curso de graduação e acabam reproduzindo na escola o que eles aprenderam com seus professores. Outros, porém, a partir da Formação Inicial buscam se aperfeiçoar/qualificar constantemente para melhorar a qualidade da educação através de aquisição de livros, participação em grupos de estudos, palestras, oficinas, congressos, simpósios, cursos de especialização, mestrado ou doutorado.
É imprescindível que o professor mantenha-se atualizado, flexível às mudanças e que continue permanentemente sua formação. Terá então, como principal função: aprender, inovar, diversificar, rever conceitos, etc., para que possa atender às necessidades educacionais escolares, na melhora da qualidade da educação brasileira. Em tempos de globalização, o acesso às informações é muito rápido. O professor necessita qualificar-se constantemente para tentar acompanhar este processo de mudança. Entendemos então, como Formação Continuada:
A formação recebida por formandos já profissionalizados e com vida ativa, tendo por base adaptação contínua a mudanças dos conhecimentos, das técnicas e das convicções de trabalho, o melhoramento de suas qualificações profissionais e a sua promoção profissional e social (NASCIMENTO, 1995 apud MERCADO, 1999: 105).
Em face deste conceito, nosso principal objetivo foi verificar se os professores de Educação Física escolar da Rede Pública de ensino estavam buscando qualificação profissional continuada. Em específico, almejamos juntamente: analisar qual o entendimento que os professores têm por Formação Continuada; levantar os motivos que levaram os professores a se qualificar ou deixarem de se qualificar; relatar quais as perspectivas destes educadores quanto a sua qualificação continuada; investigar se as instituições escolares proporcionam a formação continuada na ou fora dela.
Partindo deste contexto, buscamos refletir de como podemos estabelecer relações com a formação continuada do professor de Educação Física. Julgamos que ainda não se refletiu suficientemente sobre o trabalho docente que se realiza na escola. Defendemos a necessidade de o profissional refletir na e sobre a prática desenvolvida na escola. Em síntese, acreditamos na importância da reflexão-na-ação. Nóvoa (1997) considera que é familiar a figura do professor como transmissor de conhecimentos, técnico, executor de rotinas, planificador, sujeito que toma decisões ou resolve problemas, etc.
As contribuições da Formação Continuada para a melhoria da prática escolar e da qualidade do ensino, constituem um espaço significativo para relatos de experiências de professores e também um momento de troca de saberes. Os educadores quanto práticos reflexivos devem ser capazes de refletirem sobre si mesmo e sua própria prática. Diante da incorporação das idéias do saber docente no cenário educacional, faz-se necessário conhecer sua gênese.
Tardif (2002: 32) afirma que o professor é alguém que sabe alguma coisa e cuja função é transmitir esse saber aos outros. Todavia, essa afirmação torna-se um problema na medida em que é “preciso especificar a natureza das relações que os professores estabelecem com os saberes”. Surge então a seguinte pergunta: de onde é proveniente este saber? O professor não é um mero transmissor de conhecimentos preestabelecidos. Sua prática é constituída, de forma geral, por diferentes saberes. Ao referir-se à origem destes saberes, Tardif (2002) classifica em:
Disciplinares: vem a ser àquele conhecimento selecionado pelas instituições educacionais sob forma de disciplinas;
Curriculares: apresentam-se sob a forma de programas escolares, com objetivos, métodos e conteúdo;
Experenciais: é os saberes desenvolvidos durante a prática de sua profissão, seja ela individual ou coletiva;
Formação profissional: é o conjunto de saberes transmitido pelas instituições de formação de professores.
É de grande importância investir nos saberes, os quais os professores são portadores e trabalhá-los. É necessário um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re) construção permanente de uma identidade pessoal. Faz-se então, necessário proporcionar espaços de interação entre as dimensões pessoais e profissionais, possibilitando ao educador apropriar-se dos seus processos de formação e dar-lhes um sentido no quadro de suas histórias de vida. Ou seja, a formação está intimamente ligada à produção de sentido sobre suas vivências.
