Lecturas: Educación Física y Deportes. Revista Digital |
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español FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA:
A DIMENSÃO HUMANÍSTICA-INTERACIONAL.
Sheila Aparecida Pereira dos Santos Silva (Brasil)
sapsilva@usp.br
Resumo
Este artigo resulta de uma tese que avalia o impacto de uma metodologia de Prática de Ensino sobre a dimensão relacional de 09 (nove) alunos-mestres (a.m.) do quarto ano de Licenciatura em Educação Física. A análise grupal e as análises temáticas individuais dos planos-de-aula e relatórios pós-aula dos a.m., dos registros de observação da formadora e de outros a.m. e da transcrição das reuniões grupais semanais, durante um semestre letivo, foram organizadas em três sub-tópicos: a) relacionamento entre a.m. e seus alunos, b) a.m. e seus pares e c) a.m. e formadora. O estudo infere que os princípios propostos mostraram-se capazes de estimular a reflexão sobre a própria prática, tendo-se percebido progressos nas auto-percepções técnica e emocional dos a.m.
Além de conter um relato detalhado da trajetória percorrida por cada a.m., a pesquisa resultou em lições úteis aos formadores de professores: (1) é recomendável avaliar o a.m. conjugando-se a atenção ao discurso com a observação da ação; (2) a organização dos a.m. em duplas, exceto durante as regências, mostrou-se valiosa para seu desenvolvimento pessoal recomendando que as habilidades para tecer e receber críticas recebam especial atenção durante o processo formativo; (3) a escolha dos procedimentos didáticos dos a.m. baseou-se num perfil de professor que desejavam, nas suas representações sobre os alunos e na crença sobre as possibilidades de resultados oferecidas por diferentes estilos de ensino; (4) ocorreu ligação entre dificuldades relacionais com os alunos e percepção negativa sobre os mesmos, como também entre relacionamento positivo e percepção positiva; (5) o autoritarismo e a não aceitação dos alunos parecem ser as características que mais prejudicam o relacionamento positivo; (6) a ansiedade, a instabilidade ou perda do controle emocional perante a classe parecem não resultar negativamente sobre o comportamento do grupo desde que compensadas por atitudes relacionais positivas do a.m., principalmente a demonstração de interesse pela classe; (7) o a.m. deve ser incentivado a insistir em interações que visem a estabelecer comportamentos socialmente aceitáveis dos alunos; (8) parece não ser recomendável buscar-se formar um tipo uniforme de professor.
Unitermos: Prática de Ensino. Educação Física. Formação de Professores. Relação Professor-Aluno.Abstract
This article results of one thesis that values the impact of one methodology of the Teaching Practice Discipline about the relational dimension of nine preservice teachers (p.t.). The group and individual thematic analyses were organized in three sub-topics about the relationships between : a) the p.t. and his students; b) the p.t. and his peers; c) the p.t. and his teacher. The source were the classes plans, post-classes reports, teacher and others p.t.’s observations and the transcriptions of the weekly group meetings along one semester. The results point to the adequacy of these principles with the formation of reflective attitudes about teaching and ensue helpful lessons to the one which works on forming teachers: (1) it is a recommendation to value the p.t. looking at his discourse and practice, simultaneously; (2) the organization of the p.t. in peers, except during the regencies, is very useful to the personal development and the p.t. must be prepared to make and to receive critical commentaries; (3) the p.t.’s didactic procedures were based on the students representation that they had, on one desirable teacher’s profile and on the possibilities of each different teaching style offers; (4) the negative perception about the students is linked to the negative relationship with them. The authoritarian behavior and not-acceptance seem to be the most prejudicial factors. On the other hand, the positive perception about the students is linked to the positive relationship with them; (5) the anxiety, the emotional instability or to loose the control in front of the students can be compensate with p.t.’s positive relational attitudes, specially the interest to them; (6) the p.t. must be stimulated to insisting on interventions that promote the social acceptable behavior of the students; (7) it seems not to be recommendable to look for forming a uniform kind of teacher.
Key words: Practical of Education. Physical Education. Formation of Teachers. Relationship Teacher- Pupil.
