efdeportes.com

A nova dimensão esportiva: uma leitura do esporte e do lazer

La nueva dimensión deportiva: una lectura de deporte e de ocio.

The new sports dimension: sport and leisure lecture

   

*Dtdo. Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação Física da Unicamp.

**Prof. Titular da Faculdade de Educação Física da Unicamp

(Brasil)
 

 

Marco Antonio Bettine de Almeida*

Gustavo Luis Gutierrez**

marcobettine@yahoo.com.br
 

 

 
Resumo

    Este texto busca trabalhar com os conceitos de esporte e de lazer na sociedade contemporânea, apresentando algumas idéias que nortearam a transformação do esporte de alto-rendimento para o esporte participativo, desvinculando a busca do recorde, a especialização de papeis, a burocratização das regras, para algo mais comunicativo, prazeroso e inclusivo.

    Unitermos: Lazer. Esporte. Educação Física.

 

Resumen

    Este trabajo estudia los conceptos de deporte y ocio en la sociedad contemporánea, presentando algunas ideas que orientan la transformación del deporte de alto rendimiento en deporte participativo, desvinculando la búsqueda del récord, la especialización de funciones, la burocratización de las normas, hacia algo más comunicativo, placentero e incluyente.

    Palabras clave: Ocio. Deportes. Educación Física.

 

Abstract

    This text search work with the concepts of sport and leisure in contemporary society, presenting some ideas that guided the transformation of the sport from high-income to the sport participatory, the search of the record, the specialization of roles, the bureaucratization of the rules, for something more communicative, fun and inclusive.

    Keywords: Entertainment. Sports. Physical Education.

 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 116 - Enero de 2008

1 / 1

Introdução

    Não há dúvida que ocorreu uma transformação do conceito esporte no Brasil. Nos locais públicos como nas praças, nos parques assistimos ao nascimento de um novo conceito de esporte, o chamado por Dieckert (1984) de “esporte de lazer”.

    A junção de dois termos abrangentes, lazer e esporte, enseja estabelecer um outro sentido para o esporte. Porque o esporte de alto-rendimento não tem nada de idílico, e está muito distante daquilo que consideramos lazer. No esporte de auto-rendimento há a busca do primeiro lugar sempre, síndrome do vencedor e ambição ao recorde. Lembrando que as regras são impostas, não existe interação entre os sujeitos e as regras, a discriminação é total já que separa os aptos dos inaptos, bem como a separação histórica por gênero, idade e nível técnico. O tempo é curto, a vida de atleta é muito curta, se comparada ao esporte de lazer que é para a toda vida. No esporte de auto-rendimento temos como premissa o trabalho e o autoritarismo, com estruturas rígidas dos técnicos, dos diretores, patrocinadores. O atleta aliena seu corpo para a busca do recorde, ficando preso ao sistema financeiro pelos patrocínios e pelo sistema científico com as técnicas, os treinos e os equipamentos.

    Realizar atividades físicas sem pretensão de superar índices individuais para apenas sentir-se integrado ao meio ambiente; ser atraído para a prática de um esporte despojado de comparações atléticas; sentir-se satisfeito pela convivência com as pessoas; perceber a facilidade de acesso à prática das atividades físicas e esportivas oferecidas por uma estrutura de funcionamento organizada com segurança para a integridade pessoal de todos; tornar possível a realização do convívio social e seu aproveitamento, decorrente do esporte; favorecer uma prática esportiva que elimine diferenças no sentido de democratizar o bem estar: esses são alguns dos preceitos que nascem da prática do esporte hoje. Neste ensaio pretendemos caracterizar exatamente este esporte que se agrega aos valores do lazer.

Esporte Participação

    O que assistimos hoje é o esporte renascendo para a transformação dos valores contemporâneos, talvez mais próximos do que Dumazedier (1979) chamava de esporte participação, ou, hoje, denominado esporte de lazer. A mudança do sentido na prática cotidiana do esporte de auto-rendimento para esporte de lazer ocorreu através da projeção do lazer enquanto elemento intrínseco à atividade humana, transformando as práticas esportivas no tempo livre em entretenimento, diversão, participação, bem estar e qualidade de vida.

