Educação Física adaptada: o aprendizado, a vivência, e
a formação do conhecimento: uma construção acadêmica |
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Especialista em Atividade Física, Desempenho Motor e Saúde. UFSM/RS. |
Fernanda Panzenhagen Borges fepborges@yahoo.com.br (Brasil) |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 11 - N° 103 - Diciembre de 2006 |
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Introdução
Contextualização inicial
O período acadêmico é aquele destinado à construção do conhecimento, troca de informações, aprendizado intenso. Neste período, quando falamos da área da Educação Física, nos deparamos com inúmeros caminhos a seguir, como por exemplo, biomecânica, fisiologia, desenvolvimento humano.
Inicialmente, é difícil manter traçada uma linha que indique apenas uma direção. Nosso desejo é buscar subsídios que orientem nossa prática constante e que atentem a todas as necessidades. Procuramos mesclar algumas áreas, para ter como base informações diversas.
Ao contrário disso, existem pessoas que logo ao ingressar no ensino superior, procuram se enquadrar em temáticas de interesse. Neste caso, os acadêmicos buscam aprofundamento em áreas especificas e/ou para populações específicas, como por exemplo, atividade motora adaptada, aprendizagem motora, terceira idade.
Neste sentido, a preocupação é outra. O interesse é buscar contribuições para a construção de um conhecimento particular, e desta forma, o acadêmico se delimita exclusivamente ao estudo direcionado.
Um desses direcionamentos é a sub-área da Educação Física - a Educação Física Adaptada, que
é uma área do conhecimento em educação física e esportes que tem por objetivo privilegiar uma população caracterizada como portadora de deficiência ou de necessidades especiais, e desenvolve-se através de atividades psicomotoras, esporte pedagógico, recreação e lazer especial, e técnicas de orientação e locomoção. (Rosadas 1994).
Esta área trabalha, ou direciona estudos às pessoas com necessidades educacionais especiais. Estas são chamadas desta forma pelo fato de apresentarem características físicas, psíquicas, de natureza genética, auditivas, visuais e múltiplas diferentes das pessoas ditas "normais". São pessoas que fogem do padrão de normalidade imposto pela sociedade.
Dentre as pessoas com necessidades educacionais especiais estão
os deficientes mentais, visuais, auditivos, físicos, com múltiplas deficiências, além dos superdotados ou pessoas com altas habilidades, as que apresentam síndromes típicas neurológicas, psiquiátricas, psicológicas e as pessoas com dificuldades de aprendizagem. (Carvalho 1998).
A oferta de atividades para esta população pode ser feita em atividades físicas terrestres e atividades físicas desenvolvidas no meio líquido, como forma de promoção de saúde e qualidade de vida, bem como na orientação para uma prática eficaz.
Por isso, uma das atuações do profissional de Educação Física é estimular as necessidades, as possibilidades e as potencialidades destas pessoas quando elas se tornam alunos.
Para Silva (1998) através de atividades lúdicas e de jogos esportivos adaptados às condições específicas de cada grupo, durante a realização das atividades de lazer, de recreação e de esporte com estas pessoas, sejam estas aquáticas ou terrestres, "é importante explorar as possibilidades que estas apresentam, trabalhar suas potencialidades, trabalhar na sua autovalorização e auto-estima e reconhecer suas limitações".
Desta forma, com relação às atividades desenvolvidas em terra, ressalta-se que sua importância esteve em proporcionar vivências, e contribuições através de atividades lúdicas e brincadeiras, através da psicomotricidade inicialmente. Posteriormente as atividades foram sofrendo modificações conforme a necessidade de cada grupo de trabalho, sendo assim, pode-se ser implantado jogos adaptados, com o passar do tempo.
Acredita-se que através de atividades deste cunho, os alunos tiveram a oportunidade de organizarem-se em grupos, estabelecer regras de convivência, vínculos sociais e afetivos, propiciam o contato físico possibilitando o manuseio de diferentes materiais e o desenvolvimento de habilidades (motoras, de percepção, de atenção e musicalidade). Assim, conforme Marquezine (1998) "as atividades lúdicas e psicomotoras, sendo espontâneas, livre de tensão, trazem sempre o prazer e, conseqüentemente, o aprendizado".
