O exercicio da profissionalidade docente nas aulas de Educação Fisica da 1ª a 4ª séries de educação básica |
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*Coordenadores do projeto e professores do curso de Licenciatura em Educação Física do Instituto de Biociências da UNESP/Rio Claro. **Acadêmicos do curso de Graduação em Educação Física do Instituto de Biociências da UNESP/Rio Claro. ***Diretora da E.M.E.I.E.F. "Profa Maria Apparecida de Luca Moore", Limeira - SP. (Brasil) |
Samuel de Souza Neto* samuauro@claratianas.com.br Ana Maria Pellegrini* anapell@rc.unesp.br Larissa Cerignoni Benites** Adriana Regina Gonçalves** Bruno Nascimento Alleoni** Adriana Ijano Motta*** |
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Trabalho desenvolvido com auxílio do Núcleo de Ensino, FUNDUNESP.
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 107 - Abril de 2007 |
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Introdução
"No que se refere ao trabalho com os docentes e outros profissionais da escola, dois tipos de resistências ficam evidenciados. Num primeiro momento, a resistência era relativa à valorização do corpo no processo de escolarização, com a tradicional valorização das atividades cognitivas em detrimento das atividades físicas. Ao final do processo de intervenção, quando os dados foram apresentados, socializados com a equipe da escola, houve um impacto muito grande quanto à necessidade de resolver os problemas no contexto da escola com uma mudança de atividade quanto à relação entre o problema cognitivo e o domínio do corpo. Este segundo momento levou o corpo docente à consciência de que embora considere importante a atividade física na escola ele não sabe como empreendê-la. Os professores reconheceram deficiências em sua formação profissional e não tem idéia de como soluciona-la". (PELLEGRINI et al, 2003, p. 282)
A transcrição acima corresponde ao trabalho desenvolvido no primeiro ano do Projeto "O Comportamento Motor no Processo de Escolarização de Crianças no Ensino de Educação Infantil e no Ensino Fundamental". Esta proposta teve o seu início no ano de 2002, na cidade de Limeira, Secretaria Municipal de Educação, numa escola de educação infantil e primeiras séries do ensino fundamental, por solicitação de algumas professoras que estavam preocupadas com as dificuldades de aprendizagem de suas crianças relacionadas aos problemas de coordenação motora, agressividade, falta de atenção, ordenação.
Nesta primeira fase do projeto foi confirmado o diagnóstico apresentado, mas também foi identificado alguns limites da ação docente nos levando a trabalhar em duas frentes, na segunda fase, no ano de 2003. A primeira ficou concentrada no trabalho de intervenção do comportamento motor no processo de escolarização e a outra foi direcionada para se trabalhar com a capacitação docente em serviço através de reuniões pedagógicas e de um seminário de desenvolvimento motor com a presença de alguns especialistas.
O trabalho que ora será apresentado diz respeito a esta segunda fase, denominado por nós de "profissionalidade docente" em que se busca trabalhar o exercício da profissão docente e os limites encontrados na ação dos professores. Portanto, trata-se mais de uma reflexão com base em alguns dados encontrados no trabalho de campo, bem como de uma mediação com as concepções de ensino que subsidiam as propostas de sala de aula.
Profissionalidade é o termo utilizado para designar "o modo de resgatar o que de positivo tem a idéia de profissional no contexto das funções inerentes ao trabalho docente", abarcando três dimensões:
obrigação moral - tendo como componentes a preocupação com o bem estar dos alunos e com a ética, perpassando as relações de afetividade e motividade;
compromisso com a comunidade - estabelecendo, inicialmente, com os professores e, a seguir, com a sociedade como um todo intervenção nos problemas sociais e políticos, e compreendendo a escola como um local de preparação para a vida futura, como agente regulador da sociedade (liberdade, igualdade, justiça);
competência profissional - transcende o domínio de habilidades e técnicas e emerge a partir da interação entre a obrigação moral e o compromisso com a comunidade. (CONTRERAS, 2002, p. 73)
Porém, para que esse dimensionamento ocorra há a exigência de que se enfrente o desafio da mudança em três níveis: o das mentalidades, das práticas e dos compromissos.
