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Educação e competência:
o ensino reflexivo na Educação Física
Education and competence: reflexive teaching in Physical Education

   
LEL - Laboratório de Estudos do Lazer - DEF/UNESP.
Rio Claro, SP.
(Brasil)
 
 
Jossett Campagna
jossett_c@yahoo.com.br  
Gisele Maria Schwartz
schwartz@rc.unesp.com.br
 

 

 

 


Resumo
     O comprometimento do profissional da área da Educação e, mais especificamente neste caso, do campo da Educação Física, para com a promoção de mudanças qualitativas em seu contexto de intervenção tem, como condição primeira, as capacidades de refletir, agir e transformar. Sabendo-se no mundo, este profissional, eticamente, se vê comprometido com o processo de reflexão sobre si mesmo e sobre seu estar no mundo, em uma dialética indissociável, que envolve ação-reflexão, trazendo para o foco questões concernentes à sua competência para o exercício do papel mediador nessa perspectiva. Sendo assim, esse estudo, de natureza qualitativa, teve por objetivo discernir acerca das competências do profissional da área de Educação Física, no sentido de evidenciar a premência de sua transformação em protagonista central, ativo e reflexivo, no processo de aprimoramento da qualidade do ensino nesta área.
    Unitermos: Educação. Ensino reflexivo. Educação Física.
 
Abstract
     The engagement of the Professional in Education area, specifically in Physical Education field, with the promotion of qualitative changes in the context of interventions, has as main condition, the ability of reflection, action and transformation. When aware of his insertion in the world, this professional sees himself ethically under obligation with the reflection process about himself and about his state in the world, in an indissoluble relation, which involves action-reflection, bringing into focus questions concerned about his competences to the exercise of his mediator role in this perspective. This study, of a qualitative nature, aimed to focus the attention on the competences of the Physical Education professional, in the sense of evidencing the urgency of his transformation in central, active and reflexive protagonist of the process of improvement in qualitative sphere in this area.
    Keywords: Education. Reflexive teaching. Physical Education.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 109 - Junio de 2007

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Introdução

    Pautando-se nos princípios de liberdade e autonomia de que dispõe, o ser humano vivencia, ativamente, a construção ativa de sua própria identidade, tornando-se, neste processo, sujeito agente e paciente de suas dimensões pessoal e profissional.

    A concepção de sujeito que norteia as idéias aqui expostas refere-se ao "eu" que se coloca no centro do mundo, com espaço próprio, carecendo da relação com o "tu" para dar-lhe visibilidade como único, individual, original e, portanto, distinto dos demais na existência de si mesmo (Morin, 2002).

    Nesse embasamento, o sujeito emerge de modo simultâneo ao mundo a partir de sua auto-organização, ou seja, a partir da capacidade humana de transformar-se sempre, sendo este devir ou esta possibilidade de transformação positiva, precisamente, a bússola que permeia e fundamenta a ação educativa ao longo de toda sua existência, porque este sabe -se inacabado.

    Estas constatações desnudam a incompletude humana ao mesmo tempo que põem em evidência as múltiplas potencialidades do ser, mobilizando-o para uma busca incessante da almejada completude. Neste processo, transforma-se no protagonista central ativo e reflexivo, visando ao aprimoramento de suas facetas pessoal e profissional, metaforicamente traduzids na busca de si mesmo e de sua autonomia.

    Por outro lado, esta busca permanente, conota e denota a impossibilidade de o ser humano buscar-se, a si mesmo, isoladamente ou na exclusividade.

    Dialogando sobre a abordagem desta busca solitária, Freire (1984, p.27-28) expõe que a mesma deve ser feita com outros seres, que também procuram ser mais em comunhão com outras consciências. Para este educador com penetração (inter)nacional, fazer de uma consciência, objeto de outras, significa "coisificar" consciências.

    É ele, ainda, que, na abordagem da educação como processo permanente, no qual todos se educam, atenta para a relativização do saber ou da ignorância, alegando que nem o saber, nem a ignorância são absolutos (Freire, 1984). Neste sentido, ele defende não ser possível falar de educados e não educados, mas de graus relativos e não absolutos de educação, refreindo-se a uma relatividade concernente a um saber edifica do por meio da superação e que traz, em si, a própria superação traduzida na ignorância.

