Tempo de incidência dos gols em equipes de diferentes níveis competitivos na copa do mundo de futsal |
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*Aluno do Programa de pós-graduação em Saúde Pública - Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo-SP **Aluno do Programa de pós-graduação em Educação Física e Sociedade - Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP Especialização em Futsal, Universidade Norte do Paraná, Londrina-PR |
Raphael Mendes Ritti Dias* Wilton Carlos de Santana** rdias@usp.br (Brasil) |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 11 - N° 101 - Octubre de 2006 |
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1. Introdução
Sob direção da FIFA nos últimos 15 anos (FIGUEIRÊDO, 2004), o futsal ganhou maior visibilidade em nível internacional. Algumas evidências ratificam, minimamente, tal assertiva, como, por exemplo, a regularidade da Copa do Mundo - 1989 (Holanda), 1992 (Hong Kong), 1996 (Espanha), 2000 (Guatemala) e 2004 (China); a participação, no último Mundial, de dezesseis países dos cinco continentes; a confirmação da sua inclusão nos Jogos Pan-Americanos de 2007; a filiação à FIFA de mais de 130 países praticantes de futsal (SAAD, 1997). Por conseguinte, é possível constatar que o futsal encontra-se em franca ascensão e sinaliza para um futuro promissor.
O futsal, a exemplo do basquetebol, do futebol e do handebol, é um jogo de invasão (quanto à ocupação do espaço), de luta direta pela posse da bola (quanto à disputa da bola), de circulação da bola (quanto às trajetórias predominantes), em que predominam, do ponto de vista energético-funcional, esforços intermitentes, mistos alternados (aeróbio-anaeróbio) (GARGANTA, 1998). Daí acharmos que a característica mais pontual do jogo de futsal seja o dinamismo, traduzido pela marcação intensa, passe acelerado, constante perda e recuperação da posse de bola, movimentações constantes sem a posse da bola, situações de superioridade/inferioridade e igualdade numéricas, diversidade de situações (SANTANA, 2004), solicitações metabólicas intensas, visto que são realizados freqüentes deslocamentos rápidos e curtos, com mudanças de direção e paradas bruscas (ARAÚJO et al, 1996).
O que teria contribuído para que o futsal chegasse a esse patamar? Pensamos que muito se deve a alguns dispositivos regulamentares. Por exemplo, a regra 03 prevê um número ilimitado de substituições de jogadores, o que permite aos técnicos o revezamento constante destes e, por extensão, a possibilidade de se manter a intensidade das movimentações durante toda a partida. Concomitantemente a isso, uma outra característica do jogo de futsal que explica o seu dinamismo, e em particular que mais interessa para este estudo, é a possibilidade iminente de se fazer gols. Diríamos, inclusive, que dificilmente uma partida de futsal será jogada sem que se marquem tentos. A Copa do Mundo de 2004 ratifica esta assertiva: foram marcados 238 gols em 40 jogos (média de 5,95 gols por partida). Em parte, a consecução de gols pode ser explicada por conta da escassez de espaço (CHAVES & AMOR, 1998) - o jogo de futsal em nível internacional exige uma quadra com dimensões entre 38 e 42 metros de comprimento e 18 e 22 metros de largura; isso faz com que os jogadores, ao invadirem o campo adversário, estejam próximos à meta e, por isso, com grande possibilidade de chutarem nesta (evidentemente que terão de imprimir ações técnico-táticas de ataque que dêem conta disso). Outros dispositivos da regra incitam a concretização de gols:
A prorrogação da duração de qualquer período da partida para a execução de uma penalidade máxima e de um tiro direto livre sem barreira, uma vez terminado o tempo regulamentar (regra 08);
O gol válido diretamente de bola de saída (regra 09);
A validade do gol, mesmo quando do encerramento da partida, se a bola estiver na trajetória da meta (tocando ou não no goleiro adversário) (regra 11);
A punição da equipe que faz jogo passivo, isto é, que tem condições de jogar a bola e, intencionalmente, retarda o jogo (regra 12);
A atuação do goleiro fora da área de meta (regra 12);
A expulsão temporária de atleta que implica numa superioridade numérica momentânea para uma das equipes (regra 12);
A vedação de barreira em tiros livres a partir da 6ª falta (regra 14);
A validade do gol diretamente de arremesso de canto (regra 18);
A lei da vantagem (anexo I).
