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Táctica de grupo ofensiva
em balonmano: aclaramento

   
Mestre em Ciências do desporto na área de treino de alto
rendimento desportivo. Grau obtido na Faculdade de Ciências
do desporto e de Educação Física da Universidade do Porto.
 
 
Paulo Jorge Pereira
pjmpereira@hotmail.com
(Portugal)
 

 

 

 

 
Resumo
     O presente trabalho busca aglutinar um conjunto de acções de táctica grupal ofensiva (circulação de jogadores) com características idênticas e com propósito comum que é o aclaramento. Este meio táctico é utilizado com o objectivo de libertar uma zona partindo da circulação/fixação de um jogador ou jogadores de forma a ser explorada por outros que beneficiam do movimento. Embora possa ser utilizado contra defesas menos profundas (6:0), a sua aplicação parece ser mais adequada contra sistemas defensivos de maior profundidade (5:1, 3:2:1 ou 3:3).
    Unitermos: Táctica de grupo ofensiva. Aclaramento.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 11 - N° 105 - Febrero de 2007

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Introdução

    O presente trabalho tem como propósito apresentar um conjunto de acções tácticas associadas ao aclaramento, que sendo um conteúdo táctico terminologicamente característico do basquetebol, é perfeitamente identificável nos procedimentos tácticos ofensivos do andebol actual. Pode ser considerada uma acção típica de circulação de jogadores, com o objectivo particular de libertar um espaço para ser explorado por um beneficiário (Pereira, 1995). Este movimento, pode ser utilizado em conjugação com outros conteúdos tácticos e envolve dois ou mais jogadores constituindo uma acção táctica de grupo. A maioria das acções propostas tem como intervenientes directos dois (unidades 2X2) ou mais elementos constituindo pequenos grupos de jogadores (com um máximo de 3 a 4 elementos) com funções diferenciadas. Existem estudos que referem a predominância maioritária das acções tácticas de grupo no jogo (Barbosa, 1998), no entanto seria oportuno, embora difícil, também estudar a eficácia das mesmas quando comparadas com acções individuais ou colectivas no sentido de melhor conhecermos e clarificarmos as necessidades tácticas do jogo, nomeadamente quanto ao reconhecimento das acções mais eficazes ou mais eficientes no que respeita ao número de jogadores envolvidos nas tarefas tácticas ofensivas.

    Deve ser entendido que o cumprimento dos princípios específicos do ataque (Roman, 2002) e os detalhes de operacionalidade, devem fazer parte, quer da sua utilização em jogo, quer da exercitação no treino, pelo que a manipulação do exercício e as variáveis utilizadas para o efeito devem ser tarefa de profunda reflexão por parte do treinador. Por conseguinte, as tarefas dos intervenientes devem ser planificadas tendo em conta o tempo e o modo no sentido de se obter a melhor estruturação espaço-temporal e a realização técnica adequada para aumentar a qualidade e reportório das respostas.


Desenvolvimento

    De acordo com o princípio da unidade entre a formação táctica elementar e a formação táctica complexa (Antón, 1998), pretende-se que os exercícios seguidamente expostos, sejam parte integrante de um modelo de jogo previamente estabelecido. As acções devem ser trabalhadas em diferentes contextos (maior ou menor dificuldade) utilizando distintas variáveis (espaço, número de jogadores e bolas, fechada ou aberta em diferentes momentos da acção, etc.), mas sempre com um objectivo fundamental que é o de que os jogadores consigam reconhecer os elementos constituintes dessa mesma acção, independentemente dela ocorrer de forma simplificada (no treino) ou em jogo.

    É imperativo conhecer os contornos da tarefa táctica e factores que condicionam a tomada de decisão (Mayo, 2000) no que respeita aos mecanismos de percepção, decisão e execução, de forma a planificar os exercícios adequadamente. Relativamente à fase perceptiva, não é a mesma coisa, num determinado exercício, ocorrerem muitos ou poucos estímulos, verificarem-se de forma sequencial ou simultânea, da mesma forma que ter na fase decisora mais ou menos alternativas de resposta, condiciona a fase seguinte, a execução do gesto motor propriamente dito.

