Análise comparativa da avaliação funcional do paciente geriátrico institucionalizado por meio dos protocolos de Katz e Tinetti Comparative analysis of the institutionalized geriatric patient functional test through Katz e Tinetti protocols |
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*Fisioterapeuta, Doutor em Ciências da Saúde- UnB, Docente da Universidade Católica de Brasília, Docente do Programa de Mestrado em Educação Física e Mestrado em Gerontologia. Fisioterapeuta da Câmara dos Deputados. **Fisioterapeutas formadas pela Universidade Católica de Brasília, Egressas da Iniciação Científica Voluntária do Programa de Mestrado em Gerontologia. |
Gustavo Azevedo Carvalho* Nara Moreira Peixoto** Patrícia Dalton de Capella** carvalho@ucb.br (Brasil) |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 114 - Noviembre de 2007 |
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Introdução
A expectativa de vida tem crescido nos últimos anos, e com isso surge a preocupação de promover um envelhecimento saudável e de manter a capacidade funcional máxima do idoso (ASBERG, 1986; CALKINS et al., 1997).
A senescência promove uma redução das reservas de vários sistemas orgânicos, sobretudo do sistema nervoso central (SNC), do sistema circulatório, do sistema gastro-intestinal e do sistema hematopoético. Esses sistemas ficam mais vulneráveis, tornando os idosos mais suscetíveis ao aparecimento de doenças e aos efeitos colaterais dos agentes farmacológicos comumente utilizados. Além disso, o comprometimento da função neuro-muscular e articular, evidenciado pela perda de força muscular e pela perda da amplitude de movimento, gera limitações funcionais que dificultam a execução das atividades de vida diária (AVDs), como caminhar, levantar-se, manter o equilíbrio postural e prevenir-se contra quedas iminentes ( KAUFFMAN et al., 2001).
A avaliação geriátrica global é um método de diagnóstico que aborda a área médica, psico-social e funcional. Tem como objetivo detectar precocemente deficiências potenciais, traçar tratamentos terapêuticos adequados e monitorar a progressão da perda funcional a longo prazo (ASBERG & SONN, 1988; CALKINS et al., 1997). Dessa forma é importante que a avaliação compreenda além da história e exame físico, a análise da marcha, do equilíbrio e da capacidade funcional, ou seja, a habilidade para exercer as AVDs (SONN & ASBERG, 1991; FREITAS et al., 2002).
Para definir o equilíbrio e a marcha, o Índice de Tinetti é bem empregado, uma vez que detecta alterações na locomoção, diagnostica e quantifica a gravidade do comprometimento e prediz o risco de quedas (FREITAS et al., 2002; CHONG, 1995). Dentre as escalas de avaliação funcional, o Índice de Katz é vastamente utilizado e enfatiza a habilidade necessária para realizar as tarefas essenciais no dia-a-dia. Atividades como banho, alimentação, higiene pessoal e transferência são algumas medições realizadas para mensurar o nível de dependência do indivíduo idoso (KATZ, 1963; BRORSSON, 1984;)
A utilização destes instrumentos de avaliação têm importantes implicações na qualidade de vida dos idosos, uma vez que possibilita ações preventivas, assistenciais e de reabilitação. Estas ações contribuem para um processo de envelhecimento com maior expectativa de vida saudável e uma tentativa de recuperação ou manutenção da capacidade funcional (FEINSTEIN et al., 1986; ROSA et al., 2003).
Este estudo procurou identificar o nível de independência e capacidade funcional de idosos institucionalizados por meio dos protocolos de Katz e Tinetti para que medidas adequadas de prevenção e tratamento possam ser instituídas, demonstrando o quanto estes instrumentos podem servir de apoio na avaliação e determinação da terapêutica cinético-funcional a ser empregada e cuidados apropriados sejam tomados.
Materiais e métodosO presente trabalho, caracterizado em um estudo transversal, foi realizado na instituição "Lar Cecília Ferraz de Andrade - Casa do Vovô", situada em Brasília - DF, Brasil. Na instituição residiam 68 indivíduos com idade entre 39 e 97 anos, dos quais 72,06% (n=49) eram do sexo feminino e 27,94% (n=19) do sexo masculino, sendo estes separados em alas específicas.
A amostra foi selecionada por sorteio entre os idosos que se enquadravam nos critérios de inclusão do presente estudo, ou seja, estar na faixa etária entre 60 a 90 anos. Os indivíduos foram excluídos segundo os seguintes critérios pré-estabelecidos: demência grave, síndrome da imobilidade e idosos acamados. Foram incluídos 16 idosos nos critérios estabelecidos para este estudo.
O Índice de Katz (Quadro 1) foi utilizado para avaliação das AVDs relacionadas com os cuidados pessoais e o Índice de Tinetti (Quadro 2a e 2b) para avaliação da marcha e do equilíbrio. A condição cognitiva dos pacientes foi avaliada através do protocolo Mini-Mental.
