Suplementação de ribose e seu potencial efeito ergogênico no rendimento físico |
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*Acadêmicos do curso de Nutrição - Centro Universitário São Camilo, São Paulo. **Professora do Curso de Nutrição e Pós-Graduação em Nutrição Clínica e Supervisora do Estágio em Nutrição Esportiva do Centro Universitário São Camilo. (Brasil) |
Murilo Dáttilo* | Ana Carolina Cantelli* Juliana Oliveira Figueiredo* | Ariela Maier Marques Novaes* Vanessa Rodrigues Romero* | Ana Paula Santos Lino* Luciana Rossi** lrossi@scamilo.edu.br |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 114 - Noviembre de 2007 |
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Introdução
Atualmente, observa-se uma preocupação muito grande com o rendimento esportivo por parte dos atletas, pois cada fração de segundo a menos pode resultar na quebra de um recorde olímpico, mundial e a conquista da melhor classificação. Associados ao sucesso de talentosos atletas estão a ciência e a tecnologia, colaborando para obtenção de vitórias. Dessa maneira, a nutrição esportiva está cada vez mais inserida nesse contexto, pois ingestões adequadas de macro e micronutrientes podem melhorar o rendimento esportivo e, inversamente, a falta de ingestão de alimentos pode interferir no rendimento durante a competição e também resultar em problemas de saúde decorrentes do próprio esporte.
Aliado ao papel da alimentação no rendimento esportivo, está a questão da suplementação nutricional como um fator ergogênico. A venda de suplementos nutricionais já ultrapassou a cifra de 6,5 bilhões de dólares nos Estados Unidos em 1996 e cada vez mais as pessoas acreditam que a saúde seja comprável1. Além disso, uma questão muito importante que deve ser levada em consideração são os feitos "milagrosos" descritos nos rótulos dos produtos, prometendo aumento de energia e da performance física, alívio do estresse, além de poder prevenir ou tratar inúmeros problemas de saúde. Muitas vezes, essas promessas chegam ao consumidor sem possuir nenhuma comprovação científica que garanta os efeitos prometidos e a preservação da saúde do usuário2.
Dentre a extensa gama de suplementos esportivos disponíveis, surgiu a ribose, uma pentose naturalmente encontrada na dieta e que participa na formação de uma série de estruturas químicas do corpo, como o ácido desoxirribonucléico (DNA), ácido ribonucléico (RNA) e as adenina nucleotídeos (componentes energéticos), como adenina trifosfato (ATP), adenina monofosfato (AMP) e adenina difosfato (ADP)3.
A ribose como suplementação para fins ergogênicos se baseia no seu potencial papel em não somente aumentar os componentes energéticos, mas também em poder promover uma melhora na performance durante a realização do exercício4 onde, teoricamente, auxiliaria na rápida ressíntese dos estoques de ATP5. Logo no lançamento do produto, as expectativas a seu respeito foram muito grandes e promissoras, o que levou a ser considerada por alguns como "uma estrela ascendente no cenário dos suplementos"5. Além disso, o marketing que envolve o produto apela para uma "redução dramática no tempo de recuperação de 72 horas para 12 horas" e para "o mais sofisticado sistema de suporte energético".
Diante disso, esse artigo visa esclarecer os atuais mecanismos de fornecimento de energia através da suplementação de ribose e demonstrar os possíveis efeitos ergogênicos de sua utilização na performance física.
MetodologiaFoi realizado uma revisão bibliográfica de artigos científicos selecionados na base de dados do Pubmed até o ano de 2006. Como palavras-chaves utilizou-se: ribose, exercise, performance.
DiscussãoVias energéticas e síntese de adenina nucleotídeos
A homeostase celular é extremamente necessária para manutenção de sua integridade e função. Sendo assim, se faz necessário que concentrações de ATP se mantenham em um nível adequado e que haja também um balanço no pool de adenina nucleotídeos (AMP + ADP + ATP). Este pool é extremamente essencial para a realização de reações metabólicas básicas, como síntese de proteínas, glicogênio e ácidos nucléicos4.
A importância das vias bioenergéticas para contração muscular esquelética tem sido amplamente apreciada nos dias atuais. Contrações musculares intensas e repetitivas geram uma condição de hipóxia no músculo esquelético, ou seja, diminuição na chegada de oxigênio à célula muscular. O corpo então utiliza vias metabólicas anaeróbias na tentativa de sustentar a demanda exigida, através do catabolismo de compostos de fosfatos altamente energéticos como ATP. Porém, como os níveis de oxigênio estão limitados, as contrações musculares podem ser mantidas somente por um curto período de tempo, pois os compostos energéticos disponíveis não são suficientemente capazes de manter as contrações por um tempo prolongado6-8.