    Também (re)conhecido por suas idéias de educação participativa, dialogal e ativa, Freire aguça olhares para o fato de a educação dinamizar processos de mudança, chamando à responsabilidade profissional todos aqueles inseridos numa perspectiva histórica, cuja ação, reação e intervenção não se fazem de maneira neutra e, portanto, comprometidas com as transformações axiológicas prementes, exigindo-lhe as capacidades de agie e refletir como competência essencial.

    Este profissional, sabendo-se no mundo e comprometido por si mesmo, intenciona sua consciência para a própria forma de estar, condicionando sua consciência de estar. Em outras palavras, a reflexão que o profissional faz sobre si e sobre seu estar no mundo não se dissocia de sua ação sobre o mundo e, sendo assim, esta indissociabilidade ação-reflexão traz para o foco, complexas e abrangentes questões relacionadas ao papel mediador que deve balisar sua práxis na perspectiva aludida. A competência é uma destas questões que vivem a desafiá-lo.

    Vale elucidar que o termo competência, sob óticas teóricas diversas, tem suscitado concepções também distintas, tais como a de ser um atrativo estranho (Le Boterf, 1994), a de referir-se aos saberes de experiência e de ação (Barbier, 1996), ou, ainda, aquela que representa a capacidade de mobilizar diversos recursos cognitivos - saberes, técnicas, savoir-faire, atitudes, competências mais específicas - para o enfrentamento de determinado tipo de situação (Perrenoud, 2000).

    As idéias sobre competência (Perrenoud,2000), bastante discutidas no Brasil, embutem pressupostos, os quais carecem ser elucidados:

  • a competência não se constitui num saber ou atitude em si mesma, uma vez que a ação pura e simples não garante sua eficácia;

  • a competência mobiliza, integra e orquestra recursos numa situação singular, passando por esquemas de pensamento (operações mentais complexas), já que há necessidade de buscar, no repertório de experiências, sua adequação ao momento inusitado da prática profissional.

  • a competência é construída ao sabor da navegação (expressão esta utilizada por Perrenoud, sustentada nas idéias de Le Boterf (1997), o que denota uma idéia de constante dinamismo do profissional e dinamicidade do contexto processual.

    Nesta mesma perspectiva, emerge o destaque que alerta para o fato de que a competência não pode e nem deve ser pensada como a pura e simples implementação "racional" de conhecimentos, de modelos de ação e de procedimentos. A justificativa para isto reside no fato de que a incorporação do conhecimento não garante sua mobilização em situações-problema bastante comuns no exercício cotidiano da profissão, inclusive, no campo da Educação Física. O pensamento a seguir ilustra de esta matriz teórica que vem dando sustentação às práticas nesta área.

    Para Perrenoud (1999, p.8), uma competência nunca é:

[...] a implementação "racional" pura e simples de conhecimentos, de modelos de ação, de procedimentos. Formar em competências não pode levar a dar costas à assimilação de conhecimentos, pois a apropriação de numerosos conhecimentos não permite, ipso facto, sua mobilização em situações de ação.

    A competência pressupõe, então, um pensamento prático, referindo-se àquele tipo de cognição requisitada em situações inusitadas, para as quais o profissional mobiliza conhecimentos que elaborou num contexto permeado por variáveis temporais e espaciais singulares (Perez-Gomez, 1997).

    Assim, o pensar e o refletir daquele que intervém na (re)construção e legitimação de seu campo profissional, tomados como recursos cognitivos no conjunto das potencialidades humanas, ganham magnitude e ampliam sua abrangência funcionando como verdadeiros instrumentos de resistência pessoal e social, facilitando a decodificação e transformação da informação em conhecimento (Pimenta, 2002), isto é, em saberes capazes de contemplar, inclusive, o erro e a ilusão como cegueiras do conhecimento.

    Estes aspectos, contemplando os princípios do conhecimento pertinente, da condição humana, da identidade terrena, do enfrentamento das incertezas, da compreensão e da ética do gênero humano (Morin, 2002), se focados na formação inicial e/ou continuada do profissional, corroboram para o acaloramento dos debates entre aqueles que pensam e concretizam educação no século XXI.

    Este aquecimento nos debates pode ser justificado por alguns fatores, como, por exemplo, a elevação dos níveis de exigência para lidar nas e com as macro complexidades atuais, cujas ressonâncias extrapolam o fazer do tecnicismo, a passividade, a reprodução e a heteronomia, fixando-se como diferenciais na inserção crítica e criativa dos educadores físicos, neste campo de atuação bombardeado por apelos midiáticos da era global(izante).