"Por mentalidade quero significar a maneira de pensar, julgar e agir. (...)
O desafio das práticas significa tornar as vivências e experiências objetos de análise e reflexão. Em geral, não há preocupação com o contexto em que são construídas e consolidadas as nossas práticas, em outras palavras, não reconstruímos a trajetória histórica da nossa prática.
Finalmente, o desafio do compromisso significa transitar do discurso para a ação, articular o real possível e o ideal, destruir as fantasias que cercam o mundo dos planejamentos e programas, gestar e gerir propostas capazes de dialogar com as práticas e as realidades, resgatar o sentido do planejar para a ação (...)". (MACHADO, 1996, p. 103-104)
Caso contrário poderemos cair no velho reducionismo, em que o 'novo' é sempre melhor do que o 'velho' e não se respeita a experiência bem sucedida.
Entretanto, o que faz um professor?
Em que universo habita?
Como é formado?
Em que contexto se dá a socialização da profissão?
Quais são os nossos paradigmas?Um professor ensina determinados conteúdos julgado significativos para se viver no grupo social, orientam o processo ensino-aprendizagem dos alunos na sala de aula, cria "mundos", estabelece uma mediação entre a pessoa, a realidade e a cultura, tendo na docência a especificidade de sua profissão. Profissão esta que é constituída de determinados saberes (TARDIF, 2002; PIMENTA, 1997; SCHON, 1992) que dão legitimidade à ação docente, sendo apreendidos num processo formal de educação que deverá continuar, posteriormente, na forma de uma educação permanente e de formação continuada.
Todavia não há docência sem discencia e da mesma forma não há ensino sem uma concepção de homem, mundo e sociedade, que se modifica de época em época, segundo os valores e necessidades de cada tempo, emergindo desta constatação diferentes desenhos para a sala de aula. Dessa forma, tendo a sala de aula como objeto de estudo, o nosso objetivo será apontar alguns aspectos da profissionalidade docente, buscando averiguar nas perspectivas de ensino (concepções ou dimensões), bem como no trabalho de campo, com as professoras desta escola, alguns indicativos desta realidade.
A sala de aula, O Mito da Caverna e as concepções de ensino1Pensar a sala de aula e o papel do professor é como fazer um exercício de reflexão sobre "O Mito da Caverna", narrado por Platão (428-347), no livro VII da Republica, em que o filósofo-educador busca descrever a situação geral da humanidade. E o que ele vê? Que todos nós estamos condenados a ver sombras a nossa frente e toma-las como verdadeiras. Neste contexto, a "caverna" com suas pinturas e espectro sombrio pode representar as nossas limitações, mitos e fantasmas, subjacentes à sala de aula, que para serem superados precisam da "luz ". De fato,,,
"Há dois mundos. O visível é aquele em que a maioria da humanidade está presa, condicionada pelo lusco-fusco da caverna, crendo, iludida que as sombras são a realidade. O outro mundo, o inteligível é apanágio de alguns poucos. Os que conseguem superar a ignorância em que nasceram e, rompendo com os ferros que os prendiam ao subterrâneo, ergueram-se para a esfera da luz em busca das essências maiores do bem e do belo". (SHILLING, 2001)
Todavia, o nosso grande desafio estaria em superar estas imagens, espectro, que são tomadas como verdadeiras, fruto da ignorância e de nossa inércia. Dentro deste contexto encontramos a sala de aula com o seu repertório de mitos e fantasmas, trazidos ora pela situação local de desequilíbrio social e ora pelos dogmatismos pedagógicos que nos fecham dentro de um profundo subterrâneo.
