efdeportes.com
O óxido nítrico (NO) e o seu papel
vasodilatador durante o exercício físico

   
  1. Centro de Pesquisa em Exercício e Esporte,
    Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Paraná.

  2. Centro de Ciências Biológicas,
    Universidade Estadual de Londrina, Londrina, Paraná.

  3. Departamento de Educação Física, Universidade Paranaense, Toledo, Paraná.

  4. Departamento de Educação Física, Universidade Estadual de Ponta Grossa.
        (Brasil)


 
 
Daniele Cristina Vitorino1,2  
Cosme Franklim Buzzachera1 | Tatiane Hallage1  
Hassan Mohamed Elsangedy1 | Kleverton Krinski3  
Fabrício Cieslak1,4 | Sergio Gregorio da Silva1
dani.vitorino@yahoo.com.br
 

 

 

 

 
Resumo
     O NO funciona como uma importante molécula sinalizadora capaz de facilitar a dilatação dos vasos sanguíneos e de reduzir a resistência vascular, sendo produzido através de três isoformas da enzima NO sintase: nNOS (neuronal), eNOS (endotelial) e iNOS (induzível). Durante o exercício físico, onde uma redistribuição no fluxo sanguíneo em direção aos músculos ativos é verificada, o NO poderia apresentar um papel fundamental na vasodilatação local. Entretanto, devido às dificuldades metodológicas na mensuração do fluxo sanguíneo durante o exercício físico, inúmeros estudos controversos são apresentados. Desse modo, o objetivo da presente revisão foi demonstrar o papel do NO com ênfase no exercício físico agudo e crônico, baseado em estudos envolvendo modelos humanos e animais.
    Unitermos: Óxido Nítrico. Hiperemia. Exercício físico.
 
Abstract
     The Nitric Oxide (NO) is considered an important signaling molecule capable of to facility the blood vessels dilatation and to reduce the vascular resistance, which is produced by one of three isoforms: nNOS (neuronal), eNOS (endothelial) e iNOS (inducible). During exercise, when a redistribution of blood flow in direction to contracting muscles is observed, the NO could be fundamental on local vasodilatation. However, due to methodological difficulties on measurement of blood flow during exercise, various controversies studies are presented. Thus, the purpose of this study was to demonstrate the role of NO during acute and chronic exercise, based in previous studies involving humans and animals models.
    Keywords: Nitric Oxide. Hyperemia. Physical exercise.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 113 - Octubre de 2007

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Introdução

    Por muitos anos, o endotélio vascular foi visto primariamente como uma barreira separando o lúmen do vaso sanguíneo e seus conteúdos das células musculares lisas da vasculatura, o espaço intersticial e os tecidos circundantes. No entanto, no início da década de 80 tornou-se claro que o endotélio libera vários fatores que poderiam governar o tônus vascular (Moncada et al., 1988; Shepherd, 1983; Shepherd e Katusic, 1991). As primeiras observações foram realizadas por Furchgott e Zawadzki (1980), os quais demonstraram que faixas da artéria aorta de coelho relaxaram em resposta á administração exógena de acetilcolina (ACh) somente quando o endotélio vascular estava intacto. Subseqüentemente, foi demonstrado que o endotélio pode sintetizar óxido nítrico (NO) a partir da L-arginina, onde diversas isoformas da óxido nítrico sintase (NOS) foram descobertas. Verificou-se que essas enzimas são amplamente distribuídas no endotélio vascular (eNOS), tecido neural e músculo esquelético (nNOS), e uma isoforma induzível (iNOS), cujos níveis aumentam dramaticamente sob certas condições, como choque séptico (Dinerman et al., 1993).


Oxido Nítrico (NO) e suas enzimas Óxido Nítrico Sintase (NOS)

    As enzimas NOS consitutivas (cNOS) são subdivididas em dois produtos gênicos distintos, os quais produzem uma forma endotelial (eNOS tipo III) e uma forma neuronal (nNOS tipo I), baseados nos tipos celulares nos quais essas isoenzimas foram primeiramente descritas (Fõrstermann, U. et al., 1998). As isoenzimas constitutivas produzem NO para subservir o controle do sistema nervoso central e autônomo (Bredt et al., 1990; Bult et al., 1990), o controle do tônus vascular (Ignarro et al., 1987) e participar da fisiopatologia (EI-Dwairi et al., 1998).

    Ambas as isoformas na NOS constitutiva são expressas no músculo esquelético (Kobizik et al.,1994; Kobizik et al., 1995), sendo que a nNOS está localizada na região sarcolemal e junção neuromuscular (Kobizik et al, 1994; Kusner e Kaminsk, 1996), enquanto a eNOS encontra-se uniformemente distribuída na fibra muscular e na parede dos vasos sanguíneos (Kobizik et al,1995).

