Validação do conteúdo do Instrumento de Avaliação Postural - IAP |
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*Fisioterapeuta, Professora das Faculdades Integradas Facvest- Lages, SC. Mestranda em Ciências do Movimento Humano- CEFID, UDESC, Florianópolis, SC. **Doutor em Medicina da Educação Física, Professor do Curso de Mestrado UDESC e UNISUL, Coordenador do Laboratório de Desenvolvimento Humano-LADEHU. ***Terapeuta Ocupacional, Mestranda em Ciências do Movimento Humano- UDESC. |
Daniela Branco Liposcki* Francisco Rosa Neto** Ana Carolina Savall*** liposcki@yahoo.com.br (Brasil) |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 109 - Junio de 2007 |
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Introdução
O corpo humano, durante o processo evolutivo, passa por constantes transformações diante do crescimento e desenvolvimento físico e, buscando o equilíbrio compatível com as novas proporções, provoca modificações e adaptações para o ajustamento ao centro de gravidade, influenciando assim, na postura corporal, compreendida como a posição ou atitude que o corpo adota no espaço bem como a disposição entre os segmentos corporais em relação ao centro de gravidade, promovendo conforto e sustentação ao corpo de forma econômica e harmoniosa.
A postura corporal assumida pela criança e pelo adolescente tem implicações em sua saúde e bem-estar. Moffat e Vickery (2002) afirmam que a postura correta mantém o esforço total em seu mínimo, distribuindo-o para as estruturas mais aptas a suportá-lo, enquanto que a "má postura" apresenta efeito oposto, aumentando o estresse total e distribuindo-o para estruturas menos capazes de suportá-lo.
Estudos de avaliação postural e análise de padrões posturais realizados com escolares, como pode-se citar os de Rosa Neto (1991); Verderi (2003); Oliveira (2005); Penha (2005), indicam presença de desvios posturais significativos nos escolares que, segundo Oliveira (2005), podem ser conseqüentes a alterações fisiológicas naturais do crescimento e desenvolvimento humano. Portanto, como sugere Penha (2005), algumas das alterações posturais evidenciadas nos estudos são próprias do desenvolvimento postural normal da criança e adolescente, sendo naturalmente incorporadas durante o crescimento.
No entanto, há alterações estruturais que caracterizam assimetrias, as quais podem ser geradas por demandas diárias do corpo como utilização inadequada dos mobiliários, vícios posturais, uso de calçados impróprios, podendo presumir a existência de patologia e que acarretam desconforto, algias e incapacidades funcionais, muitas vezes perdurando por toda a vida. Pantanali, Rosa Neto e Caon (2005), afirmam que o diagnóstico precoce de alterações posturais ainda na infância é de importância fundamental, pelo seu papel na gênese de alterações biomecânicas, que rotineiramente podem tornar-se sintomáticas, denotando problemas posturais, desgastes articulares e distúrbios da marcha.
Diante do exposto, a realização de Avaliação Postural deve constituir rotina nas escolas devido ao seu caráter preventivo, possibilitando identificar os desvios comumente encontrados, podendo-se evitar a prescrição de atividades e exercícios que venham a acentuá-los e realizar triagem e encaminhamento das crianças e jovens que apresentam desvios patológicos para um tratamento multidisciplinar adequado, contribuindo, em última instância, para a qualidade de vida e saúde dos escolares. Conforme Maine e Beresford (2005) "A avaliação postural refletirá na corporeidade dos escolares, servindo como meio de orientação e incentivo a executarem corretamente as atividades, contribuindo na prevenção de distúrbios posturais que afetam o desempenho motriz e conseqüentemente a qualidade de vida."
Para uma avaliação postural eficiente faz-se necessário, como postula Teixeira (2003), a realização de uma "leitura sensível" da criança e de todo o contexto em que está inserida, já que, segundo Bankoff (1994), na postura convergem todos os elementos que caracterizam a corporeidade como os fatores anátomo-funcionais, psico-emotivos e sócio-ambientais; e utilização de instrumentos que extraiam informações relevantes, sem parcialidade ou preconceito.
A utilização de instrumentos validados é imprescindível ao possibilitar o estabelecimento de uma linguagem comum entre os profissionais das diferentes áreas, prover bases científicas para a compreensão e estudo dos problemas observados, propiciar a comparação de dados ao longo do tempo e permitir o confronto de técnicas e abordagens terapêuticas. Do mesmo modo, sua utilização estabelece marcos com os quais se podem monitorar progressos e, além disso, possibilita a demonstração objetiva da eficiência do tratamento (TEIXEIRA, 2003).
