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Pesquisando o lazer de um
grupo de idosos no Brasil

   
*Professora Doutora da Universidade Federal de Minas Gerais
**Acadêmica da UFMG, Bolsista CNPq

Centro de Estudos de Lazer e Recreação - CELAR
(Brasil)
 
 
Christianne Luce Gomes*
chris@eef.ufmg.br  
Gabriela Baranowski Pinto**
gabrielabaranowski@gmail.com
 

 

 

 

 
Resumo
    Esta pesquisa exploratória objetivou identificar e analisar o que os idosos que participam de um Projeto de Extensão Universitária entendem por lazer, através de quais atividades o vivenciam e alguns fatores que interferem na efetivação de suas experiências. Constatou-se que o lazer assume funções de descanso e diversão, sendo o aspecto sociabilização fundamental para a escolha das atividades. As vivências pertencem a todos os campos de interesses do lazer, ocorrem principalmente durante a semana e são na maioria gratuitas, apesar de haver certas práticas pagas muito adotadas pelos idosos do grupo.
    Unitermos: Lazer. Idosos. Extensão universitária.
 
Abstract
    The purpose of this research was to analyze what the elderly people understand by leisure, through what activities they live the leisure and what factors interfere in this kind of experience. The bibliography research was combined with an exploratory study and together with the elderly people of a university project, and the data were collected by the application of questionnaires. The investigated group has similar characteristics to the brazilian profile and worldwide elderly, especially considering aspects like gender and economic condition. The understanding of leisure contemplates basically the aspects of rest and entertainment; the activities happen more during the week and belong to different fields of interests. The sociability was the key factor to choose the leisure experiences of the investigated group.
    Keywords: Leisure. Elderly people. University project.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 11 - N° 106 - Marzo de 2007

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Introdução: a pesquisa realizada

    Ao contrário dos países desenvolvidos que constituíram uma cultura de apoio e valorização ao idoso, principalmente por estar enfrentando este processo há mais tempo, nações em desenvolvimento, como o Brasil, carecem de estudos e pesquisas que permitam conhecer melhor este segmento social. Essa medida é imprescindível para uma intervenção mais consistente junto a essa população, tendo em vista a promoção de uma vida com mais qualidade na velhice.

    Assim, foi realizado um estudo exploratório baseado na interação qualitativo/quantitativo, caracterizando-se pela combinação da pesquisa bibliográfica com um trabalho de campo junto aos participantes de um Projeto de Extensão Universitária que atende, aproximadamente, 200 idosos. As atividades do projeto enfatizam a melhoria das capacidades físicas para a manutenção da autonomia e independência do idoso, além de procurar ampliar a interação social dos envolvidos - seja nos momentos das aulas de ginástica, esporte, dança, alongamento e relaxamento, ou nos momentos de lazer organizados para o grupo, tais como passeios, excursões e festas.

    A amostra foi constituída por 151 pessoas idosas voluntárias, pertencentes a ambos os sexos, com faixa etária em torno de 60 anos, sem restrição de etnia, classe ou grupo social. Os dados foram coletados a partir de um questionário contendo questões abertas e fechadas. Devido às dificuldades com a leitura, escrita e compreensão das questões, todos os idosos foram auxiliados para respondê-las. Para realizar a tabulação dos dados foi utilizado o Pacote Estatístico SPSS 11.5 e o Programa Excel.

Alguns resultados

    A análise do significado de lazer para os sujeitos investigados revelou aspectos interessantes. Na coleta de dados, observou-se que muitas vezes os idosos elaboraram respostas vagas e de difícil construção, o que de certo modo demonstra a dificuldade do grupo de formular conceitos sobre um tema - lazer - que, provavelmente, nunca havia sido traduzido em palavras. A falta de prática dos idosos do grupo em responder questionários e, principalmente, em refletir sobre a realidade como um todo, problematizando o cotidiano, o lazer e a vida, pode ter contribuído para o surgimento desta dificuldade.

    Constatamos que o entendimento de lazer dos voluntários é algo bastante variado, mas, que acaba assumindo as mesmas funções de descanso e divertimento discutidas na literatura (Dumazedier, 1976). O aspecto de desenvolvimento que o lazer proporciona, contudo, foi lembrado por poucos idosos, que traduziram essa possibilidade como "aprender, produzir e criar".