Na superação de nossos mitos encontramos na leitura de alguns paradigmas, relacionados ao papel do professor, tentativas, em diferentes épocas, de superação dessa situação de "ignorância" e, ao mesmo tempo, de constituição dos saberes da profissão docente.
No pêndulo da sala de aula emerge uma primeira abordagem que vem do paradigma do "magister"2 nos remetendo para uma imagem de competência do professor que é portador de um saber sistematizado, consagrando inteiramente a sua existência para uma atividade de produção e transmissão de conhecimentos na qual constitui a finalidade da sua atividade educativa. Neste enfoque o valor central está no saber que vale "em si próprio e por si próprio". De modo que o papel do professor consistiria em desbloquear o acesso ao saber, mediante a observância de uma exigência rigorosa para consigo e para com os alunos em que a competência profissional estaria na capacidade para dominar o que se ensina. (FERNANDES, 1998)
Do questionamento aos limites desta proposta surgiu o paradigma do "pedagogo" que, se entendido em toda a sua extensão, está relacionado aos métodos ativos de ensino em que o aluno se torna o sujeito da educação e o professor o orientador deste processo. Embora possa parecer simples, não é, muito pelo contrário, pois exige-se que o mesmo domine o conteúdo específico, conheça a faixa etária de desenvolvimento dos alunos, bem como tenha uma grande fluência com a metodologia de ensino.
Cabe ressaltar que essa abordagem é consecutiva do reconhecimento de que o aluno é o sujeito do conhecimento, de que o processo de transmissão do saber é, ao mesmo tempo, o da sua aquisição. Nesta perspectiva, a aprendizagem confere ao aluno um protagonismo central. O alvo da educação já não é o saber, mas o próprio aluno. Neste novo paradigma a instrução está subordinada à educação e o domínio do saber não é uma exigência predominante, pois o essencial é a capacidade do professor para levar em conta as necessidades do aluno, prescindindo de uma formação psicológica, psicossociológica ou pedagógica. Muda-se, portanto, a definição da competência profissional. (FERNANDES, 1998)
Uma terceira abordagem deste processo buscou superar a questão do conteúdo e do método, propondo uma combinação das duas propostas naquilo que denominou-se chamar de o paradigma do "técnico". Em tese o que se buscou foi uma melhor performance da eficácia e da eficiência no processo de ensino, tendo como meta gerar uma tecnologia educacional.
Neste referencial, o ponto de partida foram os insucessos de uma pedagogia pautada apenas na transmissão dos conteúdos (transmissão cultural) ou no estabelecimento de métodos (forma), apresentando como opção a organização instrucional do conteúdo e da forma numa única proposta de ensino.
No paradigma do técnico, o professor se torna o executor dos objetivos instrucionais, das estratégias de ensino e da avaliação estabelecidos por uma comissão de especialistas relacionados à uma dada área de conhecimento, A ênfase recai no formalismo didático dos planos elaborados, segundo normas pré-fixadas e no distanciamento entre teoria e prática. Neste enfoque, os conteúdos centram-se na organização racional do processo de ensino, considerando-se o planejamento didático formal, a elaboração de materiais instrucionais e a utilização de livros didáticos. Portanto, é o processo que determina o que professores e alunos deverão fazer e quando e como o farão.
Nesta referência em que predomina a técnica de ensino, a sua base de instrução tem como pressupostos a psicologia comportamental, a instrução programada, a teoria da comunicação, o planejamento formal (previamente elaborado) e os livros didáticos (descartáveis). De forma que o ensino fica condicionado à sua dimensão técnico-prática da prática escolar, sofrendo, como nas outras abordagens, questionamentos em virtude de seus limites. (VEIGA, 1988)
Das críticas efetuadas a esta proposta emergiu uma nova concepção centrada no paradigma "sócio-político" da educação. Este questiona as outras referências, propondo que o foco da educação não está centrado no professor, no aluno ou na técnica de ensino, "mas na questão central da formação do homem" (VEIGA, 1988).