Assim como os baixos níveis de ATP, a concentração de adenina nucleotídeos é similarmente afetada durante o exercício intenso, se tornando reduzida durante períodos de hipóxia ou metabolismo anaeróbio. A depleção das moléculas de adenina nucleotídeos e a diminuição de sua concentração podem desencadear o estado de fadiga metabólica e, para recomposição de seus níveis, o corpo utiliza o metabolismo de novo de nucleotídeos purínicos, ou então, as vias de recuperação4.
Algumas evidências indicam que um dos principais caminhos para a síntese de novo de nucleotídeos é a fosforilação da ribose em ribose-5-fosfato a partir da via da pentose fosfato. Outros dados indicam que a glicose, através da mesma via, possa ser uma peça chave para o processo regenerativo das moléculas de adenina nucleotídeos, pois a glicose-6-fosfato também pode ser convertida (através de uma série de passos intermediários) em ribose-5-fosfato4. Após, a ribose-5-fosfato sofreria uma ação enzimática e resultaria na formação de um novo composto, o 5-fosforibosil-1-pirofosfato (PRPP)9. Uma vez formado, o PRPP é convertido indiretamente para inosina monofosfato (IMP) que, então, é convertida para adenilosuccinato pela anedilosuccinato sintetase e após para AMP através da adenilosuccinase. Sendo assim, o AMP estará disponível para ser refosforilado para reposição das concentrações de ATP depletadas4.
Assim como previamente discutido, o corpo também dispõe das vias de recuperação e, para isso, o PRPP formado pode se combinar com determinados compostos formados a partir do catabolismo de adenina nucleotídeos, como inosina, hipoxantina e adenina para formação de AMP4. (Figura 1)
Na via da pentose fosfato existe a participação de enzimas como a glicose-6-fosfato desidrogenase (G-6-FDH) e a 6-fosfogluconato desidrogenase (6-FGDH), sendo que ambas possuem uma atividade limitada, tanto no músculo esquelético quanto no músculo cardíaco. Um outro dado muito importante é que as concentrações de ribose no músculo são encontradas em pequenas quantidades. Sendo assim, evidências indicam que as vias para síntese de ribose-5-fosfato e de seus compostos como PRPP, apresentam algumas limitações10-12.
Baseado nisso, há a sugestão de que uma maior disponibilidade de ribose poderia resultar em um aumento da formação de PRPP e da taxa de síntese de adenina nucleotídeos9. Então, a suplementação de ribose exógena pode ser uma possibilidade no caminho na geração de uma resposta metabólica apropriada para a ressíntese de adenina nucleotídeos, pois esse composto possui uma passagem direta para a via da pentose fosfato, sofrendo uma conversão direta para ribose-5-fosfato pela enzima riboquinase, não necessitando da ação da G-6-FDH e 6-FGDH na formação do PRPP. Como resultado, poderia ocorrer aumento na síntese e recuperação de adenina nucleotídeos por uma via mais direta e instantânea10-12.
Suplementação de ribose na formação de compostos energéticosO interesse na suplementação de ribose como um ergogênico se dá ao seu potencial papel em não somente aumentar os componentes energéticos, mas também por poder resultar em uma melhora na performance durante a realização do exercício. Porém, o que a ribose pode trazer em questões reais de benefícios no rendimento para o esporte vem sendo avaliada tanto em animais10,13 quanto em humanos3,14-19.
Tullson & Terjung10 estudaram em animais o papel que a ribose tem na recuperação dos níveis de adenina nucleotídeos em fibras musculares isoladas. Foi observado que, quando adicionada solução de ribose ao músculo, havia um aumento de 3,4 a 4,3 vezes nas taxas de síntese de novo, variando conforme o tipo de fibra utilizada.
Zarzeczy et al.13 avaliaram como a produção de ATP pelo músculo isolado de ratos poderia ser mantida durante uma hora no estado de restabelecimento (após contrações intensas) através da via de recuperação. A recuperação de adenina para ATP foi comparada com e sem a adição de ribose ao músculo, e observou-se que a recuperação de ATP foi incompleta e foram observadas baixas taxas de recuperação de adenina tanto no músculo em repouso (que não sofreu contrações) quanto no músculo em pós-contrações quando a ribose foi suplementada. Porém, a adição de ribose aumentou em aproximadamente cinco vezes a recuperação de adenina no estado de repouso e pós-contrações. Esses achados indicam que aumentando a recuperação de nucleotídeos com a administração de ribose pode ser importante na recuperação de ATP após contrações intensas.