    Por outro lado, o princípio da associação óptima indutiva/dedutiva (Antón, 1998) permite garantir um equilíbrio entre aquilo que são as actividades programadas pelo treinador (de carácter indutivo) e as respostas criativas dos atletas em função das situações problema colocadas pelo jogo (de carácter dedutivo). Neste sentido, para além das soluções concretas existentes, as respostas não previstas, devem ser encaradas sempre como uma transferência das anteriores e, dentro de um quadro lógico, resultantes da necessidade de encontrar soluções para os problemas impostos pelo próprio jogo.

    Treinar em condições tácticas similares ao jogo e estruturar os exercícios de acordo com três momentos: Exercícios introdutórios, de aprofundamento ou desenvolvimento e de carácter complexo ou de competição (Villalobos y Morell, 2004), devem ser aspectos a ter em conta na construção de trabalhos com estas características.

    A figura 1 mostra uma solução resultante da relação entre o lateral e o extremo contíguo, aproveitando o facto dos seus defensores directos (ou pares) estarem escalonados. O extremo desmarca para o interior (eixo longitudinal do campo) no momento em que o lateral se prepara para iniciar a finta com saída para o exterior sobre o seu par. O conteúdo táctico utilizado pode definir-se como um aclaramento efectuado pelo extremo libertando o espaço exterior para o lateral beneficiar. A simultaneidade de movimentos contrários desta acção pode originar erros se os defensores decidirem trocar de marcação dado que o extremo deve em todo o momento oferecer linha de passe ao lateral adaptando o seu deslocamento. O lateral pode finalizar no exterior ou assistir o extremo que interrompe a progressão para se colocar próximo da linha de 6m (Fig. 2). Nesta acção, os defensores têm a tarefa mais facilitada pelo facto de estarem a actuar no exterior do campo, não só pela qualidade da trajectória exigida ao lateral (adaptação dos apoios e consequentemente do tronco) a par da interligação eficiente do ciclo de passos com a suposta utilização necessária do drible. Produzindo-se a troca de marcação entre os defensores, e também devido às características da zona e orientação espacial dos intervenientes, as possibilidades de intercepção do passe aumentam (fig. 2). Por outro lado, à medida que nos aproximamos do eixo longitudinal central do campo, as dificuldades da utilização da troca (considerando sempre defensores escalonados) obrigam a que os defensores estejam preparados para defender em espaço amplo (caso optem pelo deslizamento), induzindo por vezes debilidades ao sistema, nomeadamente ao sistema defensivo 6:0.

    Se perante uma defesa 5:1 este problema pode ser minimizado (defensores avançados habitualmente tão ou mais rápidos que os centrais), o mesmo já não se passa com um sistema 6:0, onde por norma os defensores centrais são menos móveis quando comparados com o jogador central opositor. Embora não seja o tema central deste trabalho, não podemos ignorar a problemática imposta pela natureza dos duelos individuais (Lago P., 2002) que se produzem em determinadas zonas do campo tendo em conta por exemplo as características antropometricas e funcionais dos intervenientes directos na acção.

    Como se pode observar na figura 3, e considerando uma defesa 6:0, a acção de aclaramento por parte do pivot, combinado com a finta do central, pode provocar erros irremediáveis ao sistema defensivo dado que implica que os defensores centrais estejam preparados para defender de forma eficaz em situação de 1X1 em espaço amplo, dado que a troca de marcação neste caso, provavelmente não seria a solução táctica mais eficaz. O sucesso da acção está determinado pela sincronização das tarefas do central (1X1) e do pivot (deslocamento) bem como do desempenho individual no momento de ter que provocar o desequilíbrio sem o qual nada acontece. O objectivo primordial deve ser colocar em evidência o duelo entre o defensor central e um central atacante que supostamente domina as acções técnicas e tácticas associadas ao 1X1. Criadas as condições, o central pode: finalizar a acção com remate, penetrar em drible, induzir uma progressão sucessiva (decalage) ou assistir o pivot que deve estar em condições de receber se a dúvida (deslizar ou trocar) for colocada ao defensor central menos profundo (fig. 4).

    Desta forma, o desfecho da acção, é definido em primeira instância pela eficiência do cumprimento das tarefas em situação de 2X2 (defensores centrais contra central e pivot) sem a qual não existe obtenção de vantagem posicional ou numérica, ou seja não existem condições óptimas para finalizar com êxito (objectivo fundamental do ataque).