Ainda, destaca-se que enquanto jogos, estes proporcionam "o aprender fazendo". As pessoas com necessidades educacionais especiais se desenvolvem através de sua interação com o ambiente que as rodeia e o nível dessa relação depende do potencial intelectual que possuem.
Portanto, a recreação, o jogo, o brinquedo e as atividades psicomotoras, são meios de exploração e de desenvolvimento global, visando também, uma interação e integração social efetiva destas pessoas.
Por isso, a prática pedagógica da Educação Física aliada às atividades psicomotoras recreativas, vem comprovar a necessidade de sua aplicação junto as pessoas com necessidades educacionais especiais, pois é uma possibilidade de desenvolvimento e integração com diferentes grupos e colaborando para a superação das dificuldades, pré-conceitos e das rotulações impostas à deficiência.
Em se tratando de atividades desenvolvidas no meio líquido, é importante destacar que estas podem auxiliar e contribuir no desenvolvimento global dos alunos envolvidos, pelo fato de apresentarem um fator diferenciado - a água, justamente por serem desenvolvidas atividades em um ambiente diferenciado do habitual - o terrestre.
Sendo assim, as atividades aquáticas proporcionam a estas pessoas vivências e experiências diferenciadas das realizadas em terra, pois o meio líquido oferece alguns benefícios.
as atividades físicas em piscinas são utilizadas na melhora de muitos distúrbios neurológicos. A tepidez e a sustentação da água ajudam a aliviar alguns dos sintomas desses indivíduos, oferecendo maior possibilidade de flutuação e mobilidade articular e uma progressão graduada dos exercícios é valiosa para os alunos cujos músculos estão fracos ou paralisados. (Skinner e Thomson, 1985).
A temperatura da água também é um fator relevante, pois as atividades se tornam mais prazerosas e a musculatura fica mais relaxada, proporcionando maior mobilidade do aluno e professor, facilitando desta forma a execução das atividades.
Segundo Skinner e Thomson (1985), "a água quente faz com que o professor mova o aluno mais facilmente do que em terra. Como em outras condições, esses fatores melhoram ao mesmo tempo a confiança e a moral do mesmo".
Durante as atividades em meio líquido o aluno tem algumas vantagens que de certa forma não podem ser aproveitadas em terra, pois o relaxamento e alongamento se tornam mais amplos na água, contribuindo para o seu desenvolvimento.
As atividades aquáticas adaptadas têm por objetivo proporcionar às pessoas com necessidades educacionais especiais algumas habilidades na água para ajudá-los nas atividades de vida diária.
Neste sentido, concorda-se com Gomez, Miguel e Fernández (2000) que falam sobre os benefícios das atividades aquáticas para pessoas com necessidades educacionais especiais, da seguinte forma:
la natación es una de las mejores formas para mejorar la movilidad y la capacidad física del minusválido. Las propiedades del agua de hacer que un cuerpo "pierda" peso y que flote, reduce la deficiencia y da la posibilidad de moverse más o menos en el agua. Además, la práctica de la natación incrementa la capacidad física, lo que a su vez da mayor estabilidad psíquica. Com una mejor condición física y psíquica, crece nuestra confianza teniendo mayores posibilidades de afrontar el trabajo cotidiano. Y si además el agua está a una temperatura agradable el baño se convierte en bálsamo para cuerpo y alma. (Gomez, Miguel e Fernández 2000).
Por isso, a oportunidade de movimento que as atividades aquáticas propiciam às pessoas com necessidades educacionais especiais, é extremamente auxiliadora e benéfica em seu desenvolvimento, sua aprendizagem e em sua educação. Sabe-se que todo movimento resulta em uma experiência fundamental na vida do ser humano, sendo assim, as atividades aquáticas proporcionam o desenvolvimento da percepção espacial, a capacidade de coordenação, o sentido de equilíbrio, a capacidade de observação, o desenvolvimento da criatividade e do autocontrole, estimulando assim, pelas experiências e vivências, o desenvolvimento afetivo, cognitivo e social, bem como o seu desenvolvimento motor.