Neste contexto vai se reivindicar uma escola pública do tipo única, para todos, pois é uma educação que se preocupa e se compromete com os interesses do homem das camadas mais desfavorecidas economicamente. Caberia ao professor trabalhar no sentido de ir além dos métodos e técnicas, procurando associar escola-sociedade, teoria-prática, conteúdo-forma, técnico-político, ensino-pesquisa.
O pensamento pedagógico socialista formou-se no seio do movimento popular pela democratização do ensino, opondo-se à concepção burguesa de educação com vistas à transformação social. Na realidade trata-se de uma Pedagogia Crítica, de inspiração marxista na proposta de que a educação é o que se pode fazer do homem amanhã. (GADOTTI, 1995)
Embora algumas de suas críticas sejam relevantes em relação ao tecnicismo, neutralidade de meios e técnicas didáticas, separação conteúdos/métodos, fixação de objetivos educacionais (pelos órgãos da burocracia oficial) e a didática enquanto "receituário" sustenta uma "visão parcializada da educação, ao reduzi-la à sua dimensão socio-política, negando a especificidade do pedagógico". (LIBÂNEO, 1986)
Entretanto, no bojo destas diferentes abordagens emergiu também uma outra perspectiva, que perpassa as demais concepções, mas que tem uma especificidade própria, naquilo que denominou-se chamar de paradigma do "educador", constituindo-se no enfoque atual.
O termo "educador" surgiu como uma tentativa construtivista de retomada do ser professor na sua essência, buscando fazer uma mediação entre o passado e o presente. Neste novo delineamento, o "educador" é aquele que educa (desenvolve as faculdades físicas, intelectuais e morais - instrui) ou ajuda no processo global de desenvolvimento da criança, bem como faz do ato pedagógico um ato político no sentido de formação da cidadania.
O professor não é necessariamente um educador e, este, por seu turno, não é necessariamente um professor, ou pessoa culta ou letrada, mas que imbuído desse ideal, primeiro ensina a si mesmo e só depois se propõe a ensinar os outros na perspectiva de que o exemplo e a coerência falam mais altos que os grandes discursos.
Destas referências infere-se que ser professor, em sua origem era uma profissão que exigia, na maior parte das vezes, professar, confessar, declarar uma escolha "religiosa" cujo papel exigia uma dedicação integral à "determinada tarefa ou forma de vida" (ROSSATO, 2002, p. 89).
"No começo, portanto, professor era aquele que se identificava por um modo de vida próprio e que tinha um estilo próprio de viver. Havia, pois, uma identidade entre profissão e vida, e professor era aquele que tinha uma doutrina própria e oferecia algo de novo aos seus alunos, formando discípulos e seguidores. (...) Somente mais tarde, passou-se a aceitar e designar como professor todo aquele que se dedicava ao ensino" (ROSSATO, 2002, p. 90 )
Para o autor, embora os pedagogos gregos ou império romano, de certa forma já exercessem este papel, "pode-se dizer que somente com o surgimento das universidades medievais é que se consolidou a imagem do professor como figura central do processo educativo", pois a "própria origem do termo está baseado em algo extremamente corrente no mundo medieval: a profissão religiosa" (p. 88). Daí a expressão comum que fui utilizada durante muito tempo por pessoas públicas, como os políticos, mas no sentido pejorativo, de que o "magistério é um sacerdócio", ou seja, uma profissão de fé, de abnegação, de altruísmo. Porém, o próprio autor nos pergunta também se não seria mais adequado designar como professor aquele que constrói uma visão própria de mundo e diz sua palavra sobre o mundo?
Neste contexto, a muito tempo atrás, Rubens Alves (1984) já havia assinalado que o "educador", pelo menos no ideal de sua imaginação, habita um mundo em que a interioridade faz uma diferença em virtude das pessoas se definirem por suas visões, paixões, esperanças e horizontes utópicos.
