Fair-Play e aspectos educativos no desporto infanto-juvenil. Uma revisão bibliográfica |
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* Instituto Superior de Ciências Educativas - Odivelas ** Institut National de Educació Física - Lleida *** Escola Superior de Desporto de Rio Maior (Portugal) |
prof_valterpinheiro@hotmail.com Armando Costa** armandofilipecosta@hotmail.com Pedro Sequeira*** |
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Com o presente trabalho pretendeu-se realizar uma pesquisa bibliográfica acerca de estudos que tenham abordado temas relacionados com os valores no desporto, Fair-Play, Espírito Desportivo e Ética Desportiva. Fez-se uma listagem de algumas pesquisas realizadas em Portugal, bem como de estudos realizados no estrangeiro. O principal objectivo do trabalho foi identificar e clarificar a importância dada ao estudo dos valores do desporto ao longo dos tempos. Conclui-se que o estudo dos Valores Educativos e do Fair-Play no Desporto, tem sido escasso e realizado, sobretudo, nos escalões Infanto-Juvenis. Unitermos: Fair-Play. Valores educativos. Treino de jovens. Futebol.
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 117 - Febrero de 2008 |
Em primeiro lugar começa-se por clarificar os conceitos associados à ideia de Valores no Desporto, visto que na opinião dos especialistas estes conceitos ainda não estão claros na literatura. Posteriormente, clarifica-se a situação do Fair-Play nas aulas de Educação Física. Depois, analisa-se o papel do treinador na promoção do Fair-Play, seguido de estudos realizados nas diferentes modalidades. Aborda-se, ainda, a questão do Fair- Play enquanto elemento de prevenção de lesões.1 / 1
1. Introdução
Os estudos relacionados com Fair-Play, Ética e moral no desporto são ainda escassos. A este respeito Gonçalves, Cardoso, Freitas, Lourenço & Silva (2005) referem que o estudo das questões éticas no desporto para jovens tem sido esparso e descontínuo ao longo dos últimos anos. A grande maioria dos estudos incidem nas melhorias de aspectos físicos, técnicos e tácticos, havendo um grande défice de investigação ao nível dos valores no desporto. Desta forma, o presente trabalho pretende realçar, diversas investigações feitas até ao momento neste campo
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2. O que é o Fair-play, Jogo Limpo, Espírito Desportivo e Ética?
A literatura não é unânime quanto à utilização dos quatro conceitos acima referidos sendo que em alguns estudos aparecem como sinónimos.
Atentando nas palavras de Tavares(1999) a compreensão exaustiva destes termos ainda está para ser elaboradaNa opinião de Santos (2006) estes conceitos não estão suficientemente claros na literatura especializada.
Assim, o conceito de Fair-Play, numa tradição para o português significa jogo limpo, sendo muitas vezes entendido também como Desportivismo e Espírito Desportivo.
Assim, e se atendermos a diferentes definições de Fair- Play verificamos que cada autor acrescenta sempre algo de inovador ao conceito, mas partindo de uma base semelhante.
Martens(1978), aborda o tema, analisando-o como “um comportamento moral no meio desportivo”.
Ommo Grupe (1992) define-o como “uma adesão voluntária às regras desportivas, princípios e códigos de conduta, obedecendo ao princípio da justiça e renunciando a vantagens injustificadas
Hon & O´connor (1994), perspectivam o conceito de uma forma mais global, não sendo apenas uma forma de jogar o jogo, mas uma maneira de estar na vida.
Na concepção de Parry (1994) o Fair-Play deve ser entendido como uma virtude na adesão às regras, bem como, num compromisso de competição alicerçada num espírito mais elevado do que aquele descrito nas regras, devendo ainda incluir o respeito pelos outros, modéstia na vitória e serenidade na derrota.
No entender de Gibbons (1995) a definição de Fair- Play está sempre associada aos seguintes comportamentos: respeito pelas regras, pelo árbitros e suas decisões, respeito pelos outros, promover a igualdade de oportunidades e manter o auto-controlo em todas as situações.
Em definições mais recentes Weiss (2006) refere que o Fair- Play exige a necessidade de uniformidade de condições de competição a igualdade de oportunidades para todos os participantes, bem como, respeitar o adversário como humano e colega, e por fim o incondicional cumprimento do regulamento da competição.