Desta maneira, fica clara a responsabilidade de trabalhar com esta população, intensificando assim a importância de profissionais de Educação Física capacitados para oferecer atividades que melhorem a qualidade de vida das pessoas com necessidades educacionais especiais, pois assim, estarão intervindo e influenciando no desenvolvimento de seus alunos.
Sendo assim, pretende-se com esta explanação, descrever a experiência acadêmica após cinco anos de atuação, desenvolvendo estudos e propostas de trabalho em Educação Física Adaptada, ou seja, para pessoas com necessidades educacionais especiais, em atividades físicas no meio líquido e terrestre.
Considerações finaisDurante cinco anos de produção acadêmica, considerando o período de graduação e o de pós-graduação, foram desenvolvidos estudos e propostas de trabalho em meio líquido e terrestre com pessoas com necessidades educacionais especiais que pertenciam a Instituições Especiais de Ensino da cidade de Santa Maria/RS.
Neste sentido, foi construído um conhecimento específico neste período com grande consistência teórico e prática acerca de como proceder com uma população especial.
Ressalta-se a importância deste tempo dedicado a buscar informações referentes nesta sub-área da Educação Física - a Educação Física Adaptada, visto que as pessoas com deficiência em algumas vezes não encontram espaço para a oportunidade de atividade física regular e orientada na sociedade em que vivemos.
Sabemos que hoje em dia, esta prática está sendo cada vez mais valorizada e oportunizada, porém ainda anda em passos lentos. O importante é que nós profissionais desta sub-área estamos adquirindo espaço e respeito, o que significa que essas pessoas também estão obtendo respostas.
Desta forma, destaca-se que durante a etapa acadêmica foram oportunizadas atividades físicas de diversas características e para diversas populações específicas. As atividades realizadas e desenvolvidas durante os estudos e propostas de trabalho tiveram o objetivo de proporcionar as pessoas com necessidades educacionais especiais a vivência de atividades no meio líquido, bem como no meio em que vivemos - o terrestre.
Infere-se que estas contribuíram de forma geral na melhora das habilidades relacionadas à coordenação, agilidade e equilíbrio dos alunos envolvidos e ainda, no que se refere à sociabilidade entre alunos e entre alunos e professores/monitores que atuavam nas atividades. Houve também apresentações de dança, o que proporcionou uma vivência a mais no que diz respeito à expressão corporal e a representação diante do público. Frente a isso, destaca-se a importância da Educação Física no processo de formação e inclusão social destes alunos.
É importante ressaltar também que antes de se iniciar as aulas nas Instituições Especiais de Ensino, fazia-se uma apresentação dos objetivos das propostas de trabalho a direção e funcionário, bem como aos pais dos alunos, quando se fazia necessário.
Outro ponto relevante esteve nas avaliações. Fazia-se uma avaliação com os alunos através de uma ficha anamnética contendo alguns testes como: habilidades e padrões (sentar, levantar, andar, subir escadas, pendurar-se, agarrar, receber, arremessar, ficar na posição em pé), reflexos (preensão palmar e plantar), postura (cabeça flexionada para frente ou para trás ou para um dos lados, tronco flexionado para frente ou para trás, joelhos semi-flexionados ou hiper-estendidos, pernas cruzadas na linha média, braços hiper-estendidos ou em flexão, punho caído, mão fechada, dedos hiper-estendidos), esquema corporal (relação mão-boca e mão-olho), percepção visual (fixa objetos com os olhos e move a cabeça para observar) e percepção auditiva.
Esta avaliação visava constatar quais eram as limitações de cada aluno, dentro e fora do meio líquido, quais eram as suas potencialidades, o que realmente necessitavam, evitando comparações entre os alunos, somente visando obter conhecimentos individuais de cada um em relação as suas habilidades e qualidades motoras, para posterior embasamento do trabalho prático.
