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Treinamento contra resistência
e função muscular em idosos

   
Profa. Dra. do Departamento de Saúde.
NEAFIS - UESB, Jequié - BA.
(Brasil)
 
 
Aline Rodrigues Barbosa
alinerb13@yahoo.com.br
 

 

 

 

 
Resumo
     Com o avanço da idade adulta parece haver redução da força muscular e da flexibilidade (funções musculares) podendo prejudicar a realização das tarefas cotidianas e/ou a intensidade dessas atividades. Nas últimas décadas o treinamento contra resistência vem sendo bastante estudado e, recomendado, como alternativa para melhorar as funções musculares dos indivíduos idosos. Neste artigo, algumas informações sobre esta forma de treinamento e suas repercussões na melhora da força muscular e flexibilidade são apresentados, evidenciando sua aplicação segura em idosos.
    Unitermos: Treinamento de força. Envelhecimento. Função muscular.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 108 - Mayo de 2007

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Introdução

    Uma forma de atividade física, que vem sendo bastante estudada em indivíduos idosos nos últimos anos, é o treinamento contra resistência (TCR). A importância do TCR como uma atividade física com repercussões na prevenção e reabilitação de indivíduos idosos, em parâmetros funcionais (e metabólicos) foi reconhecida recentemente por entidades como o National Institutes of Health1 e American College of Sports Medicine2, sendo assim, recomendado para esses indivíduos.

    Vários estudos têm demonstrado que o treinamento contra-resistência, com intensidade e tempo apropriado acarreta adaptações fisiológicas, sendo eficaz no incremento da força1-6, melhora da flexibilidade7,8 em idosos.

    O objetivo do presente estudo é apresentar os principais aspectos relacionados à melhora da função muscular (força muscular e flexibilidade) em idosos, em conseqüência do TCR.


Treinamento contra-resistência

    O TCR, também conhecido como treinamento de força, é uma forma de exercício que requer que a musculatura corporal se mova (ou esforce para se mover) contra uma força oponente, geralmente oferecida por algum tipo de equipamento. A meta principal dessa forma de trabalho é melhorar a função fisiológica do músculo9.

    Nesta forma de exercício a tensão muscular atua como um estímulo localizado, e os músculos se tornam mais fortes em resposta à sobrecarga imposta, ou seja, o "stress" empregado no músculo pode ser continuamente aumentado, a velocidade de contração muscular pode ser acentuada, ou combinação desses dois fatores9.

    A intensidade, o número de séries e de exercícios executados, grupos musculares treinados, duração e freqüência do programa de treinamento, tipo de treinamento utilizado (isométrico, isotônico ou isocinético), devem ser considerados no planejamento e análise de um programa de treinamento, para melhora da função muscular.


Força muscular

    A força muscular, definida como a quantidade máxima de força ou tensão que um músculo ou grupamento muscular consegue exercer a uma velocidade específica de movimentos10, pode apresentar redução com avanço da idade adulta11.

    Nos indivíduos idosos a diminuição da força é um fenômeno associado ao declínio das atividades diárias normais e/ou na intensidade dessas atividades12, e também relaciona-se à alta prevalência de quedas e imobilização.

    O volume muscular e a área transversal do músculo parecem ser os principais responsáveis para a redução da força muscular verificada com o envelhecimento. Dados do estudo de Lexell et al.13, em análise de todo o músculo vasto lateral, mostram que a proporção média das fibras do tipo II não se altera com a idade, e que a redução no número de fibras parece afetar as fibras tanto do tipo I quanto as do tipo II, o que pode significar redução na síntese de proteína contrátil miofibrilar14. A redução das propriedades contráteis dos músculos, nos idosos, é também afetada pelo aumento da gordura intramuscular e tecido conjuntivo15.

    Os fatores neuromusculares também desempenham papel importante no desenvolvimento da força. Nos indivíduos idosos, parece haver redução no número de unidades motoras (aproximadamente 47%), acompanhado de um aumento no tamanho das unidades motoras restantes15.