    Na fig. 3 observa-se que o passe surge do lateral direito, no entanto este e outros detalhes (colocação do pivot, proximidade dos atacantes entre si e relativamente aos defensores, tipo e velocidade do passe, e dos deslocamentos etc.) são decisivos para o sucesso de qualquer acção. Provavelmente, será mais importante que a bola surja do lateral esquerdo dado que nesse momento a defesa flutua no sentido contrário à finta.

    Na construção da táctica de grupo, intrinsecamente associada ao modelo de jogo previamente elaborado em função dos conceitos do treinador e das características dos seus jogadores, torna-se imperativo prever antecipadamente soluções de continuidade para as acções trabalhadas. Embora também não seja o motivo deste trabalho, há que referir que, planificar a construção de qualquer acção táctica, deve implicar planificar soluções de continuidade ajustadas. Uma solução de continuidade para a acção descrita na figura 4 (caso os defensores centrais tivessem êxito com o deslizamento), seria por exemplo o cruzamento entre o central e o lateral esquerdo resultante da fixação par do central (Laguna, 2005), associado ao bloqueio exterior do pivot ao defensor central como mostra a figura 5. O lateral esquerdo deve finalizar da 1ª linha se o espaço e o tempo o permitir, beneficiar do bloqueio efectuado pelo pivot, ou passar ao lateral direito que decide a continuidade (finalização da 1ª linha, passe ao pivot, penetração ou decalage). Não existe um tempo determinado para a aprendizagem deste encadeamento de tarefas tácticas, no entanto tudo depende da qualidade dos intervenientes para identificarem a melhor solução, bem como de uma planificação equilibrada dos exercícios que numa etapa final deve integrar todos os estímulos e em etapas intermédias localizar os problemas a solucionar. Este exercício poderá ser aberto no início (os defensores variam a sua decisão pela troca ou deslizamento) e fechado no final caso o central (que também decide numa fase intermédia a continuidade) não consiga nenhum tipo de vantagem, determinando previamente o jogador que finaliza a acção. Da mesma forma, o exercício pode ser fechado no início (definir só deslizamento entre defensores) e aberto no final variando a conclusão do mesmo de acordo com a melhor solução.

    Considerando agora um sistema defensivo 5:1, podemos observar na figura 6 de que forma o lateral pode obter vantagem em situação de 1X1 perante o seu defensor par, simultaneamente ao movimento efectuado pelo pivot, que executa uma trajectória para o exterior. Um dos pressupostos de êxito para esta acção, obriga a que o pivot procure garantir linha de passe aberta para o lateral em todo o percurso, estabelecendo um duelo constante com o defensor central pela conquista do espaço. Uma variante possível para gerar a dúvida ao defensor central, surge quando o pivot descreve uma trajectória em direcção aos 9m demonstrando a intenção de bloquear o defensor par do lateral, e a modifica dirigindo-se em seguida para a linha de 6m. Esta acção, tendo a mesma intenção da anterior fica enriquecida pelo movimento de engano do jogador pivot. Este tipo de movimentos de engano ou outros, podem ser efectuados em qualquer das acções expostas anteriormente, dado que torna mais difícil a tarefa dos defensores.

    A utilização deste meio táctico assume maior viabilidade se considerarmos um sistema defensivo mais profundo, dado que existe mais espaço para poder ser utilizado. Por outro lado, estes sistemas, também possuem habitualmente defensores mais rápidos nas linhas mais avançadas, o que poderá limitar o êxito dos atacantes da 1ª linha ofensiva no momento de desequilibrar em situação de 1X1. Neste caso deverá ser possível (quanto mais profundo seja o sistema) colocar em evidência o duelo existente entre o defensor central que a ser o mesmo, deverá ter no confronto directo um pivot com maior mobilidade e que conheça as intenções tácticas do aclaramento.

    Da mesma forma, existe a possibilidade de circunstancialmente colocar jogadores extremos na posição de lateral, no sentido de dotar a 1ª linha ofensiva de maior mobilidade, sempre com o propósito de vencer os duelos individuais que se estabelecem em acções de 1X1 em espaço amplo. Estas adaptações obrigam, não só que os atletas estejam aptos para actuar no seu posto específico, mas também noutros, caso a situação o exija.

