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Aptidão física relacionada à saúde e ao desempenho
atlético de calouros de educação física

   
Laboratório de Pesquisa e Ensino do Movimento
da Universidade Federal de Santa Maria.
(Brasil)
 
 
Érico Felden Pereira  
Susane Graup
edfisicasm@yahoo.com.br
 

 

 

 

 
Resumo
     A Educação Física tem buscado nos últimos tempos uma identidade própria enquanto área de conhecimento. Os aspectos epistemológicos que a fundamenta e sua estrutura de inserção na sociedade estão intimamente ligados ao perfil dos profissionais e/ou futuros profissionais da área. Diante disso, este estudo buscou verificar e analisar a aptidão física relacionada à saúde e ao desempenho atlético de jovens que ingressam no curso de Educação Física. Foram realizadas análises antropométricas e aplicação de testes motores em um grupo de 29 jovens ingressante no curso de Educação Física. Foram avaliadas as seguintes características físico/motoras dos acadêmicos: estatura, massa corporal, percentual de gordura, resistência cardiorrespiratória, resistência muscular localizada, potência de membros superiores, potência de membros inferiores, flexibilidade e agilidade. Análises estatísticas descritivas permitiram comparação dos valores médios das avaliações com normas de referência. Os resultados indicam que, no geral, os acadêmicos possuem níveis médios de desempenho, não podendo ser classificados como um grupo superior em termos de aptidão física.
    Unitermos: Aptidão física. Acadêmicos de Educação Física. Perfil profissional.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 11 - N° 104 - Enero de 2007

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Introdução

    A Educação Física no Brasil adquiriu um estereótipo de atividade essencialmente de ordem prática com o objetivo de atender a necessidades exclusivamente físicas dos indivíduos através do culto ao corpo, da aquisição de habilidades motoras e desenvolvimento de capacidades físicas para fins atléticos. Porém hoje, já é possível identificar movimentos que buscam a valorização de aspectos mais amplos da cultura corporal, bem como educadores que, ainda de forma tímida, começam a ressignificar suas práticas pedagógicas e corporais na escola. Junto com essa imagem que se criou da Educação Física, diga-se não de forma totalmente injusta, também se criou uma imagem muitas vezes destorcida a respeito do profissional dessa área.

    Acredita-se que o profissional de Educação Física, primordialmente aquele que esteja atuando na Educação Física escolar deva possuir um mínimo de aptidão física que lhe permita a demonstração de movimentos, especialmente se estiver atuando com crianças pequenas, e mesmo para poder interagir com os alunos durante as práticas corporais. Não desprezando, no entanto, a possibilidade de existirem bons profissionais fora destas características.

    Diante disso, a investigação de fatores relacionados à aptidão física tanto de alunos de graduação em Educação Física quanto de professores pode trazer alguns esclarecimentos quanto ao perfil deste profissional, oportunizando uma discussão principalmente no âmbito da formação inicial. A aptidão física geral de acordo com Matsudo (1998) é composta por aspectos biológicos (antropométricos, metabólicos e neuro-musculares) e os psico-sociais (personalidade, socialização, relacionamento inter pessoal, percepção subjetiva de esforço, nível sócio econômico - educacional), sendo que estes fatores apresentam uma organização dinâmica no ser humano e conceitualmente podem voltar-se tanto para o bem estar geral, uma boa saúde e qualidade de vida e mesmo para o desempenho atlético.

    Para um melhor entendimento das diferentes qualidades físicas seus componentes foram agrupados em dois grupos. Pate (1988) e Glaner (2003) dentre outros, abordam que a aptidão física pode ser relacionada à saúde (resistência cardiorespiratória, composição corporal, flexibilidade, força e resistência muscular localizada), que objetivam um desenvolvimento da aptidão para uma boa qualidade de vida e prevenção de doenças e relacionada ao desempenho atlético (agilidade, equilíbrio, velocidade, potência, tempo de reação, coordenação), que junto com os componentes relacionados no grupo anterior irão influenciar na prática do desporto. A partir da verificação destes componentes através de análises antropométricas e testes motores é possível caracterizar diferentes pessoas ou grupos.