O objetivo desta comunicação é apresentar uma metodologia de trabalho empregada no curso de formação de professores de Educação Física na disciplina Prática de Ensino.Entendendo que a competência profissional possui, basicamente, três dimensões: a) técnica: referente ao domínio de conhecimentos ligados à sua área específica, b) política: capacidade de voltar a consciência para o contexto onde se insere sua prática ligada a um compromisso social específico e c) humanística-interacional: referente a relação sócio-afetiva e cognitiva que o educador busca construir entre ele e os alunos e entre os alunos (LIBÂNEO, 1982/1990; CANDAU, 1983; MARINI, 1990; PLACCO, 1994 e RIOS, 1994), buscou-se, nesta ocasião, privilegiar o desenvolvimento da dimensão humanística-interacional.
Os princípios norteadores do trabalho foram: a) a Teoria da Aprendizagem Significativa (AUSUBEL,1968; AUSUBEL et alii,1980) que entende o processo de aprendizagem como obra idiossincrática de um sujeito cuja estrutura cognitiva interage e se modifica através do contato e da subsunção de conhecimentos potencialmente significativos, b) a Psicologia Humanista (ROGERS,1977) que vê o aluno como centro do processo de aprendizagem onde ocorre o envolvimento da pessoa como um todo, tanto sob o aspecto cognitivo quanto sob o sensível e inspirou-se na c) Ontologia Heideggeriana (HEIDEGGER,1993) no que se refere à presença do ser no mundo enquanto um ser entre os outros cujo relacionamento deve estar pautado por um "cuidado" em que há um interesse em que cada ser descubra suas potencialidades e possibilidades no mundo, pautados por relacionamentos autênticos.
Onze alunos (10 do sexo feminino e 01 do sexo masculino) matriculados no 4º ano do Curso de Licenciatura em Educação Física, agrupados em duplas, à exceção de um deles, ministraram aulas semanais para alunos das 1ªs e 2ªs séries de uma Escola do Município de São Paulo- Brasil durante um ano letivo, sendo sistematicamente acompanhados pela professora da disciplina Prática de Ensino.
Através da elaboração sistemática de planos-de-ensino, relatórios pós-aula, da realização de observações das regências, das entrevistas com os 80 (oitenta) alunos das 1ªs e 2ªs séries do ensino fundamental, foram colhidos elementos que subsidiaram as reuniões semanais de discussão entre a professora e os alunos-mestres.
Com a utilização destes instrumentos pretendeu-se, em primeiro lugar, desenvolver a dimensão humanística-interacional destes alunos-mestres em três níveis: a) relacionamento entre a professora da disciplina e seus alunos-mestres; b) relacionamento dos alunos-mestres entre si; c) relacionamento entre os alunos-mestres e as crianças. Em segundo lugar, buscou-se desenvolver nos alunos-mestres as competências básicas para pesquisarem o próprio ensino e refletirem sobre o mesmo.
Com esta metodologia, tornou-se possível identificar: a) os problemas que graduandos de Educação Física enfrentam neste processo onde ocorrem as suas primeiras experiências como regentes, b) as soluções que se propuseram a empregar, c) o nível de auto-percepção apresentado pelos alunos-mestres e d) sua percepção a respeito das crianças nos levando a concluir que a metodologia empregada foi adequada aos objetivos propostos.