Embora este paradigma tenha ganhado a sua ênfase na segunda metade do século XX [Escola Nova, Humanismo Cristão, Políticas Públicas (LDB 4024/61), Psicologia Humanista, Filosofia Clássica Moderna etc] cabe assinalar que o mesmo teve a sua tradição no mundo antigo, ganhando a sua emancipação com o mundo medieval e, na atualidade, foi retomado, de forma mais ampla, como crítica ao processo de formação profissional e de atuação docente.
Tendo como referência este contexto procuramos trabalhar com os professores envolvidos com o projeto "O Comportamento Motor no Processo de Escolarização de Crianças no Ensino de Educação Infantil e no Ensino Fundamental", considerando a realidade escolar (projeto pedagógico e reuniões pedagógicas), mas também o ser professor.
A E.M.E.I.F "Professora Maria Apparecida de Luca Moore": um estudo de caso - o trabalho de campo e seus resultadosComo foi colocado anteriormente o objetivo deste estudo esteve vinculado em trabalhar com as professoras "a profissionalidade docente" [bem como auxilia-las na (rede) descoberta do corpo, priorizando o desenvolvimento motor]. Porém, cabe registrar que para a coleta e análise destes dados utilizamos uma abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso, tendo como técnicas: fonte documental, relatório das professoras sobre o trabalho que foi desenvolvido, relatório de um seminário científico e participação, de uma parte, das professoras (oito) num Congresso de Educação. O número total das professoras envolvidas foi de 25.
Com relação aos resultados obtidos cabe destacar:
1. Projeto Político Pedagógico da E.M.E.I.E.F. "Maria Apparecida de Luca Moore"Nesta escola a proposta pedagógica organiza-se por eixos temáticos (por bimestre), colocando no centro deste processo a questão do amor (em virtude de problemas de violência física, material e simbólica) sem apresentar a sistematização de uma concepção pedagógica. Trata-se muito mais de um slogan prepositivo, organizado na forma de quatro eixos temáticos (apresentando estreita relação com os PCNs):
Quem ama conheci a si mesmo e exerce a cidadania;
Quem ama respeito o seu espaço;
Quem ama valoriza o meio ambiente e a cultura;
Quem ama sonha e realiza.
No geral, embora estes eixos sejam interessantíssimos, visando a transformação, os mesmos não mereceram uma atenção maior com relação ao seu papel "oculto" de articulador do currículo, no Projeto Político Pedagógico (2002), em função de terem sido construídos num momento posterior a esse processo de elaboração da proposta pedagógica. Portanto, cabe ressaltar que o planejamento curricular e o planejamento de ensino gravitam sob esta órbita, devendo todo e qualquer trabalho desenvolvido nesta instituição considerar esta premissa.
Com relação ao Projeto Político Pedagógico este apresenta uma proposta sócio-política, visando situar a pessoa num processo de transformação pessoal e coletiva no exercício da cidadania, visando sempre um processo construtivo e participativo da realidade que o cerca.
No que se refere à Educação Física está ficou vinculada às atividade de movimento na educação infantil, tendo como meta "através do movimEnto, propiciar que a criança expresse emoções e pensamentos, ampliando as possibilidades do uso significativo de gestos e posturas corporais" (LIMEIRA, 2002, p. 38). Neste contexto a proposta apresentou como habilidades e conteúdos a serem explorados: conhecimento e controle corporal, imagem corporal, expressão corporal, gestos e ritmos corporais, mímicas, dramatização e musicas de rotina, pantominas, jogos e brinquedos, gincanas, jogos com regras, brincadeiras de roda, capacidades físicas (ou qualidades físicas), enfim, vivenciar o movimento corporal. Em relação às primeiras séries do ensino fundamental a Educação Física tem como proposta "proporcionar aos alunos condições para a construção de um repertório de atividades, onde ela possa usar e ampliar os movimentos corporais tanto em situação de expressão, quanto em atividades esportivas" (p. 38). Tendo como ênfase esta compreensão irá propor como atividades e conteúdo: o conhecimento sobre o corpo, movimentos corporais livres e dirigidos, lateralidade, jogos com regras, lateralidade, esportes, lutas, ginástica, atividades rítmicas e expressivas, equilíbrio, coordenção viso-motora.