    A presença de um agente indutor, como um microorganismo ou endotoxina, são capazes de estimular a atividade enzimática da iNOS, encontrada dentro de células endoteliais vasculares e células do músculo liso da vasculatura periférica, assim como em macrófagos (Nevière e Sibbald, 2000). Sua ação na endotoxemia, por exemplo, estimula a produção de NO, induzindo à falência circulatória e ao choque endotóxico (Liu et al., 1993; Wang et al., 1999). Os altos níveis de NO produzido via iNOS servem de base para os eventos fisiopatológicos que requerem a atividade citotóxica de macrófagos (Lorsbach et al., 1993), sendo que esta molécula gasosa produz efeitos citotóxicos e citostáticos em células de vários órgãos-alvo (Lee et al., 2001, 2002a; Wright et al., 1992).

    O NO funciona como uma importante molécula sinalizadora capaz de facilitar a dilatação dos vasos sanguíneos e de reduzir a resistência vascular (Joannides et al., 1995). Esta molécula gasosa se propaga rapidamente através das membranas celulares dentro da parede arterial, onde se une com a enzima guanilato ciclase, ativando-a. Isso desencadeia uma cascata de reações que induzem o relaxamento do músculo liso arterial para aumentar o fluxo sanguíneo nos vasos sanguíneos vizinhos (Mcardle et al., 2005).


A relação óxido nítrico e exercício físico (modelos humanos)

    O exercício físico causa um aumento no fluxo sanguíneo sistêmico e alterações acentuadas no fluxo sanguíneo tecidual, devido ao direcionamento sanguíneo aumentado aos músculos ativos e reduzido em alguns órgãos internos, como rins e intestino (Armstrong et al., 1987; Fixler et al., 1976).

    Qualquer aumento no dispêndio de energia torna necessários ajustes rápidos no fluxo sanguíneo que afetam todo o sistema cardiovascular. Por exemplo, o fluxo sanguíneo sofre um desvio significativo das vísceras abdominais para os músculos em contração até mesmo durante um exercício de baixa intensidade (Freqüência cardíaca =90 bpm). Dois fatores principais contribuem para o fluxo sanguíneo reduzido aos tecidos inativos: (a) maior fluxo anterógrado do sistema nervoso simpático (mecanismos central e periférico) e (b) substâncias químicas locais que estimulam diretamente a vasoconstrição ou que exacerbam os efeitos de outros vasoconstritores (Mcardle et al., 2005). Em estudo realizado por Hirai et al. (1994), verificou-se que a vasodilatação mediada pelo NO contribui para a distribuição do fluxo sanguíneo aos músculos durante o exercício físico, sugerindo que a elevada produção de NO na circulação muscular seja resultante dessa atividade (Miyauchi T. et al., 2003).

    Devido o papel do NO em ser um potente vasodilatador, o qual participa da regulação do tônus vascular local (Rubanyi, 1991), foi proposto que o exercício físico causaria alterações específicas teciduais na produção de NO em alguns órgãos, como nos rins (onde o fluxo sanguíneo é reduzido) e pulmão (onde o fluxo sanguíneo é aumentado) (Miyauchi et al., 2003). Também foi reportado que o estresse hemodinâmico de atrito aumenta a produção de NO pelo endotélio vascular (Busse et al., 1993; Kuo et al., 1990).

    O aumento no fluxo sanguíneo através do lúmen do vaso têm sido identificado como provável estímulo fisiológico para a produção de NO endotelial (Pohl et al., 1986; Rubanyi et al., 1986), com vasodilatação aguda mediada pelo NO tendendo a normalizar esse estresse (Hutcheson e Griffith, 1991; Neibauer e Cooke, 1996; Dimmeler e Zeiher, 2003). Estes resultados levantam a possibilidade de que o NO poderia contribuir para a hiperemia no exercício, quando o exercício esta associado a elevadas pressões de pulso e pulsatilidade, e que exposições repetidas ao elevado estresse de atrito como resultado do treinamento físico poderia melhorar a biodisponibilidade do NO (Green et al., 2004).

    Em humanos, evidências indiretas para o papel do NO na hiperemia pelo exercício no músculo esquelético é fornecida por elevados níveis de nitrito plasmático (Ambring et al., 1994) e nitrato urinário (Bode-Böger et al., 1994). No entanto, em resposta ao exercício aeróbico prolongado, essas medidas não refletem fidedignamente que o NO seja derivado do endotélio. Portanto, mesmo com as dificuldades nas técnicas associadas com a mensuração no fluxo sanguíneo durante o exercício, muitos investigadores têm tentado determinar o envolvimento do NO na resposta ao exercício de hiperemia na circulação periférica (Green et al., 2004).