Sempre se iniciava com um breve aquecimento (com caminhadas, corridas, batidas de pernas - na piscina - e braços,...), após fazíamos algumas atividades específicas, envolvendo o objetivo específico de cada aula e cada grupo ou aluno (como adaptação ao ambiente, aos materiais, trabalhos respiratórios, fortalecimento muscular, percepção - visual, tátil, cognitiva, estimulação motora -, fortalecimento muscular e alongamentos), e no final da aula um relaxamento ou atividades de sociabilização, quando possível.
Realizavam-se atividades onde os alunos eram estimulados pelos sons de instrumentos musicais, pelas cores, pelas letras e números, espécies de frutas, legumes e animais, dessa forma, trabalhando a área cognitiva, bem como, a fala, a estimulação para a marcha e a preensão palmar no momento de ir buscar e/ou pegar o objeto solicitado, e a respiração, quando tinham de soprar determinado instrumento musical.
Ressalta-se que no decorrer deste período os alunos apresentaram de forma geral melhorias, especialmente com relação ao equilíbrio estático e dinâmico, coordenação, orientação espacial, melhora na criatividade, perderam alguns medos (altura), obtiveram melhoras na relação entre colegas e na participação das aulas.
É importante ressaltar, as dificuldades enfrentadas com alguns alunos, os quais não vinham com roupas adequadas para a prática da Educação Física, por exemplo. Outro obstáculo enfrentado foi à questão da higiene pessoal de alguns alunos que algumas vezes impedia o andamento normal da aula, pois se tornava difícil o contato entre os alunos e o comprometimento com o espaço que dispúnhamos para aulas, pois o local destinado às aulas ás vezes era pequeno e não se depunha de uma independência maior dentro da instituição. Por outro lado, os profissionais das Instituições demonstraram interesse pelas atividades que se desenvolvia, cujo apoio e orientação serviram de estímulo e de aperfeiçoamento profissional e pessoal.
Sendo assim, conviveu-se durante um longo período de tempo em Instituições com características próprias, profissionais diferentes e alunos com diferentes deficiências e comprometimentos, mas também com algumas semelhanças básicas. Houve sempre um ótimo tratamento com relação ao trabalho desenvolvido, o que aumentava ainda mais a vontade de aprender, seja por erros ou acertos, e a satisfação e carinho demonstrados pelos alunos a cada aula, são certamente maiores que as dificuldades enfrentadas e representam a verdadeira recompensa.
Diante dos resultados apresentados pelo trabalho, julga-se importante a continuidade de atividades deste cunho, devido ao reconhecimento dado pelas Instituições, bem como, as dimensões alcançadas pelos estudos e propostas de trabalho.
O que ficou claro é que atividades físicas regulares e orientadas realizadas durante este período acadêmico contribuíram para o desenvolvimento global de cada aluno envolvido, bem como para a saúde e qualidade de vida dos mesmos e ainda para a ampliação do conhecimento pessoal e profissional e ainda pela troca de informações e amadurecimento proporcionados, o que aumenta cada vez mais o interesse e a vontade e a necessidade de continuar os estudos nesta sub-área da Educação Física.
Referências bibliográficas
CARVALHO, R. A nova LDB e a Educação Especial. Rio de Janeiro: WVA, 1998.
GOMEZ, J.M.; MIGUEL, R.P.; FERNÁNDEZ, J. - La Natación Adaptada como medio de integración para una persona com movilidad reducida. Revista Digital - http://www.efedeportes.com/ - Buenos Aires. Ano 5, nº 28. 2000.
MARQUEZINE, Maria Cristina [ETAL]; - Perspectivas Multidisciplinares em Educação Especial. - Londrina - Ed. UEL, 1998
ROSADAS, Sidney de Carvalho. 1948- Educação Física e prática pedagógica: portadores de deficiência mental/ Sidney de Carvalho Rosadas. Vitória: UFES. Centro de Educação Física e Desportos, 1994. 144 páginas.
SILVA, Silvana Maria Moura da. Avaliação e intervenção sócio-neuromotora de crianças com marasmo na primeira infância. Campinas, SP: [s. n.], 1998.
SKINNER, A. T. e THOMSON, A M. Duffield: Exercícios na água. Editora Manole, 1985.
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