    Na década de 1970 iniciou-se uma ampla pesquisa para compreender a ressonância das atividades de tempo livre. Houve uma nítida metamorfose no conceito esporte, vinculado à performance máxima, a ambição do recorde e busca de reconhecimento. O esporte sempre fora ligado ao mito do super-homem, veiculado à ascensão social, principalmente em países de terceiro mundo, onde as oportunidades de emprego são escassas. A metamorfose, da década de 1970, foi exatamente na passagem do esporte de auto-rendimento para a busca do lazer no esporte.

    O aumento do tempo livre, o conhecimento do corpo, o desenvolvimento da industria cultural, as possibilidades de entretenimento, enfim, muitos são os motivos que justificam a ampla abordagem do tema lazer neste período histórico. O desenvolvimento do seu conceito, a compreensão da sua necessidade social, a preocupação em implementar políticas públicas são marcos conceituais básicos que sustentam a transformação do sentido esporte de auto-rendimento em esporte de lazer. Este panorama de transformação, do conceito esporte no Brasil, ocorreu pela incorporação das teses de Dumazedier (1979) e Marcellino (1987) na compreensão do fenômeno lazer, bem como as críticas e reformulações do processo corrente de discussão científica. Podemos apontar a valorização dos jogos populares, a ampliação do conceito de prática esportiva, as atividades de ruas e os projetos culturais em todos os segmentos e grupos como fatores determinantes da mudança do olhar no esporte brasileiro (ALMEIDA e GUTIEREZ, 2004).

    O lazer associa-se ao bem-estar-social e qualidade de vida, conceitos amplamente difundidos no mundo contemporâneo (ALMEIDA e GUTIEREZ, 2004). A necessidade de espaços que promovam o lazer levou a população exigir além de estádios de futebol ou quadras para jogos de times profissionais, equipamentos multifuncionais, espaços livres onde a pessoa pratique e não fique como espectador passivo (HAAG, 1984). A importância do lazer e do esporte do lazer fez com que o setor privado investisse em outros ambientes como os parques temáticos. A exigência social alertou o setor público, principalmente as secretarias de esporte e lazer, para ampliação, construção e animação dos parques, ruas de lazer e clubes públicos, ações que tiveram seu início com o movimento “Esporte para Todos”. Sem entrar no mérito da utilização política militarista, foi um momento que se difundiu os ideais de esporte de lazer. Na história do esporte, vínhamos renascendo do obscurantismo corporal, a exemplo de outros países em processo de industrialização. A máquina do progresso criou atalhos para a economia, que incluiu o esporte da sociedade. Mecanismos legais foram criados sem ganhar importância devida, na tentativa de estabelecer retomadas de rumo.

    Outro fator determinante ocorreu através das ações das prefeituras, que incorporaram o discurso do esporte de lazer, não mais como higienização militar, mas como participação e cidadania. Houve uma revolução no planejamento urbano, colocando o lazer como parte deste processo de ampliação das políticas urbanísticas das cidades.

Esporte e o Lazer

    Todos estes acontecimentos levam a uma metamorfose no conceito esporte, no que se refere ao esporte participativo e as atividades físicas, pois o esporte não é mais compensatório para aliviar as tensões do trabalho, pelo contrário, o esporte de auto-rendimento leva a uma maior tensão já que é a própria representação do trabalho. Os investimentos do Estado no lazer, através do conceito de Estado de bem-estar-social e qualidade de vida levou a uma transformação no conceito de planejamento urbano e de políticas públicas no setor, e, com a ampliação dos praticantes de esporte sem fins lucrativos, constituiu-se grupos de jogos (esportes sem regras rígidas) participativos. O próprio desenvolvimento na área científica demonstrou um avanço no entendimento do esporte de lazer ou mesmo a perda da influência do esporte de alto rendimento nas aulas de educação física, pelo menos no plano do discurso.

    É interessante notar que há um avanço no esporte não tradicional como esporte de aventura, que se aproxima muito mais do esporte de lazer do que do esporte de alta-competição. Para Elias e Dunning (1992) há um avanço nas formas de integração e associação nas atividades de lazer. As atividades radicais suscitam sentimentos fortes criando tensões, provocando a excitação, o perigo imaginário e real, o medo, o prazer, a tristeza e a alegria. Neste sentido, é razoável defender a idéia de que os esportes de lazer como cultura espelham mais a sociedade atual que o futebol como monocultura. Dois fatores são fundamentais para esta análise: o primeiro refere-se à violência na prática do futebol. O segundo é o desenvolvimento do conceito de lazer. Quanto ao desenvolvimento do conceito de lazer é notório que as pessoas, de um modo geral, conheçam, se interessem e exijam práticas mais prazerosas. As atividades de esporte de lazer são amplamente difundidas e praticadas, elas levam a um determinado grau de excitação que promovem o prazer, despertam emoções, evocam tensões de forma controlada.