    Muitos pesquisadores têm avaliado o impacto do NO sobre o fluxo sanguíneo em resposta ao exercício de extensão de joelho. Nesses estudos, foram administradas doses de inibidores da NOS. Em geral, os resultados demonstraram que a inibição da NOS teve pouco impacto no fluxo sanguíneo durante a contração muscular. No entanto, o fluxo sanguíneo pós-exercício foi reduzido (Frandsen et al., 2000; Radegran e Saltin, 1999).

    A primeira investigação para elucidar os mecanismos associados com as alterações no fluxo sanguíneo com o exercício físico foi conduzido por Green et al. (1994), envolvendo mulheres jovens. Após quatro semanas de treinamento de força muscular (preensão manual), uma redução mínima na resistência vascular foi verificada, seguindo um estímulo isquêmico no membro treinado, mas não no membro não-treinado ou no controle sedentário. Concluiu-se que o NO não contribuiu para potencializar a vasodilatação no membro treinado, ou que o período relativamente curto de condicionamento físico e o baixo estímulo foram insuficientes para detectar a resposta nos jovens saudáveis. Esse estudo sugeriu que o treinamento muscular envolvendo a porção anterior de braço, um exercício localizado envolvendo pequenos grupos musculares, não influencia a função endotelial aparentemente em sujeitos saudáveis, mesmo demonstrando aumentada capacidade para o pico de fluxo sanguíneo (Green et al., 2004).

    Exercícios envolvendo grandes grupos musculares, provavelmente produzem alterações sistêmicas na hemodinâmica vascular, não visível com exercícios localizados. Em sujeitos normais, foi examinado o efeito de quatro semanas de treinamento em ciclo ergômetro na bioatividade do NO em membro superior. Seguinte ao treinamento, a vasoconstrição induzida pelo L-NMMA (inibidor da cNOS) foi aumentada, sugerindo que o treinamento potencializa a função basal do NO (Kingwell et al., 1997).

    Resumindo, os estudos realizados em humanos indicaram que o NO contribui para fluxo sanguíneo em repouso e pós-exercício, embora sua participação durante o exercício permaneça controversa. Mesmo com a continuada controversa a respeito da precisa contribuição do NO à hiperemia pelo exercício, o treinamento físico regular é associado com uma capacidade vasodilatatória aumentada (Sinoway et al., 1986, 1987; Green et al., 1996), onde estudos longitudinais forneceram evidências convincentes para o efeito anti-aterogênico da prática regular de atividade física (Lee et al., 2000; Sesso et al., 2000; Myers et al., 2002). Este fenômeno poderia ser, em parte, devido a up-regulation da função endotelial como resultado do treinamento (Green et al., 2004).


A relação óxido nítrico e exercício físico (modelos animais)

    O curto tempo de treinamento em ratos (duas a quatro semanas) aumentou a síntese de NO endotelial nas arteríolas da musculatura esquelética e a resposta vasodilatatória à aceticolina (ACh) e L-arginina, mas não em resposta ao nitroprussiato (SNP), sugerindo este potencializar a função do NO dependente do endotélio, embora não se altere a sensibilidade celular da musculatura lisa ao NO (Sun et al., 1994). Esses resultados sugerem que a elevada produção de NO constitui uma resposta adaptativa da fase inicial do treinamento físico (Green et al., 2004).

    Em outros estudos, quatro semanas de treinamento não somente melhorou a vasodilatação induzida pela ACh na artéria aorta de ratos, como também aumentou os níveis protéicos de eNOS (Delp et al., 1993; Delp e Laughlin, 1997). Similarmente, quatro semanas de exercício diário em ratos melhorou a vasodilatação induzida pelo fluxo nas artérias musculares esqueléticas, mas não nos vasos mesentéricos, os quais talvez não são submetidos ao estresse de atrito do exercício por hiperemia (Sun et al., 1998).

    Em contraste aos períodos curtos à moderado de exercício físico, estudos por uma mais longa duração não têm consistentemente apresentado aumentada função endotelial relacionada ao NO. A vasodilatação dependente do NO não foi alterada após dezesseis á vinte semanas de treinamento em porcos (McAllister et al., 1996) e dezesseis semanas em ratos, mesmo com a conformidade arterial melhorada (Kingwell et al., 1997). Isto parece indicar que a resposta vasodilatatória dependente do endotélio periférica é um fenômeno transitório, o qual é perdido com o treinamento á longo prazo. Além disso, há evidências de que a expressão da eNOS inicialmente é aumentada pelo treinamento, e também exibe este tempo de dependência; o exercício diário de uma semana resultou no aumento da expressão protéica da eNOS na artéria pulmonar e melhorado relaxamento mediado pela ACh (Jonhson et al., 2001), enquanto não houve alterações após dezesseis semanas de treinamento físico (Johnson e Laughlin, 2000).