Já em humanos, Van Gammeren et al.3 realizaram um estudo envolvendo fisiculturistas recreacionais por um período de quatro semanas com suplementação de ribose, a fim de se determinar seus efeitos na composição corporal e na performance durante o exercício. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significantes na composição corporal entre o grupo placebo e o grupo ribose, mas este último grupo apresentou ganhos significantes na força e na resistência muscular, demonstrando um aumento significante na força de uma repetição máxima (1-RM) (p = 0,008). Porém, vale a pena atentar-se para o fato de que o grupo suplementado com ribose aparentou ser menos treinado que o grupo placebo.
Dunne et al.14 esperavam em seu estudo comparativo com ribose e dextrose (em remadores) que haveria uma melhora no tempo no grupo que utilizou ribose, talvez por melhorar a recuperação dos níveis de ATP e adenina nucleotídeos do músculo esquelético após exercício de alta intensidade. Porém, verificou-se que o grupo que utilizou ribose teve uma melhora média de somente 5,2 segundos, enquanto o grupo suplementado com dextrose teve uma melhora média significativa de 15,2 segundos.
Embora alguns estudos indiquem que exista algum beneficio na performance com a suplementação de ribose, existem dados indicando que sua suplementação não traz nenhum efeito ergogênico. Op 'T Eijnde et al.15 avaliaram o efeito da ribose (16 gramas/dia durante 6 dias) na re-síntese de ATP em 19 indivíduos que realizaram múltiplas sessões de extensão de joelhos. As concentrações de ATP e adenina nucleotídeos sofreram uma redução de 25% e 20% (respectivamente) imediatamente após e 24 horas após o exercício nos grupos placebo e ribose. Baseado nos dados obtidos, os autores concluíram que a suplementação oral de ribose não mostrou um impacto positivo, tanto na performance durante o exercício como na recuperação de ATP pós-exercício.
Falk et al.16 verificaram que 2 gramas de ribose (como parte de um suplemento efervescente que também continha carboidratos, creatina e glutamina) suplementados em homens treinados não houve melhora na performance nos protocolos de 1-RM no bench press e em repetições a 80% da RM no bench press até a fadiga.
Kreider et al.18 utilizaram 10 gramas de ribose (5 gramas duas vezes ao dia) por durante 5 dias em homens treinados que realizaram corridas de ciclismo e não observaram nenhuma melhora na performance física no grupo suplementado. Similarmente, Berardi & Ziegenfuss17 observaram também em ciclistas que e a suplementação de ribose não resultou em um efeito substancial e consistente na capacidade anaeróbia, quando suplementado 32 gramas de ribose em pó distribuída ao longo de 3 dias (4 x 8 gramas por dose) em 8 homens ativos.
Em outro estudo, utilizou-se como dose diária de ribose 600 mg/kg de peso (aproximadamente 42 gramas para um individuo de 70 kg) e foi realizado um programa de treinamento de 7 dias envolvendo 2 sessões diárias de treinos de corrida19. A concentração de ATP muscular reduziu aproximadamente 25% imediatamente após a ultima sessão de treinamento e permaneceu baixa nas 24 horas, nos grupos ribose e placebo. Porém, após 72 horas, a suplementação de ribose aumentou o ATP muscular acima do observado no grupo placebo. Porém, isso não foi acompanhado por uma melhor performance avaliada pelo protocolo de corrida intermitente.
ConclusãoTodos os mecanismos de produção de energia envolvendo a suplementação de ribose são muito promissores, porém, parecem evidenciar seus benefícios somente na teoria. Apesar das razões teóricas que criam uma expectativa para uma melhora na performance atlética com a suplementação de ribose, muitos dados na literatura não identificaram nenhuma eficácia através de estudo controlados.
Além disso, a ribose pode não ser efetiva como um suplemento atlético ou, então, fornecer algum tipo de benefício somente para atividades anaeróbias sustentadas. Embora alguns dados não indiquem nenhuma razão para que a suplementação com ribose possa prejudicar o rendimento esportivo, em um contexto geral, sua suplementação parece trazer pouquíssimos resultados para a melhora da performance.
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digital · Año 12
· N° 114 | Buenos Aires,
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