Os problemas enfrentados pelos alunos-mestres foram de natureza diversa, sendo agrupados em:
1) Referentes às características das crianças: derivados da percepção dos regentes em relação às crianças da escola e que, segundo os mesmos, dificultavam o rendimento das aulas de Educação Física;
2) De ordem afetivo-emocional-social por parte dos alunos-mestres: decorrentes de sua auto-percepção enquanto docentes, alguns em relação ao relacionamento com sua dupla de regência, que também foram identificados como prejudiciais ao andamento das aulas;
3) De ordem técnico/pedagógica: detectados tanto pela professora, quanto pelos próprios alunos-mestres, referindo-se a deficiências de conhecimento ou a dificuldades de aplicação dos conhecimentos teóricos na prática didática;
4) Alheios ao desempenho dos alunos-mestres ou em relação às crianças: representados pelas ocasiões em que fatores do contexto escolar dificultaram o andamento previsto para as aulas.Estes problemas são mencionados a seguir:
1) PROBLEMAS DETECTADOS NO QUE SE REFERE ÀS CARACTERÍSTICAS DAS CRIANÇAS:
(9 problemas)
a) Nas séries iniciais encaram a E.F. como brincadeira;
b) Estabelecem as regras mas não são fiéis no seu cumprimento;
c) Atenção dispersa/ dificuldade em reunirem-se ao final das aulas p/ conversar; dificuldade p/ permanecerem sentadas e ouvir;
d) Ausência de conhecimento sobre o que significa respeitar os outros;
e) Classes heterogêneas em relação à idade;
f) Constatação: a maioria das crianças, prefere repetição de tarefas a propostas de soluções de problemas;
g) Constatação: nível cognitivo mais baixo do que o esperado; conseqüente baixa de expectativa dos alunos-mestres em relação a elas;
h) Falta de organização em função das tarefas propostas;
i) Indisciplina e agressividade; necessidade de dedicar muito tempo das aulas para resolver problemas de relacionamento com prejuízo do desenvolvimento de propostas motoras;
2) PROBLEMAS DE ORDEM AFETIVO-EMOCIONAL-SOCIAL POR PARTE DOS ALUNOS-MESTRES:
(12 problemas)
a) Desestruturação pessoal: desânimo, vontade de desistir de dar aulas, desespero e vontade de chorar quando não se atinge o sucesso esperado;
b) Decepções/.o ideal e o real;
c) Medo de perder o controle da situação;
d) Não saber estabelecer os limites ideais no comportamento afetivo em relação às crianças;
e) Dificuldade de entrosamento com a dupla de regência no que se refere à concepção de qual a melhor forma de se dar aula;
f) O planejamento foi feito pela dupla, mas acabou ficando em mãos de apenas um deles;
g) Dificuldade para esperar os alunos "se mostrarem" p/ conhecê-los como são; ansiedade em ser o centro das atenções falando demais;
h) Tendem a jogar o problema da incapacidade de ouvir apenas nas crianças, mecanismo de defesa; ansiedade em logo dar respostas;
i) Dificuldade em agradar a todas as crianças no que se refere ao relacionamento pessoal; j) Dificuldade em memorizar o nome das crianças;
l) Dificuldade em explicitar uma concepção de ser humano, educação e E.F. que norteasse o próprio trabalho;
m) Leituras recomendadas não foram completamente realizadas ( alunos que retiveram os livros)3) PROBLEMAS DE ORDEM TÉCNICO/PEDAGÓGICA:
(20 problemas)
a) A realidade desacredita a teoria; falta de visão a respeito das suas possibilidades e limites; - sentimento que deveriam ter planejado melhor, confrontando a teoria com a prática;
b) Adequação da linguagem ao nível de compreensão das crianças;
c) Propostas não significativas p/ as crianças; falta de relação com seu contexto social e conseqüente desatenção p/ novas propostas;
d) Dificuldade em selecionar atividades que agradassem a todas as crianças;
e) Dificuldade em lidar com crianças que não gostam de Educação Física;
f) Avaliações formativas e somativas foram previstas mas não executadas; dificuldade em avaliar quando os objetivos não estão claros;
g) Dificuldade em dar aula p/ grupo grande;
h) Dificuldade em estabelecer uma quantidade ótima de propostas para um semestre;
i) Não conseguir controlar o tempo de duração das aulas;
j) Dificuldade em planejar e ministrar aulas no interior de uma sala;
k) Dificuldade em ter claro o significado da não-diretividade e do construtivismo, assumindo atitudes conseqüentes;