    Isso porque o idoso tem direito a um lazer que o constitua, a atividades que o divirta e o enriqueça, e que oportunizem a organização da experiência cultural de seu tempo - entendido aqui como um período que vai além da vida adulta e abarca o seu "hoje" onde um futuro é gerado, como o passado o gerou (Barreto, 1997). Como salienta a autora, compreender o lazer na vida do idoso é fundamental para possibilitar que ele ocupe um lugar de sujeito, e não de simples objeto que "sorri, pula e dança".

    A sociabilização foi um sinônimo de lazer para os idosos e constituiu um dos principais motivos que os levam a vivenciá-lo, o que indica a necessidade de ampliação ou resgate das relações interpessoais na velhice (Silva, 2003). Assim, através de programas como a extensão universitária, os idosos pesquisados têm mais disposição para realizar as atividades de vida diária, têm suas dores pré-existentes atenuadas ou afastadas, ampliação dos laços de amizade, redescoberta do sentido e do prazer de continuar vivendo, além de possibilitar o encontro de novos parceiros. Esses benefícios também foram colocados como motivos para integração no projeto de extensão ao qual são vinculados, que foi considerado por 100% dos entrevistados como uma experiência de lazer.

    Considerando-se os interesses do campo do lazer (físicos, artísticos, manuais, intelectuais e sociais), idéia formulada por Dumazedier (1976) e complementada pelos interesses turísticos propostos por Camargo (1980), constatou-se que o envelhecimento, ao contrário do que se pensa, não restringe a vivência de variados conteúdos culturais, uma vez que os idosos pesquisados citaram atividades que podem ser relacionadas com todos eles. Apesar disso, sabemos que uma adaptação das atividades às condições individuais de quem as pratica é fundamental para que a vivência continue a ser desempenhada sem perder o caráter de lazer.

    Das atividades de lazer vivenciadas pelos idosos, 55% são praticadas predominantemente durante a semana, 40% durante o fim de semana e 5% em ambos os períodos. Estes dados nos permitem compreender que o idoso procura no lazer alguma forma de recuperar o seu lugar no processo de construção social, muitas vezes perdido quando ocorre o afastamento do trabalho, ou das obrigações familiares - consideradas cumpridas (Iwanowicz, 2000). Assim, o idoso pesquisado traz a vivência de lazer para o seu cotidiano e não a encara mais como um momento à parte, excluído de tudo o que compõe a sua rotina, fazendo com este momento seja para hoje, e não para amanhã.

    Essa informação é importante porque o lazer da maioria das pessoas é concentrado nos finais de semana e períodos de férias, de modo que determinados espaços e empreendimentos - como os hotéis de lazer - ficam subutilizados durante os dias "úteis" e períodos de baixa temporada. Se fossem oferecidas condições especiais que possibilitassem o acesso de idosos a esses empreendimentos em períodos de reduzida utilização, além de movimentar a engrenagem econômica, haveria uma grande contribuição para o exercício da cidadania e a promoção de uma vida mais significativa para esses sujeitos.

    Os motivos alegados para não praticarem algumas atividades que apreciavam foram diversos, sendo os mais comuns: problemas de saúde que impedem ou atrapalham a vivência, falta de companhia durante a realização da atividade, falta de dinheiro para custeá-la, falta de mobilização pessoal e motivação para mudar a rotina, violência urbana e crença de que algumas experiências de lazer são "inadequadas" à idade avançada.

    Alguns autores que reafirmam a carência de atividades de lazer para o público idoso atribuem como causas determinantes do acesso ao lazer fatores como a dificuldade de locomoção, falta de equipamentos apropriados, ausência de uma política de animação efetiva e o apego a situações reducionistas de entretenimento como as provocadas pela mídia de massa difundida pelo rádio e TV. Os últimos fatores, discutidos por Uvinha (1998), aparecem entre as dez atividades mais praticadas pelos idosos investigados.

    Quanto à renda, percebemos que os idosos que não possuem rendimento próprio, geralmente, não têm gastos com as suas atividades de lazer. Em contrapartida, os que possuem renda têm maior incidência de gastos, mas que se restringem a algumas poucas atividades, significando que o idoso não só pode vivenciar o lazer sem necessariamente efetuar gastos substanciais, como o faz predominantemente dessa forma.