Os índices de Katz e Tinetti foram escolhidos em função da sua grande utilização e vasta aplicabilidade para um número extenso de pacientes geriátricos, além dos mesmos possibilitarem a análise das alterações ocorridas ao longo dos anos (SPECTOR et al., 1987; SATO et al., 2001; LUCENA et al., 2002; SATO et al., 2002).
Foi aplicado o índice de Katz modificado, composto por 06 atividades básicas: banho, vestir-se, higiene pessoal, transferência, continência e alimentação. Uma pontuação 6 indica que o idoso é independente, ou seja, possui habilidade para desempenhar tarefas cotidianas. Uma pontuação 4 indica uma dependência parcial, podendo o idoso requerer ou não auxílio. Uma pontuação igual ou inferior a 2 implica na necessidade de assistência, indicando uma dependência importante. Esta escala pode ser observada no Quadro 1 (FREITAS et al., 2002).
O Índice de Tinetti utilizado foi compreendido por duas escalas: de equilíbrio e de marcha. A primeira possui 09 itens: equilíbrio sentado, levantando, tentativas de levantar, assim que levanta, equilíbrio em pé, teste dos três tempos, olhos fechados, girando 360º e sentando. Já a segunda possui 07: início da marcha, comprimento e altura dos passos, simetria dos passos, continuidade dos passos, direção, tronco e distância dos tornozelos. A pontuação total do índice é de 28 pontos. Pontuação menor que 19 indica risco cinco vezes maior de quedas. Portanto, quanto menor a pontuação, maior o problema (KAUFFMAN et al, 2001; FREITAS et al., 2002). O Quadro 2 a e 2 b apresentam esta escala utilizada.
A coleta de dados foi realizada por meio de observação e entrevista direta direcionada ao próprio idoso e/ou seu acompanhante, além da consulta aos prontuários, sendo realizada por dois avaliadores devidamente treinados para aplicação dos protocolos. A escala de Tinetti foi aplicada com o idoso sentado em uma cadeira sem braços para o exame de equilíbrio sentado e para análise da marcha o idoso foi solicitado a caminhar por um corredor andando em velocidade normal, voltando ao ponto de origem com passos rápidos, mas seguros (KAUFFMAN et al, 2001; FREITAS et al., 2002). Na primeira semana foi realizado um estudo piloto com nove idosos, escolhidos aleatoriamente, tendo em vista o aperfeiçoamento da realização das coletas de dados.
Os dados foram tratados através de análise descritiva utilizando-se o programa de estatística SPSS 12.0 para Windows.
ResultadosPara este estudo, a amostra foi constituída por 16 idosos, sendo 31,25% (n=05) homens e 68,75% (n=11) mulheres, apresentando idade média de 76,38 ± 8,82 anos. A distribuição por idade foi de 31,25% (n=5) entre 60 - 69; 31,25% (n=5) entre 70 - 79 e 37,50% (n=6) entre 80 - 89 como mostra a Tabela 1.
O tempo médio de institucionalização foi de 28,94 meses, sendo que o idoso mais antigo foi admitido na instituição a 88 meses e o mais recente a menos de 1 mês da aplicação do estudo. Com base nas consultas aos prontuários, observou-se que 62,50% (n=10) dos indivíduos não foram capazes de informar o grau de escolaridade no momento da admissão.
Todos os idosos selecionados faziam uso de medicamentos regularmente e eram submetidos a uma avaliação clínica no mínimo de 15 em 15 dias.
De acordo com o Índice de Katz, 50% (n=8) dos pacientes mostraram-se independentes, enquanto os outros 50% (n=8) apresentaram dependência importante. Analisando o Índice de Tinetti, observou-se que 50% (n=8) apresentaram risco 5 vezes maior de quedas (Tabela 2).
Quanto ao gênero, observou-se um maior grau de dependência no sexo feminino (54,54%) do que no masculino (40,00%). Já o número de pacientes apresentando risco de quedas foi maior no sexo masculino (60,00%) do que no feminino (45,45%) (Tabela 3).
Com relação à faixa etária, foi evidente a maior porcentagem de idosos com idade entre 80-89 anos apresentando dependência importante e risco de quedas (Tabela 4).
Considerações finaisA análise do nível de independência e capacidade funcional de idosos é um processo complexo e muitas vezes subjetivo, sendo influenciada por fatores demográficos, culturais, psico-sociais e sócio-econômicos. Desta forma, muitas variações são encontradas de um estudo para o outro (FEINSTEIN et al., 1986; SATO et al., 2001)
No trabalho realizado por Lucena et al. (2002) a população estudada apresentou um estado de saúde de regular a bom, visto que apenas 38,5% dos idosos encontraram-se parcial ou totalmente dependentes de acordo com o Índice de Katz. No presente estudo, observou-se, por este índice, que 50% dos idosos apresentaram dependência importante.