    Especialmente em se tratando de questões de saúde, o excesso de gordura corporal, baixos níveis de resistência cardiorrespiratória e muscular e de flexibilidade podem estar associados a diversas patologias que vão desde hipertensão, diabetes, câncer e depressão até problemas posturais e articulares, dores e fadiga (Bouchard et al., 1990; American College of Sports Medicine, 1996; Pitanga, 2001; Nahas, 2003). Ademais, tem-se constatado cada vez mais a importância da prática de atividades físicas para a manutenção e desenvolvimento destas características físicas (Caspersen, Powell e Christenson, 1985; Palma, 2000; Martins e Michels 2001; Sergio, 2001; Nahas, 1999,2003; Pieron, 2004).

    Além disso, estudos têm verificado que mesmo as qualidades físicas, a princípio voltadas ao desempenho físico, como a agilidade, o equilíbrio e a coordenação, também são extremamente importantes para uma boa saúde, já que estão intimamente ligadas ao desempenho de tarefas da vida diária, de origem profissional ou não, e possibilitam um estilo de vida mais ativo e autônomo desde a infância até a terceira idade. (Andreotti e Okuma, 1999; Etchepare, Pereira, Graup e Zinn, 2003; Shumway-Cook e Woollcott, 2003).

    O curso de Educação Física por constituir-se de múltiplas atividades no transcorrer dos semestres, tanto de ordem prática como teórica, alimenta objetivos distintos entre os acadêmicos. Apesar de todos terem que cumprir as disciplinas obrigatórias propostas pelo currículo, existem aqueles que tendem a atuar em atividades predominantemente teóricas como atividades laboratoriais e aqueles que destinam-se a trabalhar com atividades predominantemente práticas, como os desportos coletivos e individuais e ainda aqueles que se dedicam a ambas igualmente, assim como acontece durante a vida profissional. Desta forma, este estudo buscou verificar e analisar os níveis de aptidão física de calouros que ingressaram no curso de Educação Física, buscando esclarecer qual o perfil físico dos sujeitos que buscam esta formação.


Procedimentos metodológicos

    Foi formado um grupo de estudos com alunos 1º semestre do curso de Educação Física do Centro de Educação Física e Desportos (CEFD), da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Após esclarecimento dos objetivos do estudo os acadêmicos foram convidados a realizarem os testes físicos. Formaram o grupo todos aqueles que aceitaram participar do estudo, sendo então formado por 29 sujeitos (14 homens e 15 mulheres) correspondendo a aproximadamente 75% dos acadêmicos da turma. Após o final da análise dos testes os resultados foram entregues para cada acadêmico participante. Este estudo foi analisado pela Comissão Científica e de Ética do CEFD. Os testes e as avaliações antropométricas foram realizadas por pesquisadores do Laboratório de Pesquisa e Ensino do Movimento do CEFD/UFSM, treinados e com experiência nessas avaliações.


Instrumentos

    Foram utilizados os seguintes testes físicos: teste "vai e vem" para avaliação da agilidade; teste de impulsão horizontal e arremesso de medicine-ball para avaliação da potência de membros inferiores e superiores respectivamente; teste de "sentar e alcançar" para avaliação da flexibilidade; teste de cooper para avaliação da resistência cardiorrespiratória todos seguindo os protocolos de aplicação propostos por Johnson e Nelson (1986). Para a avaliação da composição corporal utilizou-se o protocolo de Petroski (1995), sendo mensuradas as dobras cutâneas: subescapular, tricipital, supra-ilíaca e panturrilha medial. Para conversão do valor da densidade corporal em percentual de gordura utilizou-se a equação de Siri (1961).