    Portanto, o menor tamanho muscular total, perda de quantidade e qualidade das proteínas contráteis14, perda gradual de motoneurônios15, e também a inatividade física são fatores relacionados ao declínio da força muscular, iniciada por volta dos 50 anos11.


Força muscular e TCR

    O potencial para reverter a redução da força muscular relacionada à idade tem sido bastante explorado nos últimos anos. Em 1980, Moritani e DeVries16 demonstraram que os indivíduos idosos mantêm a capacidade de aumentar a força muscular, desde que devidamente estimulados, ou seja através de programas de treinamento de alta intensidade. Alguns estudos posteriores17 observaram pouco ou até mesmo nenhum aumento na força muscular de indivíduos idosos, empregando treinamento de baixa a moderada intensidade.

     A partir do final dos anos 80 vários estudos3-6,17 demonstraram que os treinamentos de intensidade progressiva e de alta intensidade, além de seguro, podem aumentar consideravelmente a força muscular de indivíduos idosos.

    Os mecanismos envolvidos no aumento da força muscular, nos indivíduos idosos, não são ainda totalmente esclarecidos. Dois mecanismos têm sido citados como prováveis responsáveis pela indução do treinamento nos ganhos de força: aumento no recrutamento neuromuscular e hipertrofia muscular3,4.

    Os primeiros estudos de força com indivíduos idosos16, citavam a melhora na ativação neural como fator preponderante para o ganho de força nesses indivíduos. Estudos posteriores, utilizando biópsia, tomografia computadorizada e ressonância magnética, puderam observar que a hipertrofia muscular também parece ser responsável por uma parcela dos aumentos de força muscular verificada nos indivíduos idosos3,4,17.

    A hipertrofia de fibras do tipo I e II tem sido verificada em alguns estudos, em idosos submetidos a TCR de alta intensidade, embora outros trabalhos mostrem maior propensão à hipertrofia das fibras tipo II, os resultados não parecem ser ainda conclusivos18.

    Os estudos citados demonstraram que os músculos dos indivíduos idosos mantêm a capacidade de se adaptar às demandas do exercício físico, embora esteja evidente a capacidade de hipertrofia do músculo em decorrência do treinamento, esse aumento é relativamente pequeno quando comparado com os aumentos observados na força muscular.


Flexibilidade

    A flexibilidade pode ser definida como a capacidade de movimentar as diferentes partes do corpo através de uma grande amplitude de movimentos2. Não existe uma medida geral da flexibilidade como um todo, ela é especifica a cada articulação. Assim, as limitações impostas à amplitude de movimentos, em determinadas articulações, tem sido associada com incapacidade e desconforto em idosos, podendo repercutir no baixo desempenho nas atividades da vida diária19. O nível de atividade física e padrões de movimentos habituais parecem ser fatores preponderantes na determinação da flexibilidade.

    A extensão dos movimentos das articulações está relacionada a fatores morfológicos como músculos, ossos, estruturas e funções do tecido conjuntivo. À medida que o indivíduo avança na idade adulta, ocorrem alterações mecânicas e bioquímicas na cartilagem, ligamentos e tendões das articulações, que consistem predominantemente de colágeno, tecido conjuntivo não elástico20, alterações estas que poderiam repercutir em alterações na extensão dos movimentos de determinadas articulações.

    De acordo com JOHNS e WRIGHT21, a contribuição relativa dos tecidos na resistência total da articulação durante o movimento, seria: a) cápsula articular - 47% b) músculo e fáscia - 41% c) tendões e ligamentos - 10% d) pele - 2% . Sendo assim, os tecidos mais elásticos, músculo e a fáscia , parecem ser mais importantes e modificáveis em relação ao aumento da flexibilidade e redução da resistência ao movimento21.


Flexibilidade e TCR

    O interesse na relação entre exercícios com pesos e alteração na flexibilidade é bastante antigo. Em 1956, MASSEY e CLAUDET22 observaram que essa forma de exercícios não prejudicava a amplitude dos movimentos corporais em adultos jovens submetidos a 6 meses de treinamento. Os autores citam ainda, vários outros estudos, realizados no início da década de 50, que mostravam evidências de que esta forma de exercício físico não restringe os movimentos corporais. Posteriormente, este fato foi evidenciado por WILMORE et al.23, em estudo realizado com adultos jovens submetidos a 6 meses de TCR.