Porém, cabe ressaltar que embora haja este planejamento, o corpo docente tem consciência de que não sabe como empreender a atividade física na escola, pois reconhece as ficiências em sua formação profissional e não tem idéia de como soluciona-la (PELLEGRINI et al, 2003).
2. Relatórios das professoras E.M.E.I.E.F. "Maria Apparecida de Luca Moore" sobre o trabalho desenvolvidoNo trabalho de intervenção realizado foi diagnosticado pelas docentes que:
"Os planos elaborados pela UNESP, embora não tenham sido seguidos à risca, auxiliaram bastante as professores fornecendo idéias muito interessante e diferentes no trabalho com a educação motora.3
Os alunos demonstraram muito interesse em participar das atividades e muitas vezes pediam que as brincadeiras mais interessantes fossem repetidas, como por exemplo o alongamento dos bichos.
As atividades propostas necessitaram de adaptação no decorrer do ano letivo, principalmente em relação ao tempo de duração das mesmas (muitas atividades, inclusive, necessitaram ser trabalhadas por mais de uma aula), pois a classe atendida no primeiro ano de escolaridade possuía bastante dificuldade de entendimento de regras e instruções (comandos e tarefas forma as atividades mais difíceis, principalmente nos grupos com maiores dificuldades)".
Podemos observar que algumas crianças melhoraram no desenvolvimento motor e na atenção e percepção". (LIMEIRA, 2003a, p.1-2)
Acreditamos que o trabalho principal consistiu em levar estas professoras a acreditarem que poderiam fazer o que havia sido proposto; ir além dos limites conhecidos; acreditar que poderiam fazer "algo a mais" do que já faziam; superar a inércia que ronda toda e qualquer profissão com o passar dos anos; enfim, que as mesmas tinham capacidade, mas que seria fundamental que, primeiro, saíssem de suas couraças, enfrentassem o desafio do "novo" em relação aos conteúdos de Educação Física e refletissem sobre o exercício da docência na sala de aula, buscando superar o mito da alegoria da caverna. Foi o que aconteceu nas entrelinhas do relato apresentado quando se colocou que esses "planos de aula nos levaram a refletir sobre nossa prática, reavaliando-as e tornando-as mais específicas"; que "nós professores nos deparamos com as nossas próprias dificuldades em relação as habilidades necessárias para desenvolve-las, obrigando-nos a supera-las"; que os "planos de aula nos fizeram perceber que mesmo sem o conhecimento específico dessa área, já desenvolvíamos algumas atividades contemplando esses conteúdos"; em resumo, houve "mudanças de comportamento, por parte de muitos professores em relação ao próprio corpo, na aceitação de seus limites e valorização de suas próprias habilidades", bem como "maior envolvimento e participação dos alunos" em virtude de que as professoras: "trabalhando com vários grupos, pudemos perceber e respeitar diferentes habilidades e limites de cada aluno".