Tratamento estatístico

    Os dados das avaliações motoras e da composição corporal foram analisados quanto a sua distribuição, utilizando-se da estatística W de Shapiro-Wilk que revelou distribuição normal (p=0,05). Uma estatística descritiva para identificação dos valores de tendência central (média) e de dispersão (desvio padrão) foi utilizada o que permitiu a comparação dos dados com normas referenciais de desempenho. Foi utilizado o pacote estatístico SPSS for Windows, versão 8.0 para o tratamento dos dados.


Apresentação dos resultados

    Os resultados serão apresentados separadamente por variável, objetivando uma melhor compreensão e discussão dos dados coletados. A classificação dos sujeitos do estudo, quanto ao nível de aptidão física para cada teste, foi feita através dos valores médios encontrados na literatura para cada sexo. Vale a pena ressaltar que a maioria das classificações normativas para testes físicos foram construídas tomando-se por base amostras estrangeiras, o que influencia na classificação da aptidão física, devido a características étnicas e culturais.

    Os homens apresentaram idade média de 19,35±2,06 anos, sendo a idade mínima 17 e a máxima 24 anos. As mulheres apresentaram idade média de 20,53±2,97 anos, sendo a idade mínima 17 e a máxima 28 anos. Esses resultados indicam que as mulheres apresentam uma média ligeiramente superior de idade em relação aos homens; esta variável apresentou a menor dispersão quando comparada a análise da estatura e massa corporal, indicando um grupo homogêneo em relação à idade. Nas variáveis massa corporal e estatura, como esperado, os homens apresentam valores médios maiores, sendo que dessas variáveis a que apresentou maior dispersão foi massa corporal, indicando uma maior heterogeneidade quanto a essa variável. Os valores descritivos destas variáveis estão apresentados na tabela 1.

    Os componentes da Aptidão Física relacionada à saúde estão apresentados na Tabela 2. No geral os dados mostraram-se heterogêneos, o que pode ser observado analisando-se os índices de dispersão e valores mínimos e máximos. Nos demais componentes cujos resultados estão apresentados na tabela 3, pode-se observar uma maior homogeneidade dos dados.




Discussão

    Várias são as classificações encontradas sobre percentual de gordura e os valores considerados normais variam para cada autor. De acordo com Heyward (1991), que considera normal um percentual de gordura entre 12% e 15% para homens e 22% a 25% para as mulheres adultas jovens, os homens deste estudo estariam classificados como "abaixo do normal" e as mulheres como "normais". Segundo Pitanga (2001), os percentuais de gordura apresentados, tanto para homens como para mulheres, podem ser classificados como normais para a faixa etária. A classificação proposta por Johnson e Nelson (1986), classifica o percentual de gordura de ambos os sexos deste estudo em um nível bom. Outra classificação que merece destaque é a de Petroski (1995), por ter sido elaborada a partir de análises e protocolos de mensuração para a população brasileira da região sul do Brasil. Segundo essa classificação o percentual médio de gordura corporal identificado nos acadêmicos como abaixo do normal para os homens e como normal para as mulheres a exemplo da classificação proposta por Heyward (1991) e citada anteriormente.

    A flexibilidade é uma qualidade física relacionada tanto à saúde como ao desempenho atlético, sendo importante assim, tanto para o atleta como para o sedentário (Werlang, 1997). Para o mesmo autor a flexibilidade é a capacidade que cada articulação tem de mover-se em amplitudes de movimento específicas. No indivíduo sadio a amplitude articular é influenciada pelos ligamentos, comprimento dos músculos e tendões, e tecidos moles. O bom nível de flexibilidade varia de acordo com a necessidade de cada um, logo, a boa flexibilidade é aquela que permite ao indivíduo realizar os movimentos articulares, dentro da amplitude necessária durante a execução de suas atividades diárias, sem grandes dificuldades e lesões (Blanke, 1997). De acordo com o ACSM (1996), os valores de flexibilidade identificados nos sujeitos do sexo masculino encontram-se na média esperada para a idade que é de 29 a 33cm. Para os indivíduos do sexo feminino igualmente a média de desempenho apresenta-se dentro do esperado para a faixa etária que é de 33 a 36 cm para o teste utilizado neste estudo. Considerando a classificação proposta por Johnson e Nelson (1986), o desempenho dos indivíduos do sexo masculino encontra-se entre os percentis 5 e 25 e do sexo feminino entre os percentis 50 e 75.

