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Correlação entre perfil datiloscópico e
perfomance nos testes de 12 minutos e de
impulsão horizontal em jovens do sexo masculino

   
* Universidade de Brasília/UnB.
** GEASE - Grupo de Estudos Avançados em Saúde e Exercício.
(Brasil)
 
 
Felipe Feres Nassau* | Paulo Gentil**
Silvana Rocha Uruguai Lobato
Pedro Ivo Alvarenga Machado Costa
Valdinar de Araújo Rocha Junior

 

 

 

 

 
Resumo
     Para atingir o seu potencial genético no esporte o atleta deve treinar desde a sua juventude para a modalidade em que pretende competir, portanto, quanto mais cedo for detectado o seu talento para o esporte, mais tempo ele terá para se dedicar aos seus treinamentos. A capacidade do indivíduo em cada esporte depende de uma grande variedade de aspectos metabólicos, morfológicos e genéticos. Detectar estas variáveis por meio de procedimentos empíricos pode levar a erros. Deste modo, começou a ser estudada a possibilidade de utilizar a dermatoglifia, ou seja, características morfológicas das impressões digitais, para a identificação de tais capacidades físicas. Porém, faltam estudos fazendo correlação dos perfis dermatoglíficos com capacidades físicas encontradas através de testes para que seja possível validar a teoria apresentada. No presente estudo 87 jovens não-atletas do sexo masculino foram submetidos ao teste de andar e correr por 12 minutos de Cooper - para avaliar a resistência - e ao teste de impulsão horizontal - para avaliar a potência. As impressões digitais foram coletadas para encontrar os níveis de A, L, W, D10 e SQTL. Foi calculada a correlação entre o perfil dermatoglífico e as capacidades físicas avaliadas, encontrando-se correlação negativa significativa entre a performance no teste de impulsão horizontal e os valores de SQTL. Quanto à resistência, não houve relação entre A, L, W e SQTL, e foi verificada uma correlação negativa entre a performance no teste de 12 minutos e os valores de D10, mostrando resultados contrários às teorias comumente apresentadas.
    Unitermos: Dermatoglifia. Detecção de talentos. Jovens não-atletas. Potência. Resistência.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 11 - N° 100 - Septiembre de 2006

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Introdução

    Para atingir todo o seu potencial genético o atleta necessita treinar desde sua juventude para a modalidade na qual pretende competir (Gomes, 2002). A identificação daquele que se destaca e o nível de desempenho que possa atingir em determinada modalidade desportiva dependem de uma grande variedade de características genéticas de ordem metabólica e morfológica (Gomes, 2002; Moskatova, 1998). Marques & Bento (1991) reportam que a detecção de talentos tradicionalmente feita por meio de observações dos treinadores em competições a partir de procedimentos empíricos gera grande probabilidade de enganos, levando à necessidade de procedimentos com fidedignidade baseada em evidências científicas para selecionar possíveis atletas de alto rendimento. Atualmente, grande atenção tem sido dada à influência das características genéticas associadas à atividade física (Wolfarth et al., 2005), no entanto, os métodos de análise genômica ainda são relativamente caros e inacessíveis para a maior parte dos treinadores. Entretanto, algumas estratégias mais acessíveis têm sido usadas para detecção de talentos, como a análise dos dermatóglifos.

    Segundo Nora e Fraser (1991), os dermatóglifos, ou seja, escrita da pele, são configurações das cristas dérmicas nos dedos, palmas e plantas, formadas no período entre a décima terceira e décima nona semana de gestação e que permanecem inalteradas durante toda a vida. Variantes nestas cristas apontam tendências de diferenças entre raças, sexos e tipos constitucionais, pois informam diversos princípios biológicos (Borin, 2002). Estes perfis dermatoglíficos podem indicar também potenciais de desenvolvimento de capacidades físicas como força, potência, resistência e coordenação (Abramova et al. apud Fernandes Filho, 1999). Diversos autores realizaram análises descritivas de perfis dermatoglíficos em diferentes populações (Borin, 2002; Fazolo et al., 2005; Fernandes Filho e Abramova 1999; João, 2002; Medina, 2002; Pereira et al., 2003; Tuche et al., 2005), no entanto, há uma falta de estudos correlacionando perfis dermatoglíficos com capacidades físicas. Desta forma, é importante estudar a fidedignidade da relação entre dados dermatoglíficos e suas correspondentes capacidades físicas para validar o uso do padrão dermatoglífico proposto por Abramova et al. (apud Fernandes Filho, 1999) e verificar se este método é aplicável à descoberta de talentos. O objetivo do presente estudo é identificar as correlações existentes entre a performance no teste de 12 minutos e no teste de impulsão horizontal e os tipos datiloscópicos fundamentais em jovens do sexo masculino.