3. Participação no Congresso de Educação - EDUCAÇÃO A FRATERNIDADE: UM CAMINHO POSSÍVEL", promovido pelo Movimento Humanidade, nos dias 21 e 21 de setembro de 2003, em Vargem Grande Paulista-SPNa participação a este evento, que teve como tema central a proposta da Profa Dra Chiara Lubich (2001), as reflexões realizadas aparecem no relatório que será apresentado a seguir em que novamente se encontra os valores da profissionalidade docente, bem como parte dos valores de um currículo oculto e/ou do próprio projeto pedagógico,presente na descrição:
"Em relação às idéias discutidas acerca do pensamento da pedagoga italiana Chiara Lubich, a fraternidade, o amor, a importância dos aspectos afetivos e mesmo espiritual na relação ensino-aprendizagem. Pudemos observar algumas semelhanças com o trabalho que já realizamos em nossa Unidade Escolar:
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O tratamento ecumênico das questões espirituais;
Já temos uma prática de busca incessante em cativar e envolver os alunos para trazê-los mais próximos da escola e também de nosso Projeto: Quem ama, cuida;
A tentativa de participar da construção do conhecimento das crianças de maneira afetuosa e prazerosa;
Desenvolvemos um conjunto de ações que visam desenvolver a auto-estima dos alunos.
Nossa insistência de levar os alunos a refletirem sobre ser cidadãos solidários;
A reflexão sobre a Unidade, a busca constante de identificar quais aspectos da vida escolar nos aproxima como profissionais e como pessoas"
[LIMEIRA, 2003c, p.1-2 - o grifo é nosso]O que se pode observar, na questão da formação profissional docente continuada, o professor precisa de tempo para refletir, bem como não dá para dissociar o exercício profissional de sua vida privada, embora este não seja o objetivo, mas é fundamental um trabalho que envolva esta totalidade. Neste contexto registra-se, por parte destas professoras e da escola a preocupação com as crianças (obrigação moral) e o envolvimento das professoras com a escola e com a comunidade (compromisso com a comunidade), bem como em ser educadora.
No geral o que e observou em relação às professoras desta escola, no que tange à profissionalidade docente - quer seja pela convivência das reuniões pedagógicas, quer seja por ocasião da reunião científica ou congresso, quer seja durante o trabalho desenvolvido na escola ou mesmo pelos relatos apresentados - que estas professoras estão preocupadas com os escolares, bem como possuem uma determinada cumplicidade com a escola e com a sua direção. Esta relação fica clara na escola, principalmente, entre as docentes que não são passageiras na instituição de um ano para o outro. Há também o compromisso entre as docentes, principalmente por parte da direção, com a própria capacitação do coletivo, bem como na resolução dos problemas que afligem a população freqüentadora da escola no que diz respeito a violência domestica, excesso de agressividade entre os alunos, orientação e conscientização dos pais, entre outros. Pode-se dizer que há cultivo virtuoso de uma moral dos "bons costumes", do exercício da cidadania, na dimensão de "faça aos outros aquilo que você gostaria que fizesse a você' e "não faça aos outros aquilo que você gostaria que não fizesse com você", constituindo-se num grande prelúdio de uma educação para a paz.
ConclusãoA reflexão ora apresentada buscou evidenciar os paradigmas que têm norteado a atuação docente, colocando em questão os saberes que dão legitimidade `a prática pedagógica. Vive-se um momento de mudanças e a formação de professores não passa desapercebida, havendo uma grande preocupação em delimitar melhor o perfil desse profissional.
Não se pode ignorar a "caverna" que acabou se tornando a nossa sala de aula em virtude das sombras que foram projetadas sobre ela, decorrentes da onda de violência, de todos os tipos, que se abateu sobre a sociedade e do modelo de escola-fabril que não se justifica mais.
No vértice dessa discussão está a escola, mas como centro de formação humana, exigindo uma nova configuração de relações sociais, interpessoais, mas também curricular e pedagógica. Propõe-se que no centro deste novo processo estejam o professor e o aluno, mas que também façam parte da realidade escolar a comunidade local e as forças produtivas da sociedade. O projeto político pedagógico a ser elaborado, bem como os diferentes projetos temáticos, prescinde deste conjunto orgânico.
A escola e as demais instituições não podem mais serem vistas, apenas, como uma linha de montagem do homem do sistema. Embora possa haver a reprodução há também a contra-reprodução, cada vez que superamos a nossa inércia e mudamos o contexto de nossas aulas, dos relacionamentos, enfim, por causa daquilo que a escola é e não do que tem sido.