Vloet (2006) refere que o conceito de Fair- Play é muitas vezes utilizado de forma alargada, abrangendo não só a prática desportiva com honestidade como também valores como a saúde e a integração social. Contudo, o mesmo autor refere que a principal finalidade do Fair-play não é o Desporto como instrumento para a promoção de valores , mas antes” alcançar uma prática desportiva moralmente sã”.
3. O Fair-Play, a Escola e as aulas de Educação Física
Alguns autores desta temática, têm levado a cabo estudos com a população estudantil, no sentido de compreender a atitude dos mesmos, face ao Fair-Play.
Kahler(1985) citado por Palheira(2005) fez uma pesquisa com estudantes, no sentido de compreender se a Educação Física tem impacto no desenvolvimento do Fair-Play. As conclusões demonstram que os alunos mais velhos são mais agressivos e praticam menos acções em favor do Fair-Play, comparativamente com os sues colegas mais novos.
Gonçalves (1989), talvez o autor que em Portugal mais se tem debruçado sobre este tema, realizou um trabalho com os objectivos de conhecer os diversos tipos de comportamento associados à ideia de Espírito Desportivo e também conhecer as intenções de comportamentos que os jovens assumiriam em diferentes situações da prática desportiva competitiva. A amostra foi constituída por 2515 alunos, rapazes e raparigas do 5º ao 9º ano de escolaridade de 11 escolas do Concelho de Oeiras com uma média de idades de 12,4 anos. A amostra era constituída por não praticantes e praticantes desportivos, e neste últimos a existência de praticantes de desportos individuais e colectivos. Como instrumento de recolha de dados foi utilizado um questionário semelhante ao incluído no “Guia de intervenção para a educação do espírito desportivo”(1987). Os resultados permitem concluir que os alunos possuem uma ideia correcta sobre valores éticos no desporto. Os não praticantes parecem indicar mais vezes os comportamentos específicos do espírito desportivo. Em todas as situações os não praticantes desportivos demonstraram mais forte intenção de assumirem comportamentos de espírito desportivo.
Gonçalves (1990) pretendeu estudar a influência dos agentes de sociabilização no comportamento dos jovens e a percepção que os jovens tinham da aceitação que esses agentes manifestavam face a comportamentos antidesportivos. A amostra era constituída por 434 alunos de ambos os sexos de escolas do concelho de Oeiras, e praticantes desportivos com idades compreendidas entre os 11 e os 17 anos. As conclusões do estudo demonstraram que os treinadores são os agentes que mais influenciam o comportamento desportivo dos jovens, logo seguido de pais e colegas de equipa. No que concerne à percepção que os jovens têm relativamente à aceitação dos agentes desportivos em relação a comportamentos anti-desportivos, concluiu-se que na opinião dos jovens estudados os treinadores são mais permissíveis do que os professores de Educação Física, ao uso de comportamentos anti-desportivos.
Bredenbeck (1998) fez um trabalho com uma amostra de 50 alunos de Educação Física, de ambos os sexos. No final do curso 34 pretendiam ser professores e 16 deles treinadores. O autor utilizou o questionário como método de recolha de dados, verificando-se que os valores referenciados como mais importantes foram: jogar em conformidade com as regas; por a bola fora quando um adversário está lesionado. Por outro lado, os valores que apresentaram resultados mais baixos foram: aceitar as decisões do árbitro sem protestar; evitar o contacto físico; permitir aos adversários mais fracos ganharem.
Com a intenção de melhorar os valores nas aulas de Educação Física, Brito & Diaz (2002), encetaram uma investigação com dois grupos do 3º ano da Secundária no IES Benito Pérez Armas y seis grupos do 4º ano do IES Mencey Belcomo, num total de 125 alumnos. Levaram a cabo um programa “compreeensivo-participativo”, no sentido de dar ao aluno maior protagonismo. O trabalho centrou-se na organização da turma em pequenos microgrupos, com contratos de normas, actividades de focalizacão-aprofundamento, cadernos de aluno, ficha de auto-controlo do comportamento e questionários. Concluíram que o trabalho em pequenos grupos mediante o estilo de micro-ensino permite melhorar valores a atitudes relacionadas com a cooperação e o respeito mútuo e a tolerância, Cecchini, Montero & Pena (2003), avaliaram as consequências da intervenção do programa de desenvolvimento Pessoal de Hellisons e responsabilidade social no Fair-Play. A amostra foi constituída por alunos de duas escolas(n=142), com uma média de idades de 12,7 anos. O Programa de intervenção foi aplicado ao grupo experimental durante períodos de uma hora, num treino de Futebol indoor de iniciação. Os resultados do grupo experimental revelam melhorias significativas no critério de controlo pessoal e no processo de auto controlo. Houve uma diminuição nos comportamentos anti-desportivos encontrando-se grandes diferenças relativamente ao grupo de controlo.
Fernandes (2003), examinaram os valores desportivos e as orientações motivacionais, expressos por alunos de Educação Física
, perante diferentes situações desportivas, e comparar os comportamentos desses mesmos, de acordo com diferentes situações de envolvimentos desportivo. A amostra foi constituída por 422 alunos, 221 do género masculino e 201 do género feminino com idades compreendidas entre os 9 e os 21 anos de idade. Como instrumentos de recolha de dados utilizaram o questionário de valores no desporto(Gonçalves,1998) e uma versão traduzida e adaptada para a língua portuguesa do “Task and ego orientation in sport questionnaire” desenvolvida por Duda. Os indivíduos demonstraram concordar em assumir atitudes perante situações desportivas, consoante os princípios básicos do desportivismo e do Fair-Play. Os alunos que revelaram atitudes menos consentâneas com o desportivismo foram os alunos com idades compreendidas entre os 13 e os 15 anos.Palheira (2005), efectuou um estudo com o objectivo de conhecer o grau de conhecimentos que os jovens portugueses possuem em relação aos Jogos Olímpicos, bem como, analisar a influência da escola na promoção dos saberes sobre os jogos olímpicos e para-olímpicos. A amostra foi constituída por 517 alunos de ambos os sexos pertencentes a escolas da área da Grande Lisboa e do distrito de Leiria com idades compreendidas entre os 10 e os 20 anos. Como instrumento de recolha de dados foi utilizado o questionário desenvolvido por Naul(1995). As conclusões deste trabalho demonstram que a grande maioria dos jovens possui conhecimentos fracos sobre a temática da educação olímpica e dos seus ideais. Revelou-se que de um modo geral as percepções que os jovens têm face a participação desportiva são positivas, facto negado apenas pela seguinte afirmação” Em desporto é impossível ganhar se tivermos sempre Fair-Play”.
4. O treinador e o Fair-Play
Gonçalves (1996) efectuou um estudo no Concelho de Oeiras com o objectivo de conhecer os pensamentos dos treinadores de jovens. A amostra foi constituída por 51 treinadores de ambos os sexos de 11 clubes diferentes e o questionário foi a instrumento de recolha de dados escolhido. O autor tinha como objectivo compreender quais os objectivos e prioridades no treino, conhecer as atitudes assumidas pelos treinadores em determinados contextos desportivos. Concluiu-se que “ensinar os jovens a gostar de desporto”; “desenvolvimentos das suas capacidades” e “desenvolvimento moral dos jovens”, foram os principais objectivos mencionados pelos treinadores quando trabalham com jovens. Concluiu-se, ainda, que a vitória não é um objectivo de primeira prioridade. Os treinadores do género feminino valorizaram mais os objectivos “respeitar os valores éticos do desporto”; e “o desenvolvimento moral dos jovens”.
Pinheiro,Costa & Sequeira (2005),
levaram a cabo um trabalho como o objectivo de analisar a percepção que os atletas tinham acerca do treinador como promotor dos aspectos educativos. A amostra foi constituída por 70 jogadores de futebol com idades compreendidas entre os 8 anos e os 12 anos treinados por indivíduos licenciados em Educação Física. Foi passado um questionário com 50 questões acerca de comportamentos do treinador com respostas na escala de Linkert. Os dados evidenciam algumas situações curiosas: os treinadores não permitem que os seus atletas discutam com o árbitro, contudo, eles em algumas situações fazem-no; Os treinadores não permitem que os seus atletas digam asneiras, todavia, eles dizem-nas; os treinadores revelam ao mesmo tempo grandes comportamentos de suporte afectivo positivo e afectivo negativo.Com o mesmo objectivo e utilizando o mesmo questionário, Pinheiro, Sequeira & Alves (2005), realizaram um estudo semelhante, todavia, no Andebol. Encetaram um estudo de caso numa equipa com 23 atletas com idades compreendidas entre os 10 e os 12 anos. As conclusões vão ao encontro das de Pinheiro (2005), pois verifica-se que em algumas situações o treinador discute com o árbitro e diz asneiras.
No seu estudo Costa, Pinheiro & Sequeira (2007) pretenderam analisar se o treinador promove a Educação e a Saúde no treino. Procuraram analisar a percepção que os atletas têm do comportamentos do treinador comparando com a autopercepção do treinador. A amostra foi constituída por 4 treinadores e 37 atletas com idades compreendidas entre os 12 e os 17 anos de idade, provenientes de quatro equipas de Andebol. Concluíram que os atletas consideram o seu treinador como um exemplo a seguir. Contudo, verificou-se que os treinadores discutem com o árbitro e dizem asneiras e afirmam aos seus atletas que ganhar é o mais importante.
5. O Fair-Play e o futebol
Lee & Williams (1989) analisaram a astúcia em jovens futebolistas
dos 12 anos aos 16 anos. Concluíram que com o avanço da idade os jovens estão mais dispostos a colocá-la em prática.Pfister & Papanastassiou (1989), num estudo centrado na observação de actos de agressividade, em jovens praticantes de futebol com idades dos 13 aos 17 anos, não encontraram diferenças estatisticamente significativas entre os jovens estudados, apesar de os mais velhos apresentarem valores mais altos no uso da agressão.
Telama & Laakso (1993), estudaram as atitudes de jovens face ao Fair-Play. A amostra foi constituída por 60 jovens com idades entre os 12 e os 16 anos de idade, praticantes das modalidades de futebol e cross country skiers, utilizando como instrumento de recolha de dados a entrevista semi- estruturada, que confrontava os jovens com dilemas no desporto. Concluiu-se que os rapazes são mais receptivos a quebrar as regras do que as raparigas e que à medida que a importância do jogo aumenta os jovens tendem a quebrar mais as regras do jogo.
Cruz, Boixadós,Valiente & Capdevila (1995) elaboraram uma escala de atitudes para identificar as atitudes predominantes num grupo de futebolistas, no que concerne ao Fair-Play. A amostra foi constituída por 330 jovens de três escalões etários diferentes nomeadamente: 114 infantis; 117 iniciados; 99 juvenis. Concluiu-se que o valor mais elevado foi a diversão e a vitória e a dureza os menos importantes. Outra das conclusões deste estudo que importa ressalvar é que a atitude dos jovens para com o Fair-Play depende, sobretudo, da forma como os treinadores e os organizadores das provas orientam os jovens.
Cruz, Boixadós,Valiente & Capdevila (1995) num estudo realizado com jovens futebolistas espanhóis, pretenderam verificar quais os valores predominantes. Entrevistaram 40 jovens com idades compreendidas entre os 12 e os 16 anos. Concluiu-se que os valores predominantes eram os seguintes: Ganhar; mostrar habilidades; igualdade e justiça; Utilidade( quebrar as regras no sentido de tirar vantagem para a equipa).
Com o objectivo de estudar a relação entre o clima motivacional, a satisfação e as atitudes de Fair-Play, Boixados, Cruz, Torregrosa & Valiente (2004) levaram a cabo um estudo com uma amostra de 472 jogadores masculinos de futebol catalães
com idades compreendidas entre os 10 e os 14 anos de idade. Concluiu-se que o nível mais alto de aceitação de “jogo rude” foi encontrado num grupo com baixos níveis de orientação para a tarefa e altos níveis de orientação para o ego. Ao invés, o mais baixo nível de aceitação de “jogo rude” foi encontrado num grupo com alta orientação para a tarefa e baixa orientação para o ego. Assim, os resultados revelam a importância de criar tarefas envolvendo o “clima motivacional” no desporto.Kavussanu, Seal & Phillips (2006), efectuaram um estudo em que observaram os comportamentos pró-sociais e anti-sociais em equipas masculinas de futebol. A amostra foi constituída por 313 jogadores adolescentes de futebol recrutados entre três grupos de idades: sub-13, sub-15 e sub-17. Cada grupo de idades foi representado por 8 equipas. Os jogadores eram filmados durante os jogos e realizavam questionários no final de cada jogo. Os jogos foram analisados por dois observadores que gravaram os comportamentos de cada equipa, e não de cada jogador individualmente. Os comportamentos anti-sociais foram observados com mais frequência que os pró-sociais, sendo que foram encontradas diferenças significativas entre os 3 grupos de idades. No grupo de sub-17 ocorreram mais frequentemente comportamentos anti-sociais e menos comportamentos pró-sociais e persistiu um forte clima orientado para a performance e um fraco clima orientado para a mestria, quando comparados com os grupos mais jovens.
6. O Fair- Play e os atletas de elite
Spamer (2005), efectuou uma pesquisa com jogadores de elite de rugby denominado “comportamento ético versos ganhar a todo o custo”. O estudo surgiu devido a uma questão levantada pela literatura que opõe a Filosofia da Vitória à Filosofia do Jogo Limpo. A amostra foi constituída por dezoito jogadores de elite da selecção nacional da África do Sul com uma média de idades de 20,5 anos. Foi aplicado o questionário de Rees (2003) citado por Spamer (2005) com questões abertas e fechadas. Os resultados demonstram que o grupo manifesta maior apetência pela Filosofia da vitória a todo o custo, certamente por serem atletas sobre quem existem grandes expectativas.
Long, Pantaleon, Bruant & D´arripe-Longueville (2006), baseados na teoria das razões do jogo(Shields & Bredemeier), levaram a cabo um estudo que teve como objectivo descrever as percepções dos jovens atletas de elite sobre regras, na conformidade e na transgressão, bem como razões subjacentes para estas acções. A amostra era constituída por 10 jovens atletas de elite a quem foi aplicada uma entrevista semi-estruturada. A análise quantitativa demonstrou que o respeito e transgressões das regras dependem sobretudo das características individuais(ex.desejo de vencer), o seu ambiente social(ex.pressão do treinador), os valores e virtudes do desporto(ex.Fair-Play. Ética) e recompensas desportivas(ex.Reconhecimento dos média, recompensas financeiras).
Num estudo realizado por Cecchini, Gonzalez-mesa & Mendez (2007), os autores tiveram como objectivo analisar se a participação em desportos de contacto médio se repercute nas opiniões sobre as atitudes a condutas de Fair-Play no contexto desportivo, e se estes efeitos estão mediatizados na orientação para o ego. A amostra foi constituída por atletas universitários de alto nível e atletas profissionais(n=131), de andebol e futebol. Responderam a um questionário que abordava a participação no desporto, a orientação de meta, e as atitudes e comportamentos de Fair-Play. A análise do modelo de equação estrutural indicaram que a participação em desportos de contacto médio originam a orientação para o ego, o qual quase sempre origina baixos níveis de Fair-Play. Os efeitos directos da participação desportiva no Fair-Play diminuíram significativamente na presença da orientação para o ego.
7. O Fair-Play, o doping e prevenção de lesões
Num estudo relacionando o Fair-Play e a prevenção de lesões Roberts, Hebert, Brust & Leonard (1996), procuraram determinar o rácio, tipo e a severidade das lesões ocorridas durante um campeonato. A amostra foi constituída por 273 jogadores masculinos com idades inferiores a 20 anos. As lesões foram registadas no local por um treinador certificado de atletas e as faltas medidas através de folhas de marcação. Concluiu-se que o conceito de jogo justo pode reduzir o rácio de lesões, de faltas, a severidade das faltas, e que deveria ser considerado no Hockei no Gelo, para todos os níveis. A este nível Peterson, Graf-Baumann, Dvorak, Junge & Chomiak (2000), Langevoort, Junge, Dvorak & Myklebust (2007) e Roberts, Hebert, Brust & Leonard (1996) referem que o conceito de Fair Play reduz o nível de lesões.
Num estudo sobre doping, Laure & Lacerf (2002), levaram a cabo uma investigação com o objectivo de comparar os benefícios de uma intervenção educacional específica versus informação baseada na intervenção para reduzir a intenção dos jovens no uso de drogas. Participaram neste estudo, 545 atletas dividos ao acaso em dois grupos. Para um grupo foi dada informação sobre a epidemia do doping no desporto, discussão acerca de suplementos nutricionais e outros produtos autorizados, a recusa de drogas e informação sobre auto- medicação. Ao outro grupo foi dada informação das substâncias proibidas, discussão sobre os riscos para a saúde , discussão sobre ética e Fair- Play no desporto e informação sobre o controlo anti- doping.
O programa foi avaliado por um questionário feito aos adolescentes logo após o programa e também 3 meses depois. No 1º grupo foi encontrado um aumento significativo de factores de protecção e redução dos factores de risco, 3 meses depois. No 2º grupo não foram encontradas diferenças. Assim, este trabalho sugere que a educação para a saúde baseada na intervenção foi eficaz na prevenção do uso de drogas junto dos jovens atletas.
Brunelle, Goulet & Arguin (2005), avaliaram a eficácia de um programa de Fair-Play (PFP) na redução do número de transgressões às regras, bem como, na prevenção de lesões no Hockey no Gelo. A amostra do estudo foi constituída por 52 equipas. Recorreu-se a um grupo experimental e a um grupo de controlo, em que o grupo experimental teve acesso ao programa de Fair-Play. Disputaram-se 49 jogos, 13 inseridos dentro do PFP e 36 fora do programa. As transgressões eram obtidas por observação em tempo real, enquanto que as lesões eram registadas por questionário realizado aos atletas. Verificou-se que o número de faltas desceu significativamente nos jogos realizados PFP. Não se registaram diferenças nas lesões registadas nos jogos com ou sem PFP.
8. Outros estudos acerca do Fair-Play
Deshaies, Vallerand & Currier(1984), realizaram um estudo com jovens canadenses praticantes(n=1056) de desportos, a respeito de Espírito desportivo concluindo: Em contexto de vitória e derrota os jovens tinham a tendência para adoptarem comportamentos contra o espírito desportivo;
Bredemeir (1995), dirigiu um estudo com o objectivo com o objectivo de compreender o comportamento moral dos jovens em situações do dia a dia e em contextos desportivos. A amostra foi constituída por 110 alunos participantes num campo de férias correspondentes aos 4º,5º 6º e 7º anos de escolaridade. Os jovens foram confrontados com dois dilemas do dia a dia e dois do desporto. As principais conclusões deste estudo demonstraram a existência de diferenças significativas nos valores obtidos pelos jovens do 6º e 7º ano entre dilemas do dia a dia e no desporto, sendo que os valores no desporto são sempre mais baixos.
Zukowska (1996), realizou um trabalho no âmbito do Fair-Play. A amostra era constituída por dois grupos de jovens, um de 13 anos(n=160) e outro de 18anos(n=200), sendo que os grupos eram constituídos por jovens praticantes e não praticantes. O autor tinha como objectivo identificar a fonte do conhecimento do Fair-Play. Concluiu-se que 82% dos jovens tinha conhecimentos dos ideias do Fair-Play e que 70% dos jovens relacionava Fair-Play com situações desportivas. Relativamente aos praticantes desportivos estes afirmam que a sua principal fonte de informação em relação ao Fair-play deriva da própria prática, enquanto que os não desportistas referem os meios de comunicação como fonte principal de informação. Do total da amostra apenas 5% refere ter tomado conhecimento das noções de Fair-Play na escola.
Sage & Kavassanu (2007), examinaram ao efeitos de um envolvimento-tarefa e de um envlvimento-ego em 3 medidas de escolha de comportamento moral: prosocial, observação de comportamento prosocial e observação de comportamentos antisociais num cenário competitivo. Pretendeu-se, ainda, as diferenças sexuais no comportamento moral. A amostra foi constituída por 48 rapazes e 48 raparigas de um colégio que eram atribuídos ao acaso a uma tarefa-envolvimento, ego-envolvimento ou a uma condição de controlo. Os participantes participaram num jogo de futebol de mesa durante 10 minutos. Os jogos foram gravados e as frequências de comportamentos sociais e antisociais foram codificados. Os jogadores que participaram numa tarefa-envolvimento foram mais elevados nas escolhas prosociais do que aqueles que foram atribuídos ao envolvimento-ego. As mulheres manifestaram mais comportamentos prosociais do que os homens.
Rufino, Bastista & Maturana(2005) analisaram a influência dos media no Fair-Play dos alunos (as) e professores (as) de Educação Física das escolas públicas do município do Rio de Janeiro. Foram aplicados 2 questionários em 25 escolas em que o 1º avaliava a quantidade de exposição aos media de desporto e o interesse dos alunos por notícias com bons e com maus exemplos de Fair- Play, enquanto que o 2º questionário avaliava o comportamento em relação a situações de competição onde o jogar limpo estivesse envolvido. Estes questionários foram também aplicados a atletas e treinadores(as), sendo de seguida correlacionados os resultados para analisar a influência dos media no Fair-Play de alunos (as) e professores (as) da Educação Física, assim como a diferença do grau de Fair- Play destes para os atletas e treinadores (as).
Os autores concluíram que os professores de Educação Física alcançaram um grau mais elevado de Fair-Play entre os participantes, e os atletas obtiveram o valor mais baixo de Fair-Play. As participantes do sexo feminino revelaram valores mais elevados no que concerne ao Fair-Play na prática desportiva, podendo estar relacionado pela maior exposição dos participantes do sexo masculino aos media.
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digital · Año 12
· N° 117 | Buenos Aires,
Febrero 2008 |