    Compreender estas novas demandas na área exige, então, análise cuidadosa deste panorama que, ao mesmo tempo, globaliza o mundo e coloca o ser humano numa dimensão planetária, fazendo com que o mesmo se indague acerca de sua existência solitária e solidária (Morin,1985). E, nesta busca incessante, mobilizada pela expectativa de encontrar respostas plausíveis sobre questões existenciais - pessoal, social e profissional - freqüentemente, o ser humano vê-se engessado e alvo de antagonismos sociais.

    O mero fazer (dinâmica procedimental), então, carece de outros saberes atitudinais e conceituais (Dellors, 2003), nos quais o exercício do pensar e do refletir assumem importância decisiva na aquisição, manutenção e no aprimoramento de inusitadas competências, das quais dependem a (re)inserção e a (re)valorização do papel de agente social transformador e inovador de práticas concernentes à realidade onde, na condição de ser humano, age, reage e interage.

    Deste modo, um olhar aguçado sobre as grades curriculares que refletem as propostas pedagógicas do curso destacado revela endências de (re)adequação da formação profissional diante das demandas específicas requisitadas em cada momento histórico. Não é proposta, aqui, adentrar na discussão do mérito da pertinência ou emitir juízo de valor sobre a operacionalização das referidas tendências, focos complexos e subjetivos abordados em outros estudos, como por exemplo, aqueles relacionados à Psicomotricidade (Le Boulch, 1986), ao Desenvolvimentismo (Tani, 1988), ao Construtivismo (Freire, 1984) e ao posicionamento Crítico-superador (Coletivo de Autores, 1992).

    O que precisa ficar claro é que uma formação profissional competente, como anteriormente sugerida, deve conduzir o profissional a fecundar um conjunto de idéias e reflexões, a colocar-se numa postura inconformada e avessa às certezas cristalizadas para além da mesmice e da acomodação, a estimular-se na construção de conhecimentos, de ações significativas e de possibilidades para mobilizar e transformar o outro (Werneck, 2000).

    Sendo assim, a construção de competências encontra-se intimamente associada à formação de esquemas de mobilização do conhecimento com discernimento, em tempo real, a serviço de uma ação eficaz. Tais esquemas, requisitando a gama dos recursos cognitivos (saberes, técnicas, savoir-faire, atitudes, competências mais específicas), só se desenvolvem e se estabilizam ao sabor da prática, não sendo, portanto, possível mobilizá-los, simplesmente, pela interiorização do conhecimento.

    Como expõe Perrenoud (1999), os esquemas constroem-se ao sabor de um treinamento, de experiências renovadas, ao mesmo tempo redundantes e estruturantes, tanto mais eficaz quanto mais associada à postura reflexiva aqui exaltada.


O profissional reflexivo e seu compromisso com a qualidade

    A década de oitenta, marcada por um momento histórico no qual a "formação de formadores" apresentava-se envolta por constantes nebulosidades que tangenciavam aspectos acerca do que os profissionais sabiam, como e por que ensinavam, desencadeou a atenção de pensadores contemporâneos a respeito da importância da postura reflexiva no processo da formação profissional, pondo em debate as ressonâncias que esta formação têm em suas dimensões pessoal e social.

    A reflexão, para este estudo, é compreendida como uma capacidade inerente à condição humana, cultivável por meio do exercício do pensamento crítico e da imersão do ser pensante no universo de seu repertório de experiências. Esta concepção embute a idéia de que esta capacidade é construída num cenário histórico-político-econômico e social e, portanto, permeada de simbologias, representações imaginárias, sentimentos, afetos, emoções, entre tantos aspectos subjetivos.

    Entretanto, numa abordagem qualitativa a reflexão só tem sentido se funcionar como subsídio de mudanças positivas desencadeadas por um sujeito reflexivo que, adote no exercício profissional posturas desta mesma natureza, conjugando seus elementos intrínsecos aos extrínsecos.

    Neste sentido, Perez-Gomes (1997, p. 37) concebe que a reflexão não se restringe a meros processos subjetivos presentes no enredo psicológico do ser humano, mas sim, "[...] supõe uma análise e uma proposta totalizadora, que captura e orienta a ação [...]", "[...] não é o conhecimento puro, mas contaminado por contingências da própria experiência vital".