Na medida em que a marcação de gols se constitui na meta principal das equipes (quem fizer mais gols vence!) e mediante o fato de as regras do jogo induzir aquelas a marcá-los, nos interessou verificar o tempo de incidência dos gols (TIG) e as diferenças deste em equipes de diferentes níveis competitivos quando de jogos da Copa do Mundo de Futsal 2004.
Algumas perguntas, entre outras, serviram como norteadoras:
Em qual período do jogo aconteceram mais gols?
Em qual momento do jogo ocorreram mais (início, intermédio ou final)?
Equipes de diferentes níveis competitivos (primeiras colocadas, bloco intermediário e últimas colocadas) apresentam, quanto ao TIG, desempenhos distintos?
Mas, qual a relevância disso? Pensamos que a revelação desses indicadores poderá contribuir para que técnicos e preparadores físicos da modalidade mais bem compreendam a realidade de jogo e, conseqüentemente, possam planejar e selecionar meios e métodos de treinamento afinados com a demanda competitiva. PINTO e GARGANTA (1996) sustentam que os modelos de jogo, de preparação e de jogador influenciam em larga medida o planejamento tanto do ensino como do treino dos esportes coletivos. Concordamos com os autores: quanto mais se conhece do jogo maior a possibilidade de se acertar quando do planejamento do treino.
2. Métodos2.1. Análise dos jogos
Foi analisado o TIG de todos os 40 jogos da Copa do Mundo de Futsal, realizado nos meses de novembro e dezembro do ano de 2004. No total, foram marcados 238 gols.
Utilizamos como critério para efetuar a comparação da quantidade de gols entre as equipes de diferentes níveis competitivos a classificação final que estas obtiveram no campeonato. Desta forma, as equipes foram divididas em três escalões:
Escalão A (equipes que chegaram às semifinais): Espanha, Itália, Brasil e Argentina.
Escalão B (equipes que passaram para a segunda fase): Portugal, República Tcheca, Ucrânia e Estados Unidos.
Escalão C (equipes que não passaram da primeira fase): Taiwan, Egito, Austrália, Tailândia, Paraguai, Japão, Irã e Cuba.
A análise do tempo de ocorrência dos gols foi feita através da súmula dos jogos disponibilizada pela FIFA durante a realização do Campeonato.
2.2. Tempo de incidência de golsA análise do TIG foi feita dividindo-se o tempo total de jogo em quatro períodos de 10 minutos:
0-10 minutos: 1º quarto
11-20 minutos: 2º quarto
21-30 minutos: 3º quarto
31-40 minutos: 4º quarto
2.3 Tratamento estatísticoPara o tratamento dos dados foi utilizada estatística descritiva para apresentação dos gols e seus períodos de ocorrência. Para a comparação entre a quantidade total de gols marcados em cada período e a quantidade de gols marcados dentro de cada escalão foi utilizado o teste pareado de Wilcoxon com p<0,05.
3. ResultadosA tabela 1 apresenta a média, desvio padrão quantidade mínima e máxima de gols marcados em cada período do jogo. Os resultados indicam que durante o 4º quarto houve maior média de incidência de gols em comparação aos outros períodos do jogo.
A tabela 2 apresenta os resultados referentes à comparação entre a quantidade de gols marcados entre os períodos dentro de cada escalão. Os resultados expressos na tabela 2 indicam que não houve diferenças significantes entre a quantidade de gols marcados nos diferentes períodos no escalão A. No escalão B, a quantidade de gols marcados no 1º e 3º quartos foram significantemente inferior comparado à quantidade de gols marcados no 4º quarto. No escalão C, a quantidade de gols marcados no 4º quarto foi significantemente superior aos demais períodos.
4. DiscussãoOs resultados encontrados no presente estudo indicaram que o TIG entre equipes de diferentes níveis competitivos foi diferenciado. Se por um lado não se constataram diferenças na quantidade de gols marcados nos diferentes períodos de jogo entre as equipes mais bem classificadas (escalão A), nos outros escalões, houve diferenças significantes quando comparados o número de gols feitos nos três primeiros quartos com o número de gols feitos no último período (escalão B, no 1º e 3º quartos e escalão C, no 1º, 2º e 3º quartos).