    O que talvez possa ocorrer é que, devido à um grande aumento no tamanho muscular, haja limitação parcial na amplitude dos movimentos. Esses aumentos da massa muscular são observados apenas em atletas de culturismo, que contudo, apresentam flexibilidade acima da média de atletas de outras categorias9.

    Para que o TCR possa ter um efeito positivo sobre a flexibilidade, a literatura preconiza a execução de movimentos que utilizem grande amplitude dos movimentos, não se enfatizando os movimentos parciais. Adicionalmente, os grupos agonistas e antagonistas de determinada articulação devem ser treinados9, possibilitando assim, um efeito positivo sobre a flexibilidade.

    Alguns autores7 acreditam que os exercícios de alongamento devem ser executados juntamente com o TCR, para que esse não tenha efeito negativo na extensão dos movimentos dos indivíduos idosos. Essa recomendação baseia-se na premissa de que os exercícios de alongamento podem diminuir a tensão do músculo em repouso, prevenir a rigidez e o encurtamento muscular, além de aumentar a extensão dos movimentos articulares, prevenindo assim, possíveis lesões. Contudo, apenas o efeito do aumento da extensão dos movimentos foi comprovado por experimento20,24, para os demais itens, não existem evidências científicas.

    Vale ressaltar que WIEMANN e HAHN24 compararam os efeitos de TCR, alongamento estático e balístico e cicloergômetro, na amplitude de movimentos e tensão muscular de repouso da musculatura posterior da coxa. Segundo os autores, embora as pessoas, geralmente executem exercícios de alongamento com o intuito de evitar provável aumento da rigidez muscular, após o TCR e, visarem reduzir a tensão muscular por meio de alongamento, o seu estudo não observou nenhum sinal de diminuição na tensão muscular de repouso, através de exercício de alongamento, seja ele balístico ou estático.

    No estudo de Barbosa et al.8, observou-se aumento significativo no teste "sentar e alcançar" em idosas submetidas a 10 semanas de TCR. Neste estudo não foi utilizado qualquer exercício de alongamento, antes ou após as sessões de treinamento, também, não foi realizada qualquer forma de aquecimento de natureza aeróbia, com o intuito de aumentar a circulação sangüínea dos músculos, e assim, possivelmente melhorar suas propriedades elásticas24. O aquecimento foi realizado nos aparelhos, como parte da série a ser executada.

    Embora não tenha sido realizado com idosos, o estudo de WILMORE et al.23 também mostrou melhoras na flexibilidade em indivíduos submetidos a TCR, sem qualquer treinamento adicional para flexibilidade. Assim, observa-se que o treinamento contra resistência, além de não prejudicar a flexibilidade, pode aumentar determinadas extensões de movimento.


Considerações finais

    Existe um alto grau de especificidade na resposta ao treinamento, provavelmente, esta especificidade é devido a adaptações favoráveis que ocorrem tanto no próprio músculo quanto na organização neural e na excitabilidade para determinado movimento voluntário. Dois mecanismos têm sido citados como prováveis responsáveis pela indução do treinamento nos ganhos de força: aumento no recrutamento neuromuscular e hipertrofia muscular, sendo de amplo conhecimento que o incremento na força muscular se dá através de treinamento com altas cargas, ou de alta intensidade, inclusive com idosos.

    No treinamento contra-resistência, o aumento da flexibilidade provavelmente ocorre porque o processo de hipertrofia, decorrente do treinamento, é acompanhado de aumentos no tecido conjuntivo intramuscular, alterações no padrão de recrutamento muscular, além dos exercícios forçarem os limites de amplitude dos movimentos9,24.

    Independente dos mecanismos envolvidos na melhora da função muscular, o TCR pode ter um papel importante na prevenção das perdas funcionais associadas à idade.


Referências

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revista digital · Año 12 · N° 108 | Buenos Aires, Mayo 2007  
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