Rosa et al. (2003) observou uma forte associação entre o sexo e a ocorrência da dependência, sendo em torno de duas vezes maior a chance para as mulheres em relação aos homens. Em concordância, o presente estudo verificou uma maior dependência no sexo feminino. Por meio dos resultados obtidos após a análise da pesquisa, constatou-se que, entre os pacientes que apresentaram dependência importante, 54,54% eram mulheres contra 40,00% dos homens com este mesmo grau de funcionalidade.
Com relação à faixa etária, foi observada uma maior dependência nos idosos com idade entre 80-89 anos, o mesmo observado para o risco de quedas. Corroborando com os nossos achados, Rosa et al.(2003) referiram que a chance de um idoso ter dependência moderada / grave aumenta gradativamente até cerca de 36 vezes entre os idosos acima de 80 anos.
Segundo Rosa et al. (2003) idosos com nível mais baixo de escolaridade (apenas lê e escreve / analfabetos) apresentaram chance cerca de cinco vezes maior de ter dependência moderada / grave. Esta afirmação não pode ser verificada em nosso estudo uma vez que 62,50% (n=10) dos indivíduos não foram capazes de informar o grau de escolaridade no momento da admissão na instituição.
Os episódios de quedas são muito comuns na idade avançada principalmente durante a realização de algum tipo de locomoção. Acredita-se que isso ocorra devido as modificações que a marcha sofre com o envelhecimento, tornando os passos mais curtos, mais lentos e menos seguros e as quedas acabam ocorrendo com maior facilidade. Além disso, outros fatores como distúrbios de equilíbrio, déficits visuais, alterações osteoarticulares e efeitos colaterais medicamentosos podem provocar quedas (SILVA & SILVA, 2003; RODRIGUES et al., 2004). De acordo com Soares et al. (2003) e Silva & Silva (2003) a institucionalização é apontada como um dos fatores de risco para quedas. O asilamento pode gerar repercussões psicológicas e até mesmo físicas, que influenciam a mobilidade e conseqüentemente contribuem para uma maior propensão a quedas. Esta afirmação diverge do trabalho realizado por Rodrigues et.al., (2004) onde é citado que idosos não-institucionalizados sofrem mais quedas devido aos fatores extrínsecos como as barreiras arquitetônicas presentes em suas residências. Enquanto nos asilos existem adaptações para que não ocorram quedas.
Verificamos que todos os idosos faziam uso de variados medicamentos diariamente, os quais poderiam estar contribuindo para os achados sobre equilíbrio e marcha.
Silva & Silva (2003) em um estudo afirmaram que a maioria dos idosos que sofreu quedas era do sexo feminino. Contrariamente, neste presente trabalho pode-se observar que o maior risco de quedas está entre o sexo masculino, tendo 60,00% dos homens com risco de quedas 5 vezes maior, enquanto apenas 45,45% das mulheres apresentam o mesmo risco.
Em um estudo de incidência de quedas em 150 idosos, residentes em casas de repouso e ambulatórios de clínicas médicas locais em Belém (PA), foram constatadas incidências de queda de 53,57% entre 60-69 anos, 53,70% entre 70-79 anos, 55,88% entre 80-89 anos e 66,66% a partir dos 90 anos. É sugerido, então que a incidência de quedas aumenta com o avanço da idade (SILVA & SILVA, 2003). Os resultados do estudo aqui descrito, corroboram a partir do Índice de Tinetti, as informações de que os idosos na faixa etária entre 80-89 anos apresentam maior risco de quedas.
A comparação entre os resultados obtidos a partir da aplicação dos protocolos mostrou uma correlação direta entre ambos, apesar da especificidade de cada um, ou seja, pacientes classificados pelo protocolo de Katz com dependência importante foram aqueles que apresentavam índices abaixo de 19 no protocolo de Tinetti, apresentando portanto maior risco de queda. Existe, portanto, a tendência de correlação entre menor independência funcional e o risco de quedas entre os pacientes idosos.
ConclusãoO envelhecimento tem uma influência significativa no grau de independência e capacidade funcional do ser humano. A utilização de instrumentos de avaliação geriátrica como o Índice de Katz e de Tinetti facilitam a determinação do perfil do idoso tornando mais confiável a transmissão de informações entre os diversos profissionais da saúde e permitindo acompanhar o progresso da terapia que tende a ser mais apropriada a cada caso.
Pelos resultados podemos observar um número significativo de idosos apresentando dependência importante e risco de quedas.
Através do presente estudo pode-se observar que os instrumentos de avaliação utilizados se mostraram sensíveis e complementares entre si.
Este estudo serve como um alerta para que programas terapêuticos preventivos sejam traçados e implantados a partir das informações coletadas por instrumentos de avaliação aplicados de forma correta e segura, a fim de retardar as alterações causadas pelo envelhecimento e promover uma melhor qualidade de vida. É ressaltada ainda a importância da atuação da equipe interdisciplinar de saúde objetivando a melhora do equilíbrio e da marcha, além da independência para realização de AVD's, que representa um elemento determinante na expectativa de vida ativa e saudável do idoso.
Referências
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digital · Año 12
· N° 114 | Buenos Aires,
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