    Em outros estudos de Perez-Gomes (1999), a reflexividade, como característica do ser humano racional, é explicada como a capacidade por meio da qual ele, voltando-se para si mesmo, para as construções sociais, intenções, representações, estratégias de intervenção, simbologias e intencionalidades, realiza auto-análise e a dos grupos sociais aos quais pertence, mobilizando o conhecimento construído para enriquecer e alterar a realidade na gama de papéis sociais que, simultaneamente, desempenha.

    A reflexão e a reflexividade, ganhando adeptos (Schon, 1992, 1983; Zeichner, 1992; Nóvoa, 1992; Perez-Gomez, 1999, 1997, 1992; Molina, 1997; Libâneo, 2002, 2000; Perrenoud, 2000, 1999, entre outros) impulsionam a teoria crítica na contracorrente da racionalidade técnica até então vigente, resgatando no espaço pedagógico a reflexão na ação e sobre a ação.

    Este resgate, como uma capacidade crítica e criativa que diferencia o profissional em tempos de globalização e universalidade, ganha argumentação favorável na insuficiência, ineficácia e na inaplicabilidade de modelos ou receituários, únicos para quaisquer situações que demandem estratégias de intervenção.

    Sendo assim, ou justamente por isto, a prática e a práxis profissionais constituem-se em oportunidades privilegiadas perspectivando subsidiar a (re)construção do conhecimento transcendendo ao saber científico (Betti e Betti, 1996) e ao manejo das freqüentes lacunas teórica-prática, advindas dos inexpressivos registros/documentação sobre como o educador atua e intervém (Shulman, 1987).

Esta tendência de superação da racionalidade técnica, sustentada no espírito crítico reflexivo sobre a prática cotidiana da educação do terceiro milênio pode ser sintetizada na expressão "practicuns reflexivos", preconizada por Zeichner (1992), na qual exalta a idéia de que os profissionais da educação têm teorias próprias e, com elas, dão sua contribuição para a base codificada de conhecimentos didático-pedagógicos.

    O pensamento prático reflexivo (Schon, 1983) embute três conceitos interdependentes, porém, independentes:

  • conhecimento na ação - relativo ao saber fazer, ao procedimental;

  • reflexão na ação e sobre a ação - traduzida na investigação que promove, concomitantemente, o desenvolvimento do conhecimento e o aperfeiçoamento da prática profissional;

  • reflexão sobre a reflexão na ação ou reflexão crítica - que diz respeito à utilização do conhecimento para descrever, analisar e avaliar. Pode-se dizer que se constitui numa reflexão sobre a representação ou a reconstrução da própria representação, feita a posteriori.

    Um currículo de formação baseado numa postura reflexiva, como sugerem Betti e Betti (1996), coloca a vivência da prática supervisionada por profissionais experientes num eixo de importância tão significativo quanto a aquisição dos saberes já socializados, visto que é por meio desta que o sujeito tem a possibilidade de saltar criativamente na elaboração de novos e inusitados caminhos.

    Entretanto, a exemplo do que acontece diante de uma nova tendência embasada por outras matrizes teóricas, nem sempre suas interpretações e operacionalizações são compatíveis ou fidedignas, podendo, na sua implementação, gerar distorções quanto aos seus propósitos originais.

    Não fugindo a esta regra,as questões vinculadas à prática profissional reflexiva, desencadearam, também, questionamentos por parte de alguns pensadores contemporâneos.

    Um destes, assinado por Pimenta (2002), alerta para a descaracterizaçào da proposta do ensino e da postura reflexivas por parte do sujeito profissional, argumentando sobre a ausência de senso crítico, a descontextualização dos fundamentos, a indevida apropriação da potencialidade político-epistemológica, a tendência de tecnização da reflexão reduzindo-a ao mero saber-fazer que compromete o compasso eqüitativo teoria-prática, e sobre outras evidências, as quais isolada ou coletivamente corroboram para o aligeiramento de seu descarte, para o paradoxo de uma formação mais centrada na certificação do que na qualidade do processo formativo.