Material e métodos

    Um total de 87 jovens do sexo masculino, com média de idade de 29,46 ± 4,43 anos, participaram do presente estudo. Para participar do estudo, os indivíduos deveriam estar em boas condições de saúde, comprovada por exames médicos recentes. Os indivíduos não poderiam ser atletas nem estar praticando atividade física regularmente (mais de uma hora, três vezes por semana) nas últimas quatro semanas. Todos os indivíduos foram previamente informados dos procedimentos envolvidos no experimento e da possível utilização dos dados e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido antes de participar do estudo.

    Para a coleta das impressões digitais foram utilizadas tinta de imprensa, plaqueta de entintamento, prancheta e fichas datiloscópicas. A análise dos tipos fundamentais das impressões digitais foi realizada por meio do protocolo de Cummins & Midlo citado por Pável et al. (2004). O método de coleta das impressões digitais é assim descrito: Arco "A" - ausência de trirrádios ou deltas, se compõe de cristas que atravessam, transversalmente, a almofada digital.

    Presilha "L" - possui um delta. Desenhos fechados, em que as cristas da pele começam de um extremo do dedo, encurvam-se distalmente em relação ao outro, e não se aproximam daquele. Verticílo "W" - contêm dois deltas. Figura fechada. As linhas centrais concentram-se em torno do núcleo do desenho. Quantidade de linhas (QL) - a quantidade de linhas das cristas de pele, dentro do desenho. É contada seguindo a linha que liga o delta ao centro do desenho, sem levar-se em consideração a primeira e a última linha da crista.

    Deve-se observar, após a coleta de dados, a quantidade dos desenhos de tipos diferentes para os 10 (dez) dedos das mãos; a somatória da quantidade total de linhas (SQTL), que é a soma da quantidade de linhas nos 10 (dez) dedos das mãos; o índice delta (D10) que é obtido seguindo a soma de deltas de todos os desenhos, onde no arco A é sempre (0), na presilha L é (1) (um delta) e no verticilo W e S desenho é (2) (dois deltas), sendo assim, D10 = L + 2W, e os tipos de fórmulas digitais que indicam a representação nos indivíduos de diferentes tipos de desenhos, sendo ao todo nove tipos de fórmulas digitais: 10A - presença de 10 arcos; 10L - presença de 10 presilhas; 10W - presença de 10 verticilos; ALW - presença de arco, presilha e verticilo, em qualquer combinação; AL - presença de arcos e presilhas em qualquer combinação; AW - presença de arcos e verticilos em qualquer combinação; L=W - presença de presilha e verticilo, na mesma proporção; LW - presença de presilha e verticilo, com a condição de que o número de presilhas seja maior que cinco; WL - presença de presilha e verticilo, com a condição de que o número de verticilos seja maior que cinco.

    Segundo a tabela de Abramova et al. (1995), apresentada por Fernandes Filho (1999), a qual está reproduzida na tabela 1, há categorias pontuais de características de impressões digitais em relação a D10 e SQTL relacionadas a determinadas características somato-funcionais. No entanto, é muito difícil utilizar a tabela para realizar uma análise devido à falta de definição das categorias. No presente estudo, foram utilizados os pontos médios entre as categorias para definição dos pontos de corte. Deste modo, a categoria IV, associada aos valores máximos de resistência, foi definida como tendo os valores de D10 entre 12,35 e 15,3 e os de SQTL entre 130,3 e 148,5. A categoria I, associada à força relativa, foi definida como valores de D10 menores que 7,25 e de SQTL menores que 37,1.

Tabela 1. Classificação do conjunto dos índices dermatoglíficos e
dos índices somato-funcionais entre remadores acadêmicos altamente qualificados (n=101).

    Para avaliar a aptidão física, foi aplicado o Teste de andar e correr por 12 minutos de Cooper (Marins e Giannichi, 1998), por ser um teste simples em termos de aplicabilidade e de baixo custo. O teste foi realizado em uma pista de 400 metros, marcada a cada 5 metros. Durante o teste, os sujeitos percorreram a maior distância possível em 12 minutos, sendo permitido correr ou caminhar durante o teste. O início e fim dos testes foram marcados por um sinal sonoro. Um cronômetro foi posicionado no marco zero da pista, de modo a ficar visível aos participantes ao final de cada volta. Para o teste de impulsão horizontal foi utilizado o teste de salto horizontal - Long Jump (Marins e Giannichi, 1998), que consiste em partir da posição de pé, pés paralelos e em pequeno afastamento lateral e executar um salto detrás da linha de partida atingindo a maior distância possível à frente, flexionando as pernas e utilizando o balanço dos braços. Todos os indivíduos tiveram explicações detalhadas sobre os testes e tiveram experiência prévia com os procedimentos antes da realização dos testes.


Tratamento estatístico.

    Os resultados estão apresentados como média ± desvio padrão, os quais foram calculados por meio de procedimentos estatísticos padrão. Para avaliar a relação entre a performance nos testes e os tipos fundamentais das impressões digitais foram calculadas correlações lineares bi-caudais de Pearson. Para avaliar se as classes I e IV diferiam em relação às demais com relação aos resultados do teste de impulsão horizontal e teste de 12 minutos, respectivamente, foram usados testes de T para amostras independentes. O nível de significância foi estabelecido como p<0,05.


