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O esporte moderno de alto-rendimento,
e sua ideologia capitalista

   
Educação Física, Licenciatura - 4° Termo.
(Brasil)
 
 
Mariana Rocha Justo
miana_rj@hotmail.com
 

 

 

 

 
Resumo
     O esporte como grande fenômeno social passa a ter na sociedade um papel de destaque, bem como responsabilidade na construção de diversos conceitos do imaginário social. Mas o esporte há muito intitulado como promotor de saúde acaba por camuflar uma realidade oposta. Sendo este o objetivo de análise deste texto.
    Unitermos: Esporte-rendimento. Sociedade. Performance humana.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 115 - Diciembre de 2007

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Introdução

O esporte como potencializador das performances humanas

    O Esporte de alto nível é hoje um dos maiores fenômenos sociais, pois consegue agir direta ou indiretamente em todos os segmentos sociais, sejam eles de ordem econômica, educacional, científica, entre outras.

    Mas o que na concepção do Barão de Coubertin deveria agir como um meio civilizador da humanidade, tendo como ponto importante à competição, e não a vitória passa a ser, contemporaneamente, um ato que revela um fim em seu próprio cerne.

    Este esporte, em sua modernidade, acaba por trazer uma discussão que a muito se é explorado: o individuo e seu corpo.

    Quando há milênios, na história de diversas civilizações, começa a surgir questionamentos: de onde vem o ser humano e, mais, de onde vem o corpo humano? E a mitologia grega respondendo: da terra, o homem não aceita, e passa a investigar por olhos da ciência.

    É neste momento que a história corporal começa a ser escrita, e o corpo humano torna-se vítima preferencial da civilização.

Ao corpo, é preciso dar-lhe um pouco menos que o necessário. Se não, atraiçoa. Diz ao teu corpo: prefiro ter um escravo a ser escravo teu (Josemaría Escrivá).

    A valorização do "saber" faz com que o corpo comece a ser cada vez mais estudado, e todo conhecimento produzido passa a ser utilizado para melhor controle deste, tornando-se este objeto, e criando assim uma nova relação, e concepção de "poder" que nada tem a ver com aquele poder estatal ou governamental. Mas sim aquele poder, constantemente existente em nossa vida diária, onde aqueles que sabem dominam os que não sabem.

"Os estudos Foucault mostram a origem desses mecanismos cotidianos de poder. Nos séculos XVII e XVIII, junto com a aparição da arte do corpo humano, do estudo da anatomia, houve a descoberta do corpo como objeto transformável em eficiência e alvo do controle. É o que ele chamou de momento das disciplinas. Desde então tem-se apenas variado as técnicas de submissão e controle: nas prisões, hospícios, quartéis, escolas, etc. É a tecnologia da disciplina, fabricando os corpos de homens e mulheres submissos".

    E é nesta idéia de corpo vitíma, alheio ao próprio indivíduo, somado aos avanços tecnológicos que concebem a nova realidade esportiva, favorecendo o surgimento de novas performances que debruço a idéia contrária de que esporte é saúde.

    A sociedade moderna segue um curso de seleção do mais forte e mais hábil, e é neste caminho de valorização da vitória que o esporte-rendimento vem calcando seus princípios, já que para o esportista a vitória é seu principal objetivo.

    Como conseqüências desta nova ideologia esportiva, temos um treinamento adaptado a esta realidade da alta performance, que acaba por submeter o corpo do atleta a um processo paulatino de sacrifícios, resultando em corpos moídos e sofridos, no qual, em algum momento de vida do atleta será reclamado por ele.

    Torna-se evidente que neste processo o atleta passa a estar submisso a riscos constantes, como o que aconteceu com o atleta norte-americano, Llewellyn Starks, em 1992, em prova de Salto triplo em Nova York, que ao realizar a segunda passada1, viu sua tíbia da perna direita partir, tendo uma fratura exposta, ocasionada por anos de treinamentos repetitivos que visavam à realização de uma técnica perfeita.

    É nesta busca do melhor movimento, e da potencialização do desempenho humano, que o atleta deixa de ser "homem"2, e passa a ser visto como máquina onde suas engrenagens serão ajustadas em nome da performance. Transformando-o em um ser dual: corpo e mente, e seu corpo um mero instrumento na busca de resultados. E como máquina passa a ser facilmente substituído em caso de desgaste.