    A estes argumentos, Pimenta (2002, p. 47) acrescer outro de natureza conjuntural: somente políticas conseqüentes, voltadas para a formação, darão conta de superar as limitações inerentes ao conceito de professor reflexivo, inclusive, "[...] da proposta de superar-se a identidade necessária dos professores de 'reflexivos' para a de 'intelectuais críticos e reflexivos'.

    Associando reflexibilidade à noção do professor reflexivo, Libâneo (2002, p. 53) evidencia um reducionismo decorrente da fragilidade do pensamento pedagógico nacional nas últimas décadas, considera a teoria do professor reflexivo na ótica do "[...] pragmatismo ou reconstrucionismo social como as únicas que explicariam mais acertadamente o lugar da reflexividade na formação inicial e continuada".

    Com base nesses pressupostos, inicialmente, focalizando-se os cursos de formação na área, torna-se premente que o profissional do ensino e da educação em nível superior incorpore atitudes e condutas competentes, capazes de mediar situações de ensino-aprendizagens compatíveis com a reflexão e a reflexibilidade, tomadas como objetivos da referida proposta pedagógica.

    Paralelamente ao encaminhamento que chama à responsabilidade ética o formador de futuros profissionais, torna-se igualmente necessário que essas competências, nele instaladas, sejam exteriorizadas em sua intervenção teórico-prática cotidiana, no sentido de gestar, em seus educandos, parâmetros críticos, criativos e transformadores das demandas sociais emergentes.

    Estes dois aspectos referentes aos processos de formação e a efetiva incorporação de atitudes competentes, representam uma possibilidade de superação de quadros de racionalismo técnico e da esportivização, ainda presentes na realidade educacional da área da Educação Física.

    Pelo fato de a criatividade representar o diferencial defendido para a educação na atualidade, persistir nas abordagens cuja eficácia têm sido alvo de críticas, os avanços qualitativos poderão ficar comprometidos, comprometendo a possibilidade de reversão do quadro de falta de legitimação profissional.

    Refletir sobre o papel da reflexão no contexto educacional da área de Educação Física torna-se, então, inadiável. Este refletir auxilia no desafio instalado quanto à promoção qualitativa no processo de formação profissional, intrinsecamente associado às capacidades mediadoras e transformadoras dos atores sociais.


Considerações finais

    Diante da totalidade dos desafios e das incertezas do tempo atual, que evidenciam uma desestabilização dos aspectos éticos da Educação Física e reverberam na ressignificação da Educação como fenômeno social complexo e plurifacetado, a adoção de uma postura crítico-reflexiva pode ser uma das estratégias mediadoras dos processos de (re)criação de canais de participação, da re)democratização, do respeito às diferenças culturais e da concretização de ideais mais igualitários.

    Para tanto, torna-se necessário (re)investir na abrangência da formação profissional cujos aportes considerem a importância da formação teórica, não como condição da prática, mas de reflexão sobre a prática (Libâneo, 2000); a dupla conotação da prática como ação ética orientada para fins e como atividade instrumental adequada a situações; a cultura crítica como inerente à reflexão/reflexividade, por meio das quais o profissional possa (re)incorporar, (re)exercitar e aprimorar as mesmas competências (Perrenoud, 2000, 1999) que pretende desenvolver em seus liderados, educandos ou clientes.

    Todos estes ingredientes se completam com uma ótica crítica da realidade. A adoção/manutenção desta postura, para além da formação inicial, deve ser intensiva e extensiva aos momentos em que a mesma tem continuidade, idéia também exemplificada no pensamento de Perrenoud (2000 p.158): "Saber administrar sua formação contínua, hoje, é administrar bem mais do que saber escolher com discernimento entre diversos cursos em um catalogo".

    Ao assumir a postura reflexiva, o profissional experiente e/ou iniciante eleva suas possibilidades de realizar uma análise mais complexa da realidade onde intervém e, tanto em nível pessoal, quanto social, aprimora sua capacidade de voltar-se a si mesmo e construir estratégias de ação capazes de (re)utilizar o conhecimento construído na, durante a e sobre a prática, no sentido de empreender nela, as transformações que demanda.

    Esta postura ética pautada na competência (De Gáspari, 2001), corrobora para que o educador físico assuma, para si, a parcela de co-responsabilidade participativa que delineia a elevação da qualidade de sua atuação profissional e sua co-participação na incógnita que desafia e reitera a relevância do papel da Educação Física, almejando atender seu compromisso com a qualidade.


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