l) Discernir autoridade de autoritarismo;
m) Dificuldade em trabalhar os dom. afetivo e cognitivo nas aulas de E.F., principalmente o afetivo;
n) O dom. afetivo-social é mencionado nos objetivos gerais, mas ignorado no elenco de objetivos específicos e atividades (viria, naturalmente, implícito nos demais?);
o) Não saber como lidar com o excesso de vitalidade das crianças;
p) Dificuldade geral em estabelecer métodos de trabalho;
q) Planejamentos: evidência de diferente domínio de conhecimento e zelo p/ com as questões pedagógicas;
r) Excesso de atividades previstas no planejamento tornando-o não exeqüível. Quanto + fechado + dificuldade p/ ajustá-lo e + sentimento de frustração;
s) Planejamento não seguido devido à sua inadequação às condições reais encontradas;
t) Não saber como lidar c/ as diferenças.4) PROBLEMAS ALHEIOS AO DESEMPENHO DOS ALUNOS-MESTRES OU EM RELAÇÃO ÀS CRIANÇAS:
(03 problemas)
a) Choque entre a escola vista e a vivida pelos alunos-mestres;
b) Mecanismo disciplinar utilizado pela professora de classe;
c) Reuniões e interrupções imprevistas alteraram o planejamento feito no início do ano.No decorrer das reuniões realizadas semanalmente para análise e avaliação do processo em andamento, os próprios alunos-mestres foram incentivados a propor soluções para seus problemas, no entanto elas não surgiram com facilidade e nem na quantidade necessária para atender a todos os problemas detectados. As soluções propostas são apresentadas a seguir:
5) SOLUÇÕES PROPOSTAS PELOS ALUNOS-MESTRES:
(06 soluções)
a) Comentar com os alunos as opiniões que emitiram sobre Educ. Física;
b) Esclarecer às crianças : Educação. Física é aula; há objetivos a atingir e regras de conduta para garantir o respeito entre as pessoas;
c) Para cada regra não cumprida pelas crianças eleger, conjuntamente, uma punição correspondente;
d) Passar p/ as crianças que na aula de Ed. Física há o que aprender e que isto é possível através de atividades agradáveis;
e) Diferenciar, no planejamento, o que foi planejado (/); o planejado e executado(X); o executado e não planejado (O);
f) Tentar resgatar nas aulas seguintes o que foi planejado e não executado.CONCLUSÃO:
O processo de formação de professores para o desenvolvimento da dimensão humanística-interacional da competência profissional não é responsabilidade apenas das disciplinas de natureza pedagógica do Curso de Licenciatura mas de todo currículo de Graduação. Da mesma forma, entendemos que a formação não se encerra ao final do curso de Graduação, mas trata-se de um processo ininterrupto de crescimento humano. Com esta metodologia de trabalho buscou-se proporcionar a reflexão sobre as oportunidades de relacionamento humano presentes na disciplina Prática de Ensino, o que não exclui a possibilidade de ser empregada, também, em outras disciplinas.Os resultados foram satisfatórios pois, a partir da reflexão individual e conjunta foi possível uma análise do comportamento dos alunos-mestres em diversas situações didáticas bem como desenvolver, na maioria deles, o hábito de observar atentamente seus alunos e registrar suas intenções, sucessos e insucessos.
Referências bibliográficas
- AUSUBEL, D.P. Educational psychology: a cognitive view, New York, Holt, Rinehart & Winston, 1968.
- AUSUBEL, D.P.; NOVAK, J.D. & HANESIAN, H. Psicologia Educacional, Rio de Janeiro, Interamericana, 1980.
- CANDAU, V.M. (org.) A didática em questão, 2ª ed., Petrópolis-R.J., Vozes, 1983.
- HEIDEGGER, M. Ser e Tempo, 4ª ed., Petrópolis-RJ, Vozes, Parte I, 1993.
- LIBÂNEO, J.C. Fundamentos teóricos e práticos do trabalho docente, Tese de Doutoramento, PUC-SP, 1990.
- _______________ Saber, saber ser, saber fazer: o conteúdo do fazer perdagógico, Rev. ANDE, nº 6, p.11-9, 1982.
- MARINI, T. A função do ensino e a prática pedagógica numa universidade pública, Tese de Livre Docência, UNESP/Presidente Prudente, Fac. de Ciências e Tecnologia, 1990.
- PLACCO, V.M.N.S. Formação e prática do educador e do orientador, Campinas-SP, Papirus, 1994.
- RIOS, T.A. Ética e competência, Belo Horizonte, Interlivros, 1977.
- ROGERS, C. Liberdade para aprender, Belo Horizonte, Interlivros, 1977
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