Devido à escassez de instrumentos de avaliação postural com finalidade de triagem validados, foi criado o IAP - Instrumento de Avaliação Postural, baseando-se em fichas de avaliação postural disponíveis na literatura, em projetos e na experiência adquirida pela equipe que realiza avaliação postural em escolares, a qual notou limitações nas fichas pesquisadas e necessidade de utilizar um instrumento científico e padronizado.
O objetivo do presente estudo foi validar o conteúdo do Instrumento de Avaliação Postural - IAP, o qual foi submetido à avaliação por profissionais especializados, conferindo autenticidade científica para o instrumento a ser utilizado no projeto intitulado "PROJETO SAÚDE ESCOLAR", que objetiva avaliar os perfis de crescimento físico, postura corporal, rendimento escolar, aptidão física, desenvolvimento motor e características psicossociais e, quando necessário, realizar encaminhamento e intervenção, de crianças matriculadas de 1ª a 4ª séries do ensino fundamental, na cidade de Florianópolis/SC. O projeto supracitado é orientado pelo Prof. Dr. Francisco Rosa Neto, na disciplina Desenvolvimento Motor do curso de Pós-Graduação Strictu Sensu - Mestrado em Ciências do Movimento Humano da Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC.
MetodologiaA validação do Instrumento de Avaliação Postural - IAP foi desenvolvida em três etapas: primeiramente através do estudo e discussão da ficha inicialmente utilizada no projeto "Saúde Escolar" e outras presentes na literatura e em projetos pesquisados, observando-se suas limitações; seguindo-se da criação do IAP e, por fim, da determinação da validação de conteúdo do instrumento através da apreciação por um comitê composto por 13 juízes com importante experiência no assunto - entre Especialistas, Mestres e Doutores, atuantes nas áreas da Fisioterapia, Educação Física, Medicina e Terapia Ocupacional - aos quais foram apresentados o IAP - Instrumento de Avaliação Postural (anexo), acrescido de orientações para seu preenchimento referente à validação de conteúdo. Os juízes analisaram o instrumento considerando a clareza de descrição, validade e viabilidade de aplicação dos itens que compõem o IAP.
Para avaliar a validade de conteúdo dos itens foi utilizado o Índice de Validade de Conteúdo (IVC) proposto por Waltz, Strickland e Lenz (1991), calculado da seguinte forma:
A avaliação de cada juiz foi comparada com as avaliações dos demais, calculando-se o IVC para cada par de juízes (juiz 1 x juiz 2; juiz 1 x juiz 3; juiz 2 x juiz 3; ... e assim sucessivamente).
Os dados obtidos foram dispostos em planilha eletrônica a qual foi utilizado o programa Excel 2002 para Microsoft Windows.
Resultados e discussãoNa literatura encontram-se estudos, como os citados anteriormente, relacionados à importância da avaliação postural no ambiente escolar e às implicações da má postura em escolares, porém, são escassos os estudos relacionados à validação de instrumentos voltados à avaliação postural escolar. Autores como Miranda (2000), sugerem em seus estudos quando abordam a temática postural, exemplos de fichas de avaliação postural, não constituindo porém, em instrumentos validados. Outros instrumentos de análise postural disponíveis na literatura e no mercado, por sua vez, tornam-se inviáveis para a aplicação quando, por exemplo, se pretende realizar triagem em escolas, por consistirem em instrumentos com finalidade diagnóstica e/ou terem um alto custo financeiro, tornando-se inacessíveis aos profissionais e às instituições escolares.
O IAP - Instrumento de Avaliação Postural foi desenvolvido propiciando acessibilidade, facilidade e rapidez na utilização, inclusive para a avaliação de um número elevado de crianças, eficácia na triagem e autenticidade científica. Para a validação, seus itens foram analisados considerando-se os critérios de: clareza de descrição, que ressalta o entendimento do item por parte do profissional que irá utilizá-lo, devendo ser exposto de forma clara e evidente, não suscitando dúvida ou dificuldade durante a realização da avaliação postural; validade de aplicação do item, o qual se refere à importância e pertinência de se analisar determinado aspecto da postura durante o processo de avaliação; e, por fim, a viabilidade de aplicação do item, destacando não somente a possibilidade, bem como a facilidade em se avaliar na postura do escolar o item proposto.
No índice de validade Waltz; Strickland; Lenz (1991) referem que o foco principal da validação de conteúdo é determinar se os itens especificados no instrumento representam a adequação do conteúdo do critério expresso no instrumento, sendo a função de como o instrumento foi desenvolvido, os resultados obtidos foram analisados conforme o Índice de Validação de Conteúdo e em relação aos critérios supracitados.