    Fica claro que o esporte de lazer busca a alegria, o divertimento, o prazer e a sociabilidade. Conceitos típicos do lazer que são incorporados no esporte. A brincadeira é valorizada, a estrutura do jogo é alterada, a idéia de multiplicidade aparece com freqüência, bem como a diminuição do preconceito dos melhores e piores praticantes (OLIVEIRA, 1982). A pluralidade é importante, mas outro fator é ainda mais significativo, a preocupação com grupos minoritários, como o desenvolvimento de atividades de esporte e lazer para pessoas com necessidades especiais.

    Outro grupo importante é o da terceira idade (DIECKERT, 1984), já que esta faixa etária serve como elemento metodológico explicativo da transformação do esporte de lazer. Ao colocar ênfase na terceira idade, o autor apresenta um esporte que tem como princípio o fazer pelo fazer, o praticar para sentir-se bem com o mundo e com a vida. A colocação deste grupo reflete uma postura ideal do lazer, mais próxima do lazer pleno. No plano teórico, o lazer, para esta classe, não seria compensatório ou repositório das energias gastas no trabalho, o lazer seria o fazer pelo prazer, sem precedentes ou tempo subjugado ao trabalho, seria o lazer na sua plenitude.

    O esporte de lazer promove a participação de todos os setores e se preocupa com a acessibilidade e inclusão. Por isso os equipamentos são diferenciados; as tabelas de basquete maleáveis; as quadras não precisam de linhas rígidas; os espaços amplos; o acesso ilimitado; a participação generalista e a participação multipessoal. O esporte de lazer não precisa de estádios, de locais fechados, ou mesmo equipamentos de última geração que só os iniciados conseguem utilizar. O esporte de lazer exige equipamentos amplos que possam ser aproveitados por diversas faixas etárias, tipos de pessoas e jogos. Os equipamentos devem atender amplas necessidades não ficando somente "preso" a uma modalidade (DIECKERT, 1984).

Conclusão

    A contribuição deste texto é apresentar que o esporte de lazer não deve ser pensado como extensão do esporte de alta-competição. As pessoas não praticam esporte por causa dos jogos olímpicos, ou competições internacionais, as pessoas praticam esporte de lazer para o seu prazer. Não podemos ficar presos a idéia de ampliar o acesso ao esporte de lazer para termos futuros craques, mas sim, ampliar o acesso ao esporte para justificar uma política social, de desenvolvimento pessoal e atitude desinteressada. Temos que desenvolver o esporte de lazer para um processo de participação sem precedentes, sem restringir-se ao auto-rendimento, tendo no esporte uma forma de prática como conquista social e participação comunitária.

Referências bibliográficas

  • ALMEIDA, Marco e GUTIERREZ, Gustavo. Políticas Públicas de lazer e qualidade de vida. In: VILARTA Roberto (Org). Qualidade de vida e políticas públicas. Campinas: IPES editorial, 2004.

  • DIECKERT, Jürgen. Peculiaridade e autonomia do esporte de lazer. In: Esporte de lazer tarefa e chance para todos. (Trad. Maria Lenk). Rio de Janeiro: 1984.

  • DUMAZEDIER, Joffre. Sociologia Empírica do Lazer. Tradução: Silvia Mazza e J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva/SESC, 1979.

  • ELIAS, Nobert e DUNNING, Eric. Deporte y ócio en el proceso de Ia civilizacion. (Trad. Purificacion Jimenez). Mexico: Fondo de Ia cultura economicà, 1992.

  • HAAG, Hebert. “Educação para o lazer em modelo de referência para pesquisas curriculares específicas da educação fisica". In: Esporte de lazer tarefa e chancepara todos. Tradução: Maria Lenk. Rio de Janeiro: 1984.

  • MARCELLINO, Nelson. Lazer e Educação. Campinas: Papiros, 1987.

  • OLIVEIRA, Paulo. Brinquedos artesanais & expressividade cultural. São Paulo: SESC-CELAZER, 1982.

  • Outros artigos em Portugués

      www.efdeportes.com/
    Google
    Web EFDeportes.com

    revista digital · Año 12 · N° 116 | Buenos Aires, Enero 2008  
    © 1997-2008 Derechos reservados