A formação inicial e continuada são duas realidades distintas e, ao mesmo tempo, inseparáveis. Pensar a formação do professor significa ter bem claro que tipo de homem queremos formar, que tipo de mundo queremos habitar, que tipo de sociedade queremos construir. Esta exige uma reflexão constante daquilo que fazemos, de nossa história, de nossas contradições, de nossas descobertas e, principalmente, de nossa socialização enquanto professores (educadores).
Somos uma "profissão" em construção e os nossos currículos espelham esta realidade ao apresentarem um conjunto de conhecimentos, disciplinares, fragmentados. Não se justifica mais trabalhar por compartimentos, pois necessitamos trabalhar em rede, em eixos temáticos que visem a perspectiva da unidade na diversidade dos conhecimentos.
Neste contexto se poderia perguntar, ainda, quem é o professor na ordem das coisas? Para nós é um "educador profissional" que passa por um sistema de formação formal e que continua nesse processo ao longo de sua vida. Porém, imbuído de uma perspectiva utópica não deixa que "o mito da caverna" o asfixie, pois compartilha o seu sonho com outras pessoas, transformando-o em realidade. Esta é a proposta da ESCOLA DE LIMEIRA, buscando nas etapas da profissionalidade docente, e num trabalho coletivo e de parceria, não se tornar uma fábrica de eucaliptos, mas uma plantação de jequitibás.
Notas
O tópico ora apresentado teve como fonte de referência os estudos desenvolvidos por SOUZA NETO (2003), no texto "A formação inicial e continuada: os saberes docentes", apresentado em oficina pedagógica no Congresso de Educação: Educação para fraternidade: um caminho possível?, realizado em Vargem Grande Paulista, no período de 21 a 21 de setembro de 2003.
Este terminologia foi retirada do estudo de Hélène Hirschhorn (1993) sobre os paradigmas de comportamento profissional (magister, pedagogo e animador) que foram apresentados no trabalho de Rogério Fernandes (1998) sobre "Ofício de professor: o fim e o começo dos paradigmas".
O grifo é nosso.
Referências
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FERNANDES, R. Ofício de professor: o fim e o começo dos paradigmas. In: CONGRESSO LUSO-BRASILEIRO DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO: Práticas Educativas, Culturas Escolares e Profissão Docente. 2, 1998. São Paulo. Anais..., p. 1-20.
GADOTTI, M. História das idéias pedagógicas. 3ª ed.. São Paulo: Ática, 1995.
LIMEIRA (EMEIEF Profª Maria Apparecida de Luca Moore). Relatório da professoras das primeiras séries (manuscrito). Limeira, UNESP/RC - Projeto Núcleo de Ensino, 2003a, 1p.
LIMEIRA (EMEIEF Profª Maria Apparecida de Luca Moore), Relatório da professoras das terceiras e quartas séries (manuscrito) . Limeira, UNESP/RC - Projeto Núcleo de Ensino, 2003b, 4p.
LIMEIRA (EMEIEF Profª Maria Apparecida de Luca Moore), Relatório de Participação no Congresso de Educação - EDUCAÇÃO A FRATERNIDADE: UM CAMINHO POSSÍVEL. (manuscrito). Limeira, UNESP/RC - Projeto Núcleo de Ensino, 2003c, 2p.
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PELLEGRINI, A. M.; SOUZA NETO, S.; BENITES, L. C.; VEIGA, M. e MOTTA, A. I. O Comportamento Motor no processo de escolarização: buscando soluções no contexto escolar para a alfabetização. In: Wilson Galego e Álvaro Guedes. Cadernos do Núcleo de Ensino. São Paulo, SP: UNESP - PROGRAD, 2003, p.271-284.
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revista
digital · Año 12 · N° 107 | Buenos Aires,
Abril 2007 |