A tabela 1, representa os valores obtidos através do cálculo do Índice de Validade de Conteúdo. Representando os treze juízes pelos números de 1 a 13, a intersecção das linhas abcissas com as ordenadas apresenta o valor que corresponde ao índice de concordância entre os mesmos, na qual constata-se uma correlação favorável à validade de conteúdo, sendo que somente os juízes 2 e 4 apresentaram respostas desfavoráveis à validação nos itens referentes à VLc (curvatura da coluna cervical) e VAf (posicionamento do quadril), destacando a falta de nitidez das figuras. As observações foram consideradas e procurou-se melhorar a qualidade dos desenhos utilizados.
Nas figuras 1, 2 e 3, estão representadas, consecutivamente, as respostas dos avaliadores em relação à clareza de descrição, validade de aplicação e viabilidade de aplicação dos itens que compõem o IAP, onde observou-se uma grande concentração de respostas consideradas claras, válidas e viáveis.
A clareza de descrição do item tem importância relevante para a validação de conteúdo do Instrumento de Avaliação Postural, por se tratar de um método de avaliação da postura corporal que utiliza como forma de registro a análise subjetiva do avaliador, devendo, cada item proposto a ser avaliado, apresentar-se evidente ao avaliador.
A validade de aplicação dos itens, que se refere à relevância em se avaliar determinada estrutura corporal, a fim de obter uma correlação com os possíveis desvios posturais, é fundamental para o processo de validação do instrumento ao demonstrar se há necessidade ou não de se avaliar o item proposto. Como exemplo tem-se que Alonso e Macon (2005) ressaltam a preocupação pelos desvios vertebrais, onde as dores e desvios constituem uma das principais causas de consulta e abstenção do trabalho nos países industrializados na idade adulta, destacando a importância da atenção a esses desvios nas primeiras idades e na adolescência, pois, segundo Lapierre (apud MIRANDA, 2000), "excluindo-se as patologias de ordem traumática, senil ou infecciosa, acredita-se que as deformações ósseas têm sua origem entre o nascimento e os 20 anos de idade".
Deste modo, é, não somente relevante como importante, avaliar na postura corporal as curvaturas vertebrais e seus possíveis desvios.
A viabilidade de aplicação refere-se à possibilidade de determinada estrutura corporal ser avaliada, sendo importante sua análise para verificar a facilidade ou dificuldade, ou, até mesmo a impossibilidade em se avaliar o item proposto. Devemos considerar que o instrumento propôs-se a ter praticidade na aplicação de seu conteúdo e finalidade de triar, analisando, como postula Rosa Neto (1991), o segmento corporal, detectando seus possíveis desvios posturais, e, quando necessário, o encaminhamento e realização de avaliação objetiva com finalidade diagnóstica.
De forma ilustrativa, a figura 4 vem demonstrar a porcentagem das respostas feitas pelos juízes, onde totalizaram-se 702 respostas; sendo 89% como claras, válidas e/ou viáveis; 10% pouco claras, pouco válidas e/ou pouco viáveis e somente 1% consideradas confusas, inválidas e/ou inviáveis, o que atesta a validade de conteúdo em 89% das respostas elaboradas pelos juizes.
Os resultados apontam que os itens têm descrição clara, possuem validade e viabilidade de aplicação, o que corrobora para a validação de conteúdo do Instrumento de Avaliação Postural - IAP.
Os juízes apresentaram sugestões relacionadas à melhoria das ilustrações, alteração do conteúdo escrito, modificação na ordem dos itens e acréscimo de itens a serem avaliados. Foram alterados os itens: VAd, acrescendo à avaliação do segmento corporal tronco, o quesito inclinação lateral (à direita ou à esquerda), anterior e posterior, sugerida por 01 juiz; VPa, substituindo o termo escápula retraída por escápula abduzida, sugerida por 02 juízes; Vaf, modificando as ilustrações de quadril que, por fim, passaram a constituir o item perna na avaliação da postura na vista anterior.
ConclusãoOs resultados desse estudo permitem concluir que o Instrumento de Avaliação Postural - IAP obteve validade do seu conteúdo, após a análise dos seus itens por profissionais especializados nas áreas de Fisioterapia, Educação Física, Medicina e Terapia Ocupacional, perfazendo 89% das respostas como favoráveis à validação.
Anexo
Referências
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revista
digital · Año 12
· N° 109 | Buenos Aires,
Junio 2007 |