    Paralelo ao curso de tempo dessas mudanças, em vários modelos animais, o treinamento físico prolongado aumenta o diâmetros das artérias (Leon e Bloor, 1968; Kramsh et al., 1981; Lash e Bohlen, 1992); contudo, esta remodelação vascular em contraste à aumentada capilarização também parece ser um fenômeno dependente do NO e endotélio (Kamiya e Togawa, 1980; Gibbons e Dzau, 1994; Prior et al., 2003), mas aquele o qual parcialmente suplanta os mecanismos vasodilatadores responsivos agudamente (Green, 2004).

    Estudos animais investigando a vasculatura coronária e periférica sugerem que o treinamento físico de curto tempo potencializa a eNOS e a bioatividade e produção de NO, produzindo um tamponamento de curta duração ao aumentado estresse de atrito associado com o exercício. Após o treinamento estendido, pelo menos na circulação periférica, a aumentada produção de NO e outros possíveis mediadores induzem a alterações estruturais nos vasos, resultando em aumento no diâmetro do lúmen (Brown, 2003; Prior et al., 2003). Desse modo, o estresse de atrito é estruturalmente normalizado e a atividade do NO endotelial retorna rumo aos níveis iniciais (Green, 2004).

    Parece provável que o mecanismo direto relacionado ao estresse de atrito é o grande responsável pelos efeitos benéficos do exercício repetido. No entanto, é também conhecido que o NO reage com radicais livres de oxigênio e que este último poderia extingüir a bioatividade do NO. É possível que a indução repetida da atividade da NOS com o treinamento físico prolongue a meia vida do NO por reduzir sua degradação pelos radicais livres nessas condições (Fukai et al., 2003) ou por diretamente decrescer a produção de radicais livres (Adams et al., 2002).

    Foi demonstrado que a expressão do RNA mensageiro da eNOS e a atividade da NOS nos rins de ratos que se exercitaram em esteira foi marcadamente reduzida, quando o fluxo sanguíneo reduz o caminho de queda de estresse abaixo de condições fisiológicas normais. Por outro lado, a expressão do RNA mensageiro da eNOS e a atividade da NOS nos pulmões foi significantemente maior em ratos treinados (Miyauchi et al., 2003).

    Em animais submetidos a uma sessão de exercício agudo em esteira motorizada, a atividade da NO sintase total está aumentada, principalmente no músculo esquelético (Roberts et al., 1999). Em outro trabalho, animais submetidos a treinamento físico por natação, a atividade da nNOS está aumentada no músculo esquelético e a eNOS está aumentada nos pulmões, átrios e na aorta (Tatchum-Talom et al., 2000). Uma possível explicação para o aumento da atividade da NOS com o exercício é o aumento do conteúdo de cálcio nas fibras musculares durante a contração, fazendo com que haja a ativação das vias constitutivas da NOS (nNOS e eNOS) (Hirai et al., 1994; Roberts et al., 1999). O aumento da atividade da NOS pode ocorrer também quando há um aumento da demanda metabólica no músculo esquelético (depleção de glicogênio). Têm sido relatado em alguns estudos que o NO também desempenha um importante papel no transporte de glicose para o músculo durante a contração muscular (Balon et al., 1997; Roberts et al, 1997). Assim, a produção aumentada do NO durante o exercício pode estar envolvida no aumento do fluxo sangüíneo e transporte de glicose para o músculo esquelético, o que sugere que o NO possa ser um mediador chave no metabolismo durante o exercício (Roberts et al., 1999, Cartee et al., 1989).


Conclusão

    Uma aumentada atividade das enzimas NOS foi verificada em resposta tanto ao exercício físico agudo quanto crônico, sendo que a atividade da eNOS aumenta agudamente em resposta a hiperemia induzida pela musculatura ativa, provavelmente devido ao elevado estresse de atrito através do lúmen vascular. Ainda, estudos envolvendo modelos animais têm demonstrado uma atividade aumentada da NOS em locais onde o fluxo sanguíneo também é elevado, como a aorta e os pulmões, e atividade da NOS reduzida onde o fluxo sanguíneo é baixo, como o mesentério. Desse modo, apesar de uma convergência dos achados para o envolvimento do NO no exercício físico em diversos sistemas orgânicos nos modelos animais, as dificuldades metodológicas na mensuração do fluxo sanguíneo vascular em humanos impedem a realização de estudos semelhantes.


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revista digital · Año 12 · N° 113 | Buenos Aires, Octubre 2007  
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