    A figura 7 mostra uma acção de aclaramento perante um sistema defensivo 3:3, iniciada pelo jogador central, que após passe ao lateral próximo do pivot, transforma o sistema ofensivo em 2:4. Neste caso não se verificam movimentos contrários simultâneos. O facto do central transformar o sistema, optando por uma trajectória que o afasta do lateral fintador (que como já vimos pode ser um extremo) surge no sentido de impedir qualquer troca de marcação por parte dos defensores da 2ª linha defensiva. A continuidade é decidida pelo lateral esquerdo que tem como missão ultrapassar o defensor par, devendo estar consciente da distância que o separa duma zona onde possa constituir perigo para o sistema defensivo. Fintar e usar posteriormente o drible (unitário ou não) para depois finalizar ou passar deve ser um encadeamento de meios tecnico-tácticos dominados pelo protagonista da finta. Existe mais espaço no interior do campo, no entanto em função do comportamento do defensor, deve ser o lateral a decidir qual a zona idónea a explorar. Ultrapassado o defensor, está criada uma situação de superioridade numérica de 3X2 em espaço amplo próxima da área de 6m.

    Na figura 8, o central decide por aclarar a zona transformando o sistema ofensivo e optando por uma trajectória que o coloca nas costas do defensor par do lateral fintador. O detalhe que deve estar associado à eficiência deste movimento diz respeito à forma como essa trajectória deve ser descrita pelo central. Neste caso o central deve num primeiro momento romper o alinhamento entre os defensores (caso exista) colocando o seu defensor menos profundo com uma trajectória vertical e só depois diagonal.

    As acções explanadas não são mais do que formas possíveis de utilização do aclaramento, existem outras com certeza tão ou mais apropriadas, mas estou seguro de que todas têm um denominador comum: libertar um espaço para posteriormente explorar.

    Uma forma mais complexa de aclaramento envolvendo um maior número de jogadores, está representada na figura 9. Considerando um sistema defensivo 3:2:1, o pivot aclara uma zona a ser explorada pelo extremo (que recebe do central) quando a bola circula em sentido contrário ao aclaramento. Uma solução de continuidade, caso o defensor do exterior deslize com o extremo, poderá ser a finalização do lateral pelo exterior. A esta acção, Antón (1998) denominaria de uma circulação de jogadores dupla coordenada e simultânea (movimento simultâneo do pivot e do extremo que procuram oferecer linha de passe ou pelo menos fixar jogadores libertando zonas), ou sucessiva se consideramos o escalonamento espaço- temporal relativo ao extremo e ao lateral. Ou seja, um aclaramento duplo simultâneo neste caso ou simples se só uma zona for libertada para posterior utilização.

    Aos olhares menos atentos, tarefas desta natureza podem ser acções resultantes da iniciativa individual, no entanto o êxito das mesmas está condicionado decisivamente pelos detalhes de execução e da criação de condições favoráveis para uma eficaz finalização.


Bibliografía

  • Antón (1998) Táctica grupal ofensiva - Concepto, estructura y metodología. Gymnos editorial.

  • Barbosa, J. (1999) A organização do jogo em Andebol: Estudo comparativo do processo ofensivo em equipas de alto nível, em função da relação numérica ataque-defesa. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física. Universidade do Porto (não publicado).

  • Laguna (2005) Jugar y hacer jugar. VII Clinic Internacional de la AEBM - Memorial "Domingo Bárcenas". Zaragoza

  • Mayo, C. y Pardo A. (2001) Propuesta metodológica para el entrenamiento del juego posicional en jugadores/as de balonmano y su influencia en la toma de decisiones a través del esquema de juego. II Congresso de Ciências de la actividad física y el deporte. Universitat de Valencia.

  • Peñas, L. (2002) La preparación física en el fútbol. Biblioteca Nueva.

  • Pereira, P. (1995) A Organização do ataque da Suécia - Estudo monográfico efectuado para obtenção da licenciatura em ciências do desporto e educação física. Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física. Universidade do Porto (não publicado).

  • Román (2002) La estructuración del juego de ataque. II congreso Nacional de técnicos especialistas en balonmano.

  • Villalobos y Morell (2004) La comunicación bajo las concepciones del entrenamiento táctico. Entrenamiento simplificado de acciones de juego. EFDeportes.com - Buenos Aires - Año 10 - N° 78 - Noviembre de 2004.

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