    O atleta por sua vez absorve esta concepção de dualidade corporal, sendo esta uma idéia dominante e responsável por fazê-lo esquecer de suas características fisiológicas quanto a ser humano.

    A exemplo disto vimos muitos atletas de elite relatar que "não existe atleta sem dor", e a dor nada mais é do que uma resposta do corpo de que algo não vai bem, ou esta em exagero. Assim fica claro que nos treinamentos os atletas estão o tempo todo em seu limite fisiológico.

"Quem realizar exercícios físicos para melhorar ou manter sua saúde não deveria sentir dores ou sensação de mal estar. Atletas sim, pois, precisam chegar aos seus limites fisiológicos" Loir Carlos da Costa - Pós-graduado em Fisiologia do Exercício na UFPR.

    Aqui a dor, passa a ser como o corpo, algo a mais a ser dominado e controlado, sendo um obstáculo a mais a ser superado, e nunca um entrave na busca do melhor resultado. Parecendo existir, segundo Adorno apud Vaz (2001) um aspecto masoquista de culto ao sofrimento. E parece realmente que é isso que vem a acontecer.

    No pain, no Gain3, esta é a resposta apontada por diversos atletas em uma pesquisa realizada com atletas de resistência, sendo a dor parte importante para se obter sucesso em sua modalidade4.

    Sem contar que o visível sofrimento destes atletas, que acabam por ir além de seus limites, é comemorado como uma vitória, e laureado na mesma intensidade daquele atleta talentoso. Entrando na história e perfilando a galeria de grandes nomes do esporte mundial. Como a exemplo do que aconteceu com a Suíça Gabriele Andersen nas olimpíadas de 1984, em Los Angeles, onde em total esgotamento físico, recusa ajuda, no propósito de alcançar a linha de chegada, e assim o faz em passos cambaleantes, onde desaba ao cruzar a linha de chegada.

    Foi a ultima maratonista a cruzar a linha de chegada, mas foi eternizada pelo seu feito, sendo lembrada até mesmo mais que a vencedora daquela prova, em conseqüência de diversos discursos inflamados a respeito de seu feito:

"Discipline-se para saborear muitas vitórias...".
"... Ir até o final, mesmo que as dores do corpo parecem dizer que não conseguiremos chegar, isso se chama disciplina, isto é superação" - radialista, sobre a suíça Gabriele Andersen" 5
.

    O Esporte de alta performance então acaba por derrubar a idéia de que este esporte, que busca a superação é saúde, nele parecem tratar o corpo como uma criança que se diverte com um brinquedo: de tanto manuseá-lo com força e curiosidade, acaba por quebrá-lo, (Melo, 2001: 125).

    Deve ficar claro, que todos os exemplos citados, embora choquem, em momento algum deve ser usado para afastar os atletas, ou novos praticantes do esporte, deve-se sim buscar redirecionar os atuais conceitos acerca desta competição desenfreada. Resgatando aquela atividade que o antecede, ou seja, o jogo.

    Talvez seja uma idéia ingênua e ultrapassada, como aquela que diz: "o importante é competir e não vencer", mas lembre-se no imaginário social esta plantando o discurso de um sistema capitalista, que a cada dia constrói um abismo entre camadas sociais.


Conclusão

    No esporte de auto-rendimento a idéia do individualismo, assim como a busca por vitória acaba por transformar o indivíduo de seu contexto em máquina, pronta para ser potencializada, esquecendo-se que este é um ser humano, e muitas vezes inconsciente de todo este processo transformador de seu estado fisiológico, que pensando em realizar feitos "heróicos6" apenas acelera sua degeneração física, treinando o corpo, acelerando a morte (Vaz, 2001).


Notas

  1. Em cada passada o impacto sobre a articulação é estimada ao equivalente 1 tonelada.

  2. Ser Humano

  3. Sem dor não há ganho.

  4. Análise de técnicas psicológicas de controle da dor: um estudo comparativo entre atletas e não-atletas (Daniel Câmara Azevedo e Dietmar Martin Samulski).

  5. João Luís Almeida Machado Editor do Portal Planeta Educação;

  6. Como o da Suiça Gabriele Andersen, ou o simples ato de participar de um jogo lesionado.

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