    A resistência cardiorrespiratória diz respeito à habilidade de desempenhar numerosas repetições de certa atividade fatigante que requeira o uso considerável do sistema circulatório e respiratório (Gallahue e Ozmun, 2005; Heyward, 2004) e está relacionada à saúde, de acordo com Glaner (2003), pois baixos níveis dessa qualidade física apresentam correlação com um risco crescente de morte prematura, especialmente por doenças do coração, dentre outros fatores. Na classificação proposta por Johson e Nelson (1986) para essa variável, os homens do estudos estaria entre os percentis 25 e 50 e as mulheres entre os percentis 50 e 75 de desempenho.

    A resistência muscular localizada, consiste na capacidade de um músculo manter níveis de força sub-máxima por períodos prolongados (Heyward, 2004). Comparando o desempenho médio dos calouros na avaliação da resistência muscular localizada com a classificação proposta por Pollock e Wilmore (1993), verificamos que os homens apresentam desempenho acima da média, enquanto que as mulheres apresentam um desempenho considerado mediano. Johson e Nelson (1986), classifica os resultados obtidos pelos sujeitos desse estudos como intermediário em ambos os sexos. No entanto esses resultados são classificados abaixo da média considerando a classificação da AAHPERD (1988).

    Outra qualidade física investigada foi a agilidade, que trata-se da capacidade de realizar trocas rápidas de direção e deslocamento do centro de gravidade do corpo (Pitanga, 2001; Gallahue e Ozmun, 2005). Conforme escores em percentis propostos por Johnson e Nelson (1986), para a classificação do desempenho no teste, esse encontra-se no percentil 25, remetendo a um desempenho fraco para ambos os sexos.

    Potência é o termo empregado para se designar a capacidade máxima geradora de força em relação ao tempo (Pollock e Wilmore, 1993; Johnson e Nelson, 1986). De acordo com classificação proposta por Johnson e Nelson para avaliação da potência de membros inferiores, o desempenho médio dos calouros de ambos os sexos apresentou-se no percentil 5, o que remete a um desempenho fraco e bem abaixo da média para esta qualidade física. O desempenho na avaliação da potência de membros superiores avaliada através do teste de arremesso de medicine ball quando comparado aos valores normativos de desempenho propostos por Johnson e Nelson (1986) em análises com universitários americanos, está classificada no nível intermediário.


Conclusões

    Os resultados das avaliações da composição corporal remetem no geral a índices satisfatórios. Considerando os resultados das avaliações da flexibilidade, resistência cardiorespiratória e resistência muscular localizada observamos que há uma tendência de desempenho mediano para fraco nos homens e de mediano para satisfatório nas mulheres. As análises da agilidade, potência de membros inferiores revelaram desempenhos motores fracos, já a potência de membros superiores apresentou o desempenho em nível intermediário.

    Os resultados apontam que, ao contrário do senso comum ainda existente, os jovens que procuram formação superior em Educação Física não podem ser classificados como um grupo superior em termos de aptidão física. Essa tendência, provavelmente também será identificada em acadêmicos de outros períodos de formação e mesmo profissionais formados, sendo de extrema importância que essas informações sejam consideradas pelos professores responsáveis pela formação acadêmica desses jovens e pelos cursos de Educação Física como um todo.


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revista digital · Año 11 · N° 104 | Buenos Aires, Enero 2007  
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