Ao considerar as demais formações (informais), a exemplo dos processos de auto-formação, investimentos educativos das situações profissionais e articulação com projetos educativos na escola, estaremos valorizando não apenas a Formação Continuada do professor, mas também estaremos reforçando a autonomia da escola. Por isso, a Formação Continuada não se reduz a um simples aperfeiçoamento, mas uma possibilidade de reforma educativa inovadora, que visa resolver os problemas das instituições escolares.
As possibilidades de capacitação coletiva dos professores nas escolas aonde vêm atuando, apresentam-se como uma abertura oportuna para se alcançar estes diferentes sujeitos e pode ser vista como um dos elementos fundamentais para um ensino de qualidade por apresentar possibilidade de aprendizagem contextualizada. Através de um trabalho coletivo podemos chegar a discussões de propostas alternativas, que possibilitem a (re) construção de soluções pedagógicas, sociais e políticas. Neste sentido, compartilhamos com Souza (2006) a idéia da realização da formação continuada em serviço. A capacitação em exercício pode contribuir em diversos momentos se trabalhada reflexivamente para que a personalidade profissional docente e rotina de ação sejam melhores alicerçadas, com uma fundamentação didático-pedagógica em consonância com a atualidade e com a sua área de atuação. Ao mesmo tempo em que promove um (re) pensar e (re) construir coletivo do próprio ambiente de trabalho.
Os professores precisam sensibilizar-se para as enormes carências de nossa formação, reconhecendo assim, que há necessidade de continuar investindo na formação profissional constantemente. Face ao exposto, com este nosso trabalho, almejamos contribuir para a reflexão sobre a Formação Contínua e encontrar subsídios que venham a construir propostas alternativas condizentes com a realidade escolar e, que estas possibilitem a (re)construção de uma prática pedagógica mais contextualizada e voltada às transformações e exigências do mundo contemporâneo.
O caminho percorrido
A pesquisa envolveu onze professores de Educação Física da cidade de Santa Maria/RS. Todos eles foram escolhidos aleatoriamente e estão atuando na Rede Municipal e Estadual de Ensino. Sua grande maioria, nove são formados pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), um pela Escola Superior de Educação Física (ESEF) - atual Ulbra da cidade de Cachoeira do Sul – RS e um pela Universidade de Cruz Alta (UNICRUZ). Todos se formaram entre os anos de 1979 e 1990. Destes, dois são licenciados, sete são especialistas e dois são Mestres.
Os professores participantes da pesquisa contribuíram voluntariamente ao responderem um questionário semi-estruturado, referente à sua qualificação profissional. Muitos de seus relatos encontram-se citados no decorrer da leitura e, partindo de suas colocações, levantamos três categorias de análise que seguem abaixo:
O que é formação continuada mesmo?
Os colaboradores da pesquisa ao serem questionados sobre qual entendimento tinham de Formação Continuada, conceituaram-na, de maneira geral, sendo “a constante atualização do professor”, e sua "busca contínua de conhecimentos”. Assim, constatamos que os docentes pensam a Formação Continuada como uma maneira de se manterem atualizados com o que existe de novo, fortalecendo assim a prática pedagógica que por sua vez, “deve ser realizada todo ano”. Houve aqueles que afirmaram ser “a retomada de conteúdos”, vistos anteriormente em outras épocas, sejam de cursos ou da faculdade. Repensar aquilo que já vem sendo trabalhado seria uma nova maneira de olhar para aquilo que está sob nossos olhos há muito tempo. Segundo a professora Nair*
(...) é a busca constante do professor por novos conhecimentos, se aperfeiçoando, pesquisando e até mesmo no trabalho quando surge um problema, uma dificuldade, é ali um momento de se buscar resolver estes problemas – é a busca de um novo saber.
Percebemos aqui, além da incessante busca pelo novo, a problematização a partir do próprio local de trabalho,
onde os professores têm a possibilidade de discutir/debater os assuntos com seus colegas. Este ponto de vista salientado é também compartilhado por uma outra professora. Temos o seguinte recorte(...) Está acontecendo pra nós agora a Formação Continuada na escola, onde os professores são convidados a participar de cursos. Ali tem vários palestrantes. Agora a pouco, inclusive, o sindicato dos professores municipais realizaram um seminário convidando quatro palestrantes: professores de História, de Educação Física, etc. Todos contando suas experiências, seus saberes, que cada professora acaba tendo, fazendo na sua prática. (...) eu entendo como Formação Continuada isso, aquele trabalho que tem na escola e que pode ter uma fundamentação. (...) a gente acaba ficando só na escola e na sala de aula, acaba não lendo, procurando outras coisas, ficando só naquele teu saber, e a Formação Continuada vem àquela fundamentação que agente precisa para nossas aulas (...) uma continuidade do trabalho (Professora Paula).
* (Todos os nomes do(as) professores(as) desse artigo são fictícios)
Apenas duas professoras pensam dessa maneira, uma minoria. A representação predominante das professoras sobre Formação Continuada refere-se à realização de uma pós-graduação, seja em nível de especialização, mestrado ou doutorado, além de participação de cursos, seminários e palestras. Ou seja, a formação está fora do domínio escolar. Conforme a professora Maria, ela nos diz que “procura fazer bastantes cursos. Cursos que da para fazer da área eu faço (...)”. Para o professor Joaquim, “a formação é o constante aperfeiçoamento do professor, seja através de cursos, seminários e palestras”.
Diante destas diferentes concepções de Formação Continuada, perguntamos se os professores acreditam que a Formação Inicial que tiveram atende às expectativas da comunidade escolar de hoje. Os colaboradores admitiram que não atende mais às exigências contemporâneas. Justificam argumentando que a Formação Inicial foi um tanto falha: “o curso deixou a desejar” e, que “nenhuma faculdade diz tudo”. Constata-se aqui, que a formação dos professores nos dias de hoje não pode mais estar reduzida aos conteúdos das disciplinas e as técnicas de transmissão desses conteúdos, já que se deparam nas escolas com alunos de várias realidades para ensiná-los, sendo necessário trabalhar com um conhecimento em construção, onde a vida e as experiências diárias ensinam a ele que é necessário buscar o novo. A vida e as experiências diárias ensinam que é necessário buscar o novo. O ensino tecnicista de outrora, preparava para competição e formação de equipes. As turmas eram separadas por gênero, fartura de material e turmas pequenas para o desenvolvimento das atividades. Algo bem diferente da realidade e finalidade das aulas de Educação Física Escolar da rede pública. Outra crítica foi em relação à matriz curricular. Apesar de boa fundamentação teórica, as discussões eram distantes do universo prático.
Eu me formei na universidade tendo todo um material e chego numa escola de zona rural, que tinha um espaço de tabatinga e uma bola furada. Hoje, se for lá às coisas estão bem diferentes. As próprias aulas de Educação Física estão diferentes. Eu fui reestruturando esta fundamentação que eu tive na universidade, refazendo, e aprendendo novamente dentro das dificuldades que eu tive na escola (Professora Catharina).
Este constante refazer e aprender leva alguns poucos professores, em contrapartida, a acreditarem que a Formação Inicial da época condiz com a atualidade, por se tratar que eram discutidos assuntos universais e básicos à sua formação. A Professora Vera, neste sentido nos diz que: “a base que eu tive naquela época, até hoje me ajuda. É claro que de uma forma não totalmente como eu recebi os conteúdos, mas aquela base me ajuda ainda hoje”.
Percebe-se que a Formação Continuada é, enfim, por demais elementar para alguns e claramente insuficiente para outros. Há diferentes entendimentos. Se os professores possuem um conceito tão diferenciado, buscam também sua atualização de diversas maneiras. (PERRENOUD, 1998). Alguns aspectos dificultam isso. É o que discutiremos a seguir.
Participação e limitação docente na auto-formação
Todos os professores afirmam participar de atividades que visam proporcionar a sua Formação Permanente, sempre que possível. Esta por sua vez, é fruto da busca por cursos, palestras, seminários e congressos, geralmente promovidos na cidade local pelo Sindicato ou Secretarias Municipal e Estadual de Educação (gratuitos) ou demais Instituições de Ensino.
Pesquisas realizadas em livros e na internet, grupos de estudos virtuais e entre colegas, estágios, pós-graduação latu sensu presencial e à distância, participação de projetos de ensino pesquisa e extensão junto a Universidades são entendidos como um meio de enriquecimento cultural na formação, embora de forma modesta ainda. Mas, afinal de contas, o que impede os professores em continuar investindo em sua própria formação? Foram levantadas algumas dificuldades por ordem de freqüência que apareceram:
A falta de tempo foi o principal motivo. As cargas horárias dos professores são geralmente fragmentadas em várias escolas. Trabalham cerca de 40h semanais ou mais. Uma professora relatou trabalhar em quatro escolas, sendo 10h/aula em cada uma delas. “Perde-se muito tempo se deslocando”, pois são escolas distantes uma da outra. Cada uma delas tem seu planejamento, reuniões, avaliações, atividades complementares próprias, etc. o que faz o professor ter bastante pressa e pouco tempo. Criticam que estão presos a uma carga horária que dificulta ainda mais a sua saída para formação. Sobra pouco tempo até mesmo para a dedicação familiar, aspecto também salientado.
A dificuldade de afastamento do trabalho por estarem demasiadamente envolvidos com obrigações profissionais impede a liberação dos professores de suas escolas para a formação fora dela. Há “dificuldade em fechar os horários”, comenta um professor. Além do mais, há cobrança de formação permanente. O Município ou o Estado oferecem cursos, mas não anistiam a carga horária destes dias de encontros, portanto deverá ser cumprida. Os professores acabam por ter de adaptar seus horários para recuperar os dias ausentes. Com as reuniões pedagógicas, realizadas semanalmente, acontece à mesma coisa: devem ser recuperadas.
O alto custo na participação de eventos aparece como outro empecilho. Com baixos salários torna-se difícil o deslocamento para fora da cidade ou região. Mas há quem não concorde com isso, como no caso do professor Eduardo: “não é tanto o financeiro, mas a estimulação. Às vezes a forma e o método empregados nestas “reciclagens” nos frustram”.
O termo “reciclagem” representa a antiga designação dada à Formação Continuada e que ainda se faz presente no imaginário de alguns professores de maneira negativa. Concomitante, a crítica aos métodos utilizados que, por sua vez, não motivam e cativam o público. As mesmices nos cursos realizados e a falta de sentido/significado tornam-se distantes da realidade e dos interesses dos professores, não vendo “aplicabilidade” na realidade escolar. Nem tudo que chega a eles pode ser designado como “formação”. O protesto abaixo, expressa além de uma insatisfação com os atuais cursos uma outra maneira de visualizar a Formação Continuada.
(...) tenho uma crítica em relação a estes seminários que eu sempre participo, mas participo como ouvinte. Deveria ter um momento coletivo, que seria da gente ouvir e momento pra pequenos grupos pra gente discutir e isso não acontece (Professora Catharina).
Os professores gostam de participar da Formação Continuada quando é levado em conta o trabalho que vem sendo desenvolvido por eles, grau de envolvimento entre os participantes e, possíveis relações estabelecidas com a própria disciplina. A reflexão sobre a prática é importante. Algumas respostas demonstram a desmotivação do professor com sua própria profissão, o que leva a acomodação. Há quem espere a chegada da aposentadoria com o fim de sua carreira docente, como nos coloca o professor Joaquim: “posteriormente a isso, pretendo fazer tudo aquilo que gostaria de fazer e não fiz: jogar com as amigas, ir à academia, caminhar (...)”.
Dois professores afirmaram não encontrar dificuldades que os impeçam de se qualificar. Trata-se de uma minoria. A maioria tem dificuldade. No entanto, todos acreditam que a atualização profissional é importantíssima. Independente de qual for à área de atuação. “Sempre se aprende algo”. Trata-se de uma oportunidade de se estabelecer um contato com outras possibilidades de desenvolvimento pessoal e profissional.
Antes de mais nada é uma necessidade para o professor conseguir acompanhar o processo de evolução. O conhecimento que temos hoje pode vir a ser questionado daqui uns dois ou três anos. Talvez seja questionado se isto é o melhor. Ela é muito importante (...) (Professor João).
A citação supracitada do professor expressa a busca constante pelo novo, a qual impede cair na mesmice. É um fator que possibilita o enriquecimento cultural. Os professores ao investirem em sua formação “aprendem a todo o momento”. A construção de conhecimento acompanha não somente o lado profissional, mas contribui por toda a vida.
A formação continuada na escola
Pela Formação Continuada novas idéias e propostas metodológicas surgem. À medida que se tem alcance de mais subsídios para o planejamento escolar, problematização do cotidiano escolar e trabalho consciente, o conhecimento é construído e desenvolvido. Isso leva a um enriquecimento e amadurecimento na maneira de pensar e agir docente. Isso é o que foi levantado nos questionários. Como dizia Freire (1996), o inacabamento do ser humano faz com que este esteja sempre aberto ao diálogo.
(...) a gente não está pronto nunca (...) se achar que está tudo bem, acabamos nos acomodando. Este último seminário que a gente fez, o comentário geral de todos foi de que nunca se tinha participado de um seminário tão bom. Ficamos até o final, foi bom mesmo (Professora Fátima).
O seminário o qual a professora se refere é realizado na própria escola em que trabalha no decorrer do ano letivo. Os assuntos discutidos são propostos por eles mesmos, a partir do contexto local. Ao se trabalhar com uma proposta articulada como essa, é estabelecida conexão com o meio e com a vida, proporcionando ganhos a toda comunidade escolar.
A realização da formação na própria escola é um grande passo nesse sentido, não somente porque ela constitui um coletivo de formação, mas também porque a formação acontece no local de trabalho do professor, ficando menos facilmente separada das práticas. (PERRENOUD, 1998: 209)
O debate gerado pelos assuntos de interesse coletivo, possibilita uma formação de êxito, que aborda temas do cotidiano do professor, propiciando com isso novas idéias, informações, conhecimentos, que pode ser aplicado no seu trabalho. Caso contrário, se os assuntos proporcionados não condizem com a realidade dos professores, acabam gerando descontentamento e eles terminam não investindo e nem comparecendo nos cursos.
Os encontros formativos realizados nas escolas são proporcionados geralmente trimestralmente ou no início, meio e fim do ano. Isso facilita o processo, caso contrário, a escola tem de fechar suas portas para a saída dos professores e estas aulas terão de ser recuperadas. Acreditam que cabe a eles a iniciativa de ir ao encontro das universidades e solicitar sua ajuda. Quanto maior a abertura às discussões, melhor será a qualidade no ensino. Neste sentido, o papel desenvolvido pelas direções escolares é de vital importância, já que a Formação Continuada só acontecerá na escola se ela “(...) tiver uma direção comprometida com a transformação e disposta a acompanhar os professores nessa caminhada...” (MEDIANO, 1999: 94).
Algumas poucas escolas se encontram em situação privilegiada por localizarem-se geograficamente próximas a Universidade Federal de Santa Maria – UFSM. Desta maneira, fica mais acessível convidar professores e grupos de acadêmicos de diversas licenciaturas a desempenhar atividades de seus interesses, sejam elas, palestras, oficinas, cursos, ou até mesmo projetos de pesquisa, ensino e extensão. A realidade das demais escolas não é a mesma, devido às suas localizações. De uma forma geral, está sendo proporcionado às escolas realizar a Formação Continuada na própria escola, no entanto, ainda é algo novo.
Algumas de nossas considerações
É importante insistir na Formação Contínua na escola, pois o modo de elaboração desse dispositivo de formação e inovação é tão importante quanto seus próprios conteúdos. Isso exige do professor um trabalho contextualizado, participativo e interativo, onde ele possa discutir expor, debater suas angústias, problemas, receios com seus colegas, favorecendo o diálogo, oportunizando a troca de experiências, gerando a construção de novos saberes que serão usados no dia-a-dia da prática pedagógica. Gostaríamos de chamar atenção, através da idéia de Tardif e Lessard (2004), que as pessoas são a “matéria-prima” do processo do trabalho interativo e o desafio primeiro das atividades. A atividade docente não tem nada de natural e simples, (...) “mas é uma construção social que comporta múltiplas facetas (...)” (TARDIF, 2004: 41), a qual está inserida num conjunto inteiro de controle de regras institucionalizadas e burocratizadas. Trata-se de um trabalho composto, onde os fenômenos de tensão e dilemas dificultam a atuação plena.
Historicamente a escola foi e ainda é invadida por modelos de gestão e de execução de trabalho oriundos do contexto industrial e organizações econômicas hegemônicas. Junto a isso, essa unidade desenvolve relações de poder e forma uma organização burocratizada. O sujeito professor, dentro desse contexto, pode ser visto datado historicamente, sujeito a essa interferência. Além de uma profissão desgastante por estar em interface com o outro, ela encontra-se dentro de uma organização repleta de normas, que muitas vezes impossibilita o potencial criativo que os professores gostariam de ter.
Os resultados da pesquisa nos levam a crer que, a Formação Contínua realizada na escola vem a ser uma das melhores possibilidades para a formação docente e, respectivamente da qualidade do ensino, isso devido à exigência de um trabalho mais contextualizado, participativo e interativo do professor. Ao expor suas angústias, problemas e receios com os demais colegas, estão favorecendo o diálogo, oportunizando a troca de experiências, gerando a construção de novos saberes usados na prática pedagógica.
Referências
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CARRASCOSA, J. Análise da Formação Continuada e permanente dos professores de Ciências. IN: MENEZES, L. C. (org.). Formação Continuada de professores de ciências no contexto Ibero-americano. Campinas/SP: Autores Associados, 1996.
DEMO, P. Conhecimento e Aprender: sabedoria dos limites e desafios. Porto Alegre: ARTMED, 2000.
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
HARGREAVES, A. Aprendendo a mudar: o ensino para além dos conteúdos e da padronização. Porto Alegre: artmed, 2000.
MEDIANO, Z. D. A formação em serviço dos professores através de oficinas pedagógicas. In: Candau, V. M. (org). Magistério: construção coletiva. 3ª edição. Petrópolis: Vozes, 1999.
NÓVOA, A. (coord.). Os professores e sua formação. Lisboa, Dom Quixote, 1997.
PERRENOUD. P. Formação Contínua e Obrigatoriedade de Competências na Profissão de Professor. Idéias: São Paulo, N. 30, pp. 205-248, 1998.
TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 2ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2002.
TARDIF, M. & LESSARD, C. O trabalho docente: elementos para uma teoria da docência como profissão de interações humanas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.
SOUZA, J. R. S. Formação continuada em serviço: ressignificando a prática docente. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE PEDAGOGIA UNIVERSITÁRIA; org. Maria Emília Amaral Engers. Anais. Porto Alegre: PUCRS, 2006. 1 CD-ROM.
SQUIRRA, S. Sociedade do conhecimento. In: MARQUES DE MELO & SATHER, (org.), Direitos à Comunicação na Sociedade da Informação. São Bernardo do Campo, Editora da UMESP, 2005.
revista
digital · Año 13
· N° 119 | Buenos Aires,
Abril 2008 |