    Apesar de certas vivências de lazer dificilmente serem concretizadas sem gasto financeiro - como viajar, por exemplo -, o grupo investigado não as deixa de praticar por este motivo. Nesse sentido, é necessário compreender que há uma construção cultural do idoso que atribui um valor a essa vivência que as outras, mesmo gratuitas, não conseguem suprir.

    Mesmo os entrevistados que alegaram não ter renda própria, apresentaram gastos com as atividades de lazer, o que indica que há alguém a quem eles recorrem e que supre as suas necessidades financeiras, permitindo a realização da vivência desejada. Provavelmente, essas pessoas entendem que o idoso necessita daquela oportunidade para concretizar o lazer na sua vida, revelando o seu valor para a conquista de uma vida mais prazerosa e significativa.

Considerações finais

    Os idosos participantes do Projeto de Extensão pesquisado consideram o lazer detentor de funções principais ressaltadas na literatura, - descansar e divertir. Além disso, os interesses de lazer deste grupo, como um todo, são diversificados e contemplam atividades físico-esportivas, artísticas, sociais, manuais, intelectuais e turísticas.

    A sociabilização, considerada um aspecto que ocupa um papel crucial na manutenção da qualidade de vida destas pessoas, foi considerada importante, pois o lazer constitui-se uma forma de os voluntários da pesquisa recuperarem o seu lugar no processo de construção social, já que à medida que envelhecem, diminuem os seus vínculos sociais e as relações com o meio ambiente social e material.

    Certamente, a importância do lazer foi reconhecida pelos idosos pesquisados. Mesmo com todas as dificuldades com as quais se deparam diariamente, não abrem mão de certas vivências. Percebemos que aumentar a participação dos idosos pesquisados em atividades de lazer exige esforços mútuos da sociedade. Assim, por um lado, ainda é necessária uma conscientização dos idosos para que se informem sobre as opções de lazer que acontecem na cidade e se mobilizem para vivenciá-las. Por outro lado, os responsáveis pela promoção destas experiências precisam ampliar a divulgação dos eventos e propostas socioculturais que possibilitem a participação do público idoso, proporcionando-lhe maior acesso e diversificação das suas vivências de lazer.

    A responsabilidade pela implementação de políticas públicas de lazer precisa ser devidamente assumida pelo Estado, superando-se a orientação compensatória que ainda predomina em nossa realidade (Amaral, 2004). Contudo, essa responsabilidade pode e deve ser compartilhada com a sociedade e a iniciativa privada, tomando-se o cuidado para que o lazer não seja visto apenas como mercadoria de consumo e meio alienante de entretenimento.

    Finalmente, é interessante que haja uma contínua busca pelo que é idealizado até agora como realmente significativo para a vida do idoso, a fim de colaborar para a evolução deste grupo social em todos os campos possíveis, inclusive no campo do lazer.

Referências

  • AMARAL, S. C. (2004). "Políticas Públicas". In: GOMES, C. L. (org.). Dicionário Critico do Lazer. Belo Horizonte: Autêntica Editora, p.181-185.

  • BARRETO, M. L. F. (1997). "Lazer e cultura na velhice". Encontro Nacional de Recreação e Lazer, 9, Belo Horizonte. Coletânea... Belo Horizonte, PBH/CELAR, pp. 130-136.

  • CAMARGO, L. O. L. (1980). O que é lazer. São Paulo: Perspectiva.

  • DUMAZEDIER, J. (1976). Lazer e cultura popular. São Paulo: perspectiva.

  • IWANOWICZ, J. B. (2000). "O lazer do idoso e o desenvolvimento prossocial". In: BRUHNS, H.T. (Org.). Temas sobre Lazer. Campinas, Autores associados, p.101-127.

  • SILVA, A. C. (2003). "Lazer e idosos: uma reflexão sobre os programas de lazer "exclusivos" para o público idoso no Rio de Janeiro". Seminário "O Lazer em Debate", 4, Belo Horizonte. Coletânea... Belo Horizonte, UFMG, DEF, CELAR, p. 400-401.

  • UVINHA, R. R. (1999). "Lazer e Qualidade de vida: um enfoque na Faculdade da Terceira Idade- FEFISA." Revista Licere. Belo Horizonte, CELAR, v. 2, n. 1, p.153-163.

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