Outra constatação foi o fato de as equipes do escalão A terem obtido regularidade na quantidade de gols marcados em todos os períodos, resultado que não se estende para os demais escalões. Contudo, quando analisado a quantidade de gols marcados por todos os escalões conjuntamente, verificou-se que a maioria dos gols ocorreu no último período de jogo. Esses resultados corroboram com os encontrados por Bello Júnior (1998a) e Balzano (1999). No primeiro caso, analisou-se o TIG durante a Copa Verão (SP) 1997, categoria principal. Foram marcados 319 gols em 31 jogos e os resultados demonstraram que aproximadamente 30% dos gols marcados ocorreram quando dos 10 minutos finais de jogo. No segundo caso, analisou-se o TIG durante a 1ª fase da Liga Nacional de Futsal 1999 e encontraram-se resultados semelhantes: foram marcados 199 gols em 28 jogos e os resultados indicaram que 35,17% dos gols ocorreram nos últimos 10 minutos de partida. Acrescenta-se o estudo de Pedroso (2004), que ao analisar o TIG durante uma competição de futsal feminino em nível nacional, observou uma maior incidência de gols nos últimos cinco minutos de cada período de jogo.
Assim, parece que os minutos finais do jogo consistem num período crítico da partida, nos quais, freqüentemente, são marcados muitos gols. Ratifica isso o fato de, no cenário deste estudo, em aproximadamente 70% das partidas, terem sido assinalados gols nos últimos cinco minutos de jogo. Bello Júnior (1998b) relata que a elevada incidência de gols nesse período está associada, principalmente, aos preparos físico e emocional dos jogadores.
Balzano (1999) analisou, juntamente com o TIG, a origem dos gols em cada período. Os resultados do estudo demonstraram que nos últimos 10 minutos de jogo 21,4% dos gols são originados de jogadas com o goleiro-linha, 17,1% originados por jogadas de contra-ataque e 17,1% de faltas sem barreira. Embora Voser (2003) tenha relatado que esses resultados podem ser atribuídos principalmente ao desequilíbrio emocional, preparo físico comprometido e pela desestrutura tática das equipes (devido ao elevado número de faltas coletivas), ressaltamos que as opções táticas, por exemplo, de usar um goleiro-linha e de se jogar em contra-ataque, atendem a uma demanda circunstancial de jogo e não implicam, necessariamente, que as equipes estejam desequilibradas emocionalmente, e/ou com o preparo físico comprometido e/ou desestruturadas taticamente. Dessa forma, parece-nos que a maior incidência de gols nos últimos 10 minutos pode ser explicada tanto por componentes físicos e emocionais (não focados neste estudo e tampouco nos citados anteriormente) como por opções táticas.
5. ConclusãoConcluímos que os achados parecem indicar que o resultado observado nas equipes finalistas (padrão regular de gols em cada período) poderia ser utilizado como um referencial a ser alcançado por todas as equipes, haja vista que se trata de um indicador obtido em situação de competição das quatro melhores Seleções do mundo. Assim sendo, parece-nos que a busca pela regularidade durante todo o jogo seria o modelo a ser perseguido pelas equipes de futsal. Entretanto, por se tratar do primeiro estudo com esse enfoque, seria importante que mais estudos dessa natureza sejam feitos para confirmarem as hipóteses levantadas.
Referências
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Balzano, ON. A ocorrência e origem dos gols em jogos de futsal profissional (Liga Nacional 1999) . Monografia (Graduação em Educação Física) - UFRS, Porto Alegre.
Bello Júnior N. Estatística. In: Bello Júnio N. A ciência do esporte aplicada ao futsal. Rio de Janeiro: Sprint, 1998a. p.111-4.
Bello Júnior N. Evolução do jogo de futsal. In: Bello Júnior N. A ciência do esporte aplicada ao futsal. Rio de Janeiro: Sprint, 1998b. p.123-6.
Chaves JLC, Amor JAR. Táctica y estrategia en fútbol sala: situaciones de ataque y defensa. Barcelona: Hispano Europea, 1998.
Figueiredo V. A seleção brasileira de futsal através dos tempos. Fortaleza: Expressão gráfica, 2004.
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Voser R. A História, a Técnica e a Tática do futsal. In: Voser R. Futsal: Princípios técnicos e táticos. Canoas: Editora da Ulbra, 2003. p. 83-152.
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