Resultados

    As médias para as variáveis analisadas estão expressas na tabela 2.

Tabela 2. Resultados do teste de impulsão horizontal, teste de
12 minutos e análise dermatoglífica no grupo analisado.

    Com relação aos tipos fundamentais, os resultados das correlações estão apresentados na tabela 3. Os dados revelaram correlação positiva significativa entre SQTL e D10 (r = 0,805; p<0,01) e SQTL e W (r = 0,795; p<0,01). Houve correlação negativa entre SQTL e A (r = -0,723; p<0,01). Com relação à performance, foram encontradas correlações negativas significativas entre os resultados do teste de impulsão horizontal e os valores de SQTL (r = -0,214; p<0,05) e entre os resultados do teste de 12 minutos e os valores de D10 (r = -0,237; p<0,05). Os resultados nos testes de impulsão horizontal e 12 minutos foram significativamente correlacionados (r = 0,279 p<0,01).

Tabela 3. Resultado do teste de correlação linear de Pearson.

    Com relação às classes definidas por Abramova, 19 indivíduos foram incluídos na classe IV em relação aos valores de D10. Os resultados do teste de 12 minutos da classe IV não diferiam da média obtida pelos demais indivíduos [2367,37 ± 253,60 m vs. 2365,58 ± 226,78 m; f(1,86) = 0,001, p = 0,977)]. A análise dos valores de SQTL levou à inclusão de 14 indivíduos na classe IV. A média dos resultados do teste de 12 minutos para este grupo foi 2318,21 ± 278,23 m enquanto a média dos resultados para os demais indivíduos foi de 2375,14 ± 222,33 m, sem diferenças entre eles [f(1,86) = 0,709, p = 0,402].

    De acordo com os valores de D10, oito indivíduos foram incluídos na classe I, os resultados do teste de impulsão horizontal para este grupo não foram diferentes em relação aos demais indivíduos [2,20 ± 0,24 vs. 2,19 ± 0,17; f(1,86) = 0,019, p = 0,89]. A classificação por meio dos valores de SQTL gerou um grupo de apenas três indivíduos, com resultados médios no salto de impulsão horizontal de 2,22 ± 0,19 m, a média dos valores para os demais indivíduos foi 2,19 ± 0,18 m, sem diferença entre eles [f(1,86) = 0,054, p = 0,816].


Discussão

    Segundo Abramova et al. (apud Fernades Filho, 1999) a classe I estaria associada a valores máximos de força relativa, no entanto, os indivíduos do presente estudo nesta classe não apresentaram melhores valores no resultado do salto de impulsão horizontal em comparação com as demais classes. Apesar do teste não ter sido desenvolvido especificamente para mensurar a força relativa, seria esperado que indivíduos com maior força relativa também tivessem resultados positivos neste teste, pois ele envolve a projeção do peso do próprio corpo. De modo similar, os indivíduos da classe IV, os quais teriam níveis máximos de resistência segundo Abramova et al. (apud Fernades Filho, 1999), não diferiram dos demais com relação à performance no teste de 12 minutos. Portanto a tabela não parece ter validade no grupo estudado.

    Em adição, os resultados da presente análise não revelaram correlações significativas entre a performance no teste de impulsão horizontal e A, L ou D10, e mostraram uma correlação negativa significativa entre a performance no teste de impulsão horizontal e os valores de SQTL (r = - 0,214). Os resultados encontrados foram contrários à teoria apresentada por Abramova et al. (apud Fernandes Filho, 1999), a qual sugere que modalidades de alta potência e curta duração estão associadas a baixos níveis de D10 e desenhos complicados (W, S), e aumento da parcela de desenhos simples (A, L) e SQTL. Com relação aos esportes de resistência Abramova et al. (Fernandes Filho, 1999) sugerem que a performance esteja relacionada a altos níveis de D10, SQTL, aumento na parcela de W e falta de A. No entanto, os resultados da presente análise não mostraram correlação entre A, L, W e SQTL, e mostraram uma correlação negativa significativa entre a performance no teste de 12 minutos e os valores de D10.

    Deste modo, os resultados do presente estudo nos levam a concluir que não existem bases científicas suficientes até o presente momento para utilizar a dermatoglifia como forma de predizer a performance motora nas capacidades físicas relacionadas aos testes estudados. Seria interessante que estudos futuros analisem as características em um maior número de indivíduos e utilizando outros testes para avaliar a questão de forma mais ampla. Adicionalmente, para uma melhor compreensão da funcionalidade da dermatoglifia, estudos futuros poderiam selecionar indivíduos não-atletas com perfil dermatoglífico supostamente favorável a alguma capacidade física e analisar suas respostas a um treinamento realmente